Grupos de Trabalho (GT)
GT 070: Memórias sensíveis, contramemórias e patrimônios incômodos: políticas, suportes e narrativas nas cidades
Coordenação
Lilian Alves Gomes (UCAM), Hugo Menezes Neto (UFPE)
Debatedor(a)
Patrícia Lânes Araújo de Souza (UERJ)
Resumo:
O conceito de patrimônio de matriz eurocêntrica frequentemente reitera narrativas conciliatórias a respeito do que é digno de lembrança. A denúncia do caráter estrutural da violência, protagonizada pelas populações silenciadas pelo colonialismo nos países da Améfrica Ladina (Gonzales, 1987), vai de encontro a essa perspectiva, trazendo à tona outras agências e protagonistas na dinâmica de preservação e esquecimento. Situações traumáticas, apagadas da história oficial e da memória coletiva, têm sido cada vez mais levadas ao debate público. Os meios para tanto são diversos, como, por exemplo, as intervenções sobre monumentos legitimados; a criação de memoriais e de museus comunitários; a elaboração de antimonumentos e ações de contramemória; a releitura/reconfiguração de exposições e acervos por agentes invisibilizados ou historicamente retratados de forma estereotipada. É pertinente analisar as estratégias de contestação de narrativas supostamente estabelecidas, frequentemente povoadas por personagens brancos, cisheterossexuais, fardados e masculinos. O GT, portanto, propõe discutir: quais são os objetos, corpos, narrativas e gestos mobilizados em estratégias de contestação de narrativas patrimoniais hegemônicas? Como as questões de raça, gênero, classe e/ou sexualidade são agenciadas na disputa pela maquinaria patrimonial? Como a interpelação mútua entre a rua e a arte movimenta processos de luta pela descolonização do espaço urbano?
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Akyla Alexandre Tavares Vicente Pessoa da Silva (UFPE)
Resumo: O samba e as comunidades de Olinda-PE, especialmente a Comunidade do Alto da Sé, são elementos
fundamentais na cultura local. Com dezesseis agremiações de samba e duas escolas de samba, sendo uma delas
na Comunidade do Alto da Sé, a conexão entre essa comunidade e o samba é evidente. Este trabalho destaca a
importância dessa comunidade para as agremiações de samba em Olinda, com ênfase no papel do mestre Junior
Batera na preservação e transmissão dessa tradição musical. Vale ressaltar que esse mestre nasceu e ainda
mora na Comunidade do Alto da Sé.
A pesquisa foi conduzida por meio de entrevistas semi-estruturadas e observação participante, permitindo uma
análise aprofundada das questões relacionadas ao samba e às comunidades em Olinda. Esses métodos revelaram a
influência direta e indireta da Comunidade do Alto da Sé nas agremiações de samba da cidade.
O texto contextualiza a resistência histórica enfrentada pelo samba em Olinda, destacando a importância de
valorizar não apenas o ritmo, mas também as comunidades que o acolhem. Através de relatos de membros das
agremiações de samba, como mestre Diego e Marquinhos de Pilares, fica evidente o impacto positivo do mestre
Junior Batera na formação de novos talentos e na preservação da cultura do samba.
O mestre Junior Batera, fruto da Escola de Samba Preto Velho, deixa um legado significativo que se estende
por diversos projetos, incluindo sua participação ativa na mencionada escola de samba. Na comunidade do Alto
da Sé, onde a tradição de escola de samba e mestres de bateria é forte, muitos dos alunos dessa comunidade
ascenderam para se tornar mestres de bateria nas agremiações de samba em Olinda, graças a esses projetos.
Essa trajetória demonstra como o conhecimento e a experiência são transmitidos e multiplicados ao longo do
tempo, enriquecendo e fortalecendo a cultura e as tradições locais.
A presença marcante do samba na Comunidade do Alto da Sé vai além do aspecto musical, contribuindo para os
aspectos sociais e culturais da região e fortalecendo os laços comunitários. No entanto, as agremiações de
samba enfrentam desafios, como a falta de reconhecimento por parte do poder público e a resistência de
alguns moradores do sítio histórico de Olinda.
Um episódio ocorrido durante uma reunião para a preparação do carnaval 2024 destaca a luta das agremiações
de samba por reconhecimento e respeito. A voz do presidente da Escola de Samba Preto Velho ecoa a
determinação dessa comunidade em resistir às adversidades e preservar sua cultura.
Em suma, valorizar o samba em Olinda é reconhecer e valorizar as comunidades que o sustentam. A luta das
agremiações de samba por reconhecimento e respeito destaca a importância de ouvir e apoiar essas comunidades
para preservar a diversidade cultural no Carnaval de Olinda.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Alexssander Brandon A de Lima (UFPA)
Resumo: Como braço direito do projeto moderno-colonial, o museu se estruturou historicamente no apagamento
consciente de identidades dissidentes do cidadão produzido como ser da matriz de pensamento ocidental, por
isso, essa instituição deve ser compreendida como uma unidade pedagógica das discursividades nacionais
(BOITA, 2020). Nesse sentido, apresento algumas reflexões produzidas em minha atuação como bolsista de
iniciação científica, tendo como objetivo primordial em meu plano de trabalho detectar as formas de
enquadramento que corpos dissidentes, no tocante à diversidade sexual, ocupam em processos de musealização.
Dessa forma, é preciso questionar: quem são os sujeitos esquecidos? Qual o papel que o museu pode tomar
frente às contradições impostas por esse processo? Para isso, a metodologia se estrutura em uma ampla
pesquisa bibliográfica para fornecer a sustentação necessária para a análise dos acervos museais em pesquisa
de campo. Dessa forma, foram realizadas entrevistas curtas com um dos profissionais responsáveis ligado à
reestruturação das coleções e uma outra com um dos estagiários.
O Museu de Arte de Belém (MABE), localizado no Palácio Antônio Lemos, possui um imponente acervo artístico
representativo da ideologia burguesa da qual se liga de forma direta às discursividades modernas que
estruturam a matriz de pensamento da museologia nacional. Sua reabertura em 2024 representou um novo marco
em sua formulação, dando destaque a outros sujeitos em suas exposições.
Entretanto, há uma invisibilização no que se refere à diversidade sexual e de gênero e suas estratégias de
vida. O quadro mais próximo dessas tensões, na interpretação de um dos profissionais do museu, se intitula
Meditação de José Girard, no entanto, é algo muito ambíguo no percurso museal.
Nota-se como na produção de coleções museais, quando se tem, sexualidades dissidentes muitas das vezes
habitam o penhasco entre o segredo e a revelação, é como se essas narrativas não pudessem habitar a história
nacional e ocupassem o espaço do que é proferido por alguns profissionais, mas que nunca é reverberado pelo
percurso museal (SOLIVA; MENEZES NETO, 2022). Por quais motivos tal invisibilização ocorre em meio às
formulações das coleções, mesmo nas que proponham serem inclusivas?
Assim, o MABE ousa construir outras discursividades da identidade belenense, mas precisa compreender quais
sujeitos ainda permanecem às margens e que as coleções devem estar em permanente movimento, sobretudo em
coleções que se proponham a debater a pluralidade concreta da sociedade. Tal ímpeto é crucial para que os
mais variados grupos possam alcançar de forma plena o direito à memória e o exercício da cidadania
patrimonial.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Ana Luiza Noronha (UNB)
Resumo: O Mercado Sul, localizado no Distrito Federal, em Taguatinga, há 25 km do Congresso Nacional, abrigou as
primeiras feiras populares do território e seu começo data desde antes da inauguração de Brasília. Durante
seus mais de 60 anos de história, o território passa por diversas mudanças: a chegada dos comerciantes, o
abandono de lojas, a marginalização do espaço, a criação de uma comunidade cultural e em 2015 a ocupação
popular com objetivo de reivindicar o direito à cultura, moradia e à cidade.
O Beco, forma como é chamado por seus frequentadores, atualmente busca se tornar patrimônio cultural do DF.
É a partir do acompanhamento do processo de patrimonialização do Mercado Sul, que a pesquisa passa a olhar
para um ponto crucial: como os bens culturais, a sociedade civil, os conselhos de proteção ao patrimônio
cultural e o Estado têm atuado em relação aos patrimônios do DF. A pesquisa feita entre 2022 e 2023 culminou
no TCC ""Mercado Sul é Patrimônio Cultural": Debates sobre políticas, narrativas e o reconhecimento
patrimonial de outras identidades culturais do Distrito Federal."" que procurou trazer a análise de
documentos oficiais do Estado, dos conselhos de proteção ao patrimônio cultural, bem como abordar como a
sociedade civil tem atuado em relação aos patrimônios culturais da cidade, em especial do Mercado Sul. Neste
trabalho pretendo trazer algumas atualizações sobre o contexto patrimonial do Distrito Federal. A
patrimonialização do Mercado Sul têm sido apenas o ponto de partida de uma pesquisa ampla sobre as disputas
territoriais, de narrativas e as ações de proteção e construção da identidade cultural da capital do país.
Pretendo abordar os novos desafios, as vitórias e as iniciativas que dão continuidade ao processo de
reconhecimento do Mercado Sul, bem como a atualização das decisões dos conselhos patrimoniais do DF e como a
questão territorial está intimamente ligada aos bens culturais que foram reconhecidos ou que desejam se
reconhecer como patrimônios culturais do Distrito Federal.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Cássio Raniere Ribeiro da Silva (CEPPC)
Resumo: Nesta comunicação trago a experiência por mim vivenciada, enquanto presidente do Conselho de Preservação
de Pernambuco, onde ocupo a cadeira de Antropologia, Sociologia e Turismo, representando a sociedade civil.
O foco de análise está no processo polêmico em torno da decisão do colegiado em autorizar a transferência de
um importante painel artístico de Francisco Brennand do centro da cidade do Recife para o bairro de Boa
Viagem. Existem aspectos importantes a serem ressaltados que compreendem as disputas internas ao Conselho, a
agência dos representantes do Governo do Estado, os interesses provados do Banco privado que detém a obra, a
família do artistas e outras autoridades que se posicionaram à época contrárias a retirada. Embora o debate
tenha sido público, existem interstícios que fogem ao debate amplo. Assim, buscando observar a experiência
da participação social no Conselho de Preservação (instância máxima deliberativa em Pernambuco), os
interesses que jogam a cidade numa disputa de narrativas e minha própria experiência enquanto antropólogo e
conselheiro, à época presidente do colegiado. Com isso, pretendo evidenciar aspectos importantes para
discussão do patrimônio cultural em Pernambuco, ampliando o debate sobre a prevalência de acordos e
entendimentos, ainda fortemente adotados pela elite intelectual do Estado.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Cristina Maria Da Silva (UFCE)
Resumo: Este trabalho é um mergulho na fisionomia, nas narrativas e experiências de vida de mulheres, de
diferentes origens, por meio de suas fotografias e de seus traços visuais no tempo, em um projeto de
extensão. A pesquisa e o ensino são movimentados pelo que a extensão aponta e estimula, não o contrário. Por
meio de visitas às suas casas, vasculhando acervos familiares, escutando as músicas que embalaram a
juventude dessas senhoras, tocando seus guardados, que culminaram em uma experiência expositiva, encontramos
vestígios do que elas contam sobre si e do que acionam como um legado. Tomando a Antropologia Visual como
referência, observamos a imagem como sintoma e como conhecimento (Didi-Huberman), acionamos os seus
dispositivos e arquivos vivos, como atos (Samain) potencializadores na captura dos vestígios da memória,
sobretudo das ausências, lacunas e rasuras do vivido. Seus nomes são como bússolas que nos orientam e
cartografam os seus percursos e protagonismos coletivos: Tereza, Tonha, Iolanda, Ivoneide, Zenir, Acilda e
Helena. Suas existências a partir das imagens, dos diferentes lugares de onde vieram no Ceará, dos lugares
por onde passaram e o que delas restou, são tomadas como questões, mas também como feridas (Barthes) que nos
instigam a ver, além do que costumamos olhar. Observando seus espaços da recordação (Assmann) por meio da
rememoração (Gagnebin), podemos ampliar as possibilidades narrativas de suas singularidades. Desse modo,
diante dos movimentos das imagens articulamos fotografias com biografias e memórias e as observamos como
extensão de nossos corpos e como registro que nos permitem inventariar nossas origens tanto individual
quanto coletiva. Tomando os acervos pessoais como arquivos, desvelamos o que é contingente e arbitrário. Ao
guardar histórias, descobrimos como de maneira singular, as memórias são acervadas e como elas podem
restituir pelo afeto, bem como elas expressam o lugar de onde sofre, o lugar de onde se expressam os
sintomas, conforme Didi-Huberman. Acompanhando os passos, rastros, cantos e visualidades dessas mulheres,
podemos evocar suas memórias e sermos testemunhas dos signos (ou túmulos) de suas fabulações e geografia. Ao
escutarmos as intimidades de seus cenários familiares redimensionamos as experiências urbanas, ampliamos as
possibilidades cognitivas de como lemos as cidades e as biografias que as compõem. Se colonizar é um
exercício de desmemorização, aqui as imagens nos possibilitam rememorar e com isso vasculhar nas lacunas dos
arquivos e nos cortes da memória: as histórias e narrativas subterrâneas que atravessam pessoas, lugares e
seus acontecimentos. Os ossos dos mortos regurgitam da terra vozes que, muitas vezes, não queremos ou não
estamos prontos para escutar.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Davi Kiermes Tavares (IFBA)
Resumo: Resumo: O objetivo desta proposta de comunicação é apresentar o antimonumento denominado Tortura,
escultura de quatro metros de altura, em dupla face, confeccionada em fibra de vidro e com, aproximadamente,
250 kg. Além da placa contendo 35 nomes dos homenageados, a obra traz uma silhueta humana trespassada por
vergalhões de ferro, simbolizando elementos torturantes. Criado pelo artista plástico, cenógrafo e designer
gráfico baiano Ray Vianna, resulta de uma ação do Comitê Baiano pela Verdade, do Grupo Tortura Nunca Mais da
Bahia, da Secretaria de Justiça, Direitos Humanos e Desenvolvimento Social do Governo do Estado da Bahia,
com o apoio da Prefeitura Municipal de Salvador, sendo inaugurado no dia 28 de agosto de 2015 - em
referência ao dia da Anistia no Brasil (sancionada em 1979) -, no Largo do Campo da Pólvora, bairro Nazaré,
cidade de Salvador. Além dos aspectos materiais e simbólicos que o mesmo encerra, ressaltados serão
sobretudo seu sentido de contestação à violência do Estado brasileiro perpetrada durante o período
ditatorial, conforme considerações de Seligmann-Silva (2015); sua função como lugar de memória e de
consciência ao conformar o desejo de recordar de modo ativo o passado doloroso e dispor um aspecto
pedagógico visando instruir e alertar quanto a recorrência de regimes ditatoriais, consoante Quadrat &
Silva (2021); finalmente, sua capacidade de servir como suporte que evoca memórias - das arbitrariedades e
violações de direitos humanos cometidas pela Ditadura Militar no Brasil (1964-1985), segundo Abreu (2016);
e, de igual modo, como mecanismo de reparação simbólica, um dos eixos ou elementos estruturantes da chamada
Justiça de Transição: conceito criado em 1990, por Ruti Teitel, que foca na instrumentalização do direito em
circunstâncias excepcionais, referindo-se à justiça adaptada para sociedades que tenham passado ou estejam
passando por períodos marcados pela violência política, como sustenta Quinalha (2013). Para estudá-lo,
utilizamos a pesquisa bibliográfica, entrevista (com o artista) e observação livre in loco (do antimonumento
em seu local de inserção). Em conclusão, a proposta possibilita refletir sobre e em que medida um artefato
cultural voltado à memória da ditadura militar é capaz informar e/ou rememorar sobre as violações desse
período, bem como prover sentido de justiça reivindicativa que se desdobra em ações na defesa de direitos e
de combate ao esquecimento e ao oficialismo. O que foi exposto advém de pesquisa de doutoramento em curso.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Eduardo Monteiro R. Lima (UCAM), Lilian Alves Gomes (UCAM)
Resumo: Silêncios monumentais: homenagens ao ator Paulo Gustavo (1978-2021) no espaço público de Niterói- RJ Na
comunicação proposta, pretendemos analisar homenagens ao ator Paulo Gustavo (1978-2021) que se valem de
objetos memoriais dispostos no espaço público de Niterói- RJ. Paulo Gustavo foi um ator e humorista nascido
em Niterói e que utilizou a cidade como locação para os filmes da trilogia cinematográfica Minha Mãe é uma
Peça, campeã de bilheteria no Brasil. O ator faleceu em maio de 2021, vítima de COVID-19. No mesmo mês de
sua morte, a prefeitura de Niterói realizou uma consulta pública sobre a troca do nome da via que levava o
nome coronel Moreira César para Rua Ator Paulo Gustavo. A mudança foi aprovada e resultou na instalação de
26 placas. Elas se dividem em dois tipos. Um no padrão que já se vê pelas ruas da cidade, com o nome Rua
Ator Paulo Gustavo, seguida pelas informações sobre o artista e o CEP da via. O outro tipo tem o rosto do
ator e uma das três frases: Rir é um ato de resistência, Ame na prática, na ação. Amar é ação, amar é arte
e O humor salva, transforma, alivia, cura, traz esperança pra vida da gente. Ainda em 2021, no dia do
aniversário de Niterói, seis meses após a morte do filho ilustre da cidade, a prefeitura inaugurou, no Campo
de São Bento, duas estátuas em homenagem a Paulo Gustavo. Uma reproduz a imagem do ator e a outra mostra a
personagem mais conhecida de Paulo Gustavo, a dona Hermínia. As duas formas de homenagem, nomeação de via
pública e instalação de estátuas, despertaram não só a comoção de fãs. A imprensa noticiou ações contrárias
à efetivação da troca de nome da via e um dos pesquisadores autores desta proposta de comunicação presenciou
reações homofóbicas às estátuas quando estava produzindo fotos das homenagens em questão. Destacamos que
tanto na placa que acompanha o monumento no Campo de São Bento, quanto nas placas de sinalização da Rua
Paulo Gustavo, não se menciona que ele foi uma pessoa LGBTQIAPN+. Seus fãs e pessoas que o conheciam por
seu trabalho certamente sabem disso, mas e as futuras gerações? Uma observação importante a ser sublinhada é
a menção, na placa do monumento no Campo de São Bento, à doença que levou Paulo Gustavo a morrer. Como é
informado, o ator faleceu, aos 42 anos, vítima de COVID-19. Nesse sentido, também pretendemos discutir em
que termos a homenagem atua contra o esquecimento da pandemia de coronavírus, um evento traumático coletivo.
Por meio da análise de notícias e de dados produzidos por meio de trabalho de campo, buscaremos discutir
dinâmicas de visibilidade / invisibilidade e de enunciação / silenciamento envolvidas na materialização de
homenagens a uma pessoa LGBTQIAPN+.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Elaine Müller (UFPE)
Resumo: Neste trabalho, reflito sobre a narrativa patrimonial para o registro do ofício de parteira tradicional
do Brasil, levantando as categorias mais relevantes, os diálogos estabelecidos entre parteiras e técnicos
com expertise no campo da antropologia e da história. Na pesquisa etno-histórica realizada para a instrução
do processo de registro, os saberes e práticas das parteiras tradicionais são apresentados como sendo
comunitariamente enraizados, como uma forma de cuidado integral entre mulheres e suas famílias, como
acionando repertórios fitoterápicos e religiosos circunstanciais e, principalmente, como uma epistemologia
que poderíamos entender como contracolonial. Como pano de fundo da abordagem patrimonial sobre o ofício de
parteira, temos os tensionamentos entre saberes tradicionais e biomédicos e a perda de espaço das parteiras
num contexto de medicalização e hospitalização do nascimento, colocando o reconhecimento como uma necessária
reparação histórica por parte do Estado. Podemos dizer que a narrativa patrimonial construída no dossiê
Parteiras Tradicionais do Brasil traz a baile perspectivas e experiências diversas, colocando o saber
antropológico a serviço de uma curadoria, espécie de mediação cultural, imbricada pelas biografias de
parteiras e antropólogas, por pautas do ativismo pelos direitos das mulheres e pessoas que maternam, pela
necessidade de redimensionamento teórico metodológico do campo antropológico, museológico e patrimonial, e
pelos afetos de relações interpessoais estabelecidas ao longo de um convívio duradouro entre pesquisadoras e
interlocutoras protagonistas do ofício. Estes mesmos elementos compõem o potencial de sucesso e os riscos
envolvidos em ações de salvaguarda, como as realizadas pelo Museu da Parteira - em exposições, filmes,
livros, eventos de trocas de saberes e na aplicação do instrumento Caderneta da Parteira, por exemplo.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Fillipe Alexandre Oliveira Alves (Cebrap)
Resumo: O presente trabalho tem como proposta acompanhar os processos de consensos e dissensos presentes na
gestão coletiva de um bem patrimonializado no meio urbano e que mobiliza memórias sensíveis e de
sociabilidade de afrodescendentes na região portuária do Rio de Janeiro. Busco compreender o funcionamento e
dinâmica de uma gestão compartilhada realizada por uma miríade de sujeitos que reivindicam o legado do Cais
do Valongo para si enquanto questionam o discurso autorizado do patrimônio. Para tal foi realizado trabalho
de campo por meio de observação direta das atividades propostas pelo Comitê Gestor do Sítio Arqueológico do
Cais do Valongo, com o acompanhamento de suas reuniões, oficinas e eventos correlatos, além de análise de
atas e documentos que registram a trajetória e ação do comitê, sobretudo ao longo do ano de 2023. O discurso
dos sujeitos e instituições que atuam no Comitê Gestor do Sítio Arqueológico do Cais do Valongo parte
principalmente da ideia de impedir os sistemáticos apagamentos e branqueamento da região portuária tendo o
Cais do Valongo como norteador de suas ações. Nesse processo, esses sujeitos acabam por elaborar uma noção
própria da categoria patrimônio a partir de seus marcadores sociais, das trocas entre si e suas relações com
o bem arqueológico e com o território. Essa dinâmica não ocorre sem contradições, disputas ou
tensionamentos, olhar para esses processos nos ajuda a compreender como grupos com narrativas silenciadas
vem se relacionando e negociando entre si, com o poder público, com instituições como a Organização das
Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) e com o próprio patrimônio, ou seja,
compreender quais estratégias usam para contestar, gerir e se reapropriar de seus bens.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Jamille Maria Carvalho Barros (Oficina Francisco Brennand)
Resumo: O trabalho discute sobre as relações entre pessoas educadoras negras, que integravam a equipe educativa
do Museu do Homem do Nordeste (Recife - PE), e o museu. A negritude é aqui entendida como elemento que
atravessa o trabalho de mediação cultural e pode figurar enquanto uma experiência de autoinscrição de seus
agentes sobre a narrativa expográfica. Tais reflexões versam a escrevivência e a autoantropologia enquanto
proposições metodológicas e são materializadas através do diálogo entre relatos de vida de agentes desse
campo com memórias resgatadas pela própria pesquisadora, que também exerceu a função de educadora no espaço
estudado, bem como hoje atua na mesma função em uma outra instituição museal vizinha.
O Museu do Homem do Nordeste existe há 45 anos, enquanto um museu regional histórico e antropológico, foi
planejado e criado por Gilberto Freyre com a missão de reunir um acervo capaz de documentar o passado e os
cotidianos da vida das pessoas do Nordeste. É aqui, no setor educativo deste museu, onde estão os agentes
dessa pesquisa, que se dedicam especificamente à engajar entretenimento, reflexão e compartilhamento de
conhecimentos nesse espaço.
Esses profissionais, que idealizam, elaboram e executam tais práticas junto aos públicos do museu, são
fundamentais para a compreensão da execução e prática do que é um museu e ao que ele serve. O recorte
racial, por sua vez, é tomado enquanto eixo estruturante deste trabalho, já que tensiona o lugar desses
agentes, enquanto profissionais negros, em um âmbito onde a negritude é basilamente abordada sob a ótica
freyreana, cuja formulação de pensamento é marcada pela perspectiva da Casa Grande.
Inferir sobre a autoinscrição enquanto característica da ação de pessoas educadoras que atuam na mediação
cultural, negras, no contexto deste museu, parte de um exercício de escrevivência que, segundo Conceição
Evaristo, estabelece o imbricamento de suas próprias experiências e também das experiências comuns à
população negra do Brasil - especialmente as mulheres negras - no ato de escrever.
Assim, esse trabalho propõe uma reflexão centrada na análise sobre o mundo contemporâneo a partir da
experiência negra, como inspira o pensamento de Achille Mbembe (2014). O nosso interesse é olhar para as
relações sociais considerando as subjetividades de quem as pratica; as experiências e memórias pessoais e
coletivas, se tornam parte constituinte da relação de conhecimento aqui construída.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Larissa Maria de Almeida Guimarães (IPHAN)
Resumo: As casas do poder legislativo enquanto ambiente de estudo na Antropologia, e as matérias legislativas
enquanto objeto de análise do antropólogo, persistem como desafios antropológicos quando falamos de práticas
etnográficas em contextos institucionais e rotinas governamentais, considerando a atuação profissional para
além da academia. Os trabalhos de campo nos espaços que constituem o Poder Legislativo ainda se mostram de
forma tímida (Sprandel, 2021). A dimensão documental dos itinerários burocráticos (Teixeira, Silva e
Castilho, 2023) de processos legislativos, por meio de projetos de leis, moções, pedido de informação,
requerimentos e outros, em comissões, audiências e sessões plenárias, das matérias relacionadas aos
dispositivos declaratórios de patrimônio, envolve agenciamentos para além das narrativas oficiais e
negociações junto à sociedade civil. De forma paradoxal, tais atos declaratórios concorrem com a atuação do
Poder Executivo. No estado de Roraima, locus onde realizo meu trabalho de campo legislativo, foram
promulgadas oito leis ordinárias, entre os anos de 2015 e 2023, de caráter declaratório, adotando três
formas de identificação: patrimônio cultural material e imaterial do Estado de Roraima, patrimônio cultural
e imaterial do estado de Roraima e patrimônio cultural imaterial do Estado de Roraima. Assim, busco com
este trabalho, realizar uma etnografia do processo que envolve o reconhecimento de patrimônio cultural no
âmbito legislativo e a institucionalização do dispositivo normativo, focando a atenção à atuação de
organizações não-governamentais, das Comissões da Assembleia Legislativa do estado de Roraima e da sociedade
civil, a partir de três festas (Festas Juninas, Festejo de Bonfim e Festejo do Quarto de Bode) declaradas
como patrimônio cultural do Estado de Roraima, pensando-as como festa-questão (PEREZ, 2012) que envolvem
trocas e reciprocidades (Mauss, 2003), buscando [compreender no] modus operandi do processo legislativo,
(...) a efetividade do uso da via legislativa, mediante iniciativa parlamentar, para preservação efetiva e
agasalho do patrimônio cultural (Costa, 2019, p. 53).
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Letícia Reis dos Santos (UFMG)
Resumo: O que escolhemos lembrar sobre o passado e o que desejamos esquecer? Saidiya Hartman abre seus
experimentos de fabulação crítica incitando a refletirmos sobre nossa memória coletiva. A partir de suas
palavras, essa comunicação pretende apresentar uma pesquisa de Residência Artística em desenvolvimento
acerca da construção de narrativas de si através da fotografia com mulheres negras detentoras de comunidades
tradicionais. Do acesso restrito a equipamentos fotográficos até as interações de grandes fotógrafos, no
masculino-branco, que compuseram as imagens que temos como resquícios do passado, interrogamos institutos
que dialogam diretamente com comunidades tradicionais negras (povos de terreiro e comunidades quilombolas,
majoritariamente) para pensarmos as políticas de arquivos e memórias nas instituições e convidamos algumas
das fotografadas a refletir sobre quais são as narrativas que elas gostariam de compor e já estão compondo
sobre si. Atrelamos os dois estados com maior concentração demográfica de população negra do Brasil e
tecemos a conexão Minas-Bahia para discutir políticas patrimoniais de imagem, direito de imagem, autoria e
composição fotográfica de seus detentores culturais. As instituições escolhidas foram o Instituto Estadual
de Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais - Iepha/MG, sediado em Belo Horizonte/MG; e o Zumvi
Arquivo Afrofotográfico, localizado em Salvador/BA. Ambos os lugares possuem um acervo vasto de fotografias
e uma ampla discussão sobre comunidades tradicionais negras brasileiras. O debate a ser apresentado nessa
comunicação será pautado, sobretudo, na discussão sobre memória, arquivo, patrimônio cultural e imagens de
controle por mulheres negras, centrados no olhar da teoria feminista negra pelos trabalhos de Leda Maria
Martins, Lélia Gonzalez, Selma Dealdina, Mariléa de Almeida, Ana Claudia Jaquetto Pereira, Winnie Bueno,
Patricia Hill Collins, Silma Birge, Susan Sontag e Saidiya Hartman. Através desses caminhos entrecruzados,
será possível construir e colher metodologias sobre os registros da cultura imaterial, compreendendo
diferentes abordagens e perspectivas plurais de mulheres negras de comunidades tradicionais a se
autodefinirem por meio da fotografia. Esperamos ampliar nosso diálogo sobre quais histórias queremos contar
sobre nós, considerando a relevância imagética na dinâmica social.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Lídia Nascimento Fateicha de Oliveira (UERJ)
Resumo: O espaço hoje conhecido como Praça XV de Novembro - RJ abrigou o primeiro porto de chegada de pessoas
escravizadas na cidade durante o Brasil Colônia (1530-1822), sendo assim marcado por um passado de
violência escravista e de forte presença africana dentro do Rio de Janeiro. Tendo em consideração que poucos
são os trabalhos acadêmicos que exploram como a memória social coletiva vem sendo organizada e tratada no
local a partir dos monumentos e patrimônios materiais tombados ali, o presente artigo tem por objetivo
analisar e tensionar as narrativas de memória privilegiadas atualmente em sua paisagem. Para tal, foi
realizada uma pesquisa bibliográfica acerca da interface que se estabelece entre memória coletiva, espaço
urbano e patrimônio, bem como pesquisa documental acerca do espaço da Praça XV de Novembro. O trabalho
demonstra que este espaço foi marcado por dinâmicas importantes dentro do contexto do Brasil Colônia
(1530-1822) e do Brasil Império (1822-1889). Durante o Brasil Colônia (1530-1822), o espaço possuía uma
importância econômica e de violências escravistas. Já no período do Brasil Império (1822-1889), a Praça
tomou uma maior importância política, representando a presença da família real no Rio de Janeiro. Com a
proclamação da república em 15 de novembro de 1889, o local passou a ser chamado de Praça XV de Novembro,
abrigando desde então monumentos que remetem a figura militar e a coroa portuguesa com centralidade em sua
paisagem. Além disso, bens históricos que reforçam a figura do império português no local foram tombados
posteriormente como patrimônio, enquanto a forte presença africana no seu passado se manteve esquecida em
meio a esses processos de patrimonialização. A presença negra passou a ser representada ali, a partir de
movimentações políticas, por meio do monumento à João Cândido (almirante negro), presente no local até 2022.
Essa estátua ocupou uma posição secundária em meio a disposição espacial dos demais monumentos e foi
posteriormente removida, o que demonstra um quadro atual de disputa com relação à narrativa de memória
coletiva privilegiada ali. Desse modo, a pesquisa aponta que o espaço da Praça XV de Novembro possui um
passado de trauma social coletivo ligado a escravidão, que não vem sendo problematizado e nem ao menos
tensionado efetivamente no local. Os suportes de memória presentes ali reforçam em sua paisagem um ideal de
colonialidade, mantendo as memórias negras e os conflitos sociais silenciados a fim de transmitir uma imagem
harmoniosa da cidade.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Luzia Gomes Ferreira (UFPA), Nutyelly Cena de Oliveira (UFRJ)
Resumo: Nesta experiência, discutimos nossa visita como duas museólogas e
antropólogas negras à exposição "Heitor dos Prazeres é meu nome", com curadoria de
Pablo León de la Barra, Raquel Barreto e Haroldo Costa, realizada no Centro Cultural
Banco do Brasil (CCBB), na cidade do Rio de Janeiro/RJ, no período de 28 de junho a
18 de setembro de 2023. Destacamos, assim, a vida e a beleza negra de Heitor dos
Prazeres. Para aprofundar essas questões, compartilharemos nossas reflexões como
mulheres negras em diálogo com as propostas metodológicas de autoras como Rosane
Borges, Saidiya Hartman, Christina Sharpe, Denise Ferreira da Silva e bell hooks.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Milton Ribeiro (UEPA)
Resumo: Este texto apresenta brevemente parte da pesquisa sobre a Festa da Chiquita, tendo como mote o diálogo
entre patrimônio e memória TRANSLGB, o espaço urbano e as territorialidades sociossexuais na cidade de
Belém/PA. O argumento principal é compreender a Festa da Chiquita dentro de um quadro histórico e
espacialmente marcado pela dialética de exclusão e abjeção à Quadra Nazarena, mas também de sintonia e
integração aos territórios festivos ou de conformação de uma espacialização festiva. Em vista disso, o
percurso dessa exposição tem como fio condutor uma apresentação do que talvez seja um dos aspectos mais
duradouros da Chiquita: a relação com o grupo de carimbó Borboletas do Mar, do município de Marapanim/PA.
Sendo assim, apresentarei aqui cinco recortes de matérias e/ou notas dos jornais Diário do Pará e O Liberal
que apontam para a construção dessa relação que se estende pelo menos desde os anos 1980. O foco aqui será
observar como o Borboletas do Mar se faz presente nas espacialidades festivas da capital paraense
principalmente quando assume um lugar de destaque e presença nesta festa
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Mylena Karine (UNB), Iara Emanuelle de Souza Santos (UNB), Anne Caroline Martins Maciel (UNB)
Resumo: O seguinte trabalho tem como princípio a narrativa de lavadeiras do município de São Desidério no
interior do oeste da Bahia, onde ocorre uma forma peculiar de memória em torno do que foram seus trabalhos
ao longo dos anos, conforme nossa ida para o município tomamos por uma espécie de lavanderia que foi
remodelado para se tornar um patrimônio do município, entretanto o que deveria ser Lavanderia Cultural com
uma ideia principal de transformar o lugar que essas mulheres trabalhavam em um museu, até acreditar que
essas mulheres fossem ser homenageadas, vemos que não existem menções a nenhuma delas, muito menos registros
do que fora o local de trabalho.
Enquanto investigamos sobre o fato ocorrido, notamos algumas diferenças entre a versão das lavadeiras
(dividindo-as entre as pioneiras e suas filhas), e as pessoas que pediam os serviços, enquanto vemos que as
lavadeiras tinham seu meio de vida atrelado a prática de lavar roupa para fora, as pessoas que pediam os
serviços não tinham esse mesmo olhar sobre elas, e quando confrontados sobre tais mulheres muita das vezes
eles acreditavam que elas lavavam por prazer até mesmo diversão por estarem na beira do rio.
Dentro de uma busca por registros, em maioria houve contradições entre a história da entidade política local
e a história contada dentro de um apanhado de registros dentro da oralidade e alguns registros fotográficos,
nota-se que dentro do município existe um livro que tem a finalidade de contar a história do município,
porém não existem menções sobre essas lavadeiras. A finalidade desse trabalho, é entender e discutir de
quais formas ocorrem um apagamento, por menor que seja e maior que virá a ser, além de uma forma de elevar
para um debate ainda mais estruturado sobre a invisibilização de mulheres majoritariamente negras e de
classes inferiores.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Patrícia Lânes Araújo de Souza (UERJ)
Resumo: O presente trabalho tem como base etnografia de ato realizado em memória de Marielle Franco, brutalmente
assassinada em 2018, no dia de sua morte seis anos depois: 14 de março de 2024. O dia de seu assassinato
passou a ser um marco na luta por justiça, ou seja, pela responsabilização de quem a executou e mandantes do
crime. Tal crime é reconhecido como político dada a sua atuação como defensora de direitos humanos e
vereadora. O 14 de março constitui-se também como data de rememoração de lutas e causas a que Marielle
esteve vinculada em vida. Aqui parte-se do relato etnográfico visual de um dos eventos realizados na cidade
do Rio de Janeiro (onde Marielle nasceu, viveu, atuou politicamente e foi morta) para pensar o papel central
de diferentes objetos semente (GOMES, LÂNES, 2023) nesse evento. Tais objetos, como placas, lenços,
camisetas, flores ou mesmo a estátua criada em sua homenagem, são mobilizados por diferentes atores no
espaço público, fazendo parte do repertório de atualização de sua memória e pedidos de justiça. Se a
estátua, onde tem início o ato em questão, constitui-se em lugar de memória (NORA, 1997) e de ativação de
causas e atores políticos em diferentes momentos, outros objetos (flores, camisas, lenços, placas etc.)
podem ser pensados como vetores e mediadores de sua memória pela cidade. Tais objetos junto a grafites,
estêncis, lambes etc. marcam o espaço público a partir de atuações mais ou menos efêmeras. O ato em análise
contou com uma caminhada pelo Centro culminando com a tomada das escadarias da Câmara Municipal, onde ela
atuava como vereadora. A Câmara dos(as) Vereadores(as) do RJ está localizado na Cinelândia, espaço
emblemático para movimentos sociais progressistas, onde foi realizada vigília após seu assassinato e onde a
placa de rua foi originalmente substituída pela intervenção artística quebrada por opositores e,
posteriormente, resgatada como símbolo da resistência da importância política de Marielle. No breve trajeto
da caminhada, as participantes (em sua maioria mães e familiares de vítimas do Estado) mobilizaram imagens,
palavras de luta e objetos conectando legado e memória de Marielle a outros eventos e causas, sobretudo ao
assassinato de seus filhos (jovens negros moradores de favelas e periferias) e à luta por justiça. Aqui
pensamos, portanto, os usos e formas de produção de memória no contexto de ativismo e mobilizações sociais
públicas marcadamente urbanas a partir da memorialização pública de Marielle Franco.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Sol Alves de Lima (UFRN)
Resumo: O objetivo central deste trabalho visa compreender como os museus, especificamente o Museu da Imagem e
do Som (MIS/CE), funcionam como espaços de contato e diálogo entre diferentes narrativas culturais,
examinando como a memória das travestis é moldada, reinterpretada e apresentada por meio dessa instituição.
Dentro desse contexto, a pesquisa se volta para entender como a memória das travestis é construída dentro do
museu. Isso inclui investigar quais narrativas emergem, como são representadas e quem controla essas
representações. Questões como a dialética do lembrar e esquecer são problematizadas, questionando quem detém
o controle sobre essas ações e como isso influencia a construção da identidade cultural das travestis. Além
disso, a pesquisa enfoca a construção da identidade cultural de forma mais ampla, problematizando conceitos
como "cultura", "memória" e a invenção do "outro". Destaca-se a importância de abordagens críticas e
conscientes na análise das relações entre culturas e na preservação da diversidade cultural, garantindo que
as vozes das comunidades marginalizadas, como as travestis, sejam ouvidas e respeitadas na construção e
representação de sua própria memória dentro do contexto museológico.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Sthefanye Silva Paz (UFRJ)
Resumo: O desfile das escolas de samba do Rio de Janeiro é uma das maiores manifestações culturais brasileiras.
Anualmente, o Sambódromo que fica na Avenida Marquês de Sapucaí, no Centro da cidade, torna-se um palco
iluminado onde se apresentam distintas agremiações recreativas que se articulam em torno da cultura do
samba. Umas das principais características do cortejo é o fato de ser composto por diferentes expressões
artísticas que são resultantes de inúmeros processos de trabalho.
Todo desfile tem, por exemplo, um tema que precisa ser desenvolvido, no universo do samba carioca este tema
é chamado de enredo. O enredo se materializa na avenida através de figurinos, alegorias e adereços e tem no
samba-enredo a sua principal forma de comunicação. Todos esses processos artísticos são realizados por uma
ampla cadeia de trabalhadores do carnaval que são acompanhados de perto pela diretoria da agremiação.
Dentre as diferentes equipes de trabalho que se dividem em distintos fazeres artísticos, vale destacar a
centralidade dos carnavalescos que acompanham todo o processo de fabricação do carnaval. Devido à
centralidade que o enredo vem conquistando nos últimos carnavais, a função de pesquisador(a) de enredo tem
ganhado força. A responsabilidade e a função deste profissional é acompanhar o processo de desenvolvimento
da narrativa escolhida pela escola realizando uma defesa escrita das fantasias e alegorias que serão
apresentadas no desfile. A pesquisa de enredo é fundamental para a fundamentação histórica e conceitual do
tema que a agremiação irá apresentar no carnaval e é peça decisiva na produção do cortejo pois dela decorre
tanto os elementos plástico-visuais (fantasias e alegorias), quanto musicais (samba-enredo).
Ao longo de dois anos frequentei o barracão da G.R.E.S. Estação Primeira de Mangueira, como parte do meu
campo etnográfico de pesquisa de doutorado. Minha pesquisa inicialmente buscava refletir sobre as dinâmicas
de trabalho, hierarquia e religião a partir da interlocução com uma aderecista evangélica responsável pela
confecção de alegorias e adereços na escola. Devido a aproximação com alguns membros da escola, fui
convidada a assumir o cargo de pesquisadora, passando então a integrar a equipe de trabalhadores da
agremiação como responsável direta por um quesito do desfile.
O objetivo deste trabalho é pensar antropologicamente esta experiência a partir dos desafios do fazer
etnográfico quando o campo de pesquisa torna-se também seu trabalho, quando o modo de operar na estrutura
são alterados já que há uma mudança em minha posição no campo que se refletiu nas relações constituídas em
um ambiente altamente hierárquico.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Sylvia Teixeira Soares Bomtempo (UFRJ)
Resumo: As imagens das cidades são construídas por intencionalidades, onde os patrimônios culturais desempenham
um papel fundamental ao determinar o que deve ser lembrado e o que permanecer como bem ordinário na rotina
urbana de uma cidade (Araújo, 2015). Petrópolis é reconhecida como a Cidade Imperial, um título que nutre
orgulho em grande parte da população e impulsiona o mercado e o turismo por evocar a importância da cidade
no período monárquico brasileiro. A maioria dos patrimônios culturais tombados pelo Instituto do Patrimônio
Histórico Artístico Nacional (IPHAN) na cidade está associada a essa época, incluindo palácios, igrejas e
jardins ligados à família real e à elite que a cercava. Porém, também há também outros patrimônios que
destoam dessa imagem. O trabalho apresentado neste grupo de trabalho focaliza um desses patrimônios: a Vila
Operária de Cascatinha, uma das primeiras habitações coletivas a serem tombadas no Brasil, integrante de um
conjunto fabril localizado no bairro de Cascatinha.
O bairro, situado fora do Centro Histórico onde se encontram os patrimônios relacionados à imagem Imperial,
possui uma origem popular e representa um período da história brasileira após a queda da monarquia. Este
patrimônio cultural não está incluído no circuito histórico-turístico da cidade. As casas são habitadas por
camadas médias populares, descendentes de operários e outros estratos da classe trabalhadora, que
reivindicam o direito de modificar suas propriedades, tornando-se um ponto de conflito para o IPHAN. Dessa
forma, a Vila Operária de Cascatinha tornou-se um patrimônio indesejável tanto para o IPHAN, devido à
administração conflituosa com os moradores, quanto para moradores, que enfrentam restrições em relação a
alterações em suas residências sem a devida autorização do órgão de patrimônio. Dessa maneira, o objetivo do
trabalho é analisar as ambiguidades das práticas e discursos do patrimônio no contexto da vila, buscando
compreender os feixes de poder, seus mecanismos, técnicas, dispositivos e atores, que engendram e promovem a
gestão das políticas de memória e a manutenção do bem como patrimônio cultural em situações não
conciliatórias, em que as formas de resistência nos informam como o poder é operado.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Syntia Pereira Alves (UNIMES)
Resumo: As necrópoles e cemitérios, ao contrário do que julga o senso comum, vai muito além de ser a última
morada dos indivíduos e se constituem como importantes locais de memória, tornando-se um possível ponto de
partida para o estudo de dinâmicas sociais de um passado de difícil acesso. Neste contexto se encontra o
Cemitério Israelita de Cubatão, popularmente conhecido como Cemitério das Polacas, fundado na década de
1920 pela Associação Beneficente e Religiosa Israelita de Santos (SP), cujas atividades foram encerradas na
década de 1970. Localizado na cidade de Cubatão (SP), o Cemitério das Polacas mantém presente na paisagem da
cidade, da comunidade judaica e do Estado de São Paulo a história de indivíduos cujas vidas não se encontram
no que comumente se encontra nos registros oficiais da história de uma sociedade. Esta proposta visa
apresentar a pesquisa em andamento sobre este cemitério, espaço construído para sepultar homens e mulheres
cuja história foi atravessada pela organização criminosa Zwi Migdal que operou no leste europeu traficando
mulheres judias para Brasil, Argentina e Estados Unidos. Desta forma, o Cemitério Israelita de Cubatão se
tornou um importante espaço de memória tanto para a cidade que o abriga, quanto para a história da
comunidade judaica do Estado de São Paulo e para a história da imigração brasileira no século XX. Assim,
será apresentado o estudo que busca compreender, a partir da história do Cemitério das Polacas, relações
sociais escondidas e, por vezes, apagada de grupos sociais como mulheres traficadas e que estiveram
envolvidas com prostituição, como foi o caso das polacas. Desta forma, serão apresentados pontos observados
ao longo da investigação, como o Brasil como rota da organização Zwi Migdal, a organização e mobilização da
Associação Beneficente e Religiosa Israelita de Santos e a construir do cemitério específico para mulheres
judias envolvidas com a prostituição, o processo político envolvido na construção dos primeiros cemitérios
confessionais não-católicos do Brasil, o abandono do Cemitério das Polacas como tentativa de apagamento
histórico, seu recente tombamento e a inclusão do local como espaço de memória sensível. A pesquisa foi
realizada a partir de documentos e entrevistas a fim de compreender a história, as relações indivíduos e
sociedade e a tentativa de apagamento da memória desses incômodos mortos.