Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 101: Trabalhos etnográficos com população em situação de rua: modos de existir/resistir, políticas, governos e agências
O luto pela perda de filhos vivos: emoções e efeitos da retirada compulsória de filhos de mulheres com
trajetória de rua
O intuito deste texto é o de aprofundar a reflexão acerca dos efeitos da retirada compulsória dos filhos
no cotidiano das mulheres com trajetória de rua. A discussão é parte da pesquisa de doutorado em andamento,
cujo objetivo consiste em compreender as complexidades - que comumente ficam ocultas - presentes na prática
de afastamento compulsório de filhos de famílias marcadas socialmente por classe e raça. Em que pesem os
marcos legais estabelecidos e os direitos conquistados pela população em situação de rua, como é possível
que ocorram reiteradamente violências como essas e tantas outras diuturnamente com essas pessoas? É uma das
perguntas centrais da tese. Para contemplar possíveis respostas, o propósito está em refletir sobre a
categoria população em situação de rua no sentido de problematizá-la enquanto heterogênea, plural e
complexa. Dessa forma, apresentarei dados da etnografia desenvolvida com mulheres com trajetória de rua com
a finalidade de enfatizar as emoções por elas manifestadas durante o processo de perda do poder familiar e
após sua efetivação, em especial o luto. Aqui uma espécie de luto pela perda do filho vivo, expressão
êmica, que aciona incertezas acerca do destino do bebê/criança e impõe à mãe conviver com esta falta.
Diferentemente de filhos falecidos, este não é um luto reconhecido, é um luto não autorizado, afinal a
criança/bebê está viva e supõe-se bem cuidada - algo que supostamente a mãe biológica não seria capaz de
fazer. Nesse sentido, a presente comunicação apresenta cenas e histórias de campo na intenção de discutir de
que modos trabalham emoções como inconformidade e raiva, mobilizadas por essas mães enlutadas, sobre as
quais pesa a obrigação da aceitação sob o argumento de melhor interesse da criança. Considerando que as
experiências de luto são sempre singulares, neste caso, das mães órfãs de filhos vivos, importa atentar para
o impedimento político do direito a esse luto e também como tais vivências impactam a vida dessas mulheres,
impossibilitadas de realizá-lo.
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