ISBN: 978-65-87289-36-6 | Redes sociais da ABA:
Grupos de Trabalho (GT)
GT 035: Cidades e citadinidades: questões de Antropologia Urbana
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Coordenação
Giancarlo Marques Carraro Machado (UNIMONTES), Alexandre Barbosa Pereira (UNIFESP)
Debatedor(a)
Luiz Henrique de Toledo (UFSCAR), Heitor Frúgoli Junior (USP)

Resumo:
A proposta deste grupo de trabalho é discutir as múltiplas dimensões do urbano a partir da análise das maneiras astuciosas de se fazer cidades em distintos contextos. Nesse sentido, serão valorizadas pesquisas que apreendam as especificidades das tantas experiências do urbano em variadas escalas de cidade, a fim de diversificar o debate sobre as contradições da citadinidade. O objetivo é tentar compreender os modos distintos pelos quais citadinos, grupos e instituições são agentes ativos na construção das cidades contemporâneas, situando-se de forma controversa entre táticas e estratégias, legalidades e ilegalidades e acessibilidades e desigualdades. Este GT convida, portanto, à apresentação de trabalhos que abordem, entre outras questões, as múltiplas formas de habitar as cidades, por meio de seus usos e contra-usos dos espaços públicos. Dessa maneira, ressaltam-se questões como as diversas relações e tensões entre mobilidades e imobilidades, as experiências de gestão urbana, os ativismos urbanos, as redes de sociabilidade etc. Trata-se, assim, de agregar o maior número de pesquisas com a perspectiva de constituir um panorama que transcenda a dicotomia “na” ou “da” cidade, visto que se trata de compreender que cada processo social, por mais micro que se apresente, diz respeito às maneiras de se fazer cidades ou produzir novas experiências urbanas. Da mesma forma, como os macroprocessos de gestão das cidades contribuem para o entendimento das ações táticas dos citadinos.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
O agenciamento das identidades pelos sujeitos artistas no corpo da cidade de Belo Horizonte.
Alice Ferreira dos Santos (UNIMONTES)
Resumo: Em Michel Agier (2001), vemos o desenvolvimento de uma conceituação do que seria identidade cultural enquanto uma categoria de caráter fundamentalmente construído, processual e situacional fugindo de definições essencializantes acerca da temática que por muito tempo compuseram um paradigma no campo dos estudos em antropologia. Neste sentido, o autor aponta que as cidades globais e suas novas dinâmicas concernentes ao contato interétnico exigiram a superação de dualismos simplistas como identidade-cultura; cultura-lugar que permearam o arcabouço teórico da disciplina. No caso específico da capital Belorizontina, as definições de Agier são acionadas para a compreensão do fenômeno de agenciamento da identidade- cultura realizado pelos sujeitos artistas no corpo da urbe. O projeto Circuito Urbano de Arte (CURA) realizado na cidade desde DATA, conta com uma série de pinturas em empenas cegas, as fachadas sem janelas de edifícios, realizadas por artistas que mobilizam ou agenciam suas identidades enquanto pessoas racializadas de maneira política, ao fazer uma resistência crítica em relação a dominação simbólica exercida pelo grupo dominante. Nesse sentido as identidades se tornam não somente um objeto identitário de reconhecimento, mas também um recurso político e muitas vezes econômico para indivíduos e redes em busca de um lugar para si na modernidade. Nesse sentido, objetivou-se com este estudo buscar o aprofundamento no entendimento desse agenciamento político das identidades por meio da produção artística em Belo Horizonte. Para tanto, a pesquisa em questão, buscou uma metodologia apropriada para tal empreitada, utilizando-se da pesquisa de campo, na modalidade de observação participante, na intenção de analisar o fenômeno na perspectiva dos atores sociais para, assim, compreender os sentidos e os meandros de suas ações de perto e de dentro. Assim, acompanhou-se edições do projeto CURA, realizou-se entrevistas semi-estruturadas com alguns de seus artistas e idealizadores, além de acompanhar as redes sociais utilizadas como meio de divulgação do projeto, bem como dos próprios artistas envolvidos. Durante o referido estudo, constatou-se que essa “cultura-objeto criada a partir desse trabalho minucioso dos agentes, é o que pode ser acionada enquanto elemento de amparo da identidade no contexto urbano. Essas práticas artísticas, que se disseminam pela região central da cidade de Belo Horizonte, são a concretização estética de um contra-fluxo cultural, abrindo espaço na auto-afirmação identitária, possibilitando que esses sujeitos possam construir eles próprios as narrativas em torno de si.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Territorialidade afro-diaspórica e o cortejo da entrega do presente à Iemanjá pelo afoxé dos Filhos de Gandhi do Rio de Janeiro
Amaro Sérgio Marques (PUC-RIO)
Resumo: Trata-se de uma pesquisa desenvolvida no âmbito da Produção do Território e de Territorialidades Negras do Rio de Janeiro, realizado pelo Grupo de Pesquisa na Produção do Territórios e Territorialidades – Baobá da PUC Rio. Esse trabalho teve como objetivo investigar o contexto da realização da cerimônia e do cortejo da entrega de presente à Iemanjá (orixá das religiões de matriz africana), pelo afoxé Filhos de Gandhi do Rio de Janeiro. O evento ocorreu no dia 02 de fevereiro de 2024, com início as 8h na sede do grupo na rua Camerino número 07, no bairro da Saúde. A partir de uma revisão de literatura, através de buscadores em repositórios como o Portal Capes, Scielo, e outros, bem como em bancos de dados de Universidades Brasileiras, fizemos uma aproximação do tema. Posteriormente a partir de observação participante, foi realizado um registro de cada etapa desse evento e a seguir, a análise das mesmas. Ainda, durante a concentração na sede do afoxé, bem como na hora da alimentação e da roda para evocação dos Orixás (xirê) e no cortejo, realizamos um amplo registro fotográfico e de vídeos, além de conversas informais com os participantes, buscando compreender cada ação ou fato relevante. Com isso, organizamos a descrição e análise crítica dos fatos e das narrativas, para enfim, partir para as considerações finais. O presente a Iemanjá é realizado há cerca de 70 anos, quando da fundação do afoxé Filhos de Gandhi do Rio de Janeiro, que teria sido criado sob inspiração do Ijexá Filhos de Gandhy-bloco carnavalesco criado anteriormente em Salvador no Estado da Bahia. A presença dos praticantes de religião de matriz africana é histórica nessa área, relatado pela presença de uma grande casa de candomblé do Pai de Alabá (CORRÊA, 2016). Os membros do afoxé, juntamente com seus convidados e a população em geral, se reúnem na sede para preparar os barquinhos que são transportados em um cortejo até a praça Mauá, onde uma embarcação levará as lideranças do grupo e os representantes das religiões de matriz africana até a proximidade dos pilares da ponte Rio x Niterói, onde os participantes entregaram seus presentes a Iemanjá. Em certa medida, podemos salientar uma resistência por parte desse grupo que luta para manter essa importante tradição negra, como se fosse possível fazer – a partir do cortejo – o caminho inverso do desembarque de escravizados no antigo cais do Valongo. Numa espécie de insurgência – literalmente pela contramão da via de trânsito – esse grupo ao som dos atabaques, personagens icônicos de representação da cultura afro-brasileira e berimbaus retorna ao oceano atlântico.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Embranquecer o passado, questionar o presente, aspirar o futuro: Contribuições sobre raça, classe, gênero para o porvir na cidade de Osasco/ SP
Ana Carolina Batista de Almeida Farias (UNIFESP)
Resumo: O que será apresentado neste GT é o fragmento de uma tese no período final, as vésperas da defesa e pretende contribuir para compreender como os processos de uma cidade da Grande São Paulo chamada Osasco. A cidade de Osasco traz em si muitas questões interessantes a serem pensadas: com grandes periferias, pobreza populacional e, ao mesmo tempo, abriga a sede de um dos maiores bancos brasileiros (Banco Bradesco) que, desde sua instalação na cidade na década de 1950, juntamente com outros pilares, auxiliou para balizar os sonhos de futuros de jovens dos anos de 1980/1990/2000. Uma instituição sólida que, por muito tempo, foi compreendida como o melhor lugar a se trabalhar, sobretudo para estes até então, jovens moradores da cidade de Osasco. Hoje estes jovens são adultos e lidam com jovens de agora, que tem seus próprios anseios, muitas vezes divergentes. Isso que gera algum tipo de incompatibilidade entre os sonhos de futuro dos jovens de agora e os sonhos do futuro dos adultos. Para investigar a questão na cidade de Osasco, a pesquisa etnográfica contou com trabalho de campo presencial entre os anos de 2021 e 2022 em três escolas da cidade localizadas em pontos diferentes: uma escola na zona sul, uma escola no centro e uma escola na zona norte para observação dos jovens e seus pares nestes ambientes. Ainda que sejam três escolas públicas estaduais, o tratamento dispensado para os jovens e seus futuros foram completamente diferentes, sobretudo, quando se observa a partir das diferenças entre classe, raça e gênero. Desta maneira, a interseccionalidade contida nos jovens estudantes do Ensino Médio se constitui como um dos marcadores principais para que estes reflitam sobre suas ideias de futuro, na perspectiva branco centrada oferecida pela própria cidade, ao sonho dos adultos de serem “bradesquinos na época da juventude. Para além deste sonho dos adultos sobre os jovens, outro pilar se liga a perseguir um ideal de futuro: a discursividade do patrono da cidade, Antônio Agu, um imigrante italiano que fundou Osasco no século XIX. O mito de fundação da cidade está diretamente ligado a esta figura e, não por acaso, também molda uma história de nobreza ligada ao imigrante branco e italiano. Essas influências do passado que refletem no presente são “cobradas no futuro de jovens de hoje, que, independente de serem brancos ou não, de certa maneira, existe a expectativa que cumpram com este ideal de sucesso, tal qual é a narrativa da própria cidade sobre o que é um bom cidadão. A pesquisa visa compreender, a partir dos pilares básicos entre branquitude aspiracional e interseccionalidade moldam, como os jovens pensam seus próprios futuros e reagem a estas narrativas branco centradas.
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Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Usos (da) e trajetos em pequenas cidades. Mulheres tecendo o urbano a partir da coleta de resíduos sólidos no Maciço de Baturité, Ceará.
Ana Luiza Rosendo da Conceicao (UNILAB), Jacqueline Britto Pólvora (UNILAB)
Resumo: Palavras-chave: gênero; trabalho; cidade. Neste trabalho propomos uma reflexão sobre os usos e os percursos de mulheres trabalhadoras com a coleta de resíduos sólidos em contexto de cidades pequenas, a partir de dados iniciais da pesquisa que desenvolvemos na região do Maciço de Baturité, interior do estado do Ceará. Para tanto, lançamos mão de parte da literatura produzida sobre gênero para pensar no intercruzamento das mulheres, seu trabalho e o espaço urbano. Piscitelli (2009, p.125) em seu livro sobre a história da problematização a categoria de gênero, demonstra teoricamente a necessidade de articularmos outros marcadores sociais da diferença, como raça e classe, para que, desse modo, sejam tratadas as especificidades e diferenças com o devido respeito e equidade. Nesta perspectiva, temos como objetivo problematizar a posição de gênero nos espaços urbanos e analisar a intersecção entre “ser mulher trabalhadora e a ocupação dos espaços na cidade. Desse modo, os papéis das mulheres em seu cotidiano são observados e problematizados a partir da ocupação dos espaços públicos e das posições de agência de mulheres dentro da estrutura socialmente masculina e desigual. Assim, pensamos sobre a ocupação de mulheres nos espaços urbanos a partir da reflexão sobre o seu mundo do trabalho, incluindo questões sobre suas atividades cotidianas. O contexto da pesquisa e características específicas como o ethos e a personalidade da pesquisadora e pesquisados, atribuídas as devidas ressalvas, são indicados pela antropóloga Mariza Peirano (1992), como aspectos importantes do fazer antropológico, então acrescentamos que experiências de vida e afetos nos movem também textualmente na Antropologia, assim como o próprio método. Dessa forma, localizar mulheres agentes da pesquisa, dentro de seus contextos, é imprescindível para explicar o mundo de vida das interlocutoras em suas próprias lógicas e termos. Pensamos também na importância da interdisciplinaridade da antropologia para ampliar a pesquisa e neste sentido, apoiamo-nos também na arquiteta Leslie Kern (2021) e pensamos como central em nossa análise sobre os lugares das mulheres nas cidades pequenas. Este estudo se justifica pela necessidade de identificar as especificidades de ser mulher em contextos urbanos pequenos e apontar os enfrentamentos do cotidiano de vida das mulheres que constroem a cidade de forma ativa através do trabalho de coleta de resíduos sólidos e suas formas diversas para viver na cidade Acarape, interior do Estado do Ceará.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Explorando Taquaralto: Perspectivas Iniciais sobre Representações Urbanas e Hierarquias Sociais em uma área periférica em Palmas/TO"
Ana Paula Pinto Pereira (UERJ)
Resumo: Este artigo apresenta uma pesquisa preliminar que busca lançar as bases para a futura tese da autora, que se debruça sobre as representações sociais e hierarquias urbanas em Taquaralto, região periférica de Palmas/TO. Inspirada por reflexões teóricas sobre urbanismo, sociologia e antropologia urbana, a autora, recém-chegada à área, busca compreender a dinâmica urbana a partir de sua experiência pessoal e das primeiras inquietações surgidas. Fundamentando-se em autores como Milton Santos, Henri Lefebvre e David Harvey, Vera Telles, Robert Park, entre outros, o estudo visa compreender como as representações de Taquaralto influenciam e são influenciadas pela percepção da cidade como um todo, evidenciando as construções de sociabilidade e as hierarquias entre a Palmas planejada e a região sul segregada. A pesquisa de campo exploratória, ainda em estágio inicial, busca investigar as representações sociais dos moradores locais e residentes de outras áreas de Palmas, bem como analisar as políticas de planejamento urbano que contribuíram para a segregação socioespacial na cidade. Assim, este estudo pretende preencher uma lacuna na compreensão da dinâmica urbana em Palmas, destacando a complexidade das relações socioespaciais e urbanas, enquanto sinaliza as primeiras etapas de uma investigação mais aprofundada.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Cidades travestis: a relação corpo e cidade na produção da urbe
André Rocha Rodrigues (UFSCAR)
Resumo: Esta comunicação está atrelada à proposta de projeto de pós doutorada que visa contribuir com o campo de estudos da antropologia urbana desde as epistemologias travestis. Trata-se de um desdobramento da pesquisa de doutorado que constatou os deslocamentos realizados por travestis que atuam nos mercados do sexo como uma forma de estar no mundo. O objetivo geral é investigar como e qual cidade é criada por essas travestis em constante deslocamento, destacando a relação entre o corpo e a cidade. O referencial teórico inclui tanto a produção de intelectuais travestis presentes em espaços acadêmicos quanto as interlocutoras com as quais mantive contato durante o trabalho de campo. Isso se junta à proposta de antropologia da cidade que considera as relações, contextos e práticas dos citadinos para a construção da cidade, negando a urbe como um espaço dado, aprioristicamente, natural e inato. Para tanto pretende-se fazer uso dos materiais levantados durante as etnografias já realizadas para os trabalhos de mestrado (Rodrigues, 2015) e doutorado (Rodrigues, 2020), utilizando a noção de “memória outra (Toledo, 2019) e de uma “antropologia ex post facto (Machado, 2019). Também se propõe a considerar as expressões travestis como provedoras de sentido (Wagner, 2012). Espera-se contribuir com a produção de conhecimento sobre as práticas das pessoas na construção das cidades, a dinâmica e a influência dos deslocamentos na criação da cidade, os conhecimentos produzidos pelos corpos que vivem e produzem as cidades, as epistemologias produzidas nesses contextos e uma antropologia da cidade produzida por saberes não hegemônicos.
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Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
A cidade também são as bixas: Graffiti e Pixo como formas de biorresistência da juventude LGBTQIAPN+ teresinense
Ayan Beatrix Pereira Gomes (UFPI)
Resumo: Em dezembro de 2021, o escritor Alex Sampaio presenteou-me com seu livro “Ressuscito na Cidade Suicida”. Na época, tivemos um breve diálogo sobre saúde mental da juventude teresinense, em específico sobre jovens LGBTQIAPN+. No livro, há uma Teresina que vive em meio ao abandono des sues habitantes, casas/prédios, patrimônio, Poti e Parnaíba (rios), animais e vegetação. A Cidade Suicida, nomeada por ele, é aquela que impõe obstáculos para aquelus que não devem pertencer a ela. Entendo que esse pertencimento é atravessado por desigualdades de raça, gênero, classe e corporalidades. Desta maneira, quando não se pertence, paga-se com a própria vida. Neste trabalho, tenho como objetivo evidenciar Graffiti e Pixo como formas de biorresistência de uma juventude LGBTQIAPN+ que tenta sobreviver em uma Cidade Suicida, a partir de diálogos com o livro de Alex, minhas experiências com a Bixaria Crew e o pixo-denúncia na Estação Ferroviária. Inicialmente, remeto ao início de janeiro em que a Bixaria saiu para um rolê na zona leste, no qual foram feitas intervenções com Personas, Bombs, Xarpis e duas frases: “Salve as Bixas! e “Salve as os es Trans”. Nesse período, fazia menos de um mês que Palloma Amaral, travesti preta, havia sido assassinada com pedradas na cabeça. Naquela mesma semana em que a Bixaria riscou, alguém havia pixado a Estação Ferroviária de Teresina com a seguinte frase: “Quem matou Paloma? O Estado”. Em um portal de notícias, o que chama a atenção sobre os pixos na Estação é a degradação ao patrimônio público que está sendo restaurado. Em outro, no qual a foto do pixo sobre a morte de Palloma é usado como imagem da postagem, pede-se pela prisão de pixadores e o tratamento com o máximo rigor da lei por julgar-se ser um crime que prejudica toda a sociedade. Sobre a denúncia relativa à morte de Palloma, não se fala. O pixo é o vandalismo. A morte de mais uma travesti, não. Por último, destaco uma intervenção minha, na qual meu persona, no muro, diz: “+ 1 domingo, bixa!”. Ademais, utilizo Agier (2011) para o conceito de rede ao comentar sobre conexões que possibilitaram o surgimento da Bixaria Crew e converso sobre formas de fazer cidade a partir do graffiti e pixo; Leite (2002) para as noções de lugar, uso, contra-uso dos espaços públicos e táticas; com Pereira (2020), adentro na discussão sobre pixo biorresistência e necropolítica em diálogo com as vidas precárias de Butler (2019), a heterosexualidade necropolítica de Preciado (2020) e a cisnormatividade como dispositivo do Biopoder (Foucault, 2008; Goulart e Nardi, 2022).
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Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
“Cidade das Crianças”: entre a gestão pública e as experiências dos sujeitos
Beatriz Soares Gonçalves (UFPB), Flávia Ferreira Pires (UFPB)
Resumo: O presente trabalho visa debruçar-se sobre três respostas (duas positivas e uma negativa) dadas a uma questão colocada às crianças que foram interlocutoras em minha pesquisa de doutorado (Programa de Pós-Graduação em Antropologia da Universidade Federal da Paraíba), ainda em desenvolvimento: “Vocês concordam que Jundiaí/SP pode ser considerada a ‘cidade das crianças’? A cidade mencionada integra, desde 2018, a Rede Latinoamericana – Projeto Cidade das Crianças e, desde então, a expressão adjetiva “das crianças acompanha o nome da cidade (em documentos, em materiais de divulgação, nas redes sociais, etc.). Tal Projeto, elaborado na Itália há mais de trinta anos, consiste em uma proposta de gestão municipal que tem por objetivo colocar as crianças nos centros das ações e está presente em mais de trezentas cidades ao redor do mundo. A tese de doutorado busca compreender as especificidades da realização do Projeto Cidade das Crianças em Jundiaí/SP, desse modo, há três anos tenho acompanhado as políticas públicas e intervenções urbanas realizadas em prol da infância neste município. Três técnicas de pesquisa com crianças foram empregadas no presente recorte da tese. Em primeiro lugar, realizei uma entrevista formal com um menino de nove anos estudante da rede municipal. A segunda refere-se a conversas informais em um parquinho com três meninas moradoras de um bairro periférico. Por fim, realizei uma oficina com um grupo de aproximadamente quinze crianças que integram um órgão municipal intitulado Comitê das Crianças. Ao olhar para três respostas e justificativas conflitantes, busco compreender as diferenças urbanas que perpassam as experiências das crianças e os desafios e contradições impostos pela e à gestão. Além disso, o trabalho irá refletir sobre o fazer-cidade-das-crianças; conceito em desenvolvimento que busca dar conta do que as crianças fazem, querem, propõem e precisam no contexto urbano. Destacarei os agentes (humanos e não humanos) envolvidos nessa construção (prefeito, ongs, empresas, placas, elementos da natureza, pinturas, cores, entre outros).

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Etnografias urbanas e seus ancoradouros: regimes de mobilidade e chokepoints no Porto de Santos
Bianca Freire-Medeiros (USP), Isabela Vianna Pinho (UFSCar)
Resumo: Esta comunicação deriva do diálogo entre campos de pesquisa distintos, porém convergentes em seu interesse pelas mobilidades socioespaciais como grade analítica. O objetivo é apresentar e testar três noções cujo entrelaçamento guarda potencial heurístico para as socioetnografias urbanas, especialmente aquelas que se voltam ao papel central desempenhado pelos mercados informais e ilegais na reconfiguração das cidades, a saber: ancoradouros, regimes de mobilidade e chokepoints. Ao mesmo tempo um espaço-chave, um ponto de observação e um dispositivo analítico, o ancoradouro articula fluxos, fricções e infraestruturas, permitindo o deciframento dos regimes de mobilidade e seus pontos de estrangulamento (Freire-Medeiros, 2022). No âmbito do projeto “Carros Globais: uma pesquisa urbana transnacional sobre a economia informal de veículos (FAPESP e ANR)”, identificamos mundo afora diversos ancoradouros – portos, oficinas mecânicas, ferros-velhos, lojas de revenda e autopeças, leilões, fronteiras – que são estratégicos para articular distintas “jornadas (de carros, peças de automóveis, políticas, capitais) e “territórios (em várias escalas). Em cada um desses ancoradouros, as interações entre diversos agentes sociotécnicos produzem, tanto quanto são resultado de, fricções e rupturas que revelam a complexidade do sistema de automobilidade, tomado aqui como estruturante da vida urbana nos dois hemisférios. Nessa grande interpretativa, o Porto de Santos é um ancoradouro de alta relevância: considerado o maior complexo portuário do Hemisfério Sul em movimentação de cargas (mais de 170 milhões de toneladas por ano), por ele passam intensos fluxos transnacionais de importação e exportação necessários às "cidades carrocêntricas": veículos de grande porte, carros populares novos e usados, diversas autopeças, componentes eletrônicos essenciais para a produção de veículos, tudo isso entrelaçado à circulação de uma infinidade de pessoas, capitais e informações que dão concretude empírica àquilo que o giro móvel chama de mobilidades sistêmicas (Urry, 2007). Palco da maior parte das apreensões de cocaína de todo o país, o Porto de Santos concentra checkpoints, chokepoints, tecnologias de monitoramento e controle, permitindo observar combinações complexas entre movimentos, pausas e fixidez. A partir de descrições etnográficas dessa infraestrutura, resultantes de um extenso trabalho de campo realizado desde longa data por uma de nós (Vianna, 2022), colocamos à prova essa tríade analítica (ancoradouro, regime de mobilidades e chokepoints) que pretende apreender as dinâmicas entre fluxos e fixos, discursos e práticas (formais e informais), mercados legais e ilegais em diferentes contextos urbanos.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Identidade, pertencimento e memória nas narrativas de atores sociais em suas lutas pela moradia na RMBH
Clarissa dos Santos Veloso (PUC MINAS), Junia Ferrari (UFMG), Ana Cristina Aparecida Soares (UFMG)
Resumo: O objetivo deste trabalho é analisar narrativas de atores sociais em suas práticas de ativismo junto a movimentos sociais de luta por habitação sob a perspectiva da identidade, do pertencimento e da memória. Consideramos nas análises os processos de nomeação das ocupações urbanas, as formas como os movimentos e atores sociais constroem o frame de suas pautas e os discursos desses sujeitos sobre suas vivências nas lutas por moradia e outros direitos. As análises revelam que são mobilizadas pelos atores, em seus cotidianos e práticas de ativismo, questões que atravessam classe, gênero e raça de forma interseccional, bem como articulam dimensões da moradia associadas à preservação da natureza e às manifestações culturais e religiosas. Os dados analisados foram coletados durante a realização do Curso de Formação de Agentes Sociais pela Reforma Urbana na Região Metropolitana de Belo Horizonte (CFAS/RMBH), que aconteceu ao longo do segundo semestre de 2023. Parte integrante de um projeto que concilia pesquisa, ensino e extensão, o CFAS consiste em um ciclo de encontros gratuitos nos quais reforma urbana e direito à cidade em suas variadas dimensões são problematizados e debatidos. A partir de uma combinação de conhecimentos acadêmicos e conhecimentos produzidos pelos movimentos, facilitadores convidados compartilham experiências com a turma de cursistas e trocam conhecimentos. O Curso visa impulsionar a participação social, a transformação positiva nas comunidades periféricas e socialmente vulneráveis e as redes de apoio entre ativistas e suas pautas. Por isso, o CFAS é voltado para integrantes de movimentos, coletivos e entidades, entendendo que o agente social participante pode replicar os conhecimentos e experiências da formação em seu grupo de atuação. Na edição de 2023, trinta e um cursistas participaram dos sete encontros do CFAS, realizados de forma itinerante em territórios populares da RMBH. Nessas oportunidades, lançamos mão de observação participante para coleta de dados, com ênfase nos discursos orais e relatos de experiências, bem como de outras formas de registro, como gravação de vídeos e fotografias. Em adição, para compor nosso corpus empírico, realizamos entrevistas com os cursistas-ativistas para aprofundar a análise dos discursos e das práticas dos movimentos e de seus atores sociais.
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Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Tambores da astúcia.
Gilberto Geribola Moreno (UFSCAR)
Resumo: Este trabalho baseia-se em uma pesquisa realizada em duas cidades de pequeno porte, Foz do Iguaçu localizada na região da tríplice fronteira (Brasil, Paraguai, Argentina) e Sorocaba em São Paulo nas quais são abordadas as interações e as articulações entre as rodas de samba, grupos/blocos de carnaval e terreiros de candomblé como elementos constitutivos de certa astúcia, transgressividade e tática de se criar/fazer as cidades. Neste processo destacam-se sobreposições, deslocamentos e conflitos que instituem diferentes marcos culturais nos territórios distintos daqueles que são hegemônicos. Observa-se as relações intergeracionais e interétnicas como um elemento dessas interações e na propagação de certo saber-fazer relacionado a essa dimensão da cultura afro-brasileira. Por fim, o trabalho sinaliza que essas práticas culturais estabelecem uma configuração social específica, definindo uma cidade distinta daquela promovida pelos agentes públicos e representantes do capital.
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Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Vende-se o eu e a cidade: a plasticidade da paisagens e dos rituais de consumo em Montes Claros/MG
Gustavo Souza Santos (Centro Universitário FIPMoc - UNIFIPMoc)
Resumo: Este estudo se dedicou a refletir o encadeamento de práticas e rituais de consumo contíguos à regimes de ocupação e deflagração de práticas socioespaciais em uma região que, nos últimos anos, despontou como um esteio boêmio de consumo e comércio, sobretudo noturno, na cidade média de Montes Claros/MG. A região compreende um emaranhado de vias dispostas sob os bairros Jardim São Luiz, Melo e Funcionários que tiveram seus usos flexibilizados ao comércio por um adendo legislativo municipal em 2022 para ocupação do solo. Nesse ínterim, o intento deste esforço de pesquisa se deu em conjunto tríplice de descrição e análise: inicialmente, uma leitura ciosa das vias e espacialidades de comercialização ante aos processos de urbanização e ocupação do solo urbano; a seguir, a tipificação de práticas e rituais de consumo diante da oferta de signos e totens de lazer e entretenimento; e, por fim, o enquadramento socioespacial da ocupação e do cotidiano da área, à guisa de tecer modos de ver, perceber e consumir o espaço e a imagem da cidade. Por meio de itinerários etnográficos e observação da constituição plástica e imagética dos espaços, procurou-se examinar a composição da paisagem urbana e o influxo social de consumidores. Ora, o espaço é uma poética das relações, enquanto as relações em toda sorte de arranjos constituem as métricas precisas para que esta poética se estabeleça. Aqui, desprende-se o conceito de paisagem urbana. Isto é, a forma visível, sensível e tátil da cidade. Da compreensão dos sentidos, a paisagem urbana é a materialização eloquente da herança histórica de sua produção assimétrica e disputada. Nas vias que constituem o corpus deste percurso etnográfico, os sentidos são capturados pela unidade estética da plástica arquitetônica de letreiros, ambiências e adornos funcionais que potencializa - sob os dizeres publicitários - experiências de marca, enquanto são simultaneamente convite e vitrine de uma vitalidade urbana exígua, afeita nas luzes, musicalidade, boemia e consumo. Ruas mais povoadas, calçadas beligerantemente ocupadas. A cidade, após seu intenso fluxo de expediente comercial, ativa um novo turno em que seu funcionamento é anabolizado e estimulado. Enquanto rotas, mimetismos socioculturais e estéticas ritualísticas de consumo se pulverizam no ócio montes-clarense, noções e imagens bidimensionais de cidade e, porque não, de uma proto-citadinidade se efetivam. Isto é, é viva a cidade e é vivo o habitante que consome e celebra apenas nesse festim de uma urbanidade estetizada e coisificada no instantâneo do consumo ou do que se materializa entre fachadas e letreiros ou se apregoa como sociabilidade ritual, no qual os sujeitos buscam no consumo o amuleto para anestesiar a visão factual da cidade e de suas outras paisagens de arrocho.
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Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Etnografias de situações ordinárias e efêmeras nas ruas: análise de vertentes catalãs e francesas
Heitor Frúgoli Junior (USP)
Resumo: Proponho-me a fazer um balanço crítico do potencial contido em abordagens etnográficas voltadas a usos corriqueiros de ruas e de outros espaços públicos, com base na leitura crítica de duas obras ligadas ao contexto europeu. A primeira delas refere-se ao seguinte livro: Horta, Gerard. Rambla del Raval de Barcelona: de apropiaciones viandantes y procesos sociales. Barcelona: El Viejo Topo, 2010. A publicação decorre de projeto coletivo coordenado por Manuel Delgado (Horta, 2010, p. 23), antropólogo catalão que aprofunda fundamentos teóricos e metodológicos referenciais de uma antropologia do urbano, com ênfase nas múltiplas interações no plano das ruas a partir do olhar etnográfico. Durante dois anos, Gerard Horta (docente da Universidade de Barcelona) etnografou formas de apropriação por parte de transeuntes da Rambla del Raval, num bairro assinalado pela marginalidade e submetido há alguns anos por intervenções urbanas, como a própria rambla já mencionada. A segunda abordagem remete a um balanço do seguinte dossiê: Paquot, Thierry (ed.). “Petits riens urbains (Dossier). Revue Urbanisme, n. 370, 2010, p. 39-70. O organizador, Thierry Paquot (docente da Escola Nacional de Arquitetura de Paris–Val de Seine), que trabalha no campo da filosofia do urbano, é autor de livros e organizador de coletâneas francesas voltados a múltiplos aspectos da vida urbana. No referido dossiê, são contempladas várias atividades cotidianas – caminhar, cumprimentar, observar, usar celular etc. – com significativa participação de antropólogas/os, como Yves Winkin, Emmanuelle Lallement, Michèle Jolé, Martine Bergues, Nadja Monnet e Pascale Legué, cujos enfoques buscam extrair conhecimento de ações aparentemente corriqueiras. Em ambas as perspectivas, que serão tratadas em contraponto a outras linhas da antropologia urbana contemporânea, trata-se de atentar para um mosaico de práticas aparentemente banais que, sob outros olhares e estratégias de escrita, abrem possibilidades analíticas instigantes sobre o contexto da citadinidade.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
As cidades do carnaval de rua
Joanna Munhoz Sevaio (UFRGS)
Resumo: Em minha pesquisa de doutoramento, tenho analisado as dimensões políticas do carnaval de rua contemporâneo, a partir de trabalho de campo realizado nas cidades de Porto Alegre e Rio de Janeiro, com passagem por Lisboa, onde realizei doutorado-sanduíche. Mais especificamente, considero os usos e contra-usos das ruas como parte de um repertório de contestação de vivências urbanas segregadoras, que preconizam interesses privados. O fenômeno carnavalesco em questão, notadamente a partir dos anos 2010, coloca em evidência a ocupação dos espaços públicos, de modo que praças, monumentos, ruas e avenidas são tomadas por multidões em festa e movimento. Na catarse coletiva promovida pelos blocos, os foliões fazem-cidade, contestando a lógica imperativa das cidades-mercadoria e protagonizando processos de reencantamento do mundo. A festa é uma experiência coletiva, pública, e potencialmente insurgente. Neste trabalho, busco compor um quadro analítico sobre como os citadinos-foliões produzem as cidades observadas a partir do carnaval, apreendendo os espaços públicos pela cadência dos tambores, trompetes, xequerês e tamborins. Entendo, assim, que a dança, a música, a alegria e a liberdade dos corpos formam uma combinação poderosa a favor de cidades voltadas para a pluralidade, nas quais a citanidade dos sujeitos é uma possibilidade, entremeada por relações complexas e ambíguas dos blocos de carnaval com o poder público. Minha experiência etnográfica é sobretudo corporal: coloco-me no meio dos milhares de foliões, vivenciando a cidade junto a eles, observando os fluxos e trajetos que vão sendo configurados pelas sociabilidades carnavalescas. Ademais, tenho entrevistado representantes dos blocos que acompanho nas ruas, a fim de aprofundar o entendimento dos vieses que fundamentam as práticas de fazer-cidade dos grupos observados. Este trabalho resulta, portanto, em uma análise situacional das relações entre festa, cidade e política.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Da parte alta à parte baixa: um estudo sobre a circulação e o fazer-cidade de mulheres em Maceió (AL).
Júlia Maria Paredes (UFPB)
Resumo: Este trabalho é oriundo de minha pesquisa de mestrado, ainda em andamento, que tem por objetivo analisar os processos de circulação de mulheres residentes nos bairros da parte alta da cidade de Maceió pelos espaços da parte baixa, a fim de compreender as motivações, percursos, sentimentos e afetações circunscritas no fazer-cidade e na experiência urbana dessas maceioenses a partir de seus trajetos cotidianos. No contexto da cidade de Maceió, a divisão existente entre “parte baixa e “parte alta se expressa não apenas em aspectos geográficos, mas também em características socioeconômicas: a parte baixa circunda bairros próximos à costa litorânea e ao centro da cidade, com destaque aos bairros nobres e espaços de grande atividade turística; e na parte alta se encontram os bairros mais distantes do centro e que figuram grandes números de complexos habitacionais e periferias. A divisão entre “parte alta e “parte baixa foi o fio condutor desta pesquisa, visto que essa corriqueira diferenciação acaba por produzir e endossar nos espaços urbanos de Maceió uma série de relações desiguais e distanciamentos entre os sujeitos, estes que por sua vez se diferenciam também pelo gênero, raça, classe, sexualidade, e outros aspectos. Haja vista a disposição dicotômica da cidade e sua aparente incidência nas relações sociais entre seus habitantes, busco observar como essas assimetrias e distanciamentos se materializam no cotidiano de mulheres que moram em localidades da parte alta. Compreendendo que o fazer-cidade e a experiência urbana são construídos a partir de subjetividades envoltas no processo de movimentar-se pela cidade (Agier, 2015), este trabalho pretende lançar luz a como essas disparidades se apresentam nas experiências urbanas femininas a partir do reconhecimento de que o fazer-cidade em Maceió reproduz implicações que operam pela impermanência e insegurança das mulheres (Lyra, 2019).
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Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Rolê na cidade: o rolimã enquanto prática de resistência, disputa e legitimidade
Luciano Silveira Coelho (UEMG)
Resumo: Este texto discute aspectos estruturantes da prática do carrinho de rolimã, com base em uma etnografia realizada na região metropolitana de Belo Horizonte (RMBH) entre 2019 e 2022. As primeiras impressões indicavam que o movimento do rolimã, com equipes de competição, agremiações e organizações de eventos na RMBH, se tratava de uma ampla e coordenada ação, de um grupo coeso de pessoas, em torno de um mesmo propósito. Com uma densa e prolongada permanência em campo, encontrei um movimento marcado por disputas, interesses e apropriações múltiplas que limitam, ao mesmo que conformam, uma comunidade de prática. Tal prática emerge de uma construção coletiva, urbana e marginal, cuja análise encontra grande ressonância nas teorias da aprendizagem situada de Jean Lave e da abordagem ecológica de Tim Ingold, bem como na perspectiva do urbano enquanto território de disputas. Nesse sentido, o presente texto coloca em relevo três aspectos estruturantes da prática do rolimã na RMBH: a participação das mulheres nos eventos, a partir da noção de cidade sexuada de Michele Perrot; as disputas territoriais destes grupos com os ordenamentos do Estado e do capital, na perspectiva de cidade enquanto direito, de Henri Lefebvre; e a busca por legitimidade de uma prática marginalizada, pelo prisma do consumo como constituidor de identidades, segundo Michel de Certeau. Assim, homens e mulheres, adultos e crianças, participam, constituem e são constituídos por uma prática polissêmica, contraditória e essencialmente situada.
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Copa em movimento – sociabilidade de ajuntamento e produção imagética de cotidianos ritualizados
Luiz Henrique de Toledo (UFSCAR)
Resumo: Esta comunicação busca alinhavar alguns paradigmas indiciários etnográficos que oferecem do ponto de vista imagético as relações insuspeitas entre espaço público, política como sistema cultural convencionalizante e o torcer como mecanismo expressivo ou gramática que performa uma “sociabilidade de ajuntamento”. Tomo três eventos, a saber: a 22a edição da Copa do mundo de futebol masculino e de espetáculo, as “esportivizadas e feéricas eleições presidenciais que se avizinhavam e que ocorreriam logo em seguida, naquele mesmo ano de 2022 e o velório de Pelé, ocorrido no dia 02 de janeiro de 2023 na cidade de Santos, na chave analógica das relações político-esportivizadas “quiasmáticas”, ou seja, situações relacionais em que as negociações de signos e equivocações semânticas entre planos simbólicos distintos entram no cálculo das disputas de senso comum por significados aparentemente óbvios, mas que transformam simbolizações convencionalizadas, tais como a mera adesão ao selecionado nacional, em experiências altamente relativizadas em significantes flutuantes e/ou diferenciantes. Pensando a noção de movimento em vários planos, e como um princípio ordenador da vida cotidiana, as impressões do país que desacelera em tempos de Copa do mundo e que produz ajuntamentos solidários numa efervescência coletiva, estão obviamente alinhavadas à alguma centralidade que aponta o futebol como esporte-nação, imagem que por muitas décadas foi creditada a essa modalidade esportiva no Brasil. Percepções de uma litigiosa cidadania ou citadinidade também podem ser discutidas a partir dessas formas analógicas de apropriação esportificada da cena política nacional e dos espaços públicos na contemporaneidade, cujos valores de uma sociabilidade em movimento produz seus efeitos espetacularizados, sobretudo na remodelagem político-performática presente nas formas aparentemente mais casuais de ajuntamentos pelas cidades.
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Problemas e possibilidades nos diálogos entre antropologia urbana e educação: refletindo a partir das relações entre jovens feministas e educadoras
Maria Eduarda de Moraes Torres (UNIFESP)
Resumo: A relação entre antropologia e educação, sobretudo envolvendo contextos de ensino formais como a escola e a universidade, ainda encontra-se em consolidação. Pesquisadores que buscam traçar esse diálogo destacam como possibilidades dessa interdisciplinaridade compreender como instituições de ensino podem marcar os sujeitos a partir de projetos de Estado e sociedade, além de serem espaços para a análise de uma relação de alteridade central: a de diferentes idades e ciclos de vida (Pereira, 2017). Compreendendo isso, a partir de um levantamento bibliográfico, objetiva-se discutir a relação entre as áreas, apontando problemas em relação a esse diálogo, mas também potencialidades. Além disso, busca-se dar enfoque às relações entre gerações que se dão nos espaços educativos, partindo de considerações de uma pesquisa etnográfica em curso, desenvolvida com coletivos feministas de jovens que estão articulados em uma escola pública da zona leste paulistana e em uma universidade particular do centro da cidade. Nesse sentido, apontando aspectos das relações entre feministas, professoras e alunas de diferentes gerações nos grupos, apresenta-se uma reflexão teórico-metodológica sobre a análise das relações entre idades para além de um estabelecido atrito, considerando a questão etária como parte dos marcadores sociais da diferença. Por fim, destaca-se que as relações que se desdobram na escola e universidade extrapolam essas localidades, refletindo em outras dimensões, como a forma como ativistas experienciam o espaço urbano. Considera-se, então, como esses espaços educativos podem interessar a antropologia urbana, além de propiciar análises sobre as relações entre gerações.
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Pensando Sociabilidades e Territorialidades na cidade de Tocantinópolis- TO
Maysa Mayara Costa de Oliveira (UNIVERSIDADE FEDERAL DO NORTE DO TOCANTINS)
Resumo: A proposta desse trabalho é iniciar um debate a partir do contexto de uma cidade localizada na região do Bico do Papagaio, no Tocantins. Tocantinópolis, é uma cidade centenária, que exercia uma certa importância em seu contexto regional antes da formação do estado do Tocantins. Podemos destacar algumas singularidades dessa cidade que a fazem tão interessante para o campo de investigação das ciências sociais, e na proposta dessa pesquisa de entender as sociabilidades e territorialidades na formação da cidade. Primeiro, os conflitos que demarcaram e demarcam a história e o território da cidade. Tocantinópolis possui em sua história uma série de conflitos agrários, étnicos, que produzem também representações sobre aquele espaço, como a guerrilha do Araguaia que ocorreu naquela região, ou os processos de grilagem de terras em toda a região do Bico do Papagaio, sendo um dos locais de portas de entrada para a Amazônia legal, entre os estados do Maranhão, Tocantins e Pará, constituindo-se em uma região de intenso conflito entre posseiros, grileiros, e fazendeiros durante o regime militar (SILVA; CUNHA,2012). Outro ponto é a presença de grandes projetos na região que de um lado servem de atrativo populacional e influenciam nos fluxos migratórios, como também intensificam os conflitos territoriais, como a presença de projetos da Barragem de Estreito (MA) há aproximadamente 32 km da cidade; Projeto Carajás; a Transamazônica e as atividades agropecuárias. Outra questão que também nos interessa nessa pesquisa é entender a composição indenitárias dessa região onde se tem uma presença muito significativa de populações tradicionais: povos indígenas, quebradeiras de coco, agricultores, etc. Tais contextos nos colocam a pensar e debater questões como, pertencimento, identidade, fronteiras, estigma, e a cidade é o pano de fundo para compreender essas relações. Levando em consideração essa realidade tão singular da região, esse trabalho é um esforço de entender a realidade de cidades amazônicas, na sua formação populacional, espacial e nas suas sociabilidades, e principalmente na construção de suas identidades que estão atreladas também à constituição da cidade. Nesse aspecto, chamo a atenção para nos desvencilharmos cada vez mais de padrões e conceitos utilizados para pensar as cidades e que muitas vezes não se encaixam em nossas realidades, principalmente, quando nossas pesquisas estão fora dos grandes eixos de produção.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
"Praça do Dekinha": uma análise do fazer-cidade pelos homens ordinários
Priscila Dias Alkimim (UNIMONTES), Giancarlo Marques Carraro Machado (UNIMONTES)
Resumo: O presente trabalho explora a relevância das ações individuais na transformação dos espaços urbanos, utilizando como estudo de caso a "praça do Dekinha" localizada no bairro Jardim Palmeiras, em Montes Claros, Minas Gerais. Este espaço, originado de um triângulo viário e não oficialmente reconhecido como praça, foi transformado e mantido por mais de quatro décadas por um residente local conhecido como Dekinha. Sua dedicação envolveu o plantio de árvores, flores, a manutenção diária e esforços para obter melhorias estruturais, como instalação de bancos e lixeiras para o local, além da recente adição de um churrasquinho administrado pelo próprio Dekinha, que introduziu uma nova dinâmica ao espaço. Fundamentada em teorias urbanas de autores como Henri Lefebvre, Urpi Uriarte, Jane Jacobs, David Harvey, Michel de Certeau e Michel Agier, a análise visa entender a produção do espaço urbano através das ações coletivas e participação cidadã, ressaltando o potencial dos homens ordinários em criar espaços de convivência significativos dentro do contexto urbano. A metodologia empregada baseia-se na etnografia urbana, com observações participantes realizadas entre maio e julho de 2023, além de conversas detalhadas com Dekinha. Este enfoque permitiu uma compreensão aprofundada das interações cotidianas e do valor atribuído ao espaço pelos envolvidos, respeitando-se os princípios éticos de pesquisa. Os resultados indicam que a atuação de Dekinha, em conjunto com a comunidade, não só transformou fisicamente o espaço, mas também reforçou a identidade coletiva e a memória do lugar, evidenciando como intervenções locais e espontâneas podem gerar impactos significativos no tecido urbano. Essas ações refletem um compromisso profundo com a melhoria da qualidade de vida urbana, desafiando as abordagens convencionais de planejamento urbano e destacando a importância de narrativas locais na formação da identidade das cidades. O estudo conclui que a "praça do Dekinha" exemplifica o papel vital que os cidadãos podem desempenhar na criação de espaços urbanos mais inclusivos e humanos, através de ações cotidianas e colaborativas, destacando a capacidade de agência de indivíduos e comunidades na moldagem do espaço urbano.
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Terreiros e cidades: co-constituição, socialidades mais-que-humanas e modos de fazer lugares
Thaís Cristina Leal Verçosa (UFPE)
Resumo: Como cidades e terreiros de candomblé se fazem, desfazem e refazem, em relação? Que lugares são, esporádica ou continuamente, utilizados pelo povo de santo em cada cidade, transformando seus usos e/ou criando novas formas de habitar o espaço? Aqui, proponho uma reflexão sobre os impactos que o desenvolvimento urbano causa aos terreiros de candomblé, alterando suas rotas e modificando o cotidiano das casas, ao mesmo tempo em que discuto como estas casas de culto surgem, se moldam, se deslocam e se refazem para se manterem ativas apesar da inquietação constante que marca as grandes cidades. Partindo da perspectiva dos estudos sobre candomblé, e olhando desde os trabalhos antropológicos empreendidos por pesquisadores dessa religião afro-brasileira no contexto de Salvador, sua região metropolitana e adentrando o Recôncavo Baiano, destaco que poucos foram aqueles que se debruçaram realmente sobre a temática dos terreiros e sua relação com o espaço-cidade, lidando com a questão de maneira tangencial, assumindo-a como dada ou pensando de maneira determinista, em que o espaço-terreiro está constituído de uma vez por todas e serviria, tal qual um modelo, para todas as formas de apropriação entre terreiros e cidades, desconsiderando as especificidades de cada casa de culto e seus modos únicos de habitar e produzir lugares. Este modo genérico de olhar para a relação aqui proposta torna subjacente, ainda, outro ponto relevante para a discussão: o espaço, ele próprio, viabiliza modos singulares para que cada terreiro venha a existir. Muitos são os desafios enfrentados quando levamos em conta essa conexão, e traz repercussões que incidem sobre a existência dos terreiros. Mudanças espaciais - sejam elas provocadas por demandas de entidades ou pessoas, ação do poder público sobre o espaço ou necessidade de expansão dos terreiros, além de questões relacionadas à perseguição religiosa - são parte da história de vida de muitas dessas casas de candomblé. Para fins desse debate, me interesso em examinar como diferentes tipos de actantes - pensando a partir de Latour (2012) - ou agentes (sendo eles pessoas, animais, objetos rituais e entidades as mais diversas) se associam à questão espacial e como esta afeta os agentes, em uma relação associativa, na qual os vínculos estabelecidos importam e instauram mundos. Ingold (2015) chama essas conexões de malhas, o me que permite olhar para trajetórias de agentes diversos e são boas para pensar sobre como estas constituem lugares, através dos movimentos. O terreiro de candomblé, é, assim, um organismo vivo, que se movimenta por diversas linhas de trajetórias, que se encontram e se entrelaçam, produzindo espaços urbanos, impactando na dinâmica das cidades e sendo impactado por elas, numa relação dialética incessante.
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