ISBN: 978-65-87289-36-6 | Redes sociais da ABA:
Trabalho para Mesa Redonda
MR 28: Etnografias com o sistema de justiça criminal
Desigualdade Jurídica e Encarceramento no Brasil: um estudo a partir da atuação do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul na análise e decisão de habeas corpus impetrados durante a Pandemia de Covid-19
Partindo de dados e reflexões, abordaremos a atuação do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul na análise de habeas corpus impetrados durante a Pandemia da Covid-19 no Brasil. A pesquisa na qual se baseia essa apresentação está inserida dentro de um projeto maior que tem como objetivo descrever e analisar como se deu, durante a Pandemia, o tratamento desigual na apreciação de pedidos de liberdade de réus presos para os crimes de furto, roubo, tráfico e homicídio nos Estados de Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. Aprovado pelo Edital nº 12/2021 da CAPES (Impactos da Pandemia), o projeto parte da hipótese de que a sociedade brasileira se estrutura de forma hierarquizada, o que se reflete em diferentes formas de desigualdade. No plano jurídico, a desigualdade opera tanto no nível normativo, momento em que as leis são elaboradas, quanto no nível da administração dos conflitos, quando as leis são aplicadas pelos profissionais do Direito. Assim, a pesquisa procura problematizar como as instituições judiciárias reproduzem desigualdades jurídicas na formulação e na aplicação das leis, em especial em situações extraordinárias como as que se desenvolveram no contexto da Pandemia da Covid-19. Além disso, partimos da hipótese de que a política criminal no Brasil também é marcada, após a Constituição de 1988, pela coexistência de princípios contraditórios, ou seja, modelos que ora são mais punitivos ora são mais garantidores de direitos. É no âmbito dessa política criminal esquizoide” (CAMPOS e AZEVEDO, 2020) que compreendemos a edição, em março de 2020, da Recomendação 62 do CNJ que propôs medidas preventivas à propagação do vírus da Covid-19 no âmbito dos sistemas de justiça penal e socioeducativo, em especial medidas de desencarceramento. Nesse sentido, embora o CNJ tenha reconhecido o estado de coisas inconstitucional” (STF, 2015) que caracteriza o sistema prisional no Brasil, bem como a vulnerabilidade das pessoas privadas de liberdade ao contágio e morte pela doença, o que observamos empiricamente é que a referida Recomendação não foi, em geral, adotada pelos tribunais. Assim, para compreender em que medida a Recomendação 62 do CNJ foi aplicada, aplicada parcialmente ou rejeitada nas decisões de juízes e desembargadores do TJMS, levantamos e analisamos o teor completo de todos os habeas corpus impetrados no período de 2020 a 2022 que fizeram menção direta à referida Recomendação, totalizando 390 decisões judicias analisadas. Além das variáveis quantitativas como o resultado e o placar das decisões, os tipos penais envolvidos, o sexo do/as pacientes e a atuação da defensoria pública, identificamos e classificamos, qualitativamente, os principais argumentos e moralidades utilizados como fundamento para as decisões proferidas.