Grupos de Trabalho (GT)
GT 101: Trabalhos etnográficos com população em situação de rua: modos de existir/resistir, políticas, governos e agências
Coordenação
Taniele Cristina Rui (UNICAMP), Adriana dos Santos Fernandes (UERJ)
Resumo:
Em novembro de 2022 ocorreu no STF a audiência de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 976, nessa ocasião, a Corte determinou aos Executivos federal, estaduais e municipais a adoção de providências em relação às condições de vida da população em situação de rua no Brasil. A audiência foi considerada histórica por ser a primeira vez que o STF abordou o tema. A questão tem alçado atores políticos inéditos e nos fez interpelar a contribuição da antropologia, e das ciências sociais nesse debate. Num cenário de hegemonia neoliberal, parcerias público-privadas são naturalizadas na gestão das camadas precarizadas que vivem ou circulam pelas ruas. Todavia, assegurar moradia, trabalho e saúde mental, evitar o definhar e a morte são modalidades de alta complexidade, que abrangem dispositivos diversos, as particularidades de cada território e o lidar com atores que operam o governo das condutas nas margens. Este GT pretende agregar trabalhos etnográficos com população em situação de rua que compartilhem relatos empíricos, instrumentais teóricos e metodológicos, e engajamentos militantes. Receberemos trabalhos atentos tanto a questões internas às ruas, suas dinâmicas, tipos urbanos, modos de habitar, ganhar dinheiro, segregação e violência, quanto a questões referentes ao aparato de gestão destinado a tal público, como abrigos, centros de convivência, CAPSad, consultório na rua, comunidades terapêuticas, prisões, ongs, igrejas e correlatos.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Caroline Silveira Sarmento (UFRGS)
Resumo: O intuito deste texto é o de aprofundar a reflexão acerca dos efeitos da retirada compulsória dos filhos
no cotidiano das mulheres com trajetória de rua. A discussão é parte da pesquisa de doutorado em andamento,
cujo objetivo consiste em compreender as complexidades - que comumente ficam ocultas - presentes na prática
de afastamento compulsório de filhos de famílias marcadas socialmente por classe e raça. Em que pesem os
marcos legais estabelecidos e os direitos conquistados pela população em situação de rua, como é possível
que ocorram reiteradamente violências como essas e tantas outras diuturnamente com essas pessoas? É uma das
perguntas centrais da tese. Para contemplar possíveis respostas, o propósito está em refletir sobre a
categoria população em situação de rua no sentido de problematizá-la enquanto heterogênea, plural e
complexa. Dessa forma, apresentarei dados da etnografia desenvolvida com mulheres com trajetória de rua com
a finalidade de enfatizar as emoções por elas manifestadas durante o processo de perda do poder familiar e
após sua efetivação, em especial o luto. Aqui uma espécie de luto pela perda do filho vivo, expressão
êmica, que aciona incertezas acerca do destino do bebê/criança e impõe à mãe conviver com esta falta.
Diferentemente de filhos falecidos, este não é um luto reconhecido, é um luto não autorizado, afinal a
criança/bebê está viva e supõe-se bem cuidada - algo que supostamente a mãe biológica não seria capaz de
fazer. Nesse sentido, a presente comunicação apresenta cenas e histórias de campo na intenção de discutir de
que modos trabalham emoções como inconformidade e raiva, mobilizadas por essas mães enlutadas, sobre as
quais pesa a obrigação da aceitação sob o argumento de melhor interesse da criança. Considerando que as
experiências de luto são sempre singulares, neste caso, das mães órfãs de filhos vivos, importa atentar para
o impedimento político do direito a esse luto e também como tais vivências impactam a vida dessas mulheres,
impossibilitadas de realizá-lo.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Gabriel Rocha Teixeira Mendes (UNICAMP)
Resumo: O presente trabalho apresenta resultados parciais do trabalho de campo de uma pesquisa de doutorado. O
objetivo central da investigação é analisar etnograficamente a circulação de pessoas em situação de rua com
transtorno mental e problemas decorrentes do uso de drogas nas margens da zona sul de São Paulo.
Estabelecemos a lei 10.216 de 2001 como clivagem da assistência à saúde mental no Brasil. A partir de então,
serviços substitutivos ao hospital psiquiátrico inauguraram a lógica psicossocial e comunitária de
atendimento, estabelecendo o Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) como ponto central do novo formato. Dez
anos depois, a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) surge como uma consolidação da reforma psiquiátrica por
articular diferentes instâncias e serviços de saúde pertencentes à atenção básica e especializada. No
entanto, mesmo com a instituição da RAPS, um equipamento de caráter psiquiátrico perdurou como um de seus
componentes: a comunidade terapêutica. Na prática, essas instituições operam de forma contrária à reforma,
frequentemente produzem tratamentos sem qualquer cientificidade e violam os direitos humanos. O que temos
observado no território pesquisado não tem sido diferente.
O distrito do Grajaú está localizado às margens da zona sul de São Paulo. Além dos altos índices de
vulnerabilidades, o território conserva algumas peculiaridades da vida urbana de São Paulo, por exemplo, as
formas de ocupação do território. De um lado intensos processos de urbanização propiciados pelo aumento
significativo da população nas últimas décadas. De outro lado modos de vida rural, que vão desde produções
agrícolas, artesanatos e bazares orgânicos, a espaços de lazer e coletivos agroecológicos. Entretanto, outro
aspecto marca a região: o arranjo dos aparelhos de Estado. A partir do trabalho etnográfico temos observado
que a dinâmica territorial produz encontros, usos e circuitos diferentes daqueles prescritos nas políticas.
Sob esse prisma a população em situação de rua pode ser exemplo, o cotidiano dessas pessoas evidencia
fragilidades e insuficiências de programas e serviços, sobretudo, de saúde mental. O funcionamento desse
mecanismo faz com que boa parte dos usuários procurem por internação em comunidades terapêuticas quando
pretendem acolhimento institucional ou algum tipo de cuidado de saúde. Nessa seara, uma dupla questão
emerge: quais rearranjos a RAPS precisa realizar para acolher a parcela que esquiva, ao mesmo tempo como
fazer para que esses usuários se sintam acolhidos por ela. Além disso, que mecanismos deveriam existir para
conter a proliferação de comunidades terapêuticas clandestinas na região.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Jade Novaes de Figueiredo (UERJ)
Resumo: Nos contextos de cuidados dos direitos das crianças, diversos discursos, moralidades, controles,
legitimidades, instituições estatais articulam-se em uma rede de apoio e de assistências. Através desta
etnografia trato sobre diferentes formas de tutelas produzidas por uma unidade escolar em relação às
crianças em território favelizado na cidade do Rio de Janeiro. A escola é considerada um depósito de
indesejáveis pelos atores que a compõem. A minha análise visa demonstrar como há formas de tutelas e governo
direcionadas a produção dessas crianças como descartáveis por intermédio de instrumentos que seriam para
garantir seus direitos. A rede escolar é hierarquizada, neste sentido, divide e define os estudantes e
funcionários os direcionando para escolas específicas. O contexto da cidade carioca está entrelaçado em
minhas análises, ao qual o cotidiano de guerra reverbera tanto na ação de extermínio direto, quanto nas
ações de governo em um extermínio das dignidades cotidianas e subjetivas. Este trabalho analisa como a
produção desta escola depósito implica na distribuição dos corpos e subjetividades considerados como
problemas diante dos marcadores sociais da diferença, atuando em processos de sujeição dessas infâncias.
Minhas análises verificam que as múltiplas violências e humilhações desaguam na produção de corpos
descartáveis. Da mesma maneira, analiso como os processos de sujeição dos estudantes e funcionários da
escola estão relacionados com a utilização e instrumentalização de laudos médicos e psiquiátricos. Os laudos
são mecanismos produzidos para a promoção de direitos e resguardos, quando atrelados a certas escolas estes
possibilitam rearranjos para a produção de sujeitos de direitos. Nesta etnografia viso demonstrar que os
laudos são instrumentalizados para o funcionamento escolar, veiculando modos de contornar os conflitos,
assim como formas de deslegetimações e antagonismos. No campo são operadas as categorias, ao mesmo tempo
médicas, sociais e pedagógicas: pessoas laudadas, pessoas incluídas e pessoas sem laudo incluídas por atos
diagnósticos. Deste modo, os laudos são operados para a suspensão de direitos, sendo um instrumento de
descartar corpos e subjetividades indesejáveis. Nesse cotidiano escolar, observei a produção de uma
necropolítica para aqueles que seriam considerados moralmente inferiores, sem necessidade de espaços dignos,
suspendendo seus direitos, os desumanizando, produzindo infâncias descartáveis. A cadeia de autoridades
delegadas que circulam pela unidade está relacionada com a gestão de moralidades, precariedades e as
suspensões de direitos, produzindo um cotidiano de sofrimento e adoecimento de todos que ali trabalham e
estudam.
Palavras-chave: escola depósito, laudos, necropolítica, sujeitos de direitos.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Jullia Alves de Almeida (UFPE)
Resumo: A partir da construção do Censo Pop Rua Recife (2023), elaborado mediante a parceria entre a
Universidade Federal Rural de Pernambuco e a Prefeitura do Recife, especificamente a Secretaria de
Desenvolvimento Social, Direitos Humanos, Juventude e Políticas Sobre Drogas (SDSDHJPD), será incorporada às
discussões antropológicas conectadas aos dados da pesquisa sociodemográfica acerca da população em situação
de rua em termos de gênero, raça, sexualidade e faixa etária.
O Centro de Referência Especializado para a População em Situação de Rua (Centro POP) atende demandas
referentes a higienização, alimentação, documentação e dispõe de ferramentas para elaborar encaminhamentos
para o Restaurante Popular, Abrigos Noturnos e Casa de Acolhimento 24h. No território do Recife existem
quatro Centros POP: Centro POP Glória, Centro POP Neuza Gomes, Centro POP José Pedro e Centro POP Maria
Lúcia, esse último encontra-se com as atividades suspensas.
O Serviço Especializado de Abordagem Social (SEAS) proporciona o contato direto com a população de rua nos
territórios, deste modo, por se tratar de uma ocupação externa de busca ativa, nos permite o contato
inicial, a abertura e a tentativa de proximidade, além do registro descritivo nos cadernos que levamos para
o campo, bem como a construção dos relatórios individuais das pessoas usuárias do serviço.
Deste modo, sob a luz das produções antropológicas referentes à população em situação de rua, serão
refletidas as vivências destes grupos na cidade do Recife, dentre elas: "No Meio da Rua: Nômades, Excluídos
e Viradores" (BURSZTYN, 2003), "Corpos Urbanos Errantes" (Frangella, 2009) e "O Sistema da Rua em Ação"
(Holanda, 2017). Em ligação, utilizarei como base os relatórios feitos por mim oriundos dos atendimentos com
os/as usuários/as nas ruas através do Serviço Especializado de Abordagem Social (SEAS), preservando
eticamente as pessoas envolvidas, utilizando nomes fictícios.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Lara Silva Fagundes (CRIA)
Resumo: O contexto pandémico da COVID-19 incitou uma série de discussões e novas formas de abordagens para
ultrapassar problemas de saúde e sociais. Nesse sentido, se faz necessário o debate sobre o investimento em
intervenção social e ações de Redução de Danos e Minimização de Riscos (RDMR) para a população em situação
de sem-abrigo em Lisboa.
A conjuntura pandêmica propiciou a identificação da necessidade de uma resposta de intervenção específica
para essa população, levando em consideração os seus consumos e dependências. Em 2021, foi inaugurado o
Centro de Acolhimento de Emergência Municipal (CAEM) de Santa Bárbara. O centro tem capacidade para 128
indivíduos e é gerido por três entidades: Câmara Municipal de Lisboa, Vitae e Ares do Pinhal.
A Associação Ares do Pinhal assumiu a responsabilidade de prestar serviços na área da saúde mental e
desenvolveu um modelo de intervenção voltado para RDMR, com a gestão do Espaço para Comportamentos Aditivos
e Dependências (ECAD).
Através da pesquisa etnográfica multimodal, o objetivo deste estudo é refletir sobre as políticas e
procedimentos adotados no CAEM, apresentar o perfil demográfico dos residentes e discutir os desafios e o
futuro da intervenção junto aos cidadãos com consumos aditivos e dependências.
Esta reflexão acerca das práticas instituídas pretende contribuir para a disseminação de conhecimentos
pertinentes à intervenção junto à população em situação de sem-abrigo, bem como promover a troca de
experiências, fomentando um diálogo construtivo para o aprimoramento contínuo das práticas de acolhimento e
intervenção social.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Luana Lima Godinho (UFF)
Resumo: RESUMO
A proposta de trabalho ora aqui apresentada visa desenvolver uma análise antropológica de um dos problemas
sociais mais complexos que acometem a população idosa: a rualização. Considerando a vulnerabilidade quanto
aos direitos de cidadania e reconhecimento desse grupo, buscarei evidenciar os mecanismos de resistência
empreendidos pelos idosos para suplantar as qualificações e avaliações cismáticas que incidem sobre seus
aparatos identitários. O julgamento formulado sobre a égide da cisma implica no congelamento e petrificação
de determinadas representações sobre a identidade do outro, resultando em um déficit no reconhecimento da
dignidade, dos direitos desse segmento e no paradoxo da solidão na multidão. Segundo dados do IPEA, entre
2012 e 2022, o crescimento da população em situação de rua foi em torno de 200%. O envelhecimento
populacional é um fenômeno mundial que afeta diversos aspectos da sociedade, como a economia, a saúde, a
educação e a segurança. A partir de pesquisa etnográfica implicada e de observação participante no
atendimento de atenção básica à população em realizada pelo serviço de abordagem social de competência
municipal na cidade de Niterói, Rio de janeiro, viso problematizar como as políticas de controle social
implementadas pelo Estado definem que redefinem as dimensões identitárias desse grupo. Desse modo, pretendo
discutir as tensões que se apresentam no trabalho de definição das identidades dos moradores idosos
realizado pelos agentes públicos e as mobilizadas pelos próprios idosos de forma a explicitar as
consequências dos julgamentos cismáticos nos critérios de reconhecimento, cidadania, subcidadania e
invisibilidade dos idosos moradores de rua. Ou seja, em que medida a lógica da desconfiança, que supõe uma
possibilidade de transição e transação dos julgamentos sobre os outros permeabilizando, dá lugar a lógica da
cisma quando se trata desse segmento da sociedade, enquadrando nos absolutismos das certezas em caixas
determinadas e fechadas. Portanto, em que medida o ensimesmamento reforça esse modo de viver a rua da
solidão na multidão.
Palavras-chave: Cisma, Identidade, População em situação de rua
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Marçal Henrique da Costa (UFPB), Luziana Marques da Fonseca Silva (UFPB)
Resumo: Este resumo visa refletir sobre a vivência de Maria, uma mulher em situação de rua no município de Rio
Tinto, localizado no litoral norte paraibano, no qual desenvolvemos uma etnobiografia (Gonçalves; Marque;
Cardoso, 2012), a fim de trazer à tona os desafios enfrentados por indivíduos em situação de extrema
vulnerabilidade no que diz respeito ao acesso aos serviços públicos de saúde e assistência social. A
metodologia aplicada nesta pesquisa antropológica é qualitativa e descritiva, os dados têm sido coletados a
partir das informações obtidas por meio de conversas diretas com a protagonista, agentes de saúde,
profissionais da assistência social e outros moradores locais. A partir do relato, é possível perceber como
o acesso de Maria aos serviços de saúde é complexo e burocrático, demandando a apresentação de documentos,
como carteira de identidade e comprovante de residência. Desprovida de documentação e vivendo à margem do
horário comercial convencional, agravado pela dependência ao crack e a constantes mudanças de localização,
Maria enfrenta uma camada adicional de violência ao ser negligenciada pelo aparato estatal. O foco adicional
desta pesquisa se direciona para a correlação entre a vulnerabilidade social e o estigma como produtora de
agravos à exposição ao HIV/Aids. Maria é tida como um potencial foco de contaminação por doenças sexualmente
transmissíveis, sendo insinuado, por parte de algumas moradoras, que vários homens haviam sido vítimas dessa
suposta contaminação. Esse posicionamento acusatório nos dá a entender como a situação de Maria é percebida
pela comunidade, é um indicativo que nos permite dimensionar como o seu corpo é lido pelo/no território. Por
um lado, Maria, sem uma moradia fixa e rotineiramente associada ao uso de drogas, impulsiona uma leitura de
que sua própria existência é impura, tal qual nos lembra Mary Douglas (1985). A necessidade de uma ação
urgente exigiu uma pronta intervenção para auxiliá-la a obter tratamento, através da parceria com ONGs
paraibanas com expertise na atenção às pessoas em situação de rua, motivando-nos a considerar iniciativas
como o projeto "Médicos na Rua" da Prefeitura de João Pessoa. Essas ações visam implementar políticas de
redução de danos, inspiradas em experiências bem-sucedidas em alguns estados do Brasil. Em última análise,
almejamos contribuir para a construção de uma resposta ao HIV/Aids mais eficiente e sensível às necessidades
desses indivíduos em situação de extrema vulnerabilidade social.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Mariana dos Santos Cruz (PUC MINAS)
Resumo: Essa proposta é resultado de uma pesquisa etnográfica, em desenvolvimento, que tem como objetivo
analisar as situações sociais decorrentes do covid-19 (pós isolamento) para as pessoas que vivem nas ruas e
para os novos personagens da rua, no centro de Belo Horizonte. A pandemia gerou problemas dramáticos e
graves para os grupos em situação de vulnerabilidade, como os moradores de periferia, pobres, sem
qualificação de mão de obra, desempregados, imigrantes, entre outros (NATALINO, 2020, p.7). Esse cenário se
agravou, marcadamente por falta de trabalho e precárias condições financeiras para pagar aluguel, luz, água
e comida, contribuindo para que os novos personagens fossem viver nas ruas em abrigos improvisados, fazendo
uso dos equipamentos públicos, especialmente nos centros das cidades. Conforme a pesquisa do Instituto de
Pesquisa Econômica e Aplicada (IPEA), a população que vive e sobrevive nas ruas do Brasil cresceu 38% entre
2019 e 2022, atingindo 281,4 mil pessoas, o que denota o aumento expressivo dessa condição de vida na
sociedade. Nesse contexto, a questão que orientou essa pesquisa foi: quais são as condições das pessoas que
estão vivendo na rua no período pós isolamento social, quanto às representações sociais, os efeitos na saúde
física e mental, relações familiares, experiências de trabalho e planejamentos futuros. Podemos afirmar que
os novos personagens no centro de Belo Horizonte se encontram na faixa etária entre 18 anos a 35 anos,
população jovem, predominantemente do gênero masculino, sem formação de mão de obra especializada para o
trabalho, sem endereço fixo, drástica interrupção de vínculos sociais, escolares e familiares, apresentam
sofrimento mental, particularmente depressão e problemas clínicos. Essa condição leva os novos personagens a
demandarem aos serviços públicos de assistência social - ONG´s, Pastoral Nacional do Povo da Rua -, em busca
de formação de mão de obra para a inserção no mercado de trabalho, moradia e assistência à saúde. Em suas
narrativas, apesar da luta diária para viver e sobreviver nas ruas, é notável um empenho para construir
sociabilidades, ajuda mútua, apropriação dos espaços públicos e novas interações sociais.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Matheus de Oliveira Barros (UFS), Camilla Martins Albuquerque (UFS)
Resumo: RESUMO
INTRODUÇÃO: A pesquisa buscou aprofundar a compreensão de duas condições marcadas por processos de
subjugação, precariedade e fragilização: 1) pessoas em situação de rua e 2) o envelhecimento dessas pessoas.
O foco deu-se na análise dos desafios enfrentados por pessoas idosas em situação de rua, considerando as
condições inerentes ao envelhecimento e as estratégias de sobrevivência em um contexto de rua. A pesquisa,
visou responder: quais são os desafios enfrentados por essa população na reprodução de suas vidas? Qual o
sentido atribuído ao envelhecimento nessas condições? A abordagem levou em consideração a produção de
significados atribuídos ao envelhecimento, e teve como objetivo principal a compreensão dessa produção por
parte das pessoas idosas em situação de rua no município de Aracaju, Sergipe. É sabido que o caráter de
envelhecimento da população brasileira, de uma maneira geral, constitui as características censitárias de
nosso tempo. Neste panorama, o debate gerontológico ganha notoriedade dentro dos espaços de produção de
conhecimento, ao elucidar questões que perpassam por condicionalidades sociais, psicológicas, econômicas e
culturais. Por este caminho, o marcador etário ganha, a cada dia, centralidade nos debates, lançando para as
mais diversas relações sociais o desafio de pensar, viver e transformar a sociedade para um mundo que se
estrutura por vivências marcadas pela cultura do envelhecimento.
METODOLOGIA: Os caminhos analíticos utilizados em nossa pesquisa possibilitaram a construção etnográfica
visando 1) avaliação institucional, para compreensão do papel dos equipamentos no suporte às pessoas idosas
em situação de rua; 2) análise política e cultural objetivando a averiguação dos estruturantes sociais que
colaboram na produção de condicionalidade sociais e subjetivas que impactam no modelo de produção dos
sentidos do envelhecimento das pessoas em situação de ruas; 3) entrevistas narrativas com o intuito de
captar formas de subjetivação e as produções de sentidos relacionados ao envelhecer e elaboradas pelas
pessoas idosas em situação de rua.
RESULTADOS: Como resultado, observamos uma singular hierarquização etária na dinâmica das relações sociais
na rua, perpassando por prestígio comunitário a intensidade da vulnerabilidade/violência. Nos atentamos,
também, a respeito do impacto institucional e as especificidades que tais instituições conotam na vida
dessas pessoas, sinalizando um significativo aumento da procura e o fortalecimento do discurso de saída das
ruas. Ademais, acentuamos a construção de distanciamentos parentais, movimento fortemente influenciado por
diversos modos de abandono ou pela própria temporalidade de rua.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Matheus Moreira Santos (UFRRJ)
Resumo: Com a formalização das Comunidades Terapêuticas, antes conhecidas pelas populações periféricas do Rio de
Janeiro como casas de recuperação ou centros de recuperação, estes espaços têm sido alvos de controvérsias.
Dedicados à prática do acolhimento e tratamento de indivíduos usuários e dependentes de álcool e/ou outras
drogas, essas comunidades, que, em boa parte das vezes, possuem viés religioso, agora, sob a alcunha de
comunidades terapêuticas, atuam efetivamente no resgate e recuperação daqueles que se encontram no fundo do
poço, aplicando modelos de cuidados não convencionais se comparados aos propostos pela Medicina, Psicologia
ou Serviço Social. Além disso, as comunidades terapêuticas também desempenham direta ou indiretamente um
papel importante na gestão da violência urbana, em territórios periféricos.
Dialogando com trabalhos que qualificam a dimensão fronteiriça de equipamentos como os centros de detenção e
os abrigos, traço caminhos de análise das CTs tendo como referência a ideia de exílio (Machado, 2021). Em
consonância com Machado (2021), abordo as CTs como zonas de exílio urbano, procurando compreender de que
maneira essa perspectiva permite uma ênfase na dimensão territorial desse circuito mobilizado pelo problema
das drogas, sob o ponto de vista da expulsão e do isolamento.
Um dos desafios da gestão desses espaços é a identificação desses territórios como perigosos. Segundo Leite
(2014), o debate público sobre a violência urbana transita para um plano moral, em que as periferias urbanas
são identificadas como um território inimigo e seus moradores categorizados às vezes como vítimas, porém
mais frequentemente compreendidos como cúmplices da criminalidade. Desse modo, pretendo investigar as
práticas, tensões e mediações produzidas no cotidiano das pessoas vinculadas a duas comunidades terapêuticas
localizadas nos bairros de Santa Cândida e Estrela do Céu, município de Itaguaí. Abrigados, ex-abrigados,
familiares, igrejas e outras instituições participam desta rede de sociabilidades, negociando e (re)fazendo
a trama da vida urbana, elaborando soluções destinadas aos que sobram ou excedem na cidade (Fernandes,
2018), possibilitando (auto)preservação da integridade e viabilizando possibilidades de (re)começos.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Maysa Luana Silva (UFABC)
Resumo: A pesquisa propõe evidenciar as violações de direitos humanos que atravessam a vida de idosos/as em
situação de rua, no município de São Bernardo do Campo/SP. Ao situar a insuficiência de políticas públicas
voltadas para o acesso à moradia digna e o impacto na qualidade de vida destes idosos. Através da
etnografia, a pesquisa analisa o processo de saída das ruas de idosos/as, para morar em pensões e cortiços
que apresentam precariedade habitacional. A proposta de intervenção é desenvolver a cartografia social de
suas moradias e territórios de ambiência, para que eles possam indicar quais as violações de direitos e
quais seriam as soluções e melhorias para avançar na qualidade de vida durante o processo de envelhecimento.
O uso do mapeamento participativo possibilita ações realizadas conjuntamente aos idosos, para evidenciar de
que forma ocorrem às mobilidades e acessos no território, as condições de moradia e a relação com as
políticas públicas de garantia de direitos que atuam nestes territórios. Assim, caracterizar de que forma
estas violações de direitos impactam no direito à cidade e no acesso à moradia digna.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Nildamara Theodoro Torres (Iniciativa PIPA)
Resumo: Viver na rua representa ocupar espaços públicos que também refletem um tipo de sociabilidade, como
compartilhar um beco, uma praça, um viaduto, partilhar roupas, alimentos, bebidas. A rua é atravessada por
mobilidades, atividades e sujeitos, todos em movimento e participando de complexas redes de relações. O
objetivo deste trabalho é discutir as dinâmicas de circulação e permanência dos sujeitos em situação de rua
nas periferias da cidade, assumindo as Comunidades Terapêuticas como alternativa de moradias temporárias. A
presença das CTs reflete um tipo de sociabilidade muito específica que, de determinadas formas, tem a ver
com o sentido de casa, família e acolhimento, mas que são, ao mesmo tempo, atravessadas por uma
temporalidade específicas de espaços como estes, temporários e com um conjunto de regras. Trago como ponto
central a CT localizada em um bairro periférico de Volta Redonda para pensarmos sobre as dinâmicas de
circulação e as múltiplas possibilidades de habitação, circulação e permanência em contextos de
precariedade. O presente trabalho é fruto de uma pesquisa qualitativa que venho desenvolvendo a partir da
cidade de Volta Redonda em diferentes fases. Num primeiro momento, acompanho e traço diálogos com
assistentes sociais do Centro Pop, com o objetivo de entender a complexidade do fenômeno da situação de rua
naquele território. Em um segundo momento, acompanho, tanto presencial quanto virtualmente, a rede de
doações de comida que circulam pela cidade distribuindo alimentos, água e roupas para, então, chegar a
sujeitos específicos que vivenciam as ruas, e que, de determinada forma, se tornaram meus interlocutores por
um breve período. Este é um trabalho composto a partir de diálogos com os principais interlocutores
integrantes de uma CT na cidade: Dona Ana e Márcio. Volta Redonda atrai um número considerável de grupos de
pessoas em situação de vulnerabilidade e/ou em situação de rua, com objetivos de, principalmente, ganhar a
vida. Ao mesmo tempo, a situação de rua é alvo de políticas e ações de instituições públicas, religiosas e
de grupos de voluntários, que visam amenizar a situação de vulnerabilidade de tais sujeitos. Vale ressaltar
que a cidade propõe a integração entre medidas assistenciais e os dispositivos de interceptação, controle e
limpeza dos espaços públicos e, também por isso, há uma extensa rede voltada para o cuidado com estes
sujeitos. Neste imbricamento, encontro a atuação das CTs, que se apresentam como instituições temporárias de
acolhimento e apresento reflexões sobre o cotidiano fragmentado de sujeitos que vivenciam o espaço das ruas
entre a circulação e o confinamento, reconfiguram as noções de casa e evidenciam o descompasso e a
fragilidade das instituições e produzem vida a partir da ausência.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Raquel Martini Carriconde (Secretaria Educação Municipio Rio de Janeiro)
Resumo: O presente trabalho parte de etnografia realizada em abrigos municipais do Rio de Janeiro, entre os anos
de 2015 e 2017, onde busquei mapear alguns dos mecanismos acionados para produzir e gerir corpos
precarizados em suas circulações e encontros com o Estado, além de pensar sobre que cidade e que Estado se
fazem para gerir esses indesejáveis das várias ordens vigentes.
Para esta apresentação, tomo como eixo de apresentação o Projeto Circulando projeto social direcionado a
pessoas em situação de rua que ocupavam os abrigos da cidade do Rio de Janeiro entre os anos de 2013 e 2016
para pensar sobre a experiência dessas pessoas em suas circulações pela cidade. Assim, busco lançar luz
sobre os dispositivos para gerir essas circulações; sobre as estratégias mobilizadas para minimizar os
impactos da circulação dessas existências indesejadas sobre as outras circulações, as boas, que devem ser
maximizadas; sobre os dispositivos acionados para produzir uma circulação mediada por múltiplas facetas do
poder tutelar (como nos fala Antônio Carlos Souza Lima); e sobre os distintivos desse poder tutelar que
produz uma circulação controlada e vigiada sobre diferentes espaços urbanos.