ISBN: 978-65-87289-36-6 | Redes sociais da ABA:
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 094: Saberes Localizados, escritas de si e entre os seus: desafios político-teóricos e metodológicos nas práticas etnográficas
A língua de resistência do quilombo raiz: O valorar da cultura e identidade local
Esta comunicação tem como objetivo tecer reflexões a partir da pesquisa de mestrado que se encontra em fase de desenvolvimento e que se concentra na análise da importância cultural de uma língua específica utilizada entre os membros do quilombo de raiz, localizado no Município de Presidente Kubitschek, mg, em contextos de interação. Nesta perspectiva, encontro-me em um duplo lugar, de pesquisadora e de jovem liderança, que possui vínculos profundos com esse território, mantendo laços sólidos com a cultura e a identidade quilombola, incluindo a tradição de apanhar flores sempre-vivas. Para além da questão do conhecimento linguístico enquanto afirmação identitária e territorial, a pesquisa proporciona contribuições significativas quanto ao meu papel de pesquisadora envolvida com uma pesquisa em seu próprio território. Nesse contexto, buscarei refletir sobre as dificuldades que reside em adotar uma perspectiva externa à comunidade para compreender os aspectos internos a esta dinâmica; sobre como lidar com um sistema acadêmico no qual o comitê de ética em pesquisa (CEP) questiona o meu papel de pesquisadora por encontrar-me profundamente imersa no território; dos desafios inerentes aos conflitos entre a prática de escrever e a vivência cotidiana, além de redefinir a compreensão do tempo entre ser pesquisadora e liderança. Como afirma Conceição Evaristo a respeito da elaboração da sua dissertação de mestrado, este foi um momento no qual a escritora iniciou um processo "entre escrever-viver", "escrever-se-ver" e "escrever-se-vendo", culminando no termo "escrevivência”. A origem dessa ideia vem de um fundamento histórico, que é o processo da escravidão dos povos africanos. Segundo a autora, a nossa escrevivência não é para adormecer os da casa grande, e sim para acordá-los de seus sonos injustos”. Pretendo expor que a escrevivência é de grande importância, pois me permite contar a minha própria história e ser a pesquisadora da minha herança cultural, dando voz às experiências, memórias e perspectivas do meu povo, a partir de um olhar de dentro do território. Como afirmado por simone weil (2022) quem é desenraizado desenraiza. Quem é enraizado não desenraiza”. Trago comigo as palavras não ditas, espaços não ocupados. Pois como nos lembra Ecléa Bosi o vínculo com o passado, que é vital, porque dele se extrai, a seiva para a formação da identidade. Nesse sentido também está a noção de direito ao enraizamento, de Simone Weil, para quem este é um direito humano semelhante a outros direitos ligados à sobrevivência do homem (Bosi, 2012: 199).