ISBN: 978-65-87289-36-6 | Redes sociais da ABA:
Trabalho para Mesa Redonda
MR 30: Etnografias dos negacionismos e das alt-sciences: Perspectivas a partir da antropologia da ciência
A carta psicografada de Ademar Gevaerd: algumas observações sobre como ufólogos navegam no ambiente da pós-verdade
Entre uma parcela significativa dos ufólogos, Ademar Gevaerd era reputado como um dos mais importantes pesquisadores brasileiros do campo das últimas décadas. Nesses anos, ele editou a Revista UFO, organizou os maiores congressos de ufologia do país e esteve presente em muitos programas de televisão que versaram sobre o tema da vida extraterrestre. Em 2022, Gevaerd faleceu em decorrência de uma queda. No ano seguinte, circularam nos meios ufológicos duas versões de uma carta psicografada atribuída a ele. Nos documentos, o suposto espírito do ufólogo trazia informações sobre a vida além-túmulo, revelações sobre a relação entre anjos e aliens, além de conjecturas sobre as relações entre o presidente Lula e os extraterrestres do tipo reptiliano. Nesta comunicação analiso os efeitos dessa carta sobre uma parcela da comunidade ufológica. Ao acompanhar esse episódio e as reflexões geradas por ufólogos a partir da disseminação do texto, terei a oportunidade descrever como coletivos que regularmente acionam o idioma da suspeita e raciocínios conspiratórios dirigidos a um fora, como a governos, cientistas e instituições públicas, lidam com situações controversas na própria comunidade. Vale observar que muitos dos estudos voltados à antropologia da pós-verdade se debruçaram sobre comunidades que emergiram ou foram catalisadas no mundo pós-Trump. Os ufólogos, por seu turno, estão presentes na cena pública desde 1947, onde apresentam sistematicamente os seus interesses, métodos de investigação e formas de organização. O meu objetivo com esta comunicação é adicionar um pouco mais de compreensão à questão de saber como paracientistas com uma trajetória anterior à emergência das plataformas digitais, navegam no ambiente do que tem se chamado de pós-verdade. Trata-se aqui, portanto, de um esforço complementar àquele caracterizado pela descrição das formas de produção de evidências, processos de constituição de grupo e modos de circulação da informação entre paracientistas. Busca-se produzir uma etnografia de sua transformação.