Grupos de Trabalho (GT)
GT 030: Arranjos contemporâneos de parentalidades
Coordenação
Claudia Lee Williams Fonseca (UFRGS), Fernanda Cruz Rifiotis (EHESS)
Debatedor(a)
Janaína Dantas Germano Gomes (UFRGS), Alessandra de Andrade Rinaldi (UFRRJ), Vanessa Ponte (UFRRJ)
Resumo:
No presente GT, pretendemos reunir trabalhos que abordem os diversos arranjos contemporâneos de parentalidades e sobretudo como esses se tornam centro de disputas pelos sujeitos. O termo parentalidade, embora frequentemente remeta às funções parentais educativas, engloba um conjunto de processos desde antes da concepção até à convivência das gerações na idade adulta. Diante de novos arranjos familiares, a parentalidade permite reconhecer funções parentais que podem ser assumidas por pessoas que não possuem necessariamente o estatuto jurídico de pai e mãe. A parentalidade também permite problematizar as diferentes formas e sentidos do cuidado, decodificados enquanto responsabilidades, competências e/ou déficit, bem como o leque de agentes implicados nas múltiplas práticas do cuidar. Rastreando as infraestruturas que conectam as esferas local e global, disseminando ideias e padrões no campo da proteção à infância, queremos entender como as políticas públicas e as leis, junto com discursos científicos e morais, interagem com os múltiplos arranjos familiares para estabelecer uma hierarquia de responsáveis pelo bem-estar de crianças. Assim nesse GT, buscamos congregar pesquisas que abarquem: formas plurais de família e suas relações de interdependência no cuidado; adoções, políticas de entrega voluntária de crianças para adoção, retirada dos filhos de mães em situação de pobreza, apropriação de crianças, busca de origens, etc.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Alana Pacheco dos Reis Verani (UFSC)
Resumo: Este trabalho faz parte de uma pesquisa etnográfica mais ampla que tem como temática a articulação entre família, convenções de gênero e animais domésticos. Nesta comunicação, pretendemos apresentar elementos que surgiram em pesquisa de campo junto a tutores de cães que se autodefinem como “pais” e “mães de pets” em aniversários de cães. Percebemos no fenômeno emergente, parentalidade pet, peças que podem nos auxiliar na compreensão de mudanças, permanências e redefinições de convenções sociais relativas às convenções de gênero, família e parentesco. Aqui, buscamos refletir sobre dados oriundos de nossas incursões em aniversário de cães, que apontam a diferenciação de animais de estimação enquanto sujeitos e passíveis de filiação. Nas práticas sociais observadas, o cuidado aparece como parte fundamental na compreensão da relação entre nossos interlocutores e seus cães. É através da linguagem do cuidado que podemos perceber a busca de serviços especializados para pets, como as confeitarias pet, o preparo caseiro de bolos e doces permitidos para consumo animal e a elaboração de festas para celebrar mais um ano de vida. A organização de festas de aniversário destaca a personalidade e individualização dos animais, estando localizada no processo de construção de parentalidade entre seres humanos e animais de estimação, que passam a ser tomados como sujeitos e imbuídos de subjetividade. A partir do aporte téorico-metodológico da antropologia feminista, em particular seu comprometimento na análise das relações de poder implicadas na produção de alteridades complexas (Bonetti, 2012), buscamos compreender os sentidos e as práticas mobilizadas entre interlocutores de nossa pesquisa sobre parentalidade, cuidado e filiação de animais de estimação.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Amanda Gioriatti Lunkes (UFPB), Pedro Francisco Guedes do Nascimento (UFPB)
Resumo: Discutiremos resultados de pesquisas etnográficas desenvolvidas entre 2013 e 2019, em uma cidade do interior da Paraíba, em que buscamos compreender como pressupostos sobre gênero e família e moralidades maternas se articulavam na implementação de programas de inclusão social como o Criança Feliz (PCF) e o Programa Bolsa Família (PBF). O PCF tem como finalidade “promover o desenvolvimento integral das crianças na primeira infância, considerando sua família e seu contexto de vida”, tendo como um dos pilares de sua atuação as visitas domiciliares por profissionais chamadas de “visitadoras”. O PBF, por sua vez, é um programa de transferência condicionada de renda internacionalmente reconhecido por seu impacto na mitigação da fome, na redução da pobreza e no acesso a direitos básicos das famílias “em situação de extrema pobreza”, por meio das condicionalidades. O trabalho de campo teve por base o acompanhamento das visitas domiciliares do PCF, assim como das ações das agentes de saúde no controle das condicionalidades do PBF. Essa experiência, somada à análise da legislação e documentos oficiais orientadores destes programas, indica-nos que partem do pressuposto de que as famílias pobres não têm conhecimentos suficientes sobre como cuidar das crianças. Sendo assim, seria necessário educá-las para que possam cuidar e “estimular” adequadamente seus filhos (PCF), e monitorar o cumprimento das condicionalidades, para assegurar o cuidado com saúde e educação (PBF). O foco das ações é colocado nas mulheres, responsabilizando a figura materna por problemas enfrentados pelo núcleo familiar e por desigualdades estruturais duradouras. Em ambos os casos, é estabelecida uma hierarquia de responsáveis pelos cuidados, em que a mãe é colocada como cuidadora primária, e, na sua ausência, este lugar passa a ser ocupado por outras mulheres, como avós, tias e irmãs da criança, raramente os homens. Além disso, acaba-se delegando atividades adicionais às demandas de cuidado das mulheres, como as exigências das condicionalidades e as atividades repassadas pelas visitadoras. Estes programas têm um entendimento bastante específico de família, reduzido à relação mãe-bebê, embora os materiais orientadores das ações das equipes, compostas quase que exclusivamente por mulheres, utilizem termos que visam ampliar o possível espectro de cuidadores. Aliando-nos a estudos que percebem estas iniciativas como geradoras da feminização da inclusão e politização da maternidade pretendemos discutir como estas orientações das políticas públicas e seu repertório legal promovem uma persistente avaliação das práticas de cuidado das famílias com que atuam, assim como questionamentos dos arranjos familiares e de cuidado em sua diversidade.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Denise Clemente da Silva (Faculdade de Saúde Pública - FSP/USP)
Resumo: Sob a luz da Governança Reprodutiva, o trabalho busca analisar de que maneira o dispositivo legal da Entrega Voluntária, combinado com as mais recentes tendências de proteção à primeira infância, tem promovido uma intensificação da regulação e monitoramento das práticas reprodutivas no Brasil. Realizamos uma análise documental etnográfica, considerando os documentos gerados pelo Estado como objetos que carregam significados, produzem e modificam subjetividades. Utilizamos como material de análise o "Manual sobre Entrega Voluntária", divulgado pelo Conselho Nacional de Justiça em maio de 2023. Este manual faz parte de uma série de práticas incentivadas nos últimos anos no Brasil que se propõem a fortalecer uma cultura de entrega de crianças para adoção, mediada e regulamentada pelo sistema judiciário. A ênfase na priorização do direito da criança a um desenvolvimento saudável desde a primeira infância tem sido um elemento fundamental da chamada "nova cultura da adoção", que utiliza essa prática como política para a infância e para a juventude, para além de um projeto parental. Esse cenário indica um esforço do Estado em normatizar e centralizar a circulação de crianças, ao mesmo tempo em que favorece a produção de regimes morais sobre as parentalidades ideais, fornecendo embasamento para destituições do poder familiar, especialmente para as famílias em situação de vulnerabilidade.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Flávia Ferreira Pires (UFPB), Mohana Morais (UFPB), Pedro Henrique Gomes da Paz (UFPB), Laura Marques Lopes (UFPB)
Resumo: Este artigo analisa orfandades e parentalidades estabelecidas a partir da Covid-19. Para isso, apresenta três casos etnográficos, resultado de trabalho de campo realizado por uma equipe de quatro pesquisadores em 2023. São as histórias de três mulheres – uma avó, uma tia e uma irmã –, residentes em três diferentes regiões geográficas no estado da Paraíba, no Nordeste brasileiro. Em meio a moralidades e afetos reforçados socialmente, cada uma delas assumiu o trabalho do cuidado de órfãos da Covid-19 em suas respectivas famílias. São, no total, dez crianças e adolescentes, com idade entre 2 e 17 anos. Concluímos que elas eram potenciais cuidadoras antes mesmo dos óbitos ocorrerem, e que a tutela obedeceu à identidade de gênero, ao grau de parentesco, ao laço sanguíneo, aos afetos, à idade, à proximidade geográfica e à condição financeira, acarretando impactos negativos em seus estilo e projeto de vida, e na saúde mental, nesse tempo que deu novo sentido às suas vidas, devastadas pelo luto.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Gabriela Propp Fucks (UFRGS)
Resumo: Em setembro de 2023 como parte do meu projeto de pesquisa da dissertação de mestrado realizei uma incursão a campo com o intuito de observar ministérios de inclusão de pessoas com deficiência em uma instituição religiosa protestante histórica localizada na cidade de Curitiba. A intenção inicial era participar de atividades que envolvessem as pessoas com deficiência, e realizar entrevistas com os líderes responsáveis por realizar esses processos inclusivos. Entretanto, durante uma conversa informal, uma voluntária me apontou algumas das iniciativas da instituição, que é de grande porte e se encontra no coração da cidade. Dentre essas iniciativas, muitas delas partem do pressuposto de suprir necessidades sociais percebidas pelos voluntários e líderes do próprio entorno da instituição, e, portanto, possuem um forte cunho filantrópico e de ação social. Esse projeto específico que pretendo tratar ao longo do presente trabalho se trata de uma iniciativa que parte dos líderes e voluntários por meio, segundo eles, de influência divina, e que tem funcionado a partir de alguns eixos. Um deles é o de incentivo a adoção por meio de vídeos de testemunhos de pessoas adotivas que congregam na instituição, e que relatam a influência do fato de terem sido adotados com a formação do seu self. Em um dos relatos um dos pastores cita sua própria história sendo um filho adotivo e aproveita a oportunidade com o intuito de sensibilizar outros membros da instituição a tomarem o passo de se habilitarem para receber alguma criança ou adolescente também. Os relatos tocam principalmente no que diz respeito as projeções dos diferentes caminhos, que se destacam como não moralmente desejados, pelos quais poderiam ter incorrido se não houvesse a intervenção divina por meio do processo adotivo. Além disso, incentivam a adoção como uma ação desejável a ser tomada e apoiada pela liderança da instituição que rege esse projeto devido ao impacto possível que eles avaliam que possui. Essa percepção se associa a noção de que a paternidade e a maternidade são tidas como um dos valores centrais dentro dessa comunidade religiosa e nesse contexto a adoção é tida como um dos meios válidos de concretização desse chamado. Essa iniciativa apresenta um fenômeno social que se associa diretamente com concepções de direitos humanos, intervenção social por meio de agentes religiosos, e parcerias público privadas, e, portanto, é algo que intento me aprofundar etnograficamente em breve. O conceito de cuidado se implica diretamente nessas noções de atuação voluntária em prol da adoção, e me leva a questionar antropologicamente quais seriam as intencionalidades que movimentam esses sujeitos, e quais são as moralidades que se apresentam dentro desse contexto de disputa.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Giulia Escuri de Souza (UFRRJ), Juliana Nunes da Rocha (UFRRJ)
Resumo: Busco dimensionar alguns dos sentidos mobilizados através da entrega de um recém-nascido por sua mãe de nascimento ao serviço de adoção. Sendo essa pesquisa um produto da minha tese de doutorado ainda em desenvolvimento, intenciono conduzir esse trabalho em dois eixos. Primeiramente, pretendo fazer uma breve revisão do Accouchement dans le secret, parto anônimo, na França e da Entrega Voluntária no Brasil, em seguida busco trazer comparativamente o lugar da filiação e da parentalidade em ambos os casos. Diante essas diferentes leis que são aliadas a práticas e morais dentro de um padrão euro-americano de reprodução e maternidade, pretendo assimilar sob que circunstâncias é possível que uma mulher em puerpério não estabeleça uma relação de filiação com o recém-nascido. Desse modo, vale analisar de que forma essas burocracias e legislações permitem que mulheres possam entregar bebês em adoção como maneira de não se tornarem mães. Para a escrita desse trabalho trago materiais de entrevistas com profissionais francesas que acompanham essas mulheres no processo da entrega através do parto anônimo e de um caso etnográfico presente em um dos processos analisados em uma das Varas da Infância, da Juventude e do Idoso no Rio de Janeiro.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Jadhe Santana Azevedo Mineiro (UNB)
Resumo: O presente trabalho, fruto de uma monografia de graduação, tem por objetivo analisar os efeitos íntimos e pessoais causados em consumidores de testes de ancestralidade genética a partir dos resultados que recebem a respeito de seus parentes genéticos e suas origens biogeográficas, atravessando suas configurações e noções de família. Busca-se, para fins de contextualização, compreender o que são esses testes, como funcionam, quais são seus potenciais e suas problemáticas, qual é o perfil de seus consumidores e o que estes procuram ao adquirir esse dispositivo, inserido no contexto da revolução da biomedicina tecnocientífica. O campo escolhido para esse trabalho se circunscreveu virtualmente, no grupo do Facebook intitulado “DNA Brasil - Genealogia com Genética”, onde cerca de 16 mil pessoas discutem diariamente temas relacionados aos testes genéticos, à pesquisa genealógica, ao método científico de empresas que oferecem a análise do DNA coletado pelos testes, e às interpretações de seus resultados. São postados também muitos pedidos de ajuda para encontrar parentes não localizados ou desconhecidos, e debates a respeito de família, raça e biologia. Foi realizado um formulário de perguntas para coleta de dados mais amplos, assim como entrevistas online com interlocutores de diferentes regiões brasileiras e múltiplas experiências de vida. Três interlocutores, com histórias e perspectivas diversas, foram selecionados como pontos de partida para refletir sobre como os testes de ancestralidade genética se articulam e influenciam as noções de parentesco a nível individual e coletivo, à luz de estudos da antropologia do parentesco. Assim, ao tensionar os moldes e as bases das noções de parentesco com os dados coletados por meio deste trabalho de campo, é possível obter observações interessantes a respeito de como podem ser e se constituir famílias no Brasil.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Juliana P. L. Caruso (USP)
Resumo: A partir de diferentes contextos etnográficos, nos últimos anos venho buscando refletir sobre substâncias especificamente, através do prisma que os estudos de parentesco oferecem. Deste então, em pesquisas anteriores realizadas entre moradores e moradoras de comunidades tradicionais de pescadores, assim como na pesquisa atual a respeito de uma síndrome genética hereditária, o conceito substância tem ampliado possibilidades e percepções sobre as relações de parentesco estudadas. Considerando as discussões que visavam ampliar substâncias para além dos fluídos corporais, englobando comensalidade, mais-que-humanos, diferentes materialidades e imaterialidades, esta proposta de apresentação busca discutir processos de transformação de substância e seus possíveis alexetérios. A pergunta central gira em torno de refletir como diversas dinâmicas e movimentos dialogam pelas/nas relações de parentesco e convivialidade e de qual forma tais relações modificam e transmitem substâncias.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Klarissa Almeida Silva Platero (UFF), Lígia Duque Platero (Instituto Chacruna)
Resumo: Tarde de 16 de maio de 2023. Lígia está em casa quando recebe uma ligação. Do outro lado da chamada, uma voz feminina informa que é a psicóloga da Vara e pergunta se Lígia ainda está interessada em adotar uma criança. A pergunta é pertinente, pois 7 anos se passaram desde que iniciamos os trâmites jurídicos para adotar uma criança com perfil de 0 a 3 anos, sendo-nos sexo e raça aspectos indiferentes. Também havíamos decidido aceitar crianças com doenças tratáveis nascidas em todo o território nacional. Abro a porta de casa e vejo Lígia ao telefone. Ela me vê, aponta para o celular e diz sussurrando que é da Vara. Eu lhe pergunto o motivo da ligação, imaginado se tratar de mais uma reunião com a equipe técnica. Lígia me responde: “Tem uma criança para nós!”. Trêmula, balbuciei: “coloca no viva voz”. Então, a psicóloga me cumprimentou e repetiu o que já havia dito para Lígia: um menino de cinco meses e meio acabara de ficar disponível para adoção e havia chegado a nossa vez. Ela continuou nos informando sobre o histórico jurídico e perguntou se gostaríamos de conhecer o processo. Prontamente respondemos “sim”, marcamos o horário e desligamos o telefone. Nós nos abraçamos e ligamos para uma de nossas advogadas. Na manhã seguinte, estávamos na Vara para ler toda história de nosso filho, narrada nas entrelinhas de três processos judiciais. Horas depois, chegávamos ao abrigo para conhecê-lo e interagir por algumas horas. Voltaríamos ao abrigo na quinta e sexta-feira subsequentes, para o estágio de convivência. Na noite da sexta, fomos informadas de que ele poderia vir para nossa casa no sábado. Mas havia uma ressalva: caso o Termo de Guarda Provisória para Fins de Adoção não fosse emitido até às 17h da terça-feira seguinte, teríamos que levá-lo de volta ao abrigo. É aqui que começam as reflexões teórico-analíticas que pretendemos tratar neste artigo, num exercício cognitivo de transformar nossa experiência dos primeiros meses de dupla maternidade por adoção em material empírico. A frase que dá título ao trabalho é a que eu disse inúmeras vezes a operadores de diferentes instâncias, quando me via imersa no labirinto das burocracias na busca pelos direitos de nosso filho e de nossa família. Os desafios são compreender como as disputas de poder-saber entre a equipe técnica e as lógicas cartoriais do judiciário impactam no desenrolar do processo judicial de adoção e, por outro lado, compreender como a adoção é um universo desconhecido por instituições públicas e privadas, como operadoras de planos de saúde, instituições de saúde e escolas. Em meio a essas disputas de poder saber e de descontinuidades entre o direito normativo e as práticas dos operadores, discutimos os conflitos e as indignações presentes em uma história de dupla maternidade por adoção.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Laíse Rosales Munhoz (UFSM)
Resumo: Este trabalho tem como objetivo geral descrever o reconhecimento de família pelo Serviço de Cidadania e Imigração dos Estados Unidos (USCIS), órgão responsável por julgar os pedidos vistos nos Estados Unidos. Será analisada a importância do conceito de família dentro das políticas migratórias dos Estados Unidos, especialmente no que diz respeito à obtenção de “green card”, baseado no casamento. A pesquisa se concentrará em entender como a imigração estadunidense reconhece e define o conceito de família, especialmente em relação aos laços afetivos e legais. Será explorado o papel das instituições e das práticas sociais na construção do conceito dentro do contexto imigratório. Para alcançar esse objetivo, será utilizado o método da observação participante aliado à técnica da entrevista. Isso permitirá a interpretação das dinâmicas que ocorrem no campo da imigração estadunidense, assim como as experiências subjetivas vividas pelos indivíduos naturais brasileiros que são afetados pelo processo imigratório. Essa pesquisa só foi viável devido a minha atividade profissional como “paralegal” em um escritório de Imigração nos Estados Unidos. Um dos principais desafios enfrentados durante a pesquisa será a navegação através das complexas políticas migratórias dos Estados Unidos, que muitas vezes podem ser confusas e contraditórias. Para embasar teoricamente esta pesquisa, serão utilizadas obras que abordam o conceito de família dentro do campo da Antropologia e dos Estudos Migratórios. Autores como Fonseca (1981) e Schneider (1984) fornecem bases importantes sobre as construções sociais e culturais da família, que podem ser aplicadas ao contexto migratório. Fonseca (1981), destaca a influência das forças institucionais na formulação das sensibilidades familiares. Essa abordagem será fundamental para entender como as políticas imigratórias dos Estados Unidos influenciam a concepção de família dos imigrantes naturais brasileiros. Schneider (1984), por sua vez, argumenta que a estrutura biológica da família é uma construção cultural, e não uma base natural. Essas perspectivas serão utéis para analisar como as políticas migratórias podem reconhecer e legitimar diferentes formas de família, independentemente de laços biológicos. Além disso, será realizada uma revisão bibliográfica de teses e estudos sobre imigração e políticas imigratórias nos Estados Unidos. Ao final deste trabalho, espera-se contribuir para uma melhor compreensão do reconhecimento de família de brasileiros pela imigração americana, assim como dos desafios enfrentados pelos indivíduos que buscam formar família com cidadão estadunidenses ou residentes permanentes legais.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Luciana da Silva Menéndez (PPGAS - UFRGS)
Resumo: O acolhimento institucional de crianças e adolescentes gera conflitos que transcendem a relação entre Estado e famílias destituídas do poder familiar. Atores jurídicos e não jurídicos, rede de acolhimento e proteção, equipe técnica e todos os envolvidos são cobrados por soluções que privilegiam demandas dos sujeitos em situação institucional. A ideia de que há um problema a ser solucionado, fundamentada por vezes nos marcos legais, legitima e convoca a atuação dessa multiplicidade de atores que constroem e disputam narrativas sobre a vitimização de crianças e adolescentes. Isso envolve não apenas a construção social da vítima em si, mas também de outros atores que assumem papéis de culpados e salvadores. Tal visão fomenta a crença de que a família é o epicentro da ameaça e violação de direitos de crianças e adolescentes, desconsiderando a influência de outros fatores sociais e institucionais. Famílias consideradas inadequadas para o desenvolvimento de seus filhos são marcadas como desorganizadas, justificando a retirada das crianças e adolescentes como medida para garantia de seus direitos. Entretanto, essa lógica pode implicar na dissociação dos direitos da criança e do adolescente dos direitos de suas famílias. A etnografia se dará por meio da observação de discursos proferidos em debates sobre temas como violação de direitos humanos, primeira infância, acolhimento institucional, entre outros, ocorridos em audiências públicas conduzidas pelos agentes que gerenciam esses processos. A análise também se debruça sobre como os agentes gerenciam o tempo presente visando atender expectativas de um futuro idealizado. Esse tempo se configura como um evento central e crítico: por um lado, impõe um senso de demora na solução do problema do institucionalizado; por outro lado, serve para manter viva a ideia de que os agentes agem incessantemente contra o tempo e pelo melhor interesse da criança e do adolescente, mesmo com limitações institucionais e dos prazos legais. Diante desse cenário, questiona-se a precariedade da estrutura física e técnica do acolhimento institucional, bem como a possível desvalorização dos programas de assistência e seguridade social, que visam o cuidado integral da família em seu contexto territorial. Essa desvalorização pode se manifestar na subestimação do profissional e na falta de investimento em atualização e capacitação da equipe técnica para lidar com as novas demandas que se acumulam ao longo do tempo. Partindo desses e de outros questionamentos, este trabalho busca ampliar o debate, sem a pretensão de apresentar uma solução definitiva. O objetivo é incorporar perspectivas diferentes daquelas arraigadas pelos marcos legais e alguns de seus operadores, a fim de analisar alguns dos conflitos sobre o acolhimento institucional.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Manuela Vieira Blanc (UFES), Nathalia Cominotti Bonfiglio (UFES), Victoria Rangel de Moraes (UFES)
Resumo: Este trabalho tem como objetivo analisar os desafios encontrados por mães estudantes da Universidade Federal do Espírito Santo no que se refere a conciliação entre as atividades de cuidado e estudos diante da insuficiência de suporte estatal e de serviços oferecidos pela própria universidade e conferindo especial destaque aos constrangimentos institucionais observados ao longo de um trabalho de observação de inspiração etnográfica. Esta proposta se inspira em um conjunto de situações observadas pelas autoras enquanto estudante e professora universitárias, a segunda também mãe, e que apontam para os constrangimentos institucionais vivenciados por estudantes mães e seus dilemas em torno da conciliação entre os estudos, o trabalho e o cuidado e que se somarão às diferentes dimensões que atravessam a condição de sobrecarga materna. Esta proposta, portanto, se utiliza de dados de observação de inspiração etnográfica, de dados coletados ao longo de uma pesquisa etnográfica digital, via whatsapp, e de relatos de membros do coletivo Parentalidades quanto às suas vivências e embates no contexto acadêmico. No plano teórico, esse trabalho se inspira no debate da Desigualdade Sexual do Trabalho e na Teoria da Reprodução Social, que fazem o esforço de expor como são dadas as desigualdades entre homens e mulheres no que tange o trabalho do cuidado e esclarecer como esses desafios e desigualdades se organizam em prol da manutenção do sistema capitalista. A Teoria da Reprodução Social reconhece a reprodução como aspecto central ao processo produtivo, enquanto atividade de reposição da força de trabalho. A desqualificação e invisibilização destas atividades de cuidado estão relacionadas a um sistema de exclusão das mulheres, historicamente as principais responsáveis por realizá-las, dada a ausência de um aparato coletivo, na contemporaneidade, que culmina na exclusão das crianças e seus cuidadores de diferentes contextos sociais. Destacaremos o papel de uma série de constrangimentos institucionais que incidem negativamente sobre as experiências parentais, sobretudo de mulheres estudantes que são as cuidadoras principais de seus filhos no contexto acadêmico entre mulheres estudantes que são as cuidadoras principais de seus filhos, bem como os esforços de mobilização, igualmente restritos em função dos desafios de conciliação entre as atividades de cuidado e de estudos.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Milena Weber Rodrigues (UFRGS)
Resumo: Há uma década se dá o início do processo de deslocamento forçado de indígenas da etnia Warao da Venezuela para o Brasil. Esse movimento vem ocasionando uma série de transformações significativas entre estes indígenas, na medida em que o contato com a sociedade brasileira se intensifica e novas problemáticas oriundas desta relação emergem. Concomitante a isso, uma série de conflitos de diferentes naturezas têm início na medida em que grupos Warao se dispersam pelo país. O presente trabalho corresponde a uma pesquisa em andamento que busca, neste sentido, dar enfoque ao conflito existente entre as instituições de proteção à criança e ao adolescente e os indígenas Warao em Porto Alegre. A escolha do tema se dá pelo interesse em elaborar reflexões em torno das representações de infância que aparentemente são mobilizadas enquanto tecnologias de governo para tutelar as crianças destes grupos e que, por consequência, se estendem a estas unidades domésticas como um todo, operando uma lógica semelhante à do poder tutelar exercido pelo Estado nacional sobre as populações indígenas. Com base no trabalho de campo etnográfico realizado junto à população Warao na cidade ao longo de quatro anos, o objetivo aqui é contrastar a representação de infância enraizada em duas instituições - a Fundação de Assistência Social (FASC) e o Conselho Tutelar - com as concepções de infância Warao, sem esquecer de suas transformações neste contexto de deslocamento forçado. Posicionando-se de forma estratégicamente interseccionada, buscamos estabelecer diálogos com autores da antropologia da infância, antropologia das instituições e também com a etnologia em sua abordagem mais processual.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Monique Batista do Nascimento (UFRJ)
Resumo: O celibato é um dos dogmas mais controversos da tradição católica romana. Diante dos inúmeros escândalos sexuais de celibatários religiosos – somados a um momento de crise vocacional –, os debates sobre a obrigatoriedade do celibato na Igreja Católica se intensificaram nas últimas décadas. A partir disso é possível notar diversos investimentos de pesquisa acerca das bases teológicas do celibato, porém pouca atenção vem sendo dada aos cônjuges e descendentes gerados a partir da quebra desse voto sagrado, sobretudo nos dias atuais. Em razão da pouca visibilidade pública e política das discussões sobre as famílias, em 2014, um psicoterapeuta irlandês – que descobriu ser filho de padre somente aos 28 anos de idade – fundou a plataforma online denominada Coping International. Tendo como um de seus objetivos a criação de uma rede de contato e de apoio essencialmente às filhas e filhos de padres, esta plataforma pretende, também, adotar estratégias políticas para eliminar o estigma que os acompanha e alertar sobre os problemas emocionais e psicológicos que, muitas vezes, são causados pelo silêncio imposto diante deste tipo de situação familiar. Entre 2014 e 2017, o site contou com mais de 400 mil acessos em 175 países, chamando a atenção da Igreja Católica para a indesejada questão de padres que violam os seus votos de castidade. Essa rede contava ainda com a parceria de uma agência de DNA, a Origin Genetics, com o intuito de contribuir para a confirmação das paternidades. Logo, gerou-se um cenário de disputas pelo reconhecimento oficial da Igreja Católica dos descendentes de celibatários religiosos na Europa, fomentando discussões mais acirradas sobre as diretrizes adotadas pela instituição religiosa em casos de quebra de celibato. Neste sentido, o presente trabalho tem como proposta analisar e apreender, através de alguns casos públicos de filhas e filhos de padres que recorreram ao Coping International na buscar por suas origens paternas, como elas/eles expressam suas percepções e interpretações sobre família, particularmente pensando esses arranjos relacionais diante de contextos sócio-históricos fortemente marcados por valores morais-religiosos. Ademais, torna-se relevante analisar as controvérsias em torno da manutenção ou não do celibato católico, especialmente a partir das diretrizes do Vaticano na lida com a paternidade de seus ordenados, observando as implicações desses casos para a Igreja Católica e para os próprios padres.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Nayra de Oliveira Martins (UFF)
Resumo: Esse trabalho tem como proposta, a partir de uma observação direta, compreender como os processos de destituição do poder familiar são concebidos pelos profissionais da rede de proteção dos direitos da criança e do adolescentes, seguindo as diretrizes das medidas de proteção previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Apesar do processo de adoção ser apontado como uma medida excepcional para assegurar tais direitos, ainda é usado como justificativa de “salvação” em processos de destituição do poder familiar. Com a revogação de alguns artigos do ECA, devido a lei Nº 12.010|09, a qual trouxe a convivência familiar e o vínculo afetivo como primordiais no desenvolvimento do indivíduo e que, em teoria, teria como objetivo a redução dos altos números de retirada e acolhimento de crianças, a preservação do vínculo comunitário e não o apagamento de sua origem, por conta da situação de vulnerabilidade social do núcleo familiar, mostra, entretanto que, na prática, esses elementos ainda se mostram presentes. O Conselho Tutelar é a principal instituição de proteção, portanto surge como um campo de análise cuja característica é garantir a proteção integral da criança e do Adolescente, a partir do acompanhamento de famílias denunciadas, e a parceria de outras instituições de proteção, das áreas de assistência, saúde e direito. Busco observar os casos “fatídicos” descritos pelos atores envolvidos e os métodos utilizados pelos mesmos. Diante disso, procuro compreender a seleção das famílias denunciadas e o processo que permitiu que os casos fossem judicializados, ou seja, onde a rede de proteção não pode impedir a violação. Elementos que enfatizam “quem pode ter|ser mãe”, aliada a presença majoritária de mulheres intimadas a comparecer nessas instituições, servem como um reflexo a quem essa responsabilidade é designada. Da mesma maneira, demonstra quais são os tipos de maternidades reconhecidas e quais são negadas, e a violência contra elas durante e antes do processo. Além de não compreender a pluralidade do cuidado e das formas de maternar devido aos julgamentos e moralidades atravessadas na maternidade, marcados pela questão de gênero, raça, classe e território. A pesquisa ainda está em andamento e o campo se delimita na região da cidade do Rio de Janeiro, e a partir de uma análise das legislações, e as políticas públicas designadas para um controle sobre as famílias, em nome da proteção das crianças. Procuro realçar esse campo de disputa de direitos entre o “direito à infância” e o “direito à maternidade”, cuja priorização é justificada pela categoria do mais “vulnerável”, que é entendida pelos agentes como sendo sempre a criança.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Saionara de Jesus Dantas (UFRN)
Resumo: No meu trabalho de conclusão de curso desenvolvi uma etnografia do processo de institucionalização que eu e meus dois irmãos vivemos, no início dos anos 2000, em Caicó, região do Seridó potiguar. Uma escrita elaborada através das minhas memórias, as dos meninos, as de mainha e as familiares. Familiar, para mim, pode referir-se tanto à minha família de origem, quanto à minha família social. Complementando-as: as legislações que versam a respeito do direito das crianças e dos adolescentes à convivência familiar e comunitária, as fotografias desse processo e os documentos oficiais da intervenção. Os documentos produzidos pelo Estado através da Aldeias Infantis SOS, entidade que desenvolve programa de acolhimento institucional, produziram uma família social como expediente de controle. Anterior ao "ganhar uma nova família", com uma mãe social, irmãos sociais, tias sociais e um tio-gestor e uma Comunidade SOS, mainha, Sandra de Jesus, foi lida como incapaz de nos criar e a nossa família gerenciada como desestruturada, por sete anos. Eu, Saionara, fui a criança-ponte desta intervenção. Agora, aciono meu diário de campo e as memórias do processo de escrita e acrescento mais questões ao debate.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Yasmin de Sousa Andrade (UEMA)
Resumo: O exercício da maternidade no cárcere é cercado por vulnerabilidades, como o abandono familiar e a permanência integral das mães e os seus filhos dentro de um espaço da penitenciária denominado "berçário". Esse espaço é habitado tanto por gestantes quanto por mulheres que cuidam dos filhos que nasceram enquanto estavam presas (de acordo com a lei, a criança pode permanecer com a mãe privada de liberdade até completar dois anos de idade). A partir de pesquisa etnográfica realizada na Unidade Prisional de Ressocialização Feminina de São Luís Maranhão (UPFEM), fruto de uma iniciação científica, pude perceber, por um lado, as múltiplas formas de cuidados destinadas a crianças nascidas na prisão e o exercício de uma maternidade compartilhada entre as internas e, por outro, interferências institucionais nas atividades maternais dentro do berçário da penitenciária. Quando estão no berçário, as gestantes e as mães perdem o direito de realizarem as atividades laborais e educacionais disponibilizadas na penitenciária. Durante a pesquisa de campo, pude ver que as duas crianças do berçário passavam de mão em mão, recebiam cuidados de diversas mulheres e cada uma das internas as chamavam por um nome diferente. Apenas a observação seria insuficiente para saber quem eram as mães das duas crianças, pois não era visível um vínculo maior de uma ou outra com elas. O companheirismo se mostrou um componente importante no cotidiano do berçário. As tarefas são divididas, desde a faxina do local até os cuidados com as crianças (como alimentação, higienização, brincadeiras). O companheirismo se expressava, também, no suporte emocional que umas davam às outras, na troca de conselhos acerca do melhor momento de se separar de seus filhos e da situação das crianças quando saírem do estabelecimento prisional. Muitas internas são abandonadas pelos seus familiares, logo, nem sempre os responsáveis pelas crianças são membros da família das internas. Nos casos em que a criança não tem para onde ir, de acordo com a lei 1.584 §º5 do Código Civil, o caminho é a adoção, o que significa a perda da guarda de seu/sua filho/a, e a certeza de nunca mais vê-los. Uma das presas relatou não ter família, apenas uma amiga de confiança que considera como uma irmã. É ela que cuida do seu filho de 8 anos que está no "fora", assim como também cuidará da filha que está esperando. Nesta apresentação, a partir de pesquisa etnográfica realizada na UPFEM, pretendo fazer uma discussão sobre essas situações de cuidado e tutela que as crianças nascidas na prisão passam até o momento de saírem da penitenciária.