ISBN: 978-65-87289-36-6 | Redes sociais da ABA:
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 023: Antropologia e saúde mental: sofrimento social e (micro)políticas emancipatórias
Uma autoetnografia sobre o processo de sofrimento no trabalho de um profissional de saúde da atenção básica no SUS
Neste trabalho apresento o processo de sofrimento e adoecimento emocional que vivi e vivo como profissional de saúde do SUS, inserido na Atenção Básica (AB). Para tanto, utilizei o conceito de narrativa de Sonia Maluf (2021) e a autoetnografia a partir de Dulce Ferraz (2020) e Fabiene Gama (2020, 2022). Trago brevemente minha formação profissional como psicólogo desde a graduação até os dias atuais, ressaltando os caminhos de aprendizados que me levaram a trabalhar na AB. Depois, contextualizo o processo de implementação dessa política num contexto de privatização e precarização do trabalho e relaciono esses aspectos com a saúde dos/as/es trabalhadores/as da AB. A partir de uma experiência com um dos usuários que acompanhei em alguns atendimentos reflito sobre os sentidos do sofrimento/adoecimento emocional que tenho vivido e os seus desdobramentos. A autoetnografia começa apresentando mais um profissional de saúde que aprendeu a defender e a sonhar com a construção e o fortalecimento do SUS e que desde a graduação buscou e foi guiado por caminhos críticos de formação e de prática. Depois de mais de dez anos de atuação como profissional na AB na cidade do Recife-PE, especificamente trabalhando no Núcleo de Apoio a Saúde da Família - NASF (hoje equipes multiprofissionais na atenção primária à saúde - eMulti), o desgaste, o cansaço e o sofrimento no trabalho começaram a ser maiores do que o gosto, o orgulho e o prazer, ao ponto de produzirem adoecimento com o diagnóstico de burnout. Escrevi esse trabalho autoetnográfico não apenas por um desejo (quase necessidade) de organizar as emoções, mas também, por querer falar “com e falar “para outros/as/es trabalhadores/as da AB no SUS que passaram ou passam por situações semelhantes, para que a escrita possa ser um veículo da experiência e do sentido (Maluf, 2021), explicitando caminhos que lhes ajudem a perceber e refletir como seu trabalho tem afetado sua saúde mental para, a partir daí, encontrarem estratégias de resistência e superação desse processo. Tomar consciência quando o sofrimento no trabalho se torna adoecimento, por exemplo, é fundamental para buscar ajuda. Além disso, é muito importante pensar a construção de políticas públicas efetivas para esses/as (e outros/as/es) trabalhadores/as no âmbito do SUS. Não falamos aqui de um “cuidando do cuidador para “fazer de conta que existe”, mas, quem sabe, da construção de uma política nacional de promoção da saúde dos trabalhadores do SUS, uma política que parta da compreensão sobre o trabalho em saúde de maneira articulada à formação permanente dos/as/es trabalhadores/as, à organização do trabalho na AB, as relações de gênero e de raça, à ampliação de concursos públicos e à salários e carreiras profissionais dignas.