Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 034: Casas, cozinhas, quintais e suas agências em coletivos quilombolas, sertanejos, pescadores, indígenas e camponeses
Pia, faca, fogão e rodo; o corpo e a cozinha
Descuidou-se e a faca picou a ponta do dedo. Estava com pressa, pegou a forma e queimou mãos nuas. Não ouviu o pino da panela de pressão soltar e ela explodiu. Esqueceu-se da hora, passou o dia todo em pé e as pernas não suportam as escadas. Na cozinha, a todo momento, estamos descaracterizando algo vivo para torná-lo comestível. O corpo nessa relação sempre é testado até o seu limite. E geralmente falha. Mesmo vivendo em tempos de glamourização da profissão de chef, o serviço na cozinha, como os outros trabalhos manuais no Brasil, geralmente é delegado à uma classe mais pobre. Ao contar alguns acontecimentos ocorridos na Cozinha da Ocupação 9 de Julho, onde trabalhei junto de mulheres e homens que viviam na ocupação, analisarei com Hartman (2022) sobre o trabalho manual e sobre o corpo negro feminino como colônia para pensar nas prefigurações (Paternani, 2016) das mulheres negras associadas aos cuidados domésticos e culinários (Machado, 2022). Com ajuda das minhas vivências junto a Nice, procurarei focar nessas miudezas e nas manifestações mais diversas dos participantes da cozinha. Nesse tempo, era perceptível que a cozinha não era sinônimo de cuidado ou, necessariamente, nutrição. Ou que a luta era uma questão de fazer valer seus direitos a partir da consciência destes. Cozinha é trabalho, cansaço, dor, calor, mas também o dinheiro necessário para a família. A luta é uma questão de meio de vida.
© 2024 Anais da 34ª Reunião Brasileira de Antropologia - 34RBA
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