ISBN: 978-65-87289-36-6 | Redes sociais da ABA:
Grupos de Trabalho (GT)
GT 056: Etnografias do catolicismo: práticas, rituais, experiências e trajetórias em perspectiva
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Coordenação
Edimilson Rodrigues de Souza (FAMES), Carlos Alberto Steil (Unicamp)
Debatedor(a)
José Guilherme Cantor Magnani (USP)

Resumo:
O catolicismo, quer por sua importância histórica na formação da nação e da cultura brasileiras, quer por seu declínio e perda de hegemonia na atualidade, tem ocupado um lugar de destaque nos estudos da religião, constituindo-se num campo privilegiado para compreender e interpretar as transformações que acompanham o processo social e político do país. Neste universo de pesquisas, a contribuição da antropologia, por meio da etnografia, tem sido fundamental como contraponto às análises que tendem a privilegiar contextos institucionais e dados estatísticos como suas fontes. Ao voltar o seu olhar para a prática dos sujeitos no cotidiano das comunidades e grupos locais, movimentos e organizações eclesiais, deslocamentos e rituais, a etnografia tem revelado outras dimensões do catolicismo, que não são captadas pelas análises de caráter macro. São, portanto, trabalhos sobre o catolicismo, com este foco etnográfico, que este grupo de trabalho quer reunir e debater. Ou seja, serão acolhidas pesquisas sobre “a religião vivida”, que apresentem o ponto de vista dos sujeitos, a partir de suas experiências, num campo de disputas, conflitos, alianças e negociações sobre “o que é ser católico”, que lhes confere um senso de pertencimento a um coletivo e uma identidade plural. O GT não se restringe ao campo da antropologia, nem a pesquisas presenciais, mas inclui também trabalhos produzidos por pesquisadores de outras áreas, desde que realizados a partir da perspectiva etnográfica.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Ecologia e etnicidade em imaginações católicas contemporâneas
Adriano Santos Godoy (CEBRAP)
Resumo: A chamada ecologia integral’ se tornou um dos carros-chefes do Vaticano sob o pontificado de Francisco. Desde o lançamento da encíclica Laudato Si’ em 2015 até a exortação Laudate Deum’ de 2023 são continuamente anunciados novos empreendimentos, os quais buscam formatar essas novas diretrizes eclesiais. Dentre eles está o Sínodo Pan-Amazônico de 2019 que evidenciou como a Amazônia se tornou a vitrine e o laboratório para esse novo empreendimento político-religioso. Contudo, como sempre, há uma série de descompassos e desnivelamentos entre o que discursa o Vaticano e o que fazem os católicos. Nessa apresentação terei como referência pesquisas de campo, entre o sudeste e o norte do país, para explorar etnograficamente como essa ecologia integral tem sido imaginada entre católicos brasileiros. O meu argumento é que essa imaginação católica sobre ecologia tem sido plasmada através de referenciais étnicos. Por um lado, pela forte tradição missionária no Brasil com sua tradicional linguagem da inculturação. Por outro lado, pelos enquadramentos políticos pós-constituintes em que a Igreja Católica busca reaver sua influência pública. Dentro desse cenário macro da política religiosa nacional, interessa explorar na minha apresentação os imbricamentos entre ecologia e etnicidade na religião vivida pelos católicos.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Breve Relato Etnográfico Na Associação Legião De Maria: Praesidium Nossa Senhora Da Conceição Comunidade Do Imaculado Coração De Maria
Aerica Souza Malheiros (UFMA)
Resumo: Este trabalho tem o objetivo de analisar a religiosidade presente no grupo católico Legião de Maria, assim como, as relações sociais e espirituais nesse espaço religioso. Desse modo, pretendo refletir diante de um breve relato etnográfico o contexto social do mais famoso grupo religioso integrante da Igreja Católica Apostólica Romana. O recorte empírico fundamenta-se na observação da Praesidium Nossa Senhora da Conceição Comunidade do Imaculado Coração de Maria, pequeno grupo religioso presente na cidade de São Luís. Dessa forma, os objetivos da pesquisa são refletir a dinâmica do grupo, analisando a simbologia e representatividade do grupo. Identificar as simbologias espirituais do grupo e suas relações na formação do grupo. Analisar a representatividade de Maria sobre o grupo e suas relações espirituais, simbólicas e religiosas, assim como, identificar a devoção que forma o grupo e suas/seus integrantes de forma individual e coletivo. Pretende-se com este trabalho fundamentar um breve relato sobre o contexto histórico nacional e internacional do grupo, identificando seus trabalhos, formação e missões em apoio a Igreja Católica. O método utilizado na pesquisa seguiu a observação empírica como olhar etnográfico sobre as senhoras (denominadas irmãs) que estão presentes no grupo. E também a identificação dos estudos aprimorados sobre oração e os significados dos objetivos do grupo. Estes estudos são utilizados dentro das reuniões em grupo, precisamente seus cronogramas, objetivos e falas baseadas em estudos, textos e discursos simbólicos que fundam o grupo. Dessa forma, compartilho desse estudo identificando a importância desse grupo em uma comunidade religiosa e também a missão de cada integrante sobre a comunidade em que trabalham. Palavras-chave: Legião de Maria; Religião; Espiritualidade; Igreja Católica.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Perspectivas etnográficas sobre as práticas congadeiras e sincretismo
Amanda Moura Souto (UFRJ)
Resumo: Neste trabalho, objetivo apresentar as dinâmicas e relações das práticas congadeiras. Sendo elas, festejos, organizados pelas comunidades negras, em devoção a santos/as como Nossa Senhora do Rosário, São Benedito e Santa Efigênia, associados ao catolicismo e também, em alguns casos, à umbanda e ao candomblé. Utilizam-se de danças, cantos, toque de instrumentos, bandeiras e outros objetos, assim como de performances para afirmarem seu comprometimento festivo e devocional (SILVA, 2016; CORRÊA, 2018). Termos como Congadas, Congado, Congo e Reinados são alguns dos nomes que se referem a essa modalidade festiva e devocional, protagonizada por pessoas negras. Existe uma enorme profusão dessas festas, sobretudo, no território mineiro, sendo identificados cerca de 1.174 grupos, conhecidos como moçambiques, congos, marujos, caboclos, catupés, vilão de lenço, guarda de São Jorge, tamborzeiros. Segundo os antropólogos Rubens Silva (2010) e Daniel Silva (2016), cada um desses segmentos possuem caraterísticas específicas em relação à vestimenta, aos objetos, aos instrumentos, à musicalidade e às performances. Por exemplo, os grupos de Moçambique possuem instrumentos musicais característicos as gungas, espécie de guizo amarrado nas pernas, e as patangomas ou patangomes, que são chocalhos arredondados que lembram o formato de uma peneira (SILVA, 2012, p. 16); os grupos de Congo têm em sua base rítmica com caixas, tamborins e chocalhos (SILVA, 2012, p. 16); já os grupos de Marinheiro e Marujos possuem em suas músicas referências explícitas ao mar e à navegação. Esses grupos, que podem ser chamados de ternos, bandas, embaixadas, entre outros, realizam em torno de 701 festas do Rosário em mais de 300 municípios (BRASIL, 2014). A quantidade de festas, grupos e localidades indica profunda diversidade nas formas de manifestar devoção aos santos e conceber os festejos (CORRÊA, 2018; MORAIS, 2019). Consequentemente, as práticas congadeiras são expressivas dessa enorme variação de formas de pensar e de fazê-las. Nesse sentido, busco apresentar a multiplicidade de tais práticas ao focar nas formas em que o sincretismo se apresenta nesta manifestação festiva. As descrições etnográficas estão ancoradas, sobretudo, em meu trabalho de campo desenvolvido em Viçosa/MG (2019) e em Ituiutaba/MG (2020, 2021 e 2022).

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Ativismo ambiental católico no Brasil: Um olhar ao paradigma da ecologia integral
Breno Botelho (Museu Nacional - UFRJ)
Resumo: Ao longo da última década um termo ganha destaque no interior de grupos católicos atentos às transformações socioambientais, reconfigurando narrativas e práticas no interior do catolicismo, esse termo é ecologia integral. Partindo de dados coletados ao longo de dois anos de trabalho de campo multissituado, junto a grupos católicos ligados a agenda socioambiental nos Estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro, Espirito Santo, Bahia e junto a CNBB, em Brasília, como parte de doutorado em Antropologia Social em curso no Museu Naciona-UFRJ sobre ativismo ambiental católico em contexto de evento-crítico, o presente trabalho se debruçará sobre influências e inspirações orbitantes no conceito de ecologia integral a partir de sua mobilização por grupos ligados ao ativismo ambiental católico no Brasil. A ação sócio-pastoral empreendida por esses grupos reivindica como fundamento prático-teológico a noção de ecologia integral, sistematizada na carta encíclica Laudato Si’ (2015). Nela, a noção de integralidade é estruturalmente trabalhada de forma a construir pontes entre diferentes matrizes de conhecimento e realidades sociais. Compreendendo enquanto interdependentes as crises ecológica e social, enfatizadas como decorrentes do modelo de produção capitalista (cf. FRANCISCO 2015. p.95), promove a crítica do paradigma desenvolvimentista (ESCOBAR, 2007; SVAMPA, 2016, 2019; LINS-RIBEIRO, 1991, 2014) de alta entropia, baseado na extração de commodities, no incentivo ao consumismo e individualismo (FRANCISCO, 2015, pág. 83). Em oposição ao qual se propõe um novo paradigma econômico, articulando elementos das chamadas economia humana e economia ecológica (DELGADO, 2021). Encontrando no conceito de Antropoceno uma ancoragem, articula uma aproximação com as chamadas Ciências da Terra, referenciando a compreensão da Terra enquanto organismo vivo (LOVELOCK 1979, 1991) e enquanto novo ator político (MANIGLIER, 2020). Em sintonia com a compreensão de giro ecoterritorial (SVAMPA, 2019), sinaliza-se, ainda, uma atenção às dinâmicas territoriais do conflito, compreendidos, contudo, a partir de uma dimensão estrutural na relação local-global. Diante de uma religião marcada por formas plurais de pertencimento (TEIXEIRA, MENEZES, 2009) sua abordagem populariza essa ecoteologia no interior do campo progressista católico, que tem se tornado seu maior divulgador em um contexto eclesial marcado por profundos antagonismos. Esta pesquisa parte de uma compreensão construtivista sobre o fenômeno religioso e tal como operacionalizado por Christina Vital e Renata Menezes (2014), proponho uma abordagem do catolicismo em conexão, não reificando as identidades religiosas a priori mas procedendo à contextualização da forja dessas identidades em relação aos múltiplos contextos da vida social.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Rezadores e Rezadoras de Ladainha no Marajó: hierarquias, tensões e alianças no cotidiano do Catolicismo em Ponta de Pedras.
Cintia Nayara Ribeiro de Sousa (UFPA), Antonio Maurício Dias da Costa (UFPA)
Resumo: A fé católica está ligada diretamente ao processo colonial no Brasil, por se tratar da religião oficial de Portugal. Como instituição seus meios de atuação perpassam pela moralização dos costumes e pela catequização. O fim do império em 1889 significou o término dessa hegemonia e a perda de espaço como religião oficial. Mudanças importantes também ocorreram na própria igreja a partir do Concílio Vaticano II. A igreja na Amazônia enfrentou obstáculos diversos para a evangelização, principalmente, por conta das grandes dimensões do território e a falta de sacerdotes. As metodologias empregadas foram as desobrigas, registradas desde o período colonial, e em seguida foram implementadas as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) (Gordiano, 2017). Nesse contexto, a atuação de lideranças leigas era indispensável a fim de que as comunidades mantivessem a fé mesmo sem a presença dos sacramentos. A devoção aos santos representou um caminho para realizá-lo. O trabalho tem por objetivo ressaltar a experiência dos rezadores e rezadoras de ladainhas, que na ausência de sacerdotes conseguiam reunir as pessoas para orações comuns, cantadas em latim próprio do aprendizado oral. Trata-se aqui de evidenciar a relação estabelecida entre os leigos e a hierarquia oficial da igreja com seus conflitos, acordos e alianças. Aponta-se então uma escala temporal de permanências e mudanças na forma de dirigir esse ritual. A pesquisa é qualitativa, um trabalho antropológico, uma antropologia conforme Ingold (2015) construída com os atores e não apenas sobre eles. Os métodos serão: a história de vida (Kofes, 1994; Thompson, 1992) e também a observação participante na busca de estabelecer um diálogo com os interlocutores (Uriate, 2012). Portanto, partirei da perspectiva dos sujeitos leigos e leigas, rezadores e rezadoras de ladainha de Ponta de Pedras e seus associados, e não da hierarquia da igreja. Essa é a dinâmica do campo religioso (Boudieu, 2007), ora tensa, ora de alianças, entre os especialistas do sagrado e os leigos. Dessa forma, esta relação pode ser denominada complementariedade contraditória (Maués, 1995) marcante na história da igreja no Brasil e presente na fala dos interlocutores que vivenciam diariamente o catolicismo.
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Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Os saberes de um narrador de São Benedito de Bragança do Pará
Elcio Sant'Anna (FACULDADE UNIDA)
Resumo: RESUMO: Este é um estudo do saberes dos encarregados de comitivas de esmolação de São Benedito de Bragança do Pará que atua para as festividades beneditinas, uma tradição de 229 anos. A iniciativa de narrador de São Benedito a rigor funciona com suporte das devoções do catolicismo caeteara. Sendo atividade principal do encarregado de comitiva receber as doações dos promesseiros e realização de rezas e ladainhas em suas casas, sub-repticiamente torna-se canal do fluxo das narrativas de São Benedito que circulam nas regiões de município de Bragança. É assim que a pesquisa mostrou entre os anos de 2010 a 2016 estes agentes de fé beneditina, a pesar de sua subalternidade, agem para o fortalecimento da crença. Assim além da agência leiga do ritual católico quer realizando ladainhas, carregando as imagens de São Benedito, cantando o cancioneiro devocional, e até mesmo fazendo batuques, trazem para todos que quiserem ouvir as histórias de santo. Esta é a trama dos fazeres do narrador de São Benedito, perfazendo uma malha ingoldiana de caminhar, jogar bandeiras, rezar, cantar, batucar etc, no trajeto percorrido todos os anos de março a dezembro em favor do povo que clama por uma ação do sobrenatural na dura vida do fieis bragantinos. . Palavras-chaves: Saberes Narrativas Devoções
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Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Restos, relíquias e objetos sagrados: um estudo sobre a agencia das materialidades no culto aos santos católicos
Hugo Ricardo Soares (UFES)
Resumo: A proposta deste trabalho é analisar o papel desempenhado por diferentes objetos na fundamentação da devoção dedicada ao padre polonês Rodolfo Komórek. Procuro, com esta abordagem, oferecer uma contribuição etnográfica ao campo da Antropologia das devoções e do catolicismo, que não se restrinja apenas à análise das representações religiosas e dos seus simbolismos, mas que também valorize as condições materiais do fenômeno religioso. Rodolfo Komórek nasceu na Polônia em 1890 e chegou ao Brasil em 1921 como missionário salesiano. Residiu e atuou em diferentes localidades, e morreu de tuberculose em 1949, na cidade de São José dos Campos, SP, local onde floresceu o movimento devocional. No ano de 1964, os salesianos deram início ao seu processo de canonização. Atualmente, há três espaços na cidade dedicados à sua memória e culto religioso: a capela Menino Jesus de Praga (onde está sepultado), o seu Memorial, ambos localizados na paróquia salesiana; e o quarto onde faleceu, localizado no antigo sanatório Vicentina Aranha que, atualmente, é um parque público. Os objetos analisados aqui são diversificados e incluem as relíquias, ou seja, os restos mortais do padre Rodolfo, e alguns de seus objetos pessoais, como fotografias, livros, cartas e apetrechos litúrgicos. Além da evidente diferença na composição material e na forma, a variabilidade da capacidade agentiva destes objetos também depende das características dos espaços físicos e da cadeia de sentido em que foram inseridos e agrupados. Ao analisar a disposição destes objetos nos três espaços dedicados ao padre Rodolfo, procuro compreender duas questões que são interligadas: 1) Como estes diferentes objetos mobilizam a agência do padre Rodolfo na relação devocional estabelecida com os devotos. 2) Como estes objetos o presentificam nesta mesma relação? Objetos que na capela inserem o padre Rodolfo em relações propriamente devocionais, no memorial e no quarto, ganham outros sentidos, historicizando sua presença e produzindo uma singularização dentro de um registro biográfico, mais do que hagiográfico. Nesta análise, noções como a de pessoa fractal (R. Wagner) e personitude distribuída (A. Gell) podem nos ser úteis para compreendermos como coisas, objetos, enfim, materialidades de pessoas mortas neste caso, uma pessoa santificada - podem continuar mantendo sua presença e agência dentro de uma determinada rede de causalidade. Por fim, procuro com esta análise, discutir algumas questões importantes para a Antropologia das devoções, como as tensões entre as noções de representação e presentificação, as diferenças, similitudes e continuidades entre imagens e relíquias de santos; a produção de agência e o princípio de causalidade nas práticas devocionais.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
"Gay e católico": construções coletivas e disputas acerca dos sentidos de ser católico”
José Lidomar Nepomuceno de Sousa (UNB)
Resumo: Pessoas LGBTQIAPN+ são alvo constante de discursos discriminatórios que, não raras vezes, são motivados por um viés de fundamentalismo religioso. A Igreja Católica Apostólica Romana é um dos espaços onde muitas vezes se pode constatar esse tipo de discurso que aciona fundamentos teológicos, doutrinários e supostamente bíblicos para enquadrar corpos e comportamentos dissidentes num lugar de desconformidade com a fé católica por estarem essas pessoas em pecado, dada a vivência da sua sexualidade e/ou identidade de gênero. Tal postura institucional da Igreja vem sendo há muito confrontada por pessoas LGBTQIAPN+ que, professando a fé católica, desejam permanecer na Igreja e para tanto vêm se organizando coletivamente a fim de construírem espaços de acolhimento, mas também de mobilização política com o intento de disputar dentro da Igreja os sentidos do que significa ser católico”. Neste sentido, minha intenção neste trabalho é apresentar e discutir essa realidade por meio de relato etnográfico, fruto da minha própria vivência e atuação nestes espaços, enquanto católico e gay. De forma mais localizada, abordarei a realidade do grupo Diversidade Cristã de Brasília (DCBSB) junto ao espaço pastoral liderado pelos religiosos jesuítas em Brasília - DF. O grupo, que reúne católicos LGBTQIAPN+, é parte de um movimento maior, a Rede Nacional de Grupos Católicos LGBT, fundada em 2014 no Rio de Janeiro. A Rede conta hoje com grupos em várias regiões do país, mas meu interesse é refletir sobre o DCBSB, uma vez que se costuma afirmar o perfil conservador de Brasília, o que tem impedido inclusive que o grupo seja acolhido nas paróquias da Arquidiocese. A organização de grupos como o da capital federal, tem conseguido promover tensionamentos dentro dos espaços institucionais da Igreja, de modo a conseguir inclusive assento representativo dentro de instâncias importantes de discussão eclesial. Pensar esse processo de organização coletiva e seus possíveis impactos no modo como comunidade/igreja local percebem o modo de ser católico são também aspectos que me interessam. Essas experiências ainda assumem a disputa de narrativa acerca dos ideais de família e padrões de moralidade que têm sido insistentemente explorados nos últimos anos, sobretudo por grupos políticos com forte viés fundamentalista, que atuam na propagação de pânicos morais.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Corpos "fechados" e "preparados": da centralidade do batismo católico na sociabilidade pataxó
Larissa Moreira Portugal (UFSCar)
Resumo: Na aldeia Boca da Mata da Terra Indígena Barra Velha do Monte Pascoal (Porto Seguro/BA) onde habitam os Pataxó, a maioria dos moradores se consideram e se reconhecem católicos, de modo que o seu modelo de sociabilidade articula um conjunto de elementos do catolicismo tal como elaborado e vivenciado localmente. Dentre estes elementos, por exemplo, merece destaque o batismo católico, fundamento e ao mesmo tempo prática que, de maneira bastante semelhante ao que se observa em outros contextos ameríndios nos quais o cristianismo foi introduzido a partir de missões religiosas cristãs, é considerado fundamental no processo de fabricação da pessoa humana. É por meio deste mecanismo que, segundo os Pataxó, uma "criatura pagã" é apresentada a Deus, seu "criador", tornando-se pessoa humana propriamente dita. Mas, além disso, diz-se também que é através do batismo que se dá a produção de um "corpo preparado" (isto é, "fechado" e parcialmente protegido) para o trato com alguns seres "sobrenaturais" — como os santos, os encantados, os bichos e os espíritos dos mortos — com os quais são estabelecidas relações de devoção, troca e reciprocidade, mas também de perigo e predação, seja no cotidiano da vida desperta, durante os sonhos, ou em contextos cerimoniais e festivos, como nas Festas de Santo realizadas anualmente na comunidade. Nesse sentido, o objetivo desta comunicação é apresentar uma reflexão etnograficamente informada sobre a centralidade do batismo católico na sociabilidade pataxó, tendo em vista a sua relevância não somente para o que significa ser "gente verdadeiramente humana" ali, mas especialmente para a importância deste mecanismo na composição de um corpo idealmente fechado e preparado para a lida com certas alteridades. Trata-se, portanto, de pôr em foco os sentidos dados a este fundamento religioso prático que, de acordo com as formas pataxó de viver e estar no mundo, produz condição corporal indispensável para que os humanos estabeleçam relações cotidianas, oníricas e cerimoniais com os diversos seres sobrenaturais que povoam a sua cosmologia.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Rituais funerários e catolicismo entre os Yanomami de Maturacá (AM)
Leon Terci Goulart (FAPESP)
Resumo: A proposta desta apresentação é discutir as relações entre os Yanomami de Maturacá (São Gabriel da Cachoeira, Amazonas) e o catolicismo, mais especificamente, seus modos de apropriação, tradução e transformação das práticas cristãs e do discurso missionário nas cerimônias funerárias e em seu conhecimento escatológico. Tema central de minha pesquisa de doutorado em andamento, o reahu é uma cerimônia funerária Yanomami voltada, segundo meus interlocutores, para que o espírito do falecido siga satisfeito para a morada dos mortos e, assim, se desassocie do mundo dos vivos. A cerimônia combina, de modo muito complexo, conhecimentos míticos, xamânicos e escatológicos, reciprocidade, caça, artesanato, e relações com distintas formas de alteridade além de ser atravessada pelo parentesco, especialmente pelo contraste afins-consanguíneos, seu desfecho se dá no consumo de um mingau feito de banana-da-terra misturado com o pó das cinzas dos ossos do morto. Maturacá é um povoado Yanomami situado no extremo sudoeste da Terra Indígena, já na região do Rio Negro, e conta com a presença permanente de missionários salesianos, ali estabelecidos desde meados da década de 1950. Dentre as inúmeras transformações impulsionadas por mais de seis décadas de contato com os missionários, vale mencionar o sedentarismo e a redefinição das categorias socioespaciais locais, a alteração das residências coletivas em favor das casas unifamiliares e a condução de jovens para internatos em São Gabriel da Cachoeira. Em geral, a presença missionária é marcante no cotidiano de Maturacá: de provedores de bens manufaturados e assistência sanitária, antes da existência de um posto de saúde local e da intensificação das viagens à cidade, ao trabalho na direção da escola estadual indígena, instalada junto à sede da missão. As missas, que ocorrem aos domingos, são bastante frequentadas e a maioria dos Yanomami dali se consideram católicos. Nesse contexto, nas últimas décadas, diante da intensificação das relações com o catolicismo e com os salesianos, os Yanomami de Maturacá também passaram a sepultar alguns de seus mortos no cemitério da paróquia local, processo que pode ser definitivo ou preceder à realização de um reahu. Assim, minha hipótese é que a reelaboração das práticas funerárias constitui um modo específico pelo qual o catolicismo é traduzido e incorporado pelos Yanomami. Tendo em vista que minha pesquisa está em estágio inicial de cotejo dos dados etnográficos com a bibliografia, o objetivo desta apresentação é sugerir alguns caminhos possíveis para compreender as apropriações Yanomami do cristianismo, as particularidades das cerimônias funerárias realizadas em Maturacá, e a versão local que o catolicismo assume ali.
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Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
A Missa Tridentina (Vetus Ordo/Forma antiga do Rito Romano) em Vitória-ES história e vivências
Lucas Lagasse Corrêa (SEDU)
Resumo: Este trabalho é resultado de uma aproximação etnográfica de longa duração no contexto da celebração da Missa na antiga forma do Rito Romano, conhecida como Missa Tridentina ou Missa em latim, em Vitória, Espírito Santo. Depois de uma breve contextualização da história dessa Liturgia, apresentaremos os meios de comunicação (especialmente a internet) como canais de difusão de informação sobre a prática (a missa na forma antiga), e ponto de encontro de interessados pela mesma; os documentos que resguardaram juridicamente o grupo de fiéis assistentes dessa forma da missa durante os anos em que ela está sendo celebrada na capital capixaba; os relatos divulgados em meios de comunicação (jornais, TV, internet) institucionais e individuais. Ressaltaremos as principais personagens propulsoras dessa tradição, bem como a experiência de tantos fiéis católicos que estão ligados à essa experiência religiosa, que existe a cerca de 13 anos na localidade; as influências de experiências de outros municípios (Campos-RJ, Colatina-ES), os casos de divisões (Fraternidade S. Pio X, Resistência Católica) e uma perspectiva da manutenção da celebração da missa antiga.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
“Nem agouro, nem superstição”: a morte e os mortos a partir de uma cosmologia católica sertaneja
Maria Cinthia Pio de Oliveira (UFPE)
Resumo: Nesta apresentação, partimos do pressuposto de que a morte, como um fenômeno sociocultural, não significa a ruptura das relações entre os sujeitos vivos e os mortos, já que é através da memória que permanecemos ligados a estes. Na perspectiva de uma cosmologia católica, que implica tais relações, assim como a natureza e a sobrenatureza que as cercam, essa memória pode ser compreendida através da interconexão de elementos como a saudade, o tempo, o espaço e os ritos que, justapostos, formam um complexo cognitivo/afetivo que permeia essas relações (Reesink, 2010; 2012). Assim, os sentidos atribuídos ao fenômeno da morte, e às relações que o envolvem, partem dos afetos concretos daqueles que os vivenciam, variando conforme as experiências dentro de realidades compartilhadas (Fravret-Saada, 2005; Rosaldo, 2019). No entanto, muitas das crenças e práticas que constituem essas relações são desconsideradas ou consideradas fora de seus contextos. Partindo disto, busca-se problematizar representações frequentemente estabelecidas em torno de contextos socioculturais territorialmente situados, como é o caso dos catolicismos praticados nos interiores, nas margens ou nos sertões do Brasil. Estamos nos baseando numa reflexão etnográfica acerca da ideia de superstição e aquilo que classificamos, a priori, como agouros de morte, para a comunidade católica de Pelo Sinal, distrito (ou povoado) de Solidão, sertão de Pernambuco. Na contramão dos discursos e práticas que reproduzem padrões etnocêntricos clássicos (Kuper, 2008), em Pelo Sinal é possível observar uma cultura de morte onde se manifestam não só narrativas, como também experiências sobre agouros, os quais, tidos como superstição, reaparecem atualizados na categoria dos avisos”. Os avisos, enquanto experiências que demandam uma ação simbólica e reflexiva dos sujeitos, estão contidos em um sistema de comunicação com os mortos e sobre a morte, tal como as relações de reciprocidade (Mauss, 2003). Assim, é na dinâmica desse sistema que imagens se "apresentam" e são vividas, elaboradas e compartilhadas nas formas dos sonhos, visões, sinais e pressentimentos, os quais chamaremos aqui de imagens-afeto, com o intuito de demonstrar, dentre outras coisas, diferentes formas de gerenciamento das angústias decorrentes da certeza da morte diante da sua imprevisibilidade, na comunidade em questão.
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Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
UMA ESPECIALISTA ENTRE DOIS MUNDOS: Catolicismo popular e afro-brasileiro.
Maria Gleiciane F Pereira (UFPI)
Resumo: Este trabalho é parte da minha pesquisa de dissertação que tem como objetivo principal estudar a produção do conhecimento por parte de uma cartomante na região Nordeste, investigando como ela realiza o processo de adivinhação e como isso contribui para a construção do conhecimento. O ponto de análise foi o sistema ritual adivinhatório de Dona Luíza, que se baseia no uso das cartas de diversos baralhos/tarôs em seu contexto de residência no município de Camocim, no Ceará, litoral norte do Estado. Além disso, a cartomante em questão é um sujeito que transita na convergência entre dois campos religiosos. O Catolicismo Popular é uma forma de religiosidade que combina práticas, crenças e rituais populares. É caracterizado por uma forte devoção aos santos, à Virgem Maria e a outros símbolos e figuras religiosas. No Brasil, essa forma de catolicismo muitas vezes se mistura com elementos das religiões afro-brasileiras, resultando em relações de convergência religiosa. Por outro lado, as religiões afro-brasileiras são tradições religiosas trazidas pelos africanos escravizados durante o período colonial. Elas têm suas raízes nas crenças e práticas dos povos africanos, como o Candomblé, originário da região iorubá, e a Umbanda, uma religião desenvolvida a partir das convergências de elementos do espiritismo, do catolicismo e das tradições indígenas. No Brasil, onde a diversidade religiosa é uma característica marcante, compreender e estudar o diálogo e os contrastes entre o Catolicismo Popular e as religiões Afro-brasileiras é fundamental para uma análise mais profunda das práticas religiosas e das identidades culturais construídas no país. Neste texto, busco apresentar a figura da cartomante como uma especialista que transita entre esses dois mundos e desempenha um papel curioso na promoção do diálogo inter-religioso e na valorização da sua própria produção de conhecimento, assim como do discurso plural religioso.
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Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
“Todo congadeiro é católico, mas nem todo católico é congadeiro”: tensões e disputas nas classificações das práticas devocionais ao Rosário de Maria
Mariana Ramos de Morais (UFRJ)
Resumo: Diferentemente de modalidades afrorreligiosas como o candomblé e a umbanda, as práticas devocionais ao Rosário de Maria comumente nomeadas reinados, congados, congadas, dentre outros termos não têm legitimação social enquanto religião”. Elas ainda hoje são consideradas como uma expressão do catolicismo catolicismo negro ou catolicismo popular e mesmo como cultura popular ou folclore por vezes, adjetivado negro, sendo considerado um folguedo ou uma dança dramática, evidenciando o seu caráter festivo. O reinado surgiu ainda no Brasil Colônia vinculado às irmandades negras, tendo uma relação próxima com a Igreja Católica, mas se desvencilha em parte dessa instituição religiosa no período republicano. Apesar disso, essa relação ficou grafada em sua história e em seus ritos. Entre meus interlocutores, reverbera-se a ideia de que no reinado são realizadas cerimônias em que santos católicos são festejados africanamente, juntamente com os ancestrais, e há a instituição de um império negro. Minas Gerais é um dos estados em que essa prática tem marcada presença e de onde eu componho o repertório que é base para as minhas considerações nesta comunicação. Conforme o levantamento feito pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), para fins do registro do reinado como patrimônio nacional ora em curso existem 1174 grupos de reinado no estado, que realizam 701 festas por ano e estão presentes em 332 dos 853 municípios mineiros. Apesar de a festa ser o momento fundante do reinado, ele não se encerra nela. Durante todo o ano seus praticantes chamados de congadeiros se reúnem com diferentes finalidades. No entanto, talvez pelo fato de a festa ser o momento também em que o reinado ganha visibilidade social, ela se destaca embasando a associação dessa prática a uma dada ideia de cultura e encobrindo o seu caráter religioso, tão caro aos meus interlocutores que acionam o termo religião para expressar aquilo que praticam. A partir de minhas experiências etnográficas junto a congadeiros de Belo Horizonte e cidades do seu entorno, busco pensar sobre as tensões e as disputas que envolvem as classificações e definições sobre o reinado, bem como sobre o que é ser congadeiro”. Como expresso no título desta comunicação: Todo congadeiro é católico, mas nem todo católico é congadeiro”. Ouvi essa frase durante uma festa do Rosário. Ela indica um senso de pertencimento a um coletivo, ser católico, ao mesmo tempo faz uma distinção dessa identidade plural, ser congadeiro”. E é a partir dessa frase que conduzo a análise proposta nesta comunicação.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
A "opção pela causa indígena: Kikuyus, macuxis e missionários da Consolata
Melvina Afra Mendes de Araújo (UNIFESP)
Resumo: Proponho, nesta comunicação, uma discussão sobre como a experiência diretamente vivida ou experienciada a partir de memória legada dos missionários da Consolata, no Quênia, nos anos 1950, incidiu nas práticas pastorais de jovens missionários da Consolata, em Roraima, Brasil, a partir dos 1960. Trata-se, no primeiro caso, de um contexto no qual kikuyus recorreram à violência armada para recuperar suas terras e a liberdade de gerir suas vidas, o da guerrilha Mau Mau, e, no segundo, de indígenas macuxis submetidos ao trabalho forçado e acuados em suas terras.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Enfrentando o Dragão do Apocalipse”: para não esquecer, colocar uma romaria na rua em uma cidade minerária reflexões sobre a 5ª Romaria das Águas e da Terra da Bacia do Rio Doce
Ramon da Silva Teixeira (UFRRJ)
Resumo: Concebidas no bojo de um conjunto de outras ações realizadas para não esquecer um evento crítico o rompimento da Barragem de Fundão, da Samarco (Vale/BHP Billiton), em Mariana (MG) em novembro de 2015 e propor um outro modelo para que a tragédia não se repita, as Romarias das Águas e da Terra da Bacia do Rio Doce (RATBRD) são romarias itinerantes de denúncia ao modelo mineral brasileiro e anúncio de uma outra ecologia”. Organizadas por alguns setores do campo progressista da Igreja Católica em parceria com movimentos sociais e religiosos diversos, tais romarias tematizam a água e a terra a partir de uma perspectiva heurística religiosa-política que parte de uma ética ambiental holística e integral sem esquecer a opção preferencial pelos pobres que orienta historicamente a prática desses coletivos, onticamente expressa nas demandas das populações atingidas pelo desastre-crime. Desde sua primeira edição em 2016, as RATBRDs ocorrem a cada ano em uma paróquia de alguma das dioceses da Bacia do Rio Doce. Tendo em vista essa circulação por diversos locais, é objetivo neste trabalho pensar a situcionalidade e as tensões que envolveram o fazer romaria a partir da descrição e análise do planejamento, construção e viabilização do percurso por onde passou a 5ª RATBRD, ocorrida em setembro de 2022 em Conceição do Mato Dentro (MG), Diocese de Guanhães, e dos sentidos atribuídos para o caminho e os pontos de parada durante a caminhada. Conceição é um município banhado pelo rio Santo Antônio afluente do Rio Doce, local de peregrinação transformado por conflitos socioambientais desde a implantação do projeto minerário Minas-Rio da Anglo American, para onde todos os anos se dirigem milhares de romeiros/as para um centro de devoção, o Santuário do Senhor Bom Jesus do Matosinhos. Dito isso, através de uma análise do diário de campo, das conversas e discurso públicos e das fotografias produzidas em campo dos momentos pré, intra- e pós-romaria, buscarei analisar como o espaço conçeiçonese foi transformado para fazer o sagrado (sacra facere), produzir devoção e, ao mesmo tempo, uma crítica social à mineração predatória. Interessa refletir: Como o caminho escolhido para a 5ª RATBRD fez a romaria e vice-versa? Quais foram os agenciamentos materiais? Quais as materialidades e sentidos emergiram durante a caminhada da concentração até o Santuário? Como o Senhor Bom Jesus do Matosinho, o rio Santo Antônio, o contexto minerário local e seus conflitos foram motivos para a caminhada e sentidos da romaria? Com isso, espera-se contribuir com o debate sobre a produção de memória e espaços sagrados que afetam os fiéis e visitantes, ressignificam o espaço e reconfiguram as cidades; bem como refletir sobre as relações entre religião e política.
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Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Tradicionalismo católico em interface com o olavismo
Renan Baptistin Dantas (UNICAMP)
Resumo: Esta comunicação tem por objetivo expor as primeiras experimentações etnográficas de minha pesquisa de doutorado, cujo tema se volta para as relações estabelecidas entre o olavismo e a direita católica brasileira. Por olavismo entendo um movimento e um conjunto de crenças anticomunista e antiesquerda, propagado por Olavo de Carvalho, polemista católico, responsável por fortalecer movimentos de direita no Brasil das últimas duas décadas. Como se fosse o gramscismo da direita, o olavismo luta pela hegemonia cultural contra a esquerda. Seu objetivo é formar militantes, intelectuais orgânicos de direita. Por outro lado, entendo por direita católica, agentes católicos conservadores ou tradicionalistas, que tem posições claramente antimodernistas e reacionárias, quanto a moralidade pública, direitos humanos, igualdade de gênero, tolerância social, etc. Dentro desta trama, o que procuro evidenciar nesta fala, refere-se a uma incursão em um evento de estudantes universitários católicos, organizado por um grupo tradicionalista católico, cuja origem remonta à uma dissidência com a Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, da Família e da Propriedade, a TFP, fundada por Plínio Corrêa de Oliveira em 1960. Pretendo destacar deste grupo a oposição que o mesmo fez e faz ao olavismo no interior do catolicismo. Complemento tal apresentação destacando as estratégias de atuação deste grupo no meio universitário, assim como em contextos digitais. Observa-se neste sentido a importância de um recurso às discussões como as da etnografia virtual, estabelecidas por autoras como Christine Hine (2015), uma vez que o uso novas tecnologias da informação, das novas mídias, se torna meio estratégico de expressão da sensibilidade de tais grupos.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
O Horto do Padre Cícero em Juazeiro do Norte - CE: tensões entre mística, controle eclesiástico e turismo religioso
Renata Marinho Paz (URCA)
Resumo: Este trabalho pretende analisar algumas das transformações resultantes da interface entre ações voltadas para o turismo religioso e intervenções eclesiásticas no Horto do Padre Cícero, situado em Juazeiro do Norte CE. O Horto é um dos lugares centrais no itinerário do romeiro na cidade. Localizado na Serra do Catolé, é um complexo composto pela estátua monumental do Padre Cícero, o antigo casarão do sacerdote transformado em museu, e o Santo Sepulcro, espaço com grandes aflorações rochosas onde os fiéis realizam penitências; recentemente foi inaugurado o teleférico que liga o espaço ao centro da cidade, e a igreja do Bom Jesus do Horto. O local é considerado pelos devotos como um espaço sagrado; para os mais antigos, mais que sagrado, é um espaço encantado, marcado pela mística, com elementos inalcançáveis por quem não compartilha a devoção ao Padrinho e a crença em suas palavras. O Horto foi erigido e se manteve fundamentalmente a partir da ação da piedade popular e, até cerca de três décadas, permaneceu relativamente à parte do interesse das autoridades civis e eclesiásticas. Todavia, em meados dos anos 90 do século passado, uma série de intervenções começaram a ser realizadas no local, a partir de um projeto de revitalização, cuja finalidade foi urbanizar, higienizar e modernizar o espaço, a fim de atender às demandas do turismo religioso, sem considerar seus aspectos místicos e religiosos. Além disso, desde o início dos anos 2000 a Diocese de Crato vem desenvolvendo um processo de reposicionamento e aproximação face ao movimento romeiro em Juazeiro e à devoção ao Padre Cícero. Um dos resultados deste processo está associado à presença efetiva da igreja católica na organização e controle dos lugares sagrados em Juazeiro. No caso do Horto, ações exercidas pelos Salesianos, responsáveis pelo espaço, têm gerado impactos e tensionamentos nos modos como os fiéis se relacionam com o lugar. Essas ações, associadas ao incremento do turismo religioso, tem imprimido novas configurações no local. Diante disso, a proposta deste trabalho é analisar essas transformações, com foco em seus reflexos nas crenças, práticas e representações acerca desse lugar sagrado.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Os desigrejados’ celebrando trajetórias e memórias da justiça e da esperança em rituais de resistência
Tânia Nazarena de Oliveira Miranda (SEDUC), Dilma de Oliveira Leão (FICS)
Resumo: O artigo apresenta três grupos: Cebi, Comitê Dorothy e Fraternidade Emaús que desde a sua inauguração cultuam a memória dos mártires e defensores dos direitos humanos na Amazônia, mais especificamente no estado do Pará. Os grupos são formados desde o seu nascimento na perspectiva da teologia da libertação e que seguem suas lideranças e assim, permanecem com uma ruptura política e uma ruptura epistemológica em suas práxis libertadoras. Ambos atuam no campo e na cidade e se identificam como desigrejados’, sejam eles católicos, evangélicos ou protestantes. Descreve-se no texto a junção destes grupos em rituais de protesto e memória anunciando o Deus da vida, da paz, da solidariedade, da fraternidade-sororidade em meio às injustiças, violência estrutural e a natureza desprezada pelo desenvolvimento técnico científico da modernidade e pelo clericalismo neopentecostal em alta.
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Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
"Levanta o pau do Bastião": Disputas, agenciamentos e negociações do mastro de São Sebastião em uma cidade na Amazônia paraense
Victor Lean do Rosário (UFPA)
Resumo: As festas do catolicismo popular produzem interações que transformam as experiências dos sujeitos, cujas conexões perpassam os imaginários, conflitos e controvérsias em torno da sua organização. A festa de São Sebastião, na cidade de Igarapé-Açu, nordeste paraense, não foge a esta regra, onde as relações de poder são negociadas e disputadas em torno da levantação do mastro em homenagem ao santo. Neste sentido, este trabalho tem por objetivo compreender as dinâmicas de poder na levantação do mastro de São Sebastião, na Amazônia paraense. Dito de outro modo, busca-se analisar o que produz os conflitos na organização e no alteamento da árvore que homenageia o santo flechado. Para isso, o percurso teórico tem como base a etnografia, que longe de buscar uma estabilização, almeja analisar as instabilidades, conexões e controvérsias entre os sujeitos da festa católica. Além disso, utilizo também as entrevistas em profundidade com as pessoas que organizam e carregam o mastro, uma vez que as memórias da festa é figura central na composição do festejo. O mastro de São Sebastião é materializado em uma árvore intitulada quaruba-cedro, previamente escolhida pelos organizadores, com uma extensão de 20 metros e cerca de 8 a 12 toneladas, derrubada no início do mês de janeiro, e carregada nos ombros dos fiéis pelas ruas da cidade, banhado de muita bebida alcóolica, homenagens e jocosidades que envolvem a grossura, tamanho e envergadura do pau do santo”. Neste sentido, aponto que a organização, a carregada e a levantação do mastro auxilia no reconhecimento, distribuição e manutenção, em diversas escalas, de quem detém o poder na cidade, ao passo que novos/as agentes surgem, e tensões são (re)criadas em torno do madeiro. Em outras palavras, os conflitos que circunscrevem o mastro de São Sebastião são orquestrados a partir do reflexo das conexões e dinâmicas de poder construídas e disputadas sobre o município. E por fim, destaco que a festa católica em honra ao santo, serve como um fio condutor das controvérsias em busca de prestígio social, reconhecimento político e novas reconfigurações sociais.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
“Santa Sara Kali e a Narrativa Proibida”: Uma Análise Antropológica da Religiosidade Cigana
Watilla Cirqueira Leite (UFMA)
Resumo: Este artigo analisa, por meio de diferentes paradigmas antropológicos, os aspectos da religiosidade cristã entre os povos ciganos, buscando investigar e interpretar o simbolismo de uma narrativa em torno da devoção destes povos a Santa Sara Kali. A partir da representação simbólica de Santa Sara Kali, este artigo parte da premissa de que existe uma aliança estabelecida entre a divindade e cultura gajon (gadjé ou juron) com os povos ciganos, elucidativa das formas de organização social do grupo calcadas nas relações de parentesco e nas oposições masculino e feminino. O artigo é fruto de uma revisitação à etnografia produzida na dissertação de mestrado, aqui submetida à luz de um levantamento bibliográfico construído recentemente acerca da religiosidade cigana. Palavras-chave: Aliança; Ciganos; Dádiva; Religião; Santa Sara Kali.