Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 083: Patrimônios culturais e meio ambiente: pensando a proteção de modos de vida e territórios de povos e comunidades tradicionais
Controvérsias envolvendo o Parque Nacional da Serra da Canastra e os canastreiros: uma etnografia do
conflito socioambiental
Este trabalho busca compreender através de uma abordagem etnográfica o conflito socioambiental que
acontece na Serra da Canastra envolvendo a população local, os canastreiros, e o Parque Nacional da Serra da
Canastra sob a gestão do ICMBio. Esse conflito surge com a sobreposição do território tradicional dos
canastreiros pela Unidade de Conservação, produzindo implicações definidoras nas vidas das famílias
desapropriadas e no modo de vida da população local, e segue se desdobrando nos dias atuais uma vez que,
devido ao fato de que o PNSC não teve a totalidade da área prevista pelo seu decreto de criação
regularizada, está em curso medidas de desapropriação. O foco da etnografia é a relação entre os
canastreiros e a gestão local do ICMBio com ênfase nas transformações vividas no território com a criação e
ampliação do PNSC, nas mudanças experimentadas nas dinâmicas dessa relação e nas perspectivas de futuro
apontadas por ela. A etnografia é apoiada por uma revisão bibliográfica da literatura antropológica que
discute as imbricações entre a criação e o manejo de UCs, as perspectivas de desenvolvimento do Estado e de
empreendimentos econômicos hegemônicos, os sistemas de conhecimento e modos de vida das populações
tradicionais e as possibilidades que eles apresentam na busca de um pós-desenvolvimento e bem viver. As
problemáticas descobertas pelos trabalhos que também abordam esse conflito e pela experiência no campo
etnográfico envolvem, sobretudo, a dívida histórica do Estado e órgãos ambientais com os canastreiros devido
ao autoritarismo, truculência e violações de direitos cometidas nos processos de criação e ampliação do
Parque; o arcaísmo da política ambiental que insiste em um modelo de conservação de muros e cercas que
infringe os direitos territoriais das populações locais e contraria as evidências de que as populações
tradicionais e seus modos de vida são responsáveis pelo estado de conservação da biodiversidade em que se
encontram os territórios antes de se tornarem áreas protegidas e são, por isso, potencialmente aliadas no
manejo destas áreas; o contraditório alinhamento da política ambiental com a lógica desenvolvimentista,
especialmente do agronegócio e da mineração, através das medidas compensatórias de isenção de reserva legal
e de impactos ambientais e sociais causados por grandes empreendimentos; os riscos em relação à continuidade
do modo de vida dos canastreiros devido à sua desterritorialização e excesso de regulação sobre suas
práticas produtivas; e a assimetria na disputa de interesses e saberes, técnico-científicos e
tradicionais-locais, no contexto dos processos de patrimonialização ambiental através do Parque e de
patrimonialização cultural através da regulamentação da produção do queijo canastra.
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