Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 001: A produção de conhecimentos em situações de conflito
O corpo indígena como objeto e alvo do poder: um olhar sobre a Fazenda Guarani
Este artigo resulta de um trabalho de pesquisa de pós-doutoramento, em curso, sobre as violações de direitos sofridas pelos indígenas das etnias Tupinikim e Guarani, do Município de Aracruz (ES), que foram confinadas pela FUNAI, na Fazenda Guarani (MG), entre os anos de 1972 a 1978, durante a ditadura empresarial-militar brasileira. A Fazenda Guarani é identificada pela Comissão Nacional da Verdade (2014) como campo de concentração criado para os indígenas considerados desajustados. As entrevistas realizadas com esses indígenas revelaram que essas etnias foram deslocadas compulsoriamente pela FUNAI, para esse campo de concentração, a fim de facilitar o esbulho de suas terras a favor da holding Aracruz Celulose S/A. Desse modo, este artigo tem como objetivo discorrer sobre os modos como os corpos indígenas se inserem nas estratégias de poder/saber, articuladas pelo capital, pelo Estado e os seus aparelhos, durante o período da ditadura empresarial-militar e dar especial atenção às relações entre a FUNAI e as empresas; adicionalmente, refletir sobre a permanências dessas políticas refratárias às existências desses povos, no período pós-ditadura. Dentre as estratégias de poder/saber utilizada pela FUNAI, serão discutidas: a negação das identidades indígenas (sob o argumento de que não falam mais seu idioma, no caso dos Tupinikim; e de que não eram originários do município de Aracruz, no caso dos Guarani),o deslocamento compulsório, a destruição da Mata Atlântica e, em consequência, os seus modos de vida e cosmologia. O domínio sobre o corpo indígena ganha diferentes feições em diversos períodos históricos. Antes da instalação da transnacional do agronegócio da celulose na região, em 1967, existiam aproximadamente 36 aldeias, em 1979, essas aldeias foram reduzidas a três. A fábrica de processamento químico do eucalipto em pasta de celulose branqueada, construída em 1972, se localiza em cima do cemitério indígena. Atualmente, essas aldeias não possuem água potável, para sobreviver fazem uso de carros-pipa (caminhão de reservatório de água), permanecem imprensadas pelo eucalipto, as águas que restaram estão contaminadas, o veneno jogado nas plantações de eucalipto produzem várias doenças graves nesses indígenas: cegueira, câncer, doenças respiratórias, dentre outra. A holding Aracruz Celulose S/A passou por diversas reorganizações societárias e administrativas, porém, manteve seu CNPJ. Hoje é o Grupo Suzano Papel e Celulose S/A, a maior produtora mundial de pasta de celulose branqueada. Discorrer sobre essas estratégias de poder/saber sobre os corpos indígenas, neste momento em que o golpe empresarial-militar completa 60 anos, é fundamental para a construção de políticas de memória e de reparação, que ainda não foram realizadas a contento, em nosso país.