Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 103: Universidade Indígena no Brasil: experiências e possibilidades
As "colisões" e as "coalizões epistêmicas" em debate: as (im)possiblidades da Licenciatura Intercultural
Indígena no Maranhão
As lutas e articulações dos povos indígenas no Brasil para abrir passagem em direção ao ensino superior,
tem sido um caminho percorrido desde a promulgação da Constituição Federal de 1988, mas que se acirrou a
partir da primeira década do século XXI, considerando algumas conquistas e experiências pioneiras como os
casos da Universidade do Estado do Mato Grosso em 2001 e da Universidade de Brasília em 2004 que,
respectivamente, lançaram políticas de ação afirmativa para povos indígenas ingressarem em uma Licenciatura
Intercultural 'específica e diferenciada' reservada exclusivamente a esse segmento e a reserva de vagas para
candidatos indígenas nos cursos regulares da IES. Desse contexto até os dias atuais, outras conquistas
foram, ao menos formalmente, alargando essa passagem de acesso para os povos indígenas às salas de aula das
universidades. Em 2005 e 2012, o Programa de Apoio à Formação Superior e Licenciaturas Interculturais
Indígenas (PROLIND) e a "Lei de Cotas" foram importantes conquistas políticas para o acesso de indígenas ao
ensino superior. No entanto, no caso do Maranhão, foi em 2007 que a Universidade Federal do estado, a UFMA,
lançou uma política de ação afirmativa demandada pelos movimentos e articulações da população negra do
estado. Essa política, como que de forma não intencional, acabou por contemplar os povos indígenas do
estado. Já em 2016, a Universidade Estadual do Maranhão passou a realizar a primeira Licenciatura
Intercultural Indígena do estado, a LIEBI. O curso contemplou quatro povos indígenas do estado
(Tentehar/Guajajara, Canela, Krikati e Pyhcop Catiji/Gavião) e formou, em 2022, 54 cursistas. Uma análise
das experiências formativas e produções intelectuais de alguns cursistas da LIEBI entre os anos de 2016 e
2022, contexto em que atuei como docente e orientador no curso, tornou possível o entendimento de que nas
trocas, partilhas e correlações epistemológicas realizadas pelos indígenas, entre os seus saberes e os
conhecimentos acadêmicos, se manifestavam equivalências e incongruências que em Muniz (2023) chamei de
"colisões epistêmicas" e "coalizações epistêmicas". As primeiras eram expressivas de uma negociação
improvável, sem efetividade, entre as formas daquelas indígenas para pensar o mundo e as formas não
indígenas (acadêmicas). As segundas indicavam que para qualificar a atuação dos indígenas em esferas de
discussão acerca de seus direitos, um certo tipo de aliança política entre os saberes indígenas e os
acadêmicos deveria ser considerado enquanto possibilidade. Para ver e sentir de perto essas colisões e
coalizações recorri a "etnografia dos/nos interstícios" (FURTADO, MUNIZ e OLIVEIRA, 2018) e MUNIZ (2023),
por ser parte protagonista do processo que, nesse trabalho, é objeto de reflexão.