Trabalho para Mesa Redonda
MR 30: Etnografias dos negacionismos e das alt-sciences: Perspectivas a partir da antropologia da ciência
A carta psicografada de Ademar Gevaerd: algumas observações sobre como ufólogos navegam no ambiente da
pós-verdade
Rafael Antunes Almeida (UNILAB)
Entre uma parcela significativa dos ufólogos, Ademar Gevaerd era reputado como um dos mais importantes
pesquisadores brasileiros do campo das últimas décadas. Nesses anos, ele editou a Revista UFO, organizou os
maiores congressos de ufologia do país e esteve presente em muitos programas de televisão que versaram sobre
o tema da vida extraterrestre. Em 2022, Gevaerd faleceu em decorrência de uma queda. No ano seguinte,
circularam nos meios ufológicos duas versões de uma carta psicografada atribuída a ele. Nos documentos, o
suposto espírito do ufólogo trazia informações sobre a vida além-túmulo, revelações sobre a relação entre
anjos e aliens, além de conjecturas sobre as relações entre o presidente Lula e os extraterrestres do tipo
reptiliano. Nesta comunicação analiso os efeitos dessa carta sobre uma parcela da comunidade ufológica. Ao
acompanhar esse episódio e as reflexões geradas por ufólogos a partir da disseminação do texto, terei a
oportunidade descrever como coletivos que regularmente acionam o idioma da suspeita e raciocínios
conspiratórios dirigidos a um fora, como a governos, cientistas e instituições públicas, lidam com situações
controversas na própria comunidade.
Vale observar que muitos dos estudos voltados à antropologia da pós-verdade se debruçaram sobre comunidades
que emergiram ou foram catalisadas no mundo pós-Trump. Os ufólogos, por seu turno, estão presentes na cena
pública desde 1947, onde apresentam sistematicamente os seus interesses, métodos de investigação e formas de
organização. O meu objetivo com esta comunicação é adicionar um pouco mais de compreensão à questão de saber
como paracientistas com uma trajetória anterior à emergência das plataformas digitais, navegam no ambiente
do que tem se chamado de pós-verdade. Trata-se aqui, portanto, de um esforço complementar àquele
caracterizado pela descrição das formas de produção de evidências, processos de constituição de grupo e
modos de circulação da informação entre paracientistas. Busca-se produzir uma etnografia de sua
transformação.
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