Grupos de Trabalho (GT)
GT 088: Processos e histórias transfronteiriças de coletividades em movimento - Os desafios da mobilidade indígena na atualidade..
Coordenação
Renato Monteiro Athias (UFPE), José Exequiel Basini Rodriguez (UFAM)
Resumo:
Todas as pessoas se movem. A mobilidade é uma condição humana. Pelo menos isto é fortemente apoiado por estudos antropológicos referentes às dinâmicas das relações interétnicas, geo espaciais, bem como, as geopolíticas em transformações na atualidade.
Esta proposta de GT visa atualizar a discussão antropológica sobre os atuais movimentos de coletividades indígenas que mostram uma especificidade com relação com as narrativas mitológicas, histórias de deslocamentos territoriais, itinerários e trajetórias de vida sobre movimentos na atualidade geo espacial. Dentro desta abordagem abrimos o debate para de um lado mapear essas mobilizações na história e etno-historia dos povos originários, em algumas regiões de contato interétnico e muito linguístico, debater alguns elementos críticos, relativos ao uso de classificações legais e justificativas políticas de alguns governos, para prevenir ou adiar a entrada de pessoas em movimentos nas fronteiras ditas oficiais e nas fronteiras não oficiais. E, sobretudo, elencar as diversas motivações coletivas para a realização de mobilidades no contexto de uma região e sua geopolítica, especificamente pode-se falar das regiões do Noroeste Amazônico especificamente, as regiões das fronteiras com o estado de Roraima, as regiões amazônicas da tríplice fronteiras no Rio Solimões, as fronteiras nas região do Estado de Rondônia tanto com a Bolívia, quanto com o Peru, ou ainda as fronteiras dos estados do Mato Grosso e Rio Grande do Sul.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Alessandro Ricardo Pinto Campos (UFPA)
Resumo: Na sua língua do tronco Tupi, a palavra Kaapor, significa gente que mora na mata. Esta TI compreende
parte dos municípios de Araguanã, Centro Guilherme, Centro Novo do Maranhão, Maranhãozinho, Nova Olinda do
Maranhão, Santa Luzia do Paruá e Zé Doca, perfazendo uma extensão de 5.304 km2. Os Kaapor dividem esse
território com outros povos, estabelecendo relações próximas como casamentos interétnicos e também de
conflito, são eles os Tembé, Awa-Guajá, (também de língua Tupi) e os Timbira (de língua Jê).
Ao longo dos tempos, toda esta região tem sido cenário de conflitos interétnicos provocados sempre por
invasões por não indígenas. Ainda no século XIX, esses conflitos estavam vinculados à intensificação não
controlada de economias extrativas, tais como garimpo de metais preciosos. Cabe ressaltar que a esta
atividade extrativista soma-se a sempre presente exploração madeireira e pecuária. Em 1873 estes episódios
forçaram o deslocamento dos Kaapor da região do rio Piriá, onde viviam, para a região do rio Gurupi onde
estão atualmente.
O povo Kaapor se organizou em uma forte Associação presidida pelo cacique geral Iracadju, Associação
Kaapor Ta Hury do Rio Gurupi que bravamente resistindo às constantes invasões, sobretudo através de duas
táticas: a criação de aldeias em pontos estratégicos e a criação do projeto guardiões da floresta (uma
equipe treinada e equipada para defender seu território de invasores. Com ações periódicas esses guardiões
passam vários dias na mata limpando suas fronteiras, destruindo pontes clandestinas e sempre em contato com
a Policia Federal e FUNAI.
Na fala de Iracadju: Os guardiões foram formados assim. Nós Kaapor, nós jovens... não é só nós jovens. Os
mais velhos vinham fazendo monitoramento do seu território. Desde quando vai caçar antigamente, levava toda
a família, já faz parte de monitoramento. Nós só mudamos o nome. Hoje os Guardiões. Só mudamos a atividade
também. Por exemplo, antigamente Kaapor não fazia picada grande. Porque? Porque não tinha invasor, não
tinha caraí perto. Eles caçavam normal. A família, um mês caçando, chegava com um bocado de caça. Então só
mudamos o nome. Porque hoje nós criamos guardião? Guardião da floresta. Assim como sou coordenador geral da
Associação, eu cuido mais da parte de gestão da Associação, projeto... alguns recursos... quando a gente faz
o plano, porque os Guardiões já vinham trabalhando. Nós vínhamos trabalhando no monitoramento. Isso sem
apoio. Sem combustível, sem carro, sem drone, sem câmera, sem nada. Agora estamos equipados, Este artigo
trata destas principais táticas e tentativas de resistência e monitoramento de seu território.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Arturo Manuel Gonzalez Rosas (IPEC)
Resumo: A apresentação é resultado de um trabalho de campo de 18 meses na região da tríplice fronteira da
floresta amazônica em três comunidades Ticuna que compartilham identidade étnica, mas estão localizadas em
três estados-nação diferentes: Brasil, Peru e Colômbia.
É melhor caracterizar o cenário da minha investigação como uma região transfronteiriça onde as pessoas se
deslocam ou viajam através de diferentes tipos de limites. Estas travessias reforçam, desgastam e moldam
diferentes realidades. A região tríplice fronteira amazônica não é apenas a confluência de três entidades
nacionais, mas uma região com dinâmicas e características próprias, onde fatores locais, nacionais e
internacionais se entrelaçam para criar dinâmicas regionais distintas. Os elementos determinantes dessas
dinâmicas giram em torno da delimitação de ordens sociais diferenciadas que o povo Ticuna domina e por meio
das quais opera. As travessias destas realidades são marcadas por limites de natureza diversa: fronteiras
políticas, económicas e socioculturais.
Utilizando descrições etnográficas, abordarei os diferentes níveis em que os projetos nacionais instituem
ordens administrativas e territoriais dentro de suas jurisdições, e o impacto cotidiano que estas têm sobre
os Ticuna. A noção de ordem interna liga estas regiões periféricas à nação e ao seu centro. A etnografia é
utilizada para problematizar a presença do Estado onde diferentes políticas indigenistas refletem os níveis
de autonomia em que os Ticunas são incorporados aos projetos nacionais.
As fronteiras dividem e diferenciam três modelos diferentes de territorialidade Ticuna com diferentes
estatutos jurídicos e direitos legais diferenciados sobre suas terras. Este mosaico de diferentes ordens
soberanas é desafiado pelas práticas quotidianas de pessoas que desafiam continuamente estes limites,
corroendo as imposições do Estado, contrabandeando mercadorias, tendo identidades diferentes ou construindo
comunidades transnacionais baseadas em laços familiares.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Daniel Tavares dos Santos (FUNAI)
Resumo: Segundo os dados Censo Demográfico 2022, o estado do Amazonas possui o maior contingente populacional
indígena do Brasil, com mais de 490 mil indígenas, correspondendo à cerca de 28,98% da população indígena do
país. Destes, cerca de 71 mil vivem na cidade de Manaus que, assim, abarca a maior concentração populacional
de indígenas por município. Manaus concentra, também, quase 50% da população do estado do Amazonas, com mais
de 2.000.000 de habitantes.
Essa concentração populacional também se manifesta em uma alta concentração de equipamentos sociais,
educacionais e de saúde, que relega grande parte do interior do estado do Amazonas à uma dependência
institucional frente à capital. É em Manaus que se encontram, por exemplo, as unidades de saúde de média e
alta complexidade; os campi universitários com maior oferta formativa para os estudantes; os equipamentos de
cumprimento de medidas socioeducativas, o aeroporto com saída para outros estados e países, entre outros.
Atrelado a essa concentração há uma densa mobilidade de coisas e pessoas, incluso aí os indígenas.
Neste trabalho, pretendo refletir acerca dos deslocamentos de indígenas, mediados/realizados por
instituições, sejam elas governamentais ou não, e como as redes de proteção, promoção e garantia de direitos
sociais e de cidadania são articuladas e/ou se articulam (ou não) para o atendimento e suporte à estes
indígenas. Para tanto irei utilizar, para análise, de dois casos que considero emblemáticos e que
reverberaram essa (des)articulação interinstitucional. São eles: i) O caso do indígena Tadeo Kulina (da
etnia madija kulina), residente em Envira-AM, na fronteira com o estado Acre, brutalmente assassinado
enquanto acompanhava sua esposa em uma maternidade da cidade de Manaus, com deslocamento realizado pela
Secretaria de Estado de Saúde do Amazonas e; ii) o dos jovens indígenas da região do Alto Rio Negro que,
residentes em São Gabriel da Cachoeira, foram deslocados institucionalmente pela Associação Solidária
Humanitária do Amazonas ASHAM que, sob comando de missionários islâmicos turco, mantinham os indígenas em
condições precárias e em regime de internato religioso na cidade de Manaus, com o argumento de facilitação
do acesso à educação e à formação profissional.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Diego Omar da Silveira (UEA)
Resumo: O presente trabalho discute a construção e a repercussão da exposição intitulada Hixkaryana: história e
cultura indígena em Nhamundá. Trata-se de um projeto desenvolvido no âmbito da Lei Aldir Blanc, com
recursos do edital Amazonas Criativo (2021-2022) da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Governo do
Estado do Amazonas. Sua proposição baseou-se no diagnóstico de que a população dessa pequena cidade situada
na divisa do estado com o Pará conhece e dialoga muito pouco com os Hixkaryana, etnia que habita os rios
Nhamundá e Jatapu e cuja Terra Indígena Nhamundá-Mapuera ocupa parte significativa do município. A primeira
etapa do trabalho, apoiada pela Prefeitura de Nhamundá, consistiu em percorrer as treze aldeias Hixkaryana,
produzindo uma vasta documentação visual; o que, por sua vez, subsidiou segunda etapa, de pesquisa e seleção
de material para a montagem da exposição em sala anexa ao palco de eventos da principal praia da cidade
local visível e de fácil acesso à maioria dos habitantes da área urbana. Além das fotografias, nessa etapa
foram agregados dados demográficos, mapas, objetos da cultura material e pequenos relatos de indígenas. Por
fim, apresentamos o resultado da exposição e sua repercussão entre os visitantes em geral e estudantes da
rede pública, o que nos tem permitido também refletir sobre a soma de esforços entre entidades indigenistas
no caso de Nhamundá, é marcante a presença do Instituto de Pesquisa e Formação Indígena (IEPÉ) e
universidade no sentido de produzir também sobre os povos indígenas uma história pública, voltada não apenas
para acadêmicos, mas a públicos cada vez mais amplos.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
José Exequiel Basini Rodriguez (UFAM)
Resumo: La discusión sobre pueblos indígenas y estados nacionales, así como indígenas en situación en frontera,
vienen siendo temáticas recurrentes en los grupos de trabajo y otras modalidades de discusión promovidas
dentro de las reuniones de antropología regionales y nacionales.
En esta oportunidad proponemos una reflexión diferenciada a nivel continental en relación a la
representatividad, auto-afirmación y autonomías de los pueblos indígenas así como su relación con los
estados nacionales y actores não indígenas (indigenismos). La legitimidad de unos y otros puede verse a
través del concepto de territorios trans-fronterizos y de seguridad, aspectos que también podrían
invertirse, o ser reversibles, para un pensamiento de la temporalidad y la diferencia que amplié las
posibilidades de convivencia de los pueblos tradicionales en los contextos actuales.
En otras palabras, este trabajo trae la contribución de representantes indígenas de diferentes pueblos en
situación trans-fronteriza, y de modelos de intervención indigenista en diálogo con la antropología
contemporánea y las comunidades académicas del sur continental.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Lirian Ribeiro Monteiro (UFBA)
Resumo: Os Awa Guajá, um povo de recente contato, são exímios caçadores da Amazônia Maranhense. Desde a década
de 80, eles passaram por mudanças drásticas em seu estilo de vida. Nesse período, foram transferidos do
interior da floresta para uma área mais próxima dos povoados não indígenas do entorno da Terra Indígena
Caru, que é seu território homologado e compartilhado com o povo Guajajara e grupos isolados. Segundo os
Awa, a partir do processo de aldeamento onde hoje localizam-se as aldeias Awá e Tiracambu - passaram a
viver de forma mais aglomerada, diferente de sua própria organização espacial no interior da floresta, onde
viviam mais dispersos em grupos familiares pequenos. Nessa transição, da vida em floresta para a vida em
aldeia, começaram a se acostumar com a comida dos Karaí (não indígenas), tal como carne de gado, frango,
arroz, feijão, sal, açúcar, café e farinha; a morar em casas de pau a pique e a ter contatos cada vez mais
frequentes com os não indígenas. Com as mudanças em seu estilo de vida, as doenças se proliferaram, e com
isso, surgiu a necessidade de atravessar da aldeia à cidade para o atendimento hospitalar. Este trabalho
apresenta os principais resultados das discussões realizadas com os Awa Guajá, entre 2018 e 2023, sobre
processos de cura e adoecimento com relação entre três mundos distintos: floresta-aldeia-cidade,
compreendendo aqui a floresta como o mundo Awa, a cidade como o mundo dos não indígenas e a aldeia como um
espaço de fronteira.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Marcos Flávio Portela Veras (UNIVERSIDADE EVANGÉLICA DE GOIÁS)
Resumo: Essa comunicação aborda algumas reflexões preliminares de uma pesquisa sobre a presença/ausência
indígena na história ambiental de Goiás no âmbito de uma pesquisa de Pós-Doutorado. A baixa densidade
demográfica indígena neste estado brasileiro suscita questionamentos e aponta para processos de
invisibilidade histórica em virtude de intervenções sociais dos mais diversos agentes de intervenção. Sendo
uma das regiões onde o agronegócio mais se expandiu, especialmente a partir da Marcha para o Oeste produzida
pelo Estado Novo, dentro das estratégias capitalistas de incorporação de novos territórios, inevitavelmente
as populações tradicionais teriam sido pressionadas a se dispersarem ou se submeterem. A falta de
informações sobre a presença indígena nos estudos de história ambiental fomenta investigações que elucidem
trânsitos e mobilidades que lhes estejam associados. Com o propósito de compreender os processos sociais
envolvendo as populações originárias de Goiás nas relações com os agentes de intervenção que resultaram em
sua população atual, proponho uma aproximação epistemológica do conceito de fronteira utilizada na história
ambiental, uma abordagem relacional e móvel do território e os processos históricos relacionados a história
indígena. Logo, pensar as mobilidades indígenas que já foram atestadas em outras áreas etnográficas podem
ser caminhos pertinentes para elucidar a questão levantada.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Orivaldo Nunes Junior (UFAM)
Resumo: Os Guarani da Bacia do Rio da Prata viveram com a maior parte de seu território sob a ocupação
portuguesa desde 1514 e espanhola desde 1542. O vice-reinado do Peru, capital em Lima, comandava a Audiência
e Chancelaria Real da Prata dos Charcas, o mais alto tribunal da Coroa Espanhola na zona conhecida como Alto
Peru (hoje Bolívia), e a Gobernacion del Guayrá (hoje Paraguai). Até 1776, foi parte do Vice-reino do Peru,
logo foi parte do Vice-Reino do Rio da Prata. Passou a ser a Intendência de Assunção do Paraguai em 1782, o
que incluía os trinta povo das Missões em território Guarani, após a resistência contra os ataques de
Portugal e Espanha para expulsar os Guarani do oriente para o ocidente do Rio Uruguai, chamada de Guerra
Guaranítica (1750 a 1755). A disputa de fronteiras entre os reinos de Portugal e Espanha gestaram o Mapa das
Cortes (1749) que balisou o Tratado de Madrid (1750) que instituiu o princípio de direito romano "uti
possidetis" segundo o qual os que de facto ocupam um território possuem direito sobre este, uma espécie de
Usucapião medieval. Com isto, portugueses e espanhois tentavam comprovar que não haveria "terra nullius"
(terra que pertence a ninguém) nos territórios fronteiriços e, assim, reduzir a possibilidade de guerras de
impérios. Após as Guerras Napoleônicas (1810) destituirem o poderio imperial espanhol, os vice-reinados nas
américas iniciaram suas disputas territoriais internas. O vice-reinado do Rio da Prata, a partir de sua
capital Buenos Aires, buscou independência e compôs as Províncias Unidas do Rio da Prata, anexando a
Gobiernacón del Guayrá que resistiu buscando sua própria independência (1811). As disputas territoriais
comandadas desde Rio de Janeiro, Assunção, Buenos Aires e Montevideo, tentaram abocanhar o espólio espanhol
numa disputa que durou décadas de resistência, culminando na Guerra do Paraguai (1864-1870) que reduziu não
apenas as terras, mas as vidas da população Guarani que, mais uma vez, resistiu em suas terras divididas
entre Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai. Os indígenas da Bacia do Rio da Prata até a atualidade resistem
à ocupação de seu território e aguardam o novo ciclo cósmico de destruição e recriação, chamado por
etnólogos de Yvy Mara'ey (Terra sem males), onde terão oportunidade de reabitar seu território tradicional,
o Yvyrupá (berço da terra) conforme fora criado por Nhanderu Nhamandu, o primeiro, criador dos Tekoá, local
onde se vive conforme as regras, o Tekó, mantendo os corpos, Ekó, purificados para serem habitados pelos
Nhe'e, conforme demonstram o "uti possidetis" Guarani na publicação do Mapa Guarani Digital (2016). A teoria
da multiescalaridade fractal pode auxiliar na compreensão dos ciclos micro, médio e macro que compõe a
resistência Guarani no espaço e no tempo.
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
Sandro Martins de Almeida Santos (UFRR)
Resumo: Desde 2016, um coletivo indígena vem chamando atenção de pesquisadores e autoridades brasileiras por
suas práticas migratórias. Eu mesmo venho acompanhando o processo desde 2017. Trata-se do povo Warao,
originário da Venezuela, que se encontra esparramado hoje por quase todos os estados do Brasil. A
comunicação tem como objetivo apresentar reflexões acerca das conexões que os Warao vêm estabelecendo entre
seu território tradicional, no delta do rio Orinoco, e uma série de cidades brasileiras, tais como Boa
Vista, Manaus, Teresina, João Pessoa, Belo Horizonte e outras. Os caminhos Warao são pavimentados,
sobretudo, por suas relações de parentesco e também por suas práticas xamânicas ligadas ao adoecimento e à
cura. A ferramenta analítica dos circuitos, advinda da antropologia urbana, é empregada como tentativa de
acompanhar não somente os caminhos Warao, mas compreender o que trafega e dá sentido à conexão entre
pessoas, coisas e lugares, buscando evitar a dicotomia enganosa entre indios aldeados" e índios na cidade".
Os Warao chegaram para fazer parte das paisagens urbanas brasileiras e vêm constituindo uma multiplicidade
de circuitos envolvendo indígenas e não indígenas: parentesco, xamanismo, artesanato, trabalho de rua,
movimento indígena, entre outros. Evidencia-se que a intensidade das chegadas e partidas Warao não obedece a
uma lógica utilitarista. Pesquisas recentes, além das minhas próprias, vêm demonstrando como os Warao aliam
as necessidades de sobrevivência com as suas obrigações de parentesco, mobilizando e fazendo chegar coisas e
informações a pessoas que vivem em diferentes partes do Brasil e na Venezuela. O destaque nesta comunicação
são os processos relativos à circulação de cuidados (idosos, crianças e enfermos), às trocas matrimoniais e
ao pagamento de dívidas com "brujos" (cura e proteção). As chegadas de grandes contingentes, as partidas
inusitadas e o retorno eventual à Venezuela, aspectos que causam confusão entre as equipes responsáveis
pelos acolhimentos institucionais, oferecem complexidade à compreensão do fenômeno que abarca dois problemas
prementes de política pública no Brasil: a migração transnacional e o direito dos povos indígenas em
situação urbana. Desde que ganharam visibilidade no Brasil, a partir de 2017, os Warao vêm sendo tratados
pelas autoridades como migrantes e refugiados. Acessam políticas para migrantes e se somam aos povos
originários do Brasil na denúncia de uma violência histórica: a inexistência de políticas diferenciadas para
indígenas em contextos urbanos.
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