ISBN: 978-65-87289-36-6 | Redes sociais da ABA:
Grupos de Trabalho (GT)
GT 090: Religiões afro-ameríndias entre Norte e Nordeste do Brasil: territórios, trânsitos e práticas
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Coordenação
Leonardo Oliveira de Almeida (cebrap), Patricio Carneiro Araújo (UNILAB)

Resumo:
Atentos/as às históricas peculiaridades das formas de ocupação colonial, ameríndia e africana das regiões Norte e Nordeste do país e aos efeitos destes encontros e desencontros nas expressões afrorreligiosas nestas regiões, que trazem consigo entidades e deidades em constante relação, este Grupo de Trabalho pretende reunir pesquisas, concluídas ou em desenvolvimento, dedicadas a pensar as religiões de matrizes afro-indígenas designadas como terecô, jurema, catimbó, umbanda cabocla, mina, omolokô, xambá, toré, torém, uricurí, xangô, candomblé, entre outras, dando enfoque à agência das entidades (caboclos, encantados, exus, pombagiras, ciganos, pretos-velhos, etc.) e divindades (inquices, voduns, orixás) nos trânsitos e trocas entre a região norte e nordeste. Partimos do entendimento de que, a despeito das distintas formas de ocupação colonial destas regiões, sempre houve entre elas intensos trânsitos de sujeitos, seres, conhecimentos, práticas, rituais, objetos, entidades e deidades, que trazem consigo paisagens, ecologias e ancestralidades. Exatamente por isso, nosso intuito é reunir trabalhos dedicados a pensar essas relações, através de tais fluxos e trânsitos, estabelecidos no universo dos terreiros. Portanto, esperamos receber trabalhos dedicados a pensar em termos descritivos, comparativos e analíticos, a agência, movimento e relação de entidades e deidades que ganham contornos múltiplos nos encontros possíveis entre o Norte e o Nordeste do Brasil.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
"É umbanda do nordeste que traça com Jurema, caboclo, com o culto da pajelança e de outros cultos": uma análise sobre a Umbanda Nagô no Grupo União Espírita Santa Bárbara
Andresa Monteiro Moreira (UFAL)
Resumo: Esse trabalho é um desdobramento da minha pesquisa de mestrado que trata da construção de teorias nativas acerca do chamado sincretismo afro-brasileiro. Contrapondo-se a uma visão homogeneizadora da umbanda como religião resultante de uma confusão sincrética, procuro, a partir de uma pesquisa etnográfica, analisar os diversos atravessamentos externos e internos que constituem a Umbanda Nagô cultuada no Grupo União Espírita Santa Bárbara (GUESB) localizado em Maceió-AL. É importante salientar que os cenários culturais afro-religiosos do estado de Alagoas são marcados por um dos maiores episódios políticos de perseguição às religiões de matrizes africanas no Brasil, que ficou conhecido como Quebra de Xangô de 1912”. Diante desse brutal acontecimento, estratégias organizacionais foram reelaboradas para a continuação dos cultos no estado, dessa forma procuro apresentar a Umbanda Nagô que surgiu em Alagoas pós quebra de Xangô e os outros cultos internos à casa, como o Catimbó do Nordeste e a Umbanda de Mãe Chica, que constituem a Umbanda do GUESB. Dessa maneira, busco construir uma teoria nativa com os religiosos da casa a partir de suas práticas e vivências na religião que cultuam.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Som, fluxo e música na Umbanda: Noções etnomusicológicas sobre as energias nos rituais de umbanda.
Caio Barbosa Alencar Brayner (UECE)
Resumo: Este estudo, como o título já sugere, trabalha com as noções de som, fluxo e música no contexto da Umbanda cearense. O terreiro pesquisado é o Centro Espírita de Umbanda Jesus Maria e José (atualmente coordenado por Mãe Gardênia de Iansã) que, fundado em 1956, representa um dos terreiros mais antigos da cidade de Fortaleza e do Ceará como um todo. Uma característica fundamental do Terreiro são suas práticas que mesclam elementos do catolicismo, das religiões de matrizes africanas e da pajelança cearense, resultando assim em performances, sobretudo sonoras, provenientes de tal contexto. Trazendo os conceitos de percepção (principalmente a sonora) debatidos por Tim Ingold (2008) e o conceito de música de Anthony Seeger (2015), relaciono-os com o contexto dos conceitos, da história e das práticas dos povos de terreiro. Após descrever o C.E.U. Jesus Maria e José em relação às suas práticas e formas de viverem a umbanda, destaco o papel da música durante seus diferentes rituais (incluindo giras, firmamentos e festas). Além disso, o grupo artístico Torres de Oyá do C.E.U. Jesus Maria e José também é trabalhado na pesquisa, visto que, nesse ponto, a música vai para além do espaço da Casa. Ao final organizo e transcrevo as músicas trabalhadas pelo Terreiro e compreendo como as mesmas se organizam.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Um jogo de cartas: diálogos etnográficos com uma cartomante candomblecista em Belém do Pará
Dayane Ferreira da Silva (UFPA)
Resumo: Este estudo visa analisar a prática da cartomancia ofertada por uma cartomante candomblecista, tendo como objetivo compreender as relações entre comércio e sagrado que a prática oracular viabiliza para mulheres de terreiro. Ainda, para esta reflexão, ressalto as relações de troca e pesquisa, no qual eu, pesquisadora, também me posiciono como cartomante, partindo de um olhar familiarizado com a prática. Dessa forma, busco entender como a leitura de cartas possibilita sociabilidades tecidas na experiência de relacionar sustento econômico e religiosidade, bem como o desenvolvimento do sacerdócio enquanto serviço, sobretudo para mulheres. Para tanto, o trajeto metodológico desta pesquisa, se baseia em um diálogo etnográfico com a interlocutora, contando com observação participante e entrevistas semi estruturadas entre pesquisadora e sacerdotisa (ambas cartomantes) de um terreiro de candomblé em Belém do Pará. As experiências analisadas ampliam as discussões sobre a prática oracular de cartomancia realizada por mulheres cartomantes em Belém, além de apresentar vivências das práticas mágico-religiosas destacando as expressões de religiosidade popular no contexto sociocultural amazônico. PALAVRAS-CHAVE: Cartomancia, Oráculo, Feminino, Mercado de Bens-Religiosos, Amazônia.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Saberes tradicionais nos rituais de cura e pajelança no quilombo de Santo Antônio em Penalva - MA
Elivania Estrela Aires (UEMA)
Resumo: Minha proposta para escrita deste trabalho está relacionada às minhas vivências de pesquisa na comunidade quilombola Santo Antônio que fica em Penalva, no estado do Maranhão. Está referida em um conjunto de reflexões acerca das práticas de cura e pajelança que carregam consigo saberes e fazeres, ambos sob domínio dos detentores de saberes autodesignados curadores, benzedores, pajés, parteiras. O objetivo deste texto é refletir sobre como esses saberes estabelecem dentro do território relações sociais que fortalecem os vínculos familiares, afirma o pertencimento ao grupo, estabelece relações políticas e contribui para a afirmação identitária coletiva do grupo. A pesquisa está baseada em levantamento de fontes secundárias, diálogos com antigos moradores da comunidade, e descrições de minhas vivências na referida comunidade que foi onde eu nasci.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Da Jurema ao Catimbó: Resistência e manifestações religiosas no Sertão Cearense
Gabriel Freitas De Sousa (UFPA)
Resumo: O presente estudo, em andamento, pretende abordar sobre os fenômenos sociais, políticos e religiosos que levaram a transição dos cultos afro-indígenas no Ceará, como Jurema, Ouricuri, Toré, etc, para a Umbanda, e de que modo os marcadores sociais da diferença se interseccionam nas formas de resistências e identidades. Dessa forma, propomos (i) analisar os ritos, os símbolos e as performances de três terreiros de Jurema/Umbanda na cidade Juazeiro do Norte (CE) e 3 terreiros na cidade de Canindé (CE); (ii) Investigar por meio das lideranças, sendo esses pais e mães de santo de distintas regiões cearenses quais seriam as semelhanças e diferenças entre essas três expressões religiosas, Jurema, Catimbó e Umbanda, ou, ainda, se estas podem ser consideradas como parte de uma mesma configuração ritualística; e por último, mas, não menos importante (iii) evidenciar as resistências das diversas manifestações afro-indígenas presentes nos terreiros no estado do Ceará e como os marcadores sociais da diferença agem sobre seus corpos e existências, a partir das dimensões de raça, gênero, etnia, território e religião. Para isso, iremos dispor de ferramentas metodológicas como, entrevistas semiestruturadas com Pais e Mães de Santo, além da realização de etnografia em seus terreiros, e em duas aldeias indígenas, na tentativa de comparar os ritos e entender se há semelhanças ou distancias com as manifestações religiosas afro-indígenas.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
O fação cortou embaixo e a bananeira caiu!
Genilson Leite da Silva (UFRJ)
Resumo: O título desse trabalho é também um trecho de uma ladainha da capoeira, nela aborda-se a necessidade de compreender as raízes como algo fundamental para a existência do sujeito e sobrevivência da comunidade. Nessa perspectiva, a aproximação do meu objeto de pesquisa, mito do Zé Pilintra, possibilita que eu desenvolva alguns floreios textuais para pensar a figura do Zé Pilintra enquanto agente social que personificar a construção da identidade carioca e como agente místico que se presentifica nos cultos religiosos de matriz afro-ameríndia. A invocação do Zé Pilintra por meio da cantiga faz referência as muitas narrativas que contam que quando em fuga na Bahia, em Pernambuco ou em Minas Gerais, José Pereira dos Anjos, um de seus muitos nomes, se transformava em bananeira a fim de despistar seus perseguidores. Desse modo, o que busco fazer aqui é um exercício para compreender o mito do Zé Pilintra a partir da ideia de combinatória (Calvino, 1977) e a quadratura (Levi, 1977) sobre o referido mito. Para tal, as narrativas dos praticantes das religiões de matriz afro-ameríndia e das entidades que se apresentam nos cultos a partir da energia ou falange da malandragem nas giras que acontecem no bairro da Lapa no Rio de Janeiro. Recorro a dados etnográficos extraídos do meu campo de pesquisa por meio de observações e entrevistas com as entidade Zé da Lapa, Zé Pretinho1, Zé Pretinho2 e Zé camisa Preta, a debate realizado em grupo de Whatzapp e por fim as narrativas que se originam no imaginário popular acerca do Zé Pilintra e malandragem. Importa saber que não é interesse debater ou aprofundar sobre a origem ou legitimidade de Zé Pilintra, esse trabalho essencialista já foi empreitado de vários autores que por fim já se deram por vencido (Augras, 1999, p.43 apud Ligiéro, 2004, p.26). Há neste exercício certo desapego pela cronologia dos fatos e das narrativas, assim, operarei a partir da categoria do trickster como um ser que usa de suas artimanhas para produzir ilusões, para enganar, assim promove oposições e contradições para possibilitar a mediação entre o mito e os sujeitos. Assim o trickster é um mediador e essa função explica o fato de ele manter algo da dualidade que tem por função superar (Lévi-Strauss,1979, p.244) para dar conta de questões referentes a lacunas temporais e espaciais. Aqui seguiremos os rastros das transformações do mito de Zé Pilintra e suas variantes que possibilitam o nascimento de entidades que surgem a partir desse mito.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
“Não deixe de ir no Homem de Branco”: Relações entre espiritualidade e conhecimentos/práticas biomédicas no Culto à Jurema Sagrada
Gilliard de Oliveira Justino (UFCG)
Resumo: O presente trabalho propõe estabelecer reflexões sobre as relações entre espiritualidade e prática biomédica, que são estabelecidas pelos praticantes do Culto à Jurema Sagrada, expressão religiosa de raiz afroameríndia, derivada e inserida em um complexo polissêmico mais amplo que orbita em torno da planta denominada Jurema (gêneros Mimosa, Acácia e Pithecelobium). O fio que conduz estas reflexões são os dados de campo da pesquisa de mestrado intitulada "Jurema, sua folha cura e sua flecha mata": os sentidos de saúde e doença na Jurema Sagrada (Justino, 2016). A doença, pensada aqui enquanto episódio crísico (Morin, 1995), expressa a possível viabilização da desordem do sistema social, estabelecendo incertezas e potencializando os elementos desagregadores anteriormente presentes, oferecendo riscos à integridade da comunidade. Deste modo, percebemos que os modos de lidar com o episódio da doença, entendidos aqui enquanto drama social (Turner, 2005, 2013, 2015), desencadeiam uma série de ações e reações individuais e coletivas que estabelecem pontos de contato – conflituosos ou não - entre as práticas médicas e a Ciência da Jurema”, conhecimento/energia detido pelos juremeiros. Um elemento fundamental – e para o qual direcionamos o foco desta análise - é a intervenção direta dos Mestres e Mestras, entidades que, quando em vida, tiveram contanto com a Jurema e seu conhecimento, voltando à terra para completar suas evoluções a partir do trabalho espiritual (Justino, 2016). Para além da intervenção ritual, os Mestres e Mestras são, por vezes, elementos ativos no itinerário terapêutico dos doentes, incentivando – por vezes ordenando – a procura de assistência dentro do sistema de saúde biomédico. Sendo assim, é possível perceber que a relação estabelecida para resolução da crise da doença é de complementaridade, com práticas que adquirem um caráter sinérgico aos olhos dos juremeiros, reafirmando, em um mesmo movimento, crença no conhecimento médico – o homem de branco”, na linguagem dos Mestres - e na força da Jurema enquanto base de sentido da experiência e enquanto possibilidade de intervenção.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Entre Linhas e Cidades: identidades, territorialidades e sagrado no culto de Catimbó-Jurema
Henrique Falcão Nunes de Lima (QCM - Quilombo Cultural Malunguinho), George Henrique Pinto Pereira (UFPE)
Resumo: O presente trabalho tem como objetivo desenvolver reflexões acerca das relações entre identidade e territorialidade nos Mestres e Mestras encantados, entidades espirituais que atuam no Catimbó-Jurema, tomando como campo de pesquisa a cidade do Recife/PE. Considerando a distinção à classificação da "falange" na prática religiosa das Umbandas, as entidades juremeiras emergem como agentes que, mesmo submetidos ao processo de "encantamento" (passagem do mundo material para o espiritual), preservam em suas manifestações mediúnicas seus comportamentos, identidades nominais, alcunhas, ocupações, preferências e outros traços distintivos que possibilitam aos adeptos reconhecerem suas singularidades individuais. Isso resulta na singularidade de cada Mestre ou Mestra, uma vez que foram indivíduos distintos durante sua existência terrena. Além de analisar essas identidades, buscamos investigar a dinâmica da interação entre identidade, territorialidade e locus sagrado. Especificamente, examinamos como os territórios ocupados ou frequentados pelos Mestres e Mestras se convertem em espaços sacralizados para os praticantes da Jurema, como por exemplo áreas específicas da cidade do Recife, como a Rua da Guia, bairro da Mustardinha, Cais do Porto dentre outros. Como metodologia de buscar esses marcadores entre identidade e territorialidade, nos debruçamos em analisar os cânticos sagrados, também chamados de "linhas" de Mestres e Mestras como Tertuliano, Ritinha, Preá, Manoel Quebra-Pedra, e mais. Sendo o Catimbó-Jurema uma religião que se sustenta na tradição oral, é através das toadas que os encantados comunicam a respeito de suas histórias de vida. Para auxílio, buscamos nas bibliografias clássicas do estudos de Jurema, referências pertinentes para amparar nossas reflexões; em conjunto, exploramos a busca de dados em antigos jornais, como Diário de Pernambuco, que retrata uma série de matérias expondo a política de repressão ao Catimbó durante o início do século XX, trazendo diversos nomes de catimbozeiros apreendidos, sendo alguns deles atualmente Mestres e Mestras.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
“Abre a porteira, Exu! Deixa a mulher passar! - Maria Padilha, poder e perigo de uma Pombagira no Ceará
Jean Souza dos Anjos (UECE)
Resumo: “Naquela rua vai passando uma mulher. Essa mulher se chama Maria Padilha. Maria Padilha tem o perfume de rosa. Maria Padilha é uma serpente venenosa. Eu não sei quem ela é. Eu não sei quem ela é. É uma serpente venenosa que mordeu, matou”. Laroyê! Salve Dona Maria Padilha da Estrada! Cantando seu ponto, fumando sua cigarrilha e bebendo seu champanhe, Padilha entra no terreiro girando e gargalhando. As pessoas presentes cantam e dançam com ela. A alegria e a fé marcam a presença de Maria Padilha na Cabana Tupinambá Guerreiro das Águas Claras, terreiro de Umbanda localizado no bairro Granja Lisboa, periferia de Fortaleza-CE. Este trabalho, de caráter etnográfico e com ampla produção de imagens, reflete sobre Maria Padilha, entidade do panteão da Umbanda. Ela é da linha dos exus e pombagiras. Como uma Pombagira, Maria Padilha representa a subversão dos valores morais. É uma mulher da rua, que nega a vida doméstica e a maternidade compulsória. Por ser uma mulher que busca a liberdade é considerada perigosa em uma sociedade machista e misógina, afinal, Padilha é insubmissa e não aceita ser mandada por ninguém. Assume, muitas vezes, o papel de amiga e confidente atendendo umbandistas e clientes para resolver assuntos relacionados ao amor, a emprego, a saúde, entre outros. Conforme Augras (2009) são figuras transgressoras que estão sempre invertendo os valores prezados pela boa sociedade. Suas festas são plenas de alegria, brilho, vibração e muita energia, como indica o trabalho de Cavalcante (2018) sobre Maria Padilha de Mãe Iara Cavalcante, do Centro de Umbanda Rei Dragão do Mar, em Fortaleza-CE. A Festa da Padilha de Pai Jonas não é diferente, sendo preparada com muito esmero para a satisfação da entidade e de seus convidados e convidadas. Maria Padilha é considerada a mulher do diabo como desvela vários de seus pontos: Abriu-se as porteiras do inferno pra besta fera passar, sendo ela Maria Padilha, sendo ela a mulher do diabo. Abre a porteira, Exu! Deixa a mulher passar! É a Padilha, Exu! Deixa a mulher passar!”; Padilha, soberana da rua. Padilha, seu feitiço tem axé. Mas ela é a rainha da encruza, ela é rainha da Quimbanda, ela é mulher de Lucifer”. Entretanto, ser a mulher do diabo não significa, necessariamente, ser uma entidade do mal”. O trabalho de campo mostra que Maria Padilha está mais perto das esferas do poder do que das esferas do mal, portanto, ela é uma experiência de mulher que trabalha espiritualmente para que seus fieis e admiradores conquistem seus desejos. Este trabalho faz parte da minha pesquisa do doutoramento no Programa de Pós-graduação em Sociologia da Universidade Estadual do Ceará (UECE) e é apoiado pela Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FUNCAP).

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Mojubá ô: O princípio dinâmico das trocas justas.
Lina Regina Geralda Nunes dos Santos (UFBA)
Resumo: RESUMO: As experiências contidas na rotina de um terreiro de candomblé dão vazão para se pensar a partir do outro (KOURI, 2001), dentro de uma gama de variações simbólicas contidas nas relações destaco o estabelecimento de vínculos e a possibilidades de trocas. Pensar essa proposta a partir de Exú e explorar um dos seus princípios é justamente abordar esse momento da ida ao mercado como um movimento de compensação (FLOR DO NASCIMENTO, 2016) e que cria laços de sociabilidades. Mesmo que de forma reinterpretada por conta de uma existência secular os processos de cooperação e suas múltiplas possibilidades de interação humana (BLUMER, 1996) se reagrupam e tomam forma. Exposto isso, depreende-se que mesmo que de forma ressignificada pela questão da diáspora, destaco a importância do culto a esse orixá como um dos pilares de sustentação para o candomblé e por suas características um grande acionador do funcionamento estrutural simbólico dessas comunidades. Palavras-chave: Trocas; Interações; Candomblé.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
AS ROTAS DO CANDOMBLÉ JUAZEIRENSE”: territórios, memórias e mães de santo
Maria Edina Marques Ferreira (UNILAB), Jacqueline da Silva Costa (UNILAB)
Resumo: O presente trabalho investiga as rotas de constituição do candomblé em Juazeiro do Norte (CE) através das memórias e trajetórias das mães de santo, a partir da articulação das categorias de memória e oralidade. Segundo a literatura disponível, as primeiras casas de candomblé em Juazeiro do Norte datam da década 1970. Nosso estudo se insere no processo de reexame da história do candomblé no Ceará, já que, segundo alguns historiadores, a chegada desta religião ao Ceará dataria de 1965, com o estabelecimento da primeira casa de candomblé, sendo de origem bantu, chamada Viva Deus do Calunga, em Fortaleza. Durante muito tempo este foi considerado o primeiro terreiro de candomblé do Ceará. Essa pesquisa utiliza a metodologia da história oral combinada a interdisciplinaridade através da técnica da entrevista, sendo o principal recurso de condução dessa investigação. As mães de santo de candomblé são nossas fontes principais, pois acompanham o estabelecimento dos primeiros terreiros na cidade, assim como a estruturação e expansão dessa afrorreligiosidade nas terras caririenses. Assim, compreendemos a oralidade como um elemento estruturante das religiões afro-brasileiras e fundamental para perscrutar as rotas que possibilitaram o surgimento do candomblé no interior do Ceará, sendo a memória, elemento fundamental nessa investigação. Nesse sentido, apontamos para um trânsito e uma origem distinta em relação ao surgimento do candomblé em Fortaleza e em Juazeiro do Norte, ainda que estejam situados próximos temporalmente e partilhem aspectos em comuns como a origem bantu das casas de Asé em ambos os territórios.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Macumba, catolicismo e evangelicalismo na comunidade quilombola do Cumbe, em Aracati/CE
Ozaias da Silva Rodrigues (UFAM)
Resumo: Falar na religiosidade local do Cumbe, implica em entendermos as relações entre macumba, evangelicalismo e catolicismo nessa comunidade quilombola. Há um antagonismo entre essas expressões religiosas, ao mesmo tempo em que há um diálogo, a depender de cada caso. Na pesquisa de campo que realizei entre 2022 e 2023, fiquei sabendo do preconceito que os evangélicos têm contra festas católicas e contra afrorreligiosos. Em algumas ocasiões, ouvi queixas de católicos não-praticantes contra evangélicos, de católicos contra afrorreligiosos e destes sobre evangélicos. Interessante apontar que ouvi relatos de que algumas pessoas que eram da macumba, hoje em dia são evangélicas – e criticam a macumba, bem como católicos/as não-praticantes que se converteram, como se diz no jargão evangélico. Interessante também foi a frequência com que ouvia, estando em campo, de interlocutores/as mais íntimos/as, a palavra macumba’. A primeira vez que ouvi achei interessante, mas julguei como um dado aleatório. No entanto, no decorrer dos dias de dezembro de 2022, fui percebendo em que certas ocasiões e com certas pessoas a palavra macumba’ aparecia nas conversas de forma muito espontânea e o principal para mim, enquanto também pesquisador de religiões de matrizes africanas, era ouvir aquela palavra com a naturalidade que eu só ouço dentro dos terreiros de Candomblé e Umbanda. A palavra macumba’ era sempre evocada sem nenhum sentido pejorativo, sem nenhuma demonização do termo. Nesse sentido, a naturalização do termo macumba’ me apontava algo que só a frequência de ouvi-lo me faria entender: a macumba é constitutiva da memória de vários moradores/as do Cumbe, quase como uma memória coletiva. Eu sempre ouvia algum relato de que fulano e sicrano mexiam ou mexem com macumba, tanto no sentido de exercitar sua religiosidade afro e/ou mediunidade, quanto no sentido dos trabalhos’, dos ritos de caráter mágico. Os/as interlocutores/as mais íntimos sempre citavam os nomes das pessoas ao falar de macumba e às vezes davam detalhes vívidos sobre a antiga macumba no Cumbe. Porém, ao mesmo tempo em que a macumba é afirmada e positivada por algumas pessoas, como falei, essa foi a experiência que tive com os/as interlocutores/as mais íntimos/as, pois há quem negue a sua presença no passado do Cumbe e quem a demonize. Assim, há quem fale bem e com propriedade da macumba e há quem fale mal e com muito distanciamento da mesma. De alguma forma, a macumba subjaz ao catolicismo popular do local, que é permeado de misticismos e entidades não-cristãs.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
As Sete Encruzilhadas de Obá no candomblé cearense: agência e protagonismo da pomba-gira e do orixá na configuração do empoderamento feminino no candomblé ketu em Fortaleza (CE)
Patricio Carneiro Araújo (UNILAB)
Resumo: Francisca Maria da Justa Teixeira, uma professora de educação básica e umbandista na década de 1980 é uma chave interpretativa indispensável à compreensão da história das religiões afro-cearenses. Depois de longa convivência na umbanda, em Fortaleza e no Rio de Janeiro, é iniciada no candomblé ketu pelo saudoso Pai Baiano (Waldomiro Costa Pinto), no Ilê Babá Ogum Megegê Axé Baru Lepé (Rio de Janeiro), quando recebeu o nome iniciático de Obá Larim. Mãe Obassi, como posteriormente passou a ser conhecida, tornou-se uma importante ialorixá no Ceará. Ao seu nome está relacionada a introdução do candomblé ketu naquele estado, já que em 1990, quando foi inaugurado o Ilê Axé Oloiobá, as demais casas de candomblé existentes ali, e mais especificamente em Fortaleza, eram de outras nações. Vítima de uma morte repentina, trágica e criminosa, na madrugada do dia 24 pra 25 de 1996, sua liderança à frente da casa que criou durou apenas seis breves anos. Todavia, a força e carisma desta sacerdotisa foram mais do que suficientes para assegurarem a sobrevivência do seu legado para além da sua morte. A fonte da sua força, carisma e liderança em parte se atribui ao poder de sua pomba-gira (Sete Encruzilhadas) e ao seu orixá Obá, forte símbolo de emancipação feminina e na época ainda pouco conhecida no Ceará. Considerando, portanto, a liderança da Mãe Obassi e a agência das forças sobrenaturais das quais emanava seu poder sacerdotal, neste trabalho serão apresentados alguns resultados parciais obtidos na pesquisa intitulada Ilê Axé Oloiobá: memória e história do candomblé no Ceará”, que vem sendo desenvolvida desde outubro de 2022 junto à comunidade deste terreiro e das pessoas que a conheceram pessoalmente e/ou mantiveram alguma forma de convivência com ela. A pesquisa tem abrangido entrevistas, visita a terreiros, análise de documentos, incursões aos espaços institucionais por onde passou Mãe Obassi e observação sistemática do cotidiano do Oloiobá. Trata-se de uma história fortemente marcada pelo trauma da perda da fundadora, mas também permeada pela força de uma mulher que, por sua liderança, marcou de forma indelével a história do candomblé no Ceará. No trabalho a ser apresentado veremos como, mesmo tendo sido vítima da violência de gênero que há muito tempo permeia, também, o universo das religiões afro-brasileiras, a memória e a história da Mãe Obassi interfere até os dias de hoje nas diferentes configurações da vida do povo de terreiro no Estado do Ceará, da mesma forma que Dona Sete Encruzilhadas e o orixá Obá continuam orientando a conduta do atual babalorixá da casa e de toda aquela comunidade-terreiro.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
O Jarê e a Festa de Nosso Senhor Bom Jesus dos Passos em Lençóis, Bahia.
Paula Pfluger Zanardi (IPHAN)
Resumo: O jarê, religião descrita como candomblé de caboclo (SENNA, 1998), surge historicamente por meio de complexas interações culturais. O candomblé jeje-nagô, vindo de Cachoeira pelo rio Paraguaçu, se funde aos elementos de fundamento congo-angola já presentes na região. Porém, diferentemente do candomblé litorâneo, a religião de matriz africana da Chapada Diamantina tem em sua essência uma abertura à incorporação de elementos e entidades de outras fés, como o catolicismo popular, o espiritismo e culturas indígenas (PARÉS, 2018). A Festa de Nosso Senhor Bom Jesus dos Passos, considerado como o padroeiro dos garimpeiros desde o século XIX, é a principal festa do município de Lençóis, e a que reúne mais devotos das cidades das lavras diamantinas. Dentre os devotos do padroeiro dos garimpeiros há um expressivo número de integrantes do jarê (?) que participam ativamente da festa. A exemplo, as baianas que conduzem o ritual de lavagem das escadarias da igreja do Senhor dos Passos, e distintas lideranças religiosas do jarê que acompanham a procissão em lugar de destaque, por vezes carregando o andor. A fé no padroeiro, portanto, não se limita aos católicos. A festa é o momento de devoção a esta imagem do Senhor dos Passos em específico, a qual é encontrada em pejis dos terreiros de jarê da cidade. Por se considerada uma expressão cultural tradicional das Lavras Diamantinas, a Festa de Nosso Senhor Bom Jesus dos Passos encontra-se em processo de registro como patrimônio cultural imaterial pelo IPHAN, tendo já sido reconhecida pelo Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (IPAC). Nas últimas décadas, o sentido religioso da festa e sua conexão fundamental com a cultura do garimpo tem perdido espaço como aspecto principal da festividade, para a programação de shows promovidos pela prefeitura. Este trabalho visa apresentar as intersecções entre o jarê e a festa do Senhor dos Passos de Lençóis, os vínculos e sentidos partilhados entre as expressões culturais que tem em sua origem a cultura garimpeira da região.

Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Religiosidades no sertão profundo: pluralidade de matrizes espirituais em uma família de Cedro - Ceará
Vinícius Fernandes Evangelista (UFC), Érica Fernandes Dias (seduc/ce)
Resumo: A pesquisa intitulada Religiosidades no sertão profundo: pluralidade de matrizes espirituais em uma família de Cedro - Ceará debate a influência de diversas religiosidades no imaginário de um grupo familiar, parentes dos autores, que reside majoritariamente em Cedro, município localizado no sertão profundo da região Centro-Sul do Ceará. O presente trabalho é parte de uma dissertação em construção do programa associado do Mestrado em Antropologia da Universidade Federal do Ceará e da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira. Optou-se por uma pesquisa de abordagem qualitativa/interpretativa, para melhor compreender: até que ponto as religiosidades etnografadas apresentam arranjos únicos de crenças?; se os elementos destas religiosidades estão circunscritos apenas ao referido grupo familiar, ou se estes transcendem ao seu entorno imediato? Estas perguntas de partida baseiam-se na investigação sobre como os sujeitos da pesquisa constroem e materializam o espiritual, o religioso e o simbólico, no território onde estão inseridos. Diante da realidade observada no campo, mediante a análise das entrevistas, da comparação do material com cosmopercepções e etnografias provenientes de diferentes matrizes étnicas e religiosas - em diálogo com autores como Juana Elbein dos Santos (1986), Sobonfu Somé (2007), Grunewald e Savoldi (2020) - constatou-se, até aqui, que existe uma imensa complexidade de influências nas crenças e rituais etnografados. Uma série de elementos trazidos pelos entrevistados (vocábulos, rituais) são encontrados em povos tradicionais do Caribe, em grupos de cangaceiros antigos e em povos indígenas do norte do Brasil. Outras dimensões também são analisadas: a memória afetiva que esses sujeitos têm com o passado, no qual a espiritualidade era celebrada, porém de forma diferente; a relação entre diferentes gerações perante o sagrado; a relação dos sujeitos da pesquisa com entes espirituais não-humanos e com a feitiçaria. Para uma melhor compreensão do imaginário estudado, foi necessário entrevistar sujeitos que não eram do grupo familiar, mas que eram considerados mestres espirituais por este e por outras pessoas da cidade. Alguns personagens populares da região são retratados nessa discussão, pois, em Cedro, além de entidades não-humanas, há também entidades super-humanas populares, isto é, pessoas que são consideradas capazes de realizar o sobrenatural. Por fim, compreende-se que há nesta pesquisa um relevante potencial para o estudo das dinâmicas das religiosidades no interior do Ceará. Palavras-chave: Antropologia da religião; Religiosidades afro-indígenas; Sertão Profundo.