Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 101: Trabalhos etnográficos com população em situação de rua: modos de existir/resistir, políticas, governos e agências
Comunidades terapêuticas: articulações do religioso e secular na experiência ordinária
Com a formalização das Comunidades Terapêuticas, antes conhecidas pelas populações periféricas do Rio de
Janeiro como casas de recuperação ou centros de recuperação, estes espaços têm sido alvos de controvérsias.
Dedicados à prática do acolhimento e tratamento de indivíduos usuários e dependentes de álcool e/ou outras
drogas, essas comunidades, que, em boa parte das vezes, possuem viés religioso, agora, sob a alcunha de
comunidades terapêuticas, atuam efetivamente no resgate e recuperação daqueles que se encontram no fundo do
poço, aplicando modelos de cuidados não convencionais se comparados aos propostos pela Medicina, Psicologia
ou Serviço Social. Além disso, as comunidades terapêuticas também desempenham direta ou indiretamente um
papel importante na gestão da violência urbana, em territórios periféricos.
Dialogando com trabalhos que qualificam a dimensão fronteiriça de equipamentos como os centros de detenção e
os abrigos, traço caminhos de análise das CTs tendo como referência a ideia de exílio (Machado, 2021). Em
consonância com Machado (2021), abordo as CTs como zonas de exílio urbano, procurando compreender de que
maneira essa perspectiva permite uma ênfase na dimensão territorial desse circuito mobilizado pelo problema
das drogas, sob o ponto de vista da expulsão e do isolamento.
Um dos desafios da gestão desses espaços é a identificação desses territórios como perigosos. Segundo Leite
(2014), o debate público sobre a violência urbana transita para um plano moral, em que as periferias urbanas
são identificadas como um território inimigo e seus moradores categorizados às vezes como vítimas, porém
mais frequentemente compreendidos como cúmplices da criminalidade. Desse modo, pretendo investigar as
práticas, tensões e mediações produzidas no cotidiano das pessoas vinculadas a duas comunidades terapêuticas
localizadas nos bairros de Santa Cândida e Estrela do Céu, município de Itaguaí. Abrigados, ex-abrigados,
familiares, igrejas e outras instituições participam desta rede de sociabilidades, negociando e (re)fazendo
a trama da vida urbana, elaborando soluções destinadas aos que sobram ou excedem na cidade (Fernandes,
2018), possibilitando (auto)preservação da integridade e viabilizando possibilidades de (re)começos.