ISBN: 978-65-87289-36-6 | Redes sociais da ABA:
Grupos de Trabalho (GT)
GT 008: Antropologia da Arte
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Coordenação
Kleyton Rattes Gonçalves (UFC), Tatiana Helena Lotierzo Hirano (USP)
Debatedor(a)
Leonardo Carvalho Bertolossi (UFRJ), Daniele Borges Bezerra (UFPEL), Paulo Maia (UFMG)

Resumo:
O GT visa a reunir pesquisas, em andamento ou concluídas, voltadas às searas do campo da Antropologia da Arte, em um sentido amplo. O desiderato é abranger pesquisas etnográficas, documentais ou bibliográficas, de distintos subcampos, de modo a produzir debates e dar saliência a uma série de produções acadêmico-científicas desenvolvida nas últimas décadas na antropologia. Pretendemos reunir trabalhos e pesquisas sobre: audiovisual, imagem e som; performance, ritual, dança e teatro; poéticas, literaturas e artes verbais; artes plásticas, patrimônios e museologia; etnomusicologia. A vasta abrangência do GT foi propositalmente assim pensada, de modo a mapear uma série de fenômenos (fatos e feitos), que está abarcada, em nossa forma de organização social, pela seara que nomeamos de “arte”. Uma das frentes é dar destaque a pesquisas, em médio e longo prazo, das referidas áreas, contemplando trabalhos tanto em contextos modernistas (urbanos e euroamericanos), quanto em de povos tradicionais, originários (etnológicos). Esperamos que os trabalhos do GT permitam, em comparações, provocar torções de perspectiva articulando modos empíricos teóricos não canônicos no campo da “história da arte”.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Quem é esse Palhaço que chega ao espaço do cuidado? Unindo pontos para uma compreensão antropológica de sua performance e ritual.
Aldenildo Araujo de Moraes Fernandes Costeira (UFPB)
Resumo: O presente trabalho consiste em um exercício de compreensão do palhaço na contemporaneidade, que se manifesta em diversos espaços da vida cotidiana. Além disso, representa um ensaio para a escrita de um capítulo destinado a esse arquétipo na minha tese, que atualmente está em fase de pesquisa de campo. Esta tese é intitulada "O PALHAÇO CUIDADOR: um estudo etnográfico do cuidado em saúde" e está vinculada ao Programa de Pós-Graduação de Antropologia da Universidade Federal da Paraíba - PPGA-UFPB. Para realizar este exercício, faço um breve relato da trajetória histórica do palhaço, descrevendo sua presença em diferentes espaços e épocas. Em seguida, aproximo-me de alguns estudos antropológicos sobre rituais de cura conduzidos por dois antropólogos: Ernesto De Martino, que estudou o processo ritualístico do Tarantismo, e Victor Turner, que analisou o artefato/personagem Kavula no ritual Chihamba dos povos Lunda-Ndembus. Continuo buscando compreender a dimensão corêutica do Tarantismo, fazendo uma aproximação com as produções de Rudolf Laban, que ao se interessar pelos estudos do movimento, desenvolveu a Coreologia, construindo assim uma metodologia própria. Retorno a Victor Turner, desta feita para fazer uma aproximação do Drama Social no processo saúde-doença, tentando compreender as quatro fases desenvolvidas por ele na teoria do Drama Social, e como podemos remetê-las à vivência do adoecimento. Sigo com Tim Ingold, ao estabelecer o olhar do Palhaço Cuidador que relaciona-se com o Drama Social do adoecimento, como algo implicado em uma máxima inserção e observância aos acontecimentos e numa perspectiva da antropologia da vida. Por fim, concluo com as Teorias do Iniciador e do Guru de Frederik Barth, apresentando elementos essenciais para a formação do Palhaço Cuidador em um processo de ritual de iniciação que propicia o desenvolvimento desse papel social. Busco assim, por meio de aproximações com determinadas teorias e conceitos de alguns autores, compreender o papel do palhaço que chega à palhaçaria do cuidado, refletindo sobre suas ações ritualísticas em práticas diversas e na prática de cuidado, por meio desse exercício. As hipóteses formuladas dizem respeito às bases antropológicas do palhaço, à utilização do drama social como uma ferramenta analítica para compreender o processo saúde-doença/adoecimento, à metodologia de formação do Palhaço Cuidador no contexto da figura do iniciador e à prática desse ator social dentro da perspectiva de uma antropologia ecológica. Nesse contexto, acredito que minha abordagem encontra ressonância na Antropologia da Arte, explorando as interseções entre a performance do palhaço e as expressões artísticas, oferecendo uma perspectiva única sobre as relações entre arte, ritual e cuidado em saúde.
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Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
A macumba lírica de Lívio Abramo: traduções visuais do sagrado afro-brasileiro
Alexandre Araujo Bispo (Aut)
Resumo: A macumba lírica de Lívio Abramo: traduções visuais do sagrado afro-brasileiro. Em 1951, 1953, 1955, 1957 e depois em 1981, o desenhista, gravador, jornalista, pintor e professor paulista Lívio Abramo (Araraquara 1903 – Assunção 1992) produziu algumas obras em xilogravura (4), linogravura (1), litografia (1), aquarela (1), nanquim e aguada (1), às quais deu o título de Macumba. O elemento comum entre elas é a representação figurativa não realista de mulheres em movimento, dançando, algumas, seguramente, em transe já que esse é um traço, à princípio, particular às religiões afro-brasileiras. Em cada uma das imagens, o artista criou soluções líricas, pouco objetivas, descritivas ou documentais, para abordar um tema ainda hoje rodeado por preconceitos, transmitindo com sedutora precisão a circularidade, a espiritualidade, a transcendência e performance feminina na condução do rito religioso da macumba carioca. Em contato durante dois anos com um terreiro em Duque de Caxias, Abramo fugiu aos estereótipos e à folclorização do rito da macumba encantado que estava pelo movimento, ritmo e suntuosidade do evento sacro. O objetivo desta comunicação é mostrar que a série foi realizada em dois momentos de mudança social na sensibilidade em torno da macumba, na década de 1950 e na década de 1980 quando as religiões afro-brasileiras se apresentavam como uma oportunidade legítima de fé. Em depoimento de 1984, o artista se aproxima dos antropólogos que vão a campo para conhecerem, por experiência e observação, uma determinada realidade cultural e se relacionarem “cientificamente” com a cultura do outro. No contato, eles estabelecem relações de diálogo, experimentam os modos de ser e viver das pessoas em seus contextos de produção de sentido e dão forma a essa experiência por meios como a escrita e a imagem etnográfica. Abramo que admite uma “predisposição natural para tal manifestação”, dá forma a esse contato por meio de técnicas artísticas, transformando o movimento da macumba em linhas, manchas de cor, jogos de claro escuro, gestos cromáticos. Trata-se, portanto, de pensar que macumba é essa que o artista traduziu visualmente ao visitar por dois anos a casa da Mãe de Santo Dona Dalva?
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Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Canções de liberdade: as pulsões sonoras do reggae jamaicano como forma de resistência
Anderson de Jesus Costa (IFBA)
Resumo: O presente trabalho é resultado da minha pesquisa de doutorado sobre o conteúdo político das músicas de reggae jamaicano, e, mais do que isso, sobre uma estética afrodiaspórica. Neste comunicação, me debruço sobre as músicas do reggae jamaicano correlacionando-as com as estruturas de segregação colonial e pós-colonial e suas consequências para o povo negro da Jamaica. O intuito é discutir a maneira como esses contextos se tornaram importantes instrumentos para formação de modos de composição musical, que expressam formas de resistência dessas populações negras e afrodiaspóricas. A partir das produções musicais realizadas por dois dos principais responsáveis pela bases da resistência afrodiaspórica na música reggae jamaicana, Peter Tosh e Bob Marley, busquei debater a relação entre a música reggae e o contexto social, político e cultural da sua atuação política contestatória. Para tanto, busquei um cenário de diálogo entre algumas composições presentes em dois álbuns de cada cantor, que apontam, de forma latente, a presença de um conteúdo de descolonização e reafricanização dos afrodiaspóricos no atlântico, e as experiências biográficas dos compositores. Atentando para as suas biografias como testemunhos compartilhados das experiências de segregação colonial, mas também, de contestação. Dentro deste diálogo, três temas foram eleitos como eixos de análise: pan-africanismo, anti-racismo e as críticas ao capitalismo econômico e racial. Se, por um lado, optei por interrogar as respectivas músicas em função de uma análise dos conteúdos das letras, em sua forma/conteúdo, a partir da utilização do processo de decomposição da música, por outro lado, investi em um retorno às memórias e experiências destes artistas em trenchtown - gueto Jamaicano. Diante disso, proponho estabelecer uma relação dos conteúdos intra-estéticos da música com as bases de sentido e eficácia outorgadas pelo contexto socio-histórico-cultural, acionado aqui através dos usos de elementos biográficos. Argumento que o reggae se apresentou nos diversos cenários de diáspora africana, como uma sonoridade que diz muito sobre o que é ser um ser humano negro, principalmente, quando se é pobre e constantemente confrontado com a experiência do colonialismo/colonialidade do poder. Proponho pensarmos sobre como a diáspora diz muito sobre o que nós somos, não fazendo parte somente de uma única história biográfica, mas de sentidos sonoros de muitas existências, de pulsões sonoras que não podem ser compreendidas pela estética ocidental.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Paisagens cenográficas nas ruínas da mineração: Arte e natureza nos lugares de ausência do Instituto Inhotim
Carolina Lara de Matos (UFMG)
Resumo: O Instituto Inhotim localizado no município de Brumadinho, Minas Gerais, propõe um espaço de imersão e experimentação entre obras de arte e jardins paisagísticos explorando a potencialidade da relação entre arte e natureza. Os lugares que surgem dessa proposta tomam as mais diversas formas, colocando as relações entre obras/estruturas expográficas, cultura/natureza e lugar/caminho em evidência. As experiências produzidas pelo museu, únicas em sua estética e múltiplas em seus arranjos espaciais, carregam ausências e presenças e revelam a centralidade de determinados corpos na construção de sua arte. Aspectos do contexto da região e da formação da instituição, eclipsados na produção da experiência, tomaram corpo na minha percepção direcionando o escopo das discussões para as relações entre arte, natureza, capitalismo e colonialismo tendo como eixo a mineração. Esta que, não se emaranha somente com a região de Brumadinho, mas sustenta as bases do museu. O Inhotim tomou a forma de um agente que retroalimenta a estrutura desse capitalismo feral e colonial ao qual estamos imersos, se apropriando até mesmo das críticas e movimentos de resistência a ele na produção de paisagens cenográficas que mascaram esse processo. Esse estudo tem como objetivo analisar a dinâmica das relações - obliteradas ou não - que produzem o Instituto e sua experiência nos moldes que ele propõe, assim como compreender os tipos de arte e natureza que estão emergindo desse lugar. A noção de paisagem percorre o texto enquanto um eixo de minhas análises dada a sua centralidade nas propostas conceituais do instituto. Nesse sentido, em minhas discussões busquei pintar a paisagem que se formou para mim a partir das ausências e presenças colocadas pelo Inhotim acionando experiências etnográficas, reflexões produzidas anteriormente sobre o instituto e seu contexto social, político, geográfico e histórico e discussões que percorrem os campos de antropologia da arte, da economia e da ciência.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Entre o oficio e a prática: curadoria, o que é, o que é?
Guilherme Viana (UFRN)
Resumo: O presente trabalho está inserido no campo da antropologia da arte, com objetivo de elaborar uma discussão sobre os ofícios da curadoria, suas tramas, e suas escolhas, partindo dos conceitos de contra colonial, decolonialidade, fabulação especulativa e ficção visionária. Pensar a curadoria por essas perspectivas é propor um fazer curatorial que produz novos repertórios de imaginários, imagens, narrativas, paisagens e sons que fujam das prisões coloniais hegemônicas. É produzir um conhecimento curatorial que consiga fazer modificações nas estruturas institucionais e estéticas - é criar trâmites que possibilitem uma articulação tanto no campo teórico, como na prática, buscando-se um desmonte nas práticas coloniais hegemônicas que ainda persistem dentro do sistema artístico artístico - cultural, político e estético. A cada curadoria elaborada, é possível evocar imagens, sons, textos e obras que manifestam aspectos, sentidos e memórias que em um determinado momento foram tornadas ausentes. Além disso, a pesquisa pensa a curadoria enquanto um espaço de autorização, ou seja, atuar enquanto curador é autorizar e decidir o que deve ser preservado e visto. Diante disso, a curadoria contemporânea de festivais e museus tem se caracterizado pela sua capacidade de legitimação, ou seja, é possível enxergar, a partir dela, como se organizam as relações de poder tanto no campo estético quanto a nível institucional. Nesse sentido, também será incorporada uma discussão das seleções/escolhas de obras e bens culturais, já que pelos os museus e festivais não são uma escolha ingênua, mas sim resultado de uma disputa política.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Artes Indígenas: (des)Caminhos para Novos Olhares, Estéticas e Concepções
Gustavo Santos Moreira Franca (UFMG)
Resumo: O presente trabalho busca investigar o saber-fazer mobilizado por indivíduos e/ou coletivos indígenas nas suas expressões e estéticas artísticas, explorando as formas como essas manifestações são rearranjadas, propondo sensibilidades e percepções no encontro entre mundos. Pretende-se caminhar na esteira das novas práticas curatoriais e museológicas que estão buscando compor e refletir sobre seus acervos e exposições através de outras perspectivas. As múltiplas expressividades, concepções e relações entrelaçadas na rede obra-autoria-museu-público evocam não somente o conhecimento sobre técnicas e estéticas distintas do ocidente, mas convoca a uma potente reflexão sobre corporalidades, ontologias, relações com seres humanos e não-humanos, transmissão e aquisição de saberes que servem como pilares didáticos-pedagógicos para uma (re)configuração nos modos de pensar, agir e ser moderno-capitalista. Nesse contexto, o Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand (MASP) será central para as proposições e análises discutidas sobre a potência das imagens, tanto pelo fato de seu grande reconhecimento nacional e internacional, quanto por ser um importante fomentador de reflexões para toda a sociedade, tendo realizado feitos como a inauguração de duas exposições e catálogos, MAHKU: Mirações e Histórias Indígenas, em 2023. Essa última contou com a colaboração do Kode Bergen Art Museum, ecoando internacionalmente as produções indígenas de distintos continentes, com curadoria e pesquisadores indígenas. A crescente contínua expressão, valorização e reconhecimento das Artes Indígenas por diversas instituições internacionais torna ainda mais urgente a atenção de olhares da política patrimonial para a conservação, proteção e difusão das tantas possibilidades de bens culturais-artísticos no território brasileiro. Para isso, é preciso um esforço das Políticas de Patrimônio Cultural Imaterial de lançar mão do encerramento em si de conceitos tão relativos, como arte, identidade, circulação, entre outros, visto a especificidade epistemológica e ontológica de cada povo. Por fim, este trabalho busca eleger considerações de grande importância para a reconfiguração e reivindicação das relações que as produções artísticas indígenas evocam, em suas múltiplas formas e suportes. É importante ressaltar que a temática abordada requer uma vasta articulação interdisciplinar, envolvendo disciplinas como Arte, Educação, Museologia e Antropologia. Embora seja reconhecida a impossibilidade de esgotar essa complexa discussão, se faz necessário emaranhar distintos campos no esforço para identificar possibilidades frutíferas.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
O palco é a rua: Uma atnografia visual em conjunto com artistas de sinal em Recife-PE
Ingrid Rodrigues Cirino (UFPB)
Resumo: A arte de rua se apresenta em diversos formatos pelas cidades do mundo. A pesquisa aqui abordada foi fruto de uma dissertação de mestrado onde o campo aconteceu na rua e a etnografia foi construída a partir da experiência e vivências de artistas de sinal na cidade de Recife-PE. A ideia sempre foi fortalecer a relação entre ciência e arte utilizando do audiovisual como algo que vai além da entrega de produto final de pesquisa. A arte conversando com a ciência cria possibilidades de levar a pesquisa acadêmica para fronteiras que vão além dos repositórios das universidades, cria diálogos com os interlocutores e a sociedade além das possibilidades de compartilhamento e devolução. Utilizei fotografias e desenhos na dissertação, e produzi um filme etnográfico, onde pude dialogar diretamente com os artistas sobre como eles querem que suas imagens sejam construídas, no caso compartilhei a direção de imagem com Boby Oliveira, um dos artistas de sinal que foi meu interlocutor. Durante a experiência em campo precisei criar estratégias para seu uso na rua e trabalhando com artistas que constroem suas apresentações em menos de um minuto e com inúmeras interferências externas. Aqui, quero dividir alguns aprendizados obtidos durante os meses em campo no sinal com a câmera na mão, e pensar como a junção da antropologia/ciência e arte pode ser algo potente e muito interessante para nossa construção como pesquisadores, e nas relações feitas com os interlocutores. Também no pós pesquisa, pensando no momento depois do filme etnográfico ser lançado em plataformas digitais. Também quero, através das imagens, trazer um pouco do trabalho com a arte de sinal na cidade de Recife e o que isso nos conta sobre a urbanidade na cidade.
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Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
A criação de um dossiê temático para o processo de tombamento e patrimonialização do oficio do trabalho informal a partir do uso de carrinhos de mão: um estudo (etno)gráfico sobre os instrumentos com rodas nas práticas s
João Vítor Velame (UERJ)
Resumo: Entre 2021 e 2023, ao longo de uma pesquisa de mestrado, produzi uma série de desenhos sobre os usos e sentidos atribuídos às “coisas com rodas (conhecidos como carrinhos de mão) que são utilizadas por diferentes atores sociais no âmbito de um mercado público e de uma ocupação de catadores, localizados no Bairro dos Estados da cidade de João Pessoa, Paraíba. No ano de 2023, a partir da dimensão rica dos resultados gráficos do trabalho final da dissertação, dei continuidade a esta pesquisa no âmbito do doutorado. Esta pesquisa aqui apresentada trata-se de perambulações e linhas iniciais da minha pesquisa de doutorado a qual está inserida no campo da Antropologia, especificamente na linha de pesquisa "Produções artísticas, Imagéticas e Intelectuais" do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (PPCIS/UERJ). O principal objetivo é realizar uma análise abrangente dos usos e sentidos atribuídos aos carrinhos de mão, por meio de um estudo etnográfico das práticas socioculturais relacionadas a um mercado público da cidade do Rio de Janeiro, RJ/Brasil. O resultado deste estudo é a criação de um dossiê temático que servirá como proposta crítica o tombamento e patrimonialização dos ofícios de trabalho, tanto formais quanto informais, de diversos atores sociais que fazem uso desses instrumentos em seu cotidiano. Do ponto de vista metodológico, a pesquisa tem sido fundamentada na pesquisa etnográfica, que envolve observação participante, coleta de relatos orais, uso de diário de campo e diário gráfico, a criação de uma coleção de desenhos etnográficos e o levantamento de dados iconográficos em acervos públicos inspirado em Aby Warburg com seu trabalho "Atlas Mnemosyne". Venho me apoiando nas reflexões inspiradas pelo debate antropológico da década de 1980, nos debates teóricos de James Clifford e George E. Marcus (1983) com Writing Culture e em Roy Wagner (1986), Timothy Ingold (2000), Karina Kuschnir (2016) e Aina Azevedo (2016), influências orientadoras para repensar a criação, desenho e invenção no fazer etnográfico.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Sapataria Contracolonial: onde a beleza dos ossos é dançada pela terra
Juliana Fonseca Martins (UFMG)
Resumo: O uso dos calçados, cultura material colonizadora, identificou homens livres e de alto status social, enquanto os pés descalços dos povos originários manifestaram a liberdade de uma relação com a terra em que há sustentação e cuidado mútuo. Meus pés cresceram com ossos fortes e abertos, nutridos no sertão, e encontraram outros parecidos em diferentes lugares e nas cidades, também próximos à terra. A divergência entre as formas de pés e calçados é um fenômeno civilizatório que transcende meus pés, e registrei-a durante a série de performances Gravação de Raízes. Os pares de imagens estão compilados no “Traçado preliminar de uma estética da base”, livro que prescinde das palavras no argumento imagético favorável à expansão da sapataria artesanal sob medida. Os registros evocam os tratados de antropologia física para questionar os padrões de fôrmas de calçados que se pretendem “anatômicos”, e a cientificidade de uma indústria que produz tecnologias nem sempre favoráveis à vida, distanciando do que salta aos olhos. Na confluência com os saberes ameríndios e afro-brasileiros, em que estar descalço é prática cotidiana de cuidado com a saúde, instaurou-se esse processo de (des)calçamento que é contracolonial em sua forma, feitio e circulação. A beleza dos ossos, seu conceito fundador, significa alinhar-se com a anatomia, o caminho de vida, o movimento e a vitalidade. A oficina, espaço de difusão da habilidade de produção, é gerida por de relações horizontais de cooperação, que fortalecem a autoridade somática dos participantes. A circulação dos calçados se dá em relação com crientes, híbrido de cliente e criador, ciente da autopoesis que é a confecção de seus calçados: construção de corpo, educação somática, abertura de caminhos. O tipo de mercado a que se adequam estes artefatos é regido por Exu, como descrito por Flor do Nascimento, em que as trocas hão de necessariamente trazer benefícios a todos os envolvidos. A metodologia passa pela sustentação do compromisso (po)ético de calçar-me exclusivamente com os calçados que produzo, aferindo o sucesso da produção antes de abri-la a outros e expandi-la ao atender a demanda de crientes e compartilhar as habilidades de confecção. Pelo poder de abraçar e sustentar toda a existência que se manifesta na singularidade do corpo que calçam, os calçados artesanais sob medida foram denominados sapatas. Celebram, através de uma ciência que dança, a força e alegria advinda do contato entre pés e terra, e revelam a comunhão ancestral que abre caminho para a expressividade. Feitio de corpo, artefato de uso cotidiano cuja força se ancora em seu vazio, as sapatas deixam-se preencher pela força e beleza dos ossos que se abrem para ser dançados pela terra.
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Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
O Gosto e o Gozo do Recalcado: Fragmentos de uma Antropologia Estética Freudiana
Leonardo Carvalho Bertolossi (UFRJ)
Resumo: O Gosto e o Gozo do Recalcado: Fragmentos de uma Antropologia Estética Freudiana. Essa comunicação pretende apresentar e discutir uma pesquisa em estágio inicial sobre a relação da psicanálise freudiana com o campo das artes visuais. Para tanto, pretendo dialogar com autores como o historiador Carl Schorske, para quem o gosto moral e o gozo freudiano se constitui em sua relação com a materialidade arqueológica clássica e egípcia, e o filósofo Jacques Rancière para quem o inconsciente estético freudiano está enodulado com a poética e a mitologia grego-romana que se desdobram nas teorias do Édipo e do narcisismo. Ademais, se pretende considerar a estética freudiana, sua teoria do desamparo, dos afetos, gozos e das pulsões, na interface com pensadores caros ao pai da psicanálise, como Nietzsche, Spinoza e Hobbes. Por fim, pretendo avançar nessa antropologia estética da psicanálise e pensar as relações de Freud com o movimento artístico surrealista em alguns autores pós-freudianos, assim como a partir do diálogo com a obra das psicanalistas Tania Rivera e Noemi Moritz Kon.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Imagens inquietas: tecendo a(s) história(s)
Letícia Martins Santa Cruz (Aluna)
Resumo: O trabalho a seguir apresenta algumas reflexões que venho desenvolvendo na minha pesquisa sobre a "imagética do índio do sertão". Partindo de um conjunto específico de imagens de expedição, minha tarefa tem sido lidar de forma bem direta com a interface entre arte e ciência, e sua relação com o saber histórico. Assim, o diálogo entre antropologia e história da arte tem sido bastante fértil no que diz respeito à produção de conhecimento e a constituição de vias alternativas à categorias como "objeto" e "representação". Neste trabalho em específico, gostaria de apresentar um diálogo que faço entre a noção de "imagem lacunar" de Didi-Huberman (2011, 2013, 2017, 2018) e o conceito de "coisa" de Tim Ingold (2012). No primeiro caso, a imagem é pensada não como um objeto total e fechado, cuja apreensão poderia se dá por um conhecimento específico igualmente total, mas antes, como algo em constante expansão, cujos caminhos e relações não cessam de se constituir. Nesse mesmo caminho, Ingold (2012) repensa a produção de conhecimento num ambiente sem objetos, no qual as coisas são priorizadas nos seus fluxos e contra-fluxos, e sua existência tece e é tecida por linhas que deixam diversas "pontas soltas". Diálogos como este tem me ajudado a revisitar essas imagens de expedição com novas perguntas para além do que elas "representam" sobre um contexto histórico específico, e mais em como elas podem nos ajudar, em diferentes configurações, a tencionar a memória iconográfica do Brasil, e assim redescobri-lo de outras formas que redefinam a relação mesma que traçamos entre imagem e tempo, percebendo-as, assim, como "coisas vivas" (Samain, 2012).
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Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Arte e rituais de luto em contextos de violência: os trabalhos de denúncia e homenagem produzidos pelo coletivo Magdalenas por el Cauca – Colômbia
Natália Guindani (UFRJ)
Resumo: Este trabalho decorre das análises empreendidas em minha dissertação de mestrado (2018) que teve como objetivo central compreender a relação estabelecida entre arte e memória, em um contexto particular e historicamente delimitado, de violência sistemática. O estudo circunscreve-se sobre as três primeiras obras realizadas pelo coletivo colombiano Magdalenas por el Cauca, entre os anos de 2008 e 2013. A partir de entrevistas realizadas com a dupla de artistas Gabriel Posada e Yorladi Ruiz e da análise do registro documental e visual das obras, evidenciam-se vínculos com trabalhos de memória coletiva, empreendidos na Colômbia nas últimas décadas. Mobilizadas, principalmente, por organizações de familiares de vítimas, com apoio de organizações civis e governamentais, as obras estudadas inserem-se no contexto do chamado ‘pós-conflito’. Entende-se que há um conjunto de produções artísticas que foi sendo empreendido no país, cujo foco incidia sobre o trabalho com comunidades de vítimas como meio de visibilizar cenários de violação e sofrimento. Especificamente, o coletivo Magdalenas por el Cauca ao propor obras de intervenção efêmera no rio Cauca – lugar onde a marca da morte violenta está inscrita, formulam seus trabalhos como “intervenções rituais”, ao estabelecerem junto às mães e familiares meios de homenagem e denúncia. Ao aprofundar sobre a trajetória percorrida pelo coletivo e seus recursos artísticos, simbólicos e afetivos, encontramos a figura da mãe como o principal símbolo ativado. O primeiro trabalho do coletivo no rio Cauca, é definido pelos artistas como uma exposição-procissão, um evento ritual em que a memória das mães que perderam entes queridos emerge por meio de balsas que levam seus rostos desenhados em larga escala. Ao utilizarem o rio Cauca como local dessa intervenção ritualizada, os artistas operam com diversos sentidos a partir do reconhecimento da dor e da importância do luto na vida dos familiares que viram seus entes desaparecerem. O rio Cauca, que foi sistematicamente utilizado como ‘fossa comum’, também revelou, ao longo dos anos, vários corpos que haviam sido despejados em suas águas. Dessa forma, entende-se que o trabalho de homenagens nas suas águas é uma maneira de trazer luz a esses casos, ressignificando a memória do horror ali praticado, como um lugar de memória e testemunho. Também compõem as análises trabalhos subsequentes realizados pelo coletivo em colaboração com as mães do coletivo Madres de Trujillo, cidade do Valle del Cauca, onde ocorreu, ao longo de sete anos seguidos, um massacre contínuo. Nessas ações, as ações participativas propostas pelo Magdalenas por el Cauca são entendidas como empreendimentos ritualizados de luto e dignificação das vidas atingidas, um meio de tecer resistências contra a barbárie.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Reflexões iniciais a partir das relações entre as “imedu/aredu” ou trans/travestis do povo bóe bororo com a pintura/grafismo
Neimar Leandro Marido Kiga (UFG), Neimar Leandro Marido Kiga (UFG)
Resumo: Este trabalho buscará investigar e compreender as relações existentes entre as “Imedu/Aredu: Homem/Mulher”, (Trans/Travestis) e a prática cultural da pintura/grafismo em dias festivos, eventos e rituais do povo Bóe Bororo. O povo Bóe divide algumas funções sociais entre homens e mulheres. Atualmente, é possível observar e perceber a presença das Imedu/Aredu no que diz respeito a pintura facial e corporal, prática mais comumente realizada por mulheres cis. Tenho como objetivo trazer relatos de pessoas Imedu/Aredu de aldeias e territórios distintos do povo Bóe, a fim de mostrar para sociedade acadêmica e civil a atuação dessas pessoas no âmbito cultural/tradicional, visto que, muitas vezes, não são consideradas pertencentes às culturas tradicionais indígenas. A pesquisa será realizada a partir de entrevistas semi-estruturadas, conversas informais com interlocutoras das aldeias Meruri (T.I Meruri), Apido Paru (T.I Tadarimana) e Arareiao (T.I Teresa Cristina) e a observação participante, bem como literaturas relacionadas ao tema abordado, tais como Lux Vidal em Grafismo Indígena e Lévi-Strauss com Tristes Trópicos, entre outros. Para coleta de mais informações, será possível também o contato e observações pelas redes sociais, tais como Facebook, Instagram e WhatsApp, onde podemos encontrar fotos, áudios, vídeos e textos. Entre os resultados esperados, poderemos ter o empoderamento deste grupo tão estigmatizado pela sociedade, seja indígena ou não. Poderá trazer também mais motivação por parte da autora, das interlocutoras e de outras pessoas em produzir mais trabalhos voltados a valorização deste grupo.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Provocações e caminhos entre mundos: a emergência da cena de arte indígena contemporânea no Brasil
Nina Vincent Lannes (iphan)
Resumo: Este trabalho apresenta algumas reflexões desenvolvidas na tese ARTE, TERRA INDÍGENA. Caminhos e relações da arte indígena contemporânea entre mundos, defendida em 2021, que acompanhou desde 2015 a crescente presença de artistas indígenas do Brasil no mundo da arte contemporânea na segunda década do século XXI. Transitando entre mundos ontologicamente diversos e habitando zonas de contato, suas criações são marcadas pela reverência e reinvenção das cosmologias e estéticas de suas culturas de origem, articuladas com técnicas e linguagens da arte contemporânea. Por meio de uma etnografia multissituada realizada com artistas e curadores em exposições e eventos culturais, discutimos elaborações conceituais, escolhas estéticas, temáticas e trajetórias de vida que configuram um panorama amplo deste território partilhado. A análise de obras de arte e discursos de artistas, permite enxergar estratégias de inserção, subversão, apropriação, colaboração e criação de novos espaços e circuitos de arte. A partir destas criações e processos, destacam-se certos temas, práticas e gestos que podem servir como chave de entendimento deste fenômeno recente, permitindo aproximar alguns trabalhos de artistas e buscar chaves de interpretação que emergem das próprias poéticas analisadas. Assim, nos deparamos com obras-pensamentos que apresentam tradições e inovações por meio da experimentação com grafismo, figuração, técnica e suporte; que constroem um “Corpo-terra por meio de performances na confluência arte e vida; que tensionam zonas de contato trabalhando identidade, violência, memória e contemporaneidade; que exploram mitologia, cosmologia, espiritualidade, ancestralidade e naturezas; que se colocam declaradamente como ativismo e buscam uma prática relacional; que se posicionam na História da Arte, seja buscando um lugar ou criando outras histórias a partir deste movimento coletivo de inserção, confrontação e criação. Percebemos que a arte contemporânea tem buscado nos universos indígenas inspiração para repensar o mundo e a sociedade, os efeitos do colonialismo, do capitalismo, do antropoceno e a fronteira entre arte e vida, embora não deixe de reproduzir práticas de expropriação e exotização do "outro". Os artistas indígenas buscam valorizar sua identidade e memória, ocupar espaços de visibilidade e representatividade, criando suas próprias narrativas e provocando transformações no mundo da arte. Fortemente política, a arte contemporânea feita por estes artistas é eminentemente relacional e atua no mundo materializando e mediando redes complexas de relações com o cosmos, os seres não-humanos e com os não-indígenas, abrindo caminhos para outros mundos possíveis.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Engajamento e Movimentação em 1966-67: Gilberto Gil às vésperas da explosão tropicalista
Orlando José Ribeiro de Oliveira (UESB), Marília Flores Seixas de Oliveira (UESB)
Resumo: Resultante de pesquisa bibliográfica em que se investiga a relação entre cultura e política no Brasil dos anos 1960, o trabalho utiliza as categorias de engajamento e movimentação, no caso particular do campo da música popular brasileira, para analisar da trajetória do compositor Gilberto Gil, no período que antecedeu a explosão do Tropicalismo. As letras de canções deste período (1965 a 1967) permitem entender o engajamento praticado pelo compositor e a reconstituição de sua movimentação na agitação cultural do eixo São Paulo-Rio ajuda a compreender as condições de produção de sua música, inclusive suas parcerias. Nelas se evidenciam indícios do quanto havia de antecipação e anunciação da ruptura que viria a seguir, a despeito da ambiguidade de sua movimentação e de sua posição frente à questão dos rumos e embates da música popular brasileira. Os novos termos da relação artista-público, a emergência dos efeitos das novas mídias – com destaque para a TV e sua voracidade idólatra -, a visão crítica da realidade presente, inclusive as ‘realidades cotidianas menores’, em favor de certa brasilidade atualizada, tendo a antropofagia oswaldiana como marco referencial, definiriam, grosso modo, o caráter do movimento tropicalista que, apesar da curta duração (outubro de 1967 a dezembro de 1968), marcaria para sempre a música popular brasileira.
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Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Reativar a catástrofe, descobrir onde pisar: proposições ontológicas no pensamento estético japonês pós-2011
Ryanddre Sampaio de Souza (UFMT)
Resumo: A presente comunicação pretende apresentar a pesquisa realizada pelo autor, com campo no Japão, durante o doutorado em Antropologia Cultural (PPGSA/IFCS/UFRJ) sob a orientação da Profa. Dra. Els Lagrou e que originou a tese defendida em agosto de 2023. A referida pesquisa objetivou uma análise antropológica acerca das implicações estético-ontológicas em parte da arte japonesa contemporânea produzida após (e compondo com) o triplo desastre de 2011. Tomando como ponto de partida a importância fundamental da arte como forma de compreensão da catástrofe, a etnografia se estabeleceu como o resultado de reflexões produzidas em-e-sobre um campo profícuo de tensões, paradoxos, afetos e traumas cuja potência é situada por uma dinâmica de constantes transformações e ressignificações. Verificou-se que o poder devastador da catástrofe e as consequentes possibilidades de reconstrução – ou reinterpretação – do mundo representaram no Japão uma profunda transformação estética, política e social que pode ser compreendida através das obras criadas no contexto artístico pós-2011, relacionando-se assim não apenas a questões climáticas e ambientais e aos debates contemporâneos sobre o antropoceno, mas também com aspectos sociais, culturais e cosmológicos, reafirmando sua indissociabilidade e possibilitando a reflexão sobre novas formas de existência humana em um mundo devastado. Sugerimos que a arte produzida em-e-sobre o triplo desastre de 2011, através do seu potencial interpretativo e de articulação com os animismos japoneses ressignificados pelos desastres ambientais da história recente do Japão, pode ser entendida como uma forma de resistência, uma subversão da ordem estabelecida pela radioatividade que torna a arte japonesa contemporânea um movimento político e cosmológico em busca de um possível futuro pós-nuclear e menos violento. Busca-se, desta forma, não apenas divulgar os resultados obtidos após a defesa da tese mas, também, articular novas possibilidades de reflexão e atuação no campo da antropologia da arte e dos estudos japoneses no Brasil.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Teoria Critica Racial e a interseção com a história da arte
Tatiane de Oliveira Elias (UFSM)
Resumo: Esta comunicação pretende explorar as conexões entre a teoria crítica racial na perspectiva de Ruja Benjamin e a interseção com a história da arte, conceitos e imagens artísticas a partir das obras de artistas afrodescendentes como Jonathan Harris, Jonatas de Andrades, Angelica Dass, Kehind Willey. Deste modo, pretende-se abordar como estes artistas desconstroem, com suas obras, as imagens de controle e opressão usadas há séculos enquanto ferramenta de propagação do racismo estrutural. Examinaremos, através da teoria crítica racial, as maneiras pelas quais o racismo está embutido nos sistemas, conceitos e políticas legais. Benjamin, em seus estudos, dá ênfase às leis do Jim Crow usadas no século XIX para reforçar a segregação no sul dos Estados Unidos. A socióloga ainda explica que, na contemporaneidade, o racismo se manifesta de maneira mais sutil, diferentemente do passado no período do Jim Crow. Outrossim, as tecnologias, apesar de parecerem ser neutras e objetivas, estão imbuídas de preconceito por quem as criou. Outra teórica de suma importância é Patricia Hills Collins. Ela explica como as imagens foram usadas para oprimir e controlar os afrodescendentes. A estudiosa propõe a noção de imagens de controle como uma categorização dos discursos circulantes no imaginário social a respeito de mulheres negras, entendendo-as como artifícios designados para fazer as injustiças sociais, sobretudo em torno de gênero, raça e classe, para aparentarem normais, naturais e inevitáveis (COLLINS, 2020). As questões levantadas por Ruha Benjamin e Patrícia Collins são baseadas numa história de desigualdade social, de colonialismo e na herança invisível da escravidão. Elas demonstram as formas como o racismo se manifesta na sociedade, se alterando e se expandindo também no uso de tecnologias, palavras e imagens. As obras de arte a serem abordadas nesta comunicação são exemplos claros de tais afirmações.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
O pornobomb em desenho: uma etnografia desenhada sobre uma pintura corporal encontrada na socialidade do graffiti
Thayanne Tavares Freitas (UFRGS)
Resumo: "Meu corpo, eu faço o que eu quiser", e ele jogou a tese "Ah vamos fazer um pornobomb?", essa é uma fala de uma das minhas interlocutoras sobre o pornobomb. O pornobomb é uma pintura corporal diretamente vinculada ao graffiti, majoritariamente, realizada por grafiteiros em corpos de mulheres. Após a realização da pintura são registradas imagens fotográficas que em sua maioria são postadas em redes sociais digitais. A estética dessa pintura se aproxima do que é feito nas ruas, os chamados bombs, tags e personas saem dos muros para serem inscritos nas peles e curvas dos copos. Como existe esse vínculo com a socialidade do graffiti e pixação, é possível encontrar a prática dessa pintura corporal em vários lugares (inclusive, fora do país), para além do campo proposto nesta pesquisa, porém com denominações diferentes. Em Belém, onde minha rede de interlocutoras foi criada e estabelecida, o termo mais comum é o pornobomb, razão que faz acreditar que este termo seja uma categoria da cena local. Em Porto Alegre, por exemplo, onde realizei o meu doutorado e parte de minha pesquisa de campo, esse tipo de pintura é conhecido por bodypaint. Neste percurso, levo em consideração a minha atuação enquanto artista-pesquisadora (ilustradora e grafiteira), desde o primeiro contato com esse tipo de pintura corporal, o que influenciou na produção de várias narrativas visuais incluindo desenhos e colagens digitais. Durante o período da pesquisa foram produzidas inúmeras imagens em desenhos que conduziram a investigação de acordo com as reflexões das interlocutoras e o entrelaçamento dos incômodos da pesquisadora, bem como, impulsionado pela experimentação de outras técnicas de desenho no decorrer da pesquisa. Diante do que foi encontrado em campo foi possível propor como reflexão dessa prática o conceito corpo-muro que abrange a complexidade que essas mulheres vivenciaram experienciando o pornobomb, que rompe com a hipótese inicial de uma unilateralidade no conjunto de decisões que se estabelecem antes e durante a pintura, o que nos apresenta uma tensão na disputa de poder de ambos. Nessa comunicação apresento o campo de pesquisa e a metodologia utilizada para desenvolver a minha tese de doutorado, discuto questões voltadas ao corpo, performances de um masculino e um feminino, consentimentos e o conceito corpo-muro. O desenho mobiliza a escrita e vice-versa, criando um movimento contínuo de camadas de imagens que surgem de acordo com as narrativas. Por fim, este trabalho pretende apresentar a minha pesquisa de doutorado com o intuito de ampliar o diálogo sobre a produção de desenhos nas pesquisas antropológicas e como os modos de desenhar acompanham o ritmo da pesquisa de campo.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Um General curador de arte: “A Retirada do Cabo de São Roque”, de Henrique Bernardelli (1927), por Hamilton Mourão
Thayla Fernandes da Conceição (UERJ)
Resumo: Em 28 de setembro de 2019, por ocasião das comemorações do Bi-Centenário da Independência do Brasil, o ex-vice-presidente e general da reserva Hamilton Mourão fez a seguinte fala em seu twitter: “Na data de hoje, em 1532, o Rei D. João III criava as #capitanias no #Brasil. Descoberto pela mais avançada #tecnologia da época, o País nascia pelo #empreendedorismo que o faria um dos maiores do mundo. É hora de resgatar o melhor de nossas origens.”. No dia posterior, o General segue com pronunciamentos na mesma linha e afirma: “Donatários, bandeirantes, senhores e mestres do açúcar, canoeiros e tropeiros, com suas mulheres e famílias, fizeram o Brasil. Só um povo empreendedor constrói um país dessas dimensões que segue o destino manifesto de ser a maior democracia liberal do Hemisfério Sul”. Juntamente a esta última declaração, Mourão anexou quatro pinturas, que reforçam as projeções e os heróis nacionais por ele elencados. Essas pinturas são: “Retirada do Cabo de São Roque”, de Henrique Bernardelli (1927); “Mulato”, de Albert Eckhout (1643); Partida da Monção, de Almeida Junior (1897) e “Tropeiros”, de Henri Chamberlain (1821). A seleção destas quatro pinturas é um curioso exercício de uma espécie de curadoria realizada pelo General. Mourão, ao nosso ver, criou ali uma “imagem” (Didi-Huberman, 2020), e não qualquer uma. As pinturas, juntas, montam uma espécie de exposição, materializam sintomas e indícios da comunidade por ele imaginada (Anderson, 2013) e do seu projeto de nação, alinhados a uma perspectiva que resuscita, ou enfatiza elogiosamente, determinados heróis nacionais e respectivas violências em longa duração. Com Jacques Rancière (2009), reconhecemos que a política possui uma dimensão estética e que possíveis partilhas de um sensível unem ou diferenciam os sujeitos e, por que não, também unem ou diferenciam projetos de nação e as imagens e imaginários relativos a estes projetos. Paul Virilio (2005), por sua vez, expõe que as forças militares são regidas pela aparência – esta que imprime uma referência ao aparato estético de apresentação pessoal militar (que invoca lugares ordem, poder, controle, hierarquia e respeitabilidade) e, também, uma referência à expectativa sobre a aparência da própria comunidade, como deve ser imaginada e percebida. As duas possibilidades se comunicam narcisicamente e se encontram no reforço de imagens míticas e heroicas convenientes a determinados projetos, tais quais a imagem do bandeirante. Na busca de criar uma espécie de mosaico em movimento, de estabelecer conversas entre fragmentos e entre cenas e contra-cenas, aqui propomos uma discussão sobre estas questões focada de uma das pinturas citadas – “A Retirada do Cabo de São Roque”, que, sob custódia do Museu do Ipiranga, ilustra o bandeirantismo.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Jongo, “música popular” e “caráter nacional brasileiro” nos meados do século XX: um estudo antropológico a partir dos acervos da Hemeroteca do Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular-CNFCP
Wilson Rogério Penteado Júnior (UFRB)
Resumo: O jongo, presente ainda hoje na região sudeste brasileira, consiste em prática cultural marcada por cantos enigmáticos – isto é, o lançamento poético de palavras metafóricas, quase sempre em tom de desafio entre os participantes, acompanhadas do som de instrumentos de percussão – e dança, sendo os primeiros registros sobre sua existência datados do século XIX. Seus referenciais históricos remontam aos tempos da escravização de negros africanos no Brasil, e evidencia influência de aspectos culturais do complexo banto. Por sua importância histórica e cultural, foi reconhecido Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil, em 2005. Especialmente, desde o início deste século XXI uma gama de pesquisas tem se voltado a produzir dados etnográficos junto a diversas comunidades jongueiras. Não obstante, muitos aspectos sobre a existência do jongo ainda estão por ser estudados e evidenciados a partir de incursões investigativas. Dito isso, a presente comunicação se volta a apresentar dados sobre a relação entre o jongo e o que se convencionou chamar “música popular” no Brasil. Mais especificamente, objetiva-se demonstrar como o jongo despertou a atenção de musicistas eminentes no cenário brasileiro de meados do século XX e como deu-se a conhecer nesses circuitos. Para tanto, foram analisados recortes de periódicos existentes no conjunto de acervos da Hemeroteca do Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular, cujo trabalho antropológico empreendido voltou-se a compreender o que os noticiários que fizeram referência ao jongo em meados do século XX (mais especificamente, entre finais da década de 1940 e finais da década de 1960) podem revelar sobre ideações e imaginações, configuradas em narrativas escritas, sobre o jongo e o mercado da música popular brasileira. No conjunto de acervos da Hemeroteca, que conta com quase 60.000 (sessenta mil) recortes de jornais, foram identificados 629 registros sobre o jongo. A análise sobre tais fontes permitiu constatar que, além da preocupação de fundo em definir o caráter nacional musical, havia uma marcada relação de mediação entre jongueiros e os autores que estiveram com (e escreveram sobre) eles em diferentes ocasiões registradas nos fragmentos de jornais; uma relação baseada em processos criativos em que os intelectuais que se voltaram ao jongo para classificá-lo como “música popular” passaram a "inventar" – no sentido de tomar consciência, nomear e definir – a cultura do jongo nesses termos, assim como os jongueiros, no contato com esses interessados pela cultura do jongo, envidaram esforços para configurar criativamente a sua cultura nessa relação. Tais dados permitem, pois, contribuir com os estudos e discussões sobre “música popular brasileira”, bem como sobre os modos como o jongo foi tomado como bem cultural da nação