ISBN: 978-65-87289-36-6 | Redes sociais da ABA:
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 027: Antropologias da Paisagem: Conhecimentos, Relações e Políticas Multiespécie
A vida multiespécie dos queijos do Marajó: Paisagens e ecologias na Amazônia
O foco deste trabalho são as paisagens multiespecíficas que compõe a manifestação de um modo de vida e de uma naturezacultura alimentar tradicional ligado ao gado bubalino e bovino, bem como as fazendas, as pastagens nativas, aos campos e as famílias tradicionais da Ilha de Marajó na Amazônia paraense: a vida dos queijos marajoaras. A partir de uma etnografia em andamento em fazendas, dos Municípios de Soure e Cachoeira do Arari, sobre as relações multiespecíficas envolvendo a criação sistemática de animais na pecuária e as paisagens dos campos naturais busca-se seguir os emaranhados que produzem o queijo dentro de ecologias: do pasto à sala de ordenha, à sala de fabricação de queijo, à prateleira e além. O queijo do Marajó historicamente é produzido na região dos campos, onde predomina a atividade da pecuária, sendo a região composta por rios, lagos, mangues, praias e igarapés, além de vastas campinas e pastagens nativas diversas que subsidiam a atividade. A produção de queijo se restringia, inicialmente, às fazendas na microrregião do Arari desde o século XVIII, sendo feito, originalmente, com leite bovino, o chamado queijo tipo manteiga, de produção de pequenas famílias. A partir do final da década de 1920 e início de 1930, quando da inserção da desnatadeira no processo produtivo, iniciou-se a diferenciação dos queijos. Surgia o queijo tipo creme predominante nas fazendas de Soure. Enquanto esse é mais cremoso e comum em Soure, o tipo manteiga é mais rústico e comum em Cachoeira do Arari, além de possuírem diferenças quanto ao nível de gordura, textura, produtividade e durabilidade (tempo de prateleira). A safra do leite/queijo ocorre na época de lactação a partir de maio até setembro/outubro quando as vacas estão produzindo leite com suas crias pequenas, embora a produção continue em algumas fazendas e queijarias com uma produção menor até a seca severa no veraneio. A sazonalidade impacta diretamente no ciclo do leite visto os animais dependerem das pastagens nativas para o aumento da produção de leite. O leite oriundo das fazendas é comercializado in natura nos municípios de Soure e Cachoeira do Arari através da venda em varejo, de porta e porta, nas padarias, ou ainda, para as queijarias que atuam de forma independente. Dessa maneira, ao seguir o emaranhado da vida dos queijos marajoaras é possível problematizar as paisagens marajoaras que o constituem de três modos: 1) a relação da criação com o trabalho animal, neste caso, das pastagens nativas à ordenha manual, como um modo de incorporação dos animais as paisagens; 2) a emergência dos queijos nas queijarias a partir do manejo microbiopolítico; e por fim, 3) as relações entre queijo, paisagem e sazonalidade de onde emergem modos de vida multiespecíficos.