ISBN: 978-65-87289-36-6 | Redes sociais da ABA:
Mesas Redondas (MR)
MR 61: Por uma antropologia da agroecologia: desafio urgente perante o Capitaloceno
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Coordenação:
Spensy Kmitta Pimentel (UFSB)
Debatedor(a):
Joelson Ferreira de Oliveira (Teia dos Povos)
Participantes:
Mariana Cruz de Almeida Lima (UNICAMP)
Priscila Seoldo Marques (Fiocruz)
Spensy Kmitta Pimentel (UFSB)

Resumo:
A mesa redonda propõe-se a apresentar trabalhos recentes que demonstram o potencial da pesquisa antropológica junto às iniciativas agroecológicas. Apesar do crescente destaque que tem ganhado no debate público contemporâneo, a agroecologia é uma notável ausência nas discussões da Reunião Brasileira de Antropologia. Apenas algumas apresentações esparsas podem ser encontradas nos anais das RBAs anteriores. A atividade reunirá algumas pesquisas antropológicas recentes sobre o tema, com o intuito de estimular a futura formação de uma rede de investigadores. Entendemos que, a partir da emergência climática que assola o planeta, movimentos populares de todos os continentes percebem na agroecologia uma alternativa concreta à falência dos modelos vigentes na agricultura mundial, surgidos a partir da chamada Revolução Verde (sic). Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, das Nações Unidas, também apontam para a necessidade global de buscar modelos sustentáveis de agricultura para que se possa reduzir as desigualdades e enfrentar a fome. Trata-se, ainda, é bom dizer, de um termo em disputa, mas cuja defesa tem sido assumida por numerosos movimentos populares. Como debatedor, a mesa terá o líder camponês Joelson Oliveira Ferreira, expoente do pensamento agroecológico no país e reconhecido pela UFMG por seu notório saber na área.

Trabalho para Mesa Redonda
A persistência da eritrina segundo uma “Política com mato dentro”: um ou dois problemas da ‘vida’ nas ruínas do capitalismo
Mariana Cruz de Almeida Lima (UNICAMP)
Resumo: Árvores centenárias, na maioria nativas da Mata Atlântica, aliam-se a bananeiras, cacaus, cupuaçus. Múltiplas mãos prepararam cuidadosos berços para que elas, agora pequenas mudas, cresçam, floresçam e frutifiquem, zelando umas das outras, de gentes, bichos e demais seres outros-que-humanos. Sem Terras, pessoas negras, indígenas, pesquisadoras e militantes populares se reúnem em volta de um futuro em que seja possível “trabalhar mais com a cabeça, descansar os braços e alimentar a barriga”. Em uma pausa do trabalho na roça por vir, nossos olhos percorrem uma paisagem verdejante e sinuosa salpicada de pequenos pontos avermelhados. São flores de eritrina - “coisa de fazendeiro”. Na região sul da Bahia, a persistência desta árvore sinaliza a longevidade de uma guerra ainda em curso. Ela também condensa a expressão espacializada do controle exercido, até quase a virada do século XXI, por uma aliança entre latifundiários, agências estatais e ciência. Nesta comunicação, argumento que movimentos de luta por terra e território não são os únicos coletivos a reivindicar o entrelaçamento entre a vida humana e outra-que-humana como condição de origem e continuidade da existência no planeta. Seus maiores inimigos há muito desenvolvem arranjos técnico políticos que visam subjugar processos vitais reduzindo-os a meros meios de extração de valor. Tendo em vista que o capitalismo produz, com cada vez mais frequência e intensidade, “arranjos mais-que-humanos”, como resistir à sua captura vitalista? E como, ao fazê-lo, defender a terra e os povos que dela vivem? Estas questões ganham corpo e constituem a agroecologia cultivada na região pela Teia dos Povos. Tal “política com mato dentro”, como às vezes é chamada, não se reduz a um conjunto de técnicas de cultivo agrícola, mas se volta a alguns modos de relação com a terra e as plantas para criar um arranjo existencial capaz de barrar o avanço da produção de ruínas capitalistas. Assim, a partir de provocações suscitadas ao longo de meu trabalho etnográfico e militante junto a habitantes do Assentamento Terra Vista, busco mapear o contexto de atuação da eritrina e suas repercussões em diferentes escalas e temporalidades. Por fim, reflito sobre alguns dos modos pelos quais um diálogo com a “política com mato dentro” desestabiliza categorias nativas da própria antropologia. Se, como sugeriu Mestre Joelson, “a enxada é ferramenta para amansar antropólogos”, como uma etnografia “calejada” pode contribuir para a compreensão do vitalismo capitalista e para a luta por terra e território?

Trabalho para Mesa Redonda
Por uma antropologia da agroecologia como práticas insubmissas diante das políticas neoliberais
Priscila Seoldo Marques (Fiocruz)
Resumo: Propor um diálogo entre a antropologia e a agroecologia tem se mostrado caminho importante na trajetória de alguns antropólogos interessados em debater um campo tão significativo social e ambientalmente quanto a agroecologia. A agroecologia tem se destacado como tecnologia social e força propulsora para impactos positivos no que diz respeito aos grupos de populações tradicionais e indígenas, que, oprimidos historicamente pelas políticas neoliberais, resistiram e mantiveram tecnologias ancestrais de cuidado e manutenção da terra. Essa interseção de áreas de conhecimento é desafiante e ao mesmo tempo necessária nestes tempos de devastação e apropriação da natureza enquanto mercadorias. Em nossa apresentação, traremos algumas reflexões iniciais de cunho antropológico e alguns aportes teóricos, intentando dialogar com aspectos sociopolíticos, ambientais, biofísicos presentes nos estudos transdisciplinares do campo extenso em que a agroecologia se insere: as concepções de territórios sociais, proposta por Paul Little, abarcando as dimensões do Bem Viver tratadas por Aníbal Quijano e Alberto Acosta, assim como perspectivas descolonizadoras de Mbembe e Santos. Esses autores tratam, em certa medida, de possíveis construções desde ações contra-hegemônicas, ou seja, alternativas ao sistema neoliberal (este que representa a exclusão, desigualdade e opressão de muitos povos que trataremos ao longo do texto como à margem do sistema, com suas lutas e modos de existir invisibilizados por séculos). Ainda partindo como referencial teórico em relação ao tema da agroecologia, dialogaremos com Siliprandi, Caporal, Costabeber e Altieri para abrir o campo de reflexões transdisciplinares, e Tsing com sua perspectiva sobre as interações multiespécie.

Trabalho para Mesa Redonda
Por que a agroecologia anuncia devires para a antropologia
Spensy Kmitta Pimentel (UFSB)
Resumo: A apresentação buscará discutir os impactos do contato com a agroecologia para a antropologia, e os caminhos possíveis diante desse bom encontro, que, do nosso ponto de vista, tem o potencial de revolucionar a disciplina. Partimos da constatação de que a agroecologia opera como um conector cosmopolítico, propiciando a possibilidade de novas alianças entre os mais distintos povos e grupos sociais. A inspiração para essa análise provém da observação do papel-chave que a agroecologia tem assumido nas pautas de diversos movimentos latino-americanos altamente relevantes, sobretudo os ligados à Via Campesina. Nas últimas décadas, os devires e afetos gerados ao longo da pesquisa antropológica têm sido objeto de intenso debate acadêmico. Entendemos que o campo da agroecologia pode apontar caminhos para a formação de novas alianças entre campo e cidade, entre populações camponesas, tradicionais e urbanizadas, de tal forma a colaborar no enfrentamento do difícil cenário atual, relacionado à crise climática. Essa aproximação, porém, impõe diversos desafios de ordem metodológica e epistemológica à antropologia, os quais discutiremos durante a mesa-redonda.