ISBN: 978-65-87289-36-6 | Redes sociais da ABA:
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 102: Transições democráticas e controle social: repensando marcações temporais
Territorialidade, segurança pública e crime no Rio de Janeiro
Na presente comunicação busco revisitar algumas reflexões sobre a produção discursiva e imagética das favelas e periferias do Rio de Janeiro como espaços da insegurança e do descontrole (em termos das garantias estatais), uma vez atravessados por modos de governo das condutas, contenção e contorno fronteiriço por parte de grupos milicianos e das chamadas facções do tráfico”. A isso podemos adicionar as operações policiais que criam territórios de exceção”, conduzidas pelos corpos especiais das Polícias Militar e Civil, mas hoje também realizadas pela PRF e PF; operações que visam a poda das pontas soltas de uma anomalia concebida como extirpável - como cansa de conclamar parte do jornalismo policial - se houver interesse político. Que tal tanatopolítica tenha como alvos privilegiados os corpos negros, é o que muitas vezes escapa às discussões sobre biopolítica e racismo e, no mesmo movimento, reforça o apagamento das lutas pelo reconhecimento da existência de territórios negros na cidade do Rio de Janeiro. E que tais operações sirvam para transformar tais localidades em campos de treinamento de uma elite de assassinos a serviço de interesses corporativos é muitas vezes esquecido (vamos borrar a partição dura entre legal/ilegal; vide escritório do crime”). A isso podemos adicionar, lá onde se misturam segurança nacional e segurança pública, as sucessivas experiências GLO na cidade do Rio de Janeiro. Tal produção enunciativa se deixa ver numa cascata de adjetivações: territórios do crime, minados, precarizados, marginais, territórios sob controle de grupos armados, entre outros. A cada uma delas corresponde um direcionamento dos problemas (e escalonada pressão política): seja por parte das análises acadêmicas; seja nos diagnósticos (que se querem propositivos) dos formuladores das políticas de segurança pública; seja nas justificativas e valorações policiais. Sem pretender expandir a análise para fora do Rio de Janeiro, contrastando com outros modos de territorialização, o quadro ganha ainda em complexidade ao considerar a passagem e composição entre tecnologias de poder: disciplinares”, com sua modelagem que fixa territórios fechados e faculta a passagem entre eles; e as tecnologias do controle ou da segurança”, que operam a partir de redes flexíveis e sobrepostas (o recente ENFOC, de Flávio Dino, sua preocupação com o crime que não respeita fronteiras, é exemplar nesse sentido; no cotidiano das ruas, as duras policiais em celulares também servem de exemplo da captura em rede como dispositivo micropolítico do controle). Todavia, tal discussão não pode prescindir, como lastro valorativo, ancoragem analítica e exigência política, das avaliações e lutas por parte de quem habita esses territórios”. E é daí que se começa.