Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 098: Som, música e eventos: experimentações etnográficas
Pique Favela: DJs de baile, montagens e o sonoro na construção de territorialidades no funk carioca
O funk carioca é o primeiro gênero de música eletrônica brasileiro e é continuamente criado nos bailes
funks do Rio de Janeiro. Os bailes são realizados desde a década de 1970 por e para a população que habita
morros e favelas da Região Metropolitana, principalmente. De forma geral, os bailes são festas de Sound
System, ou seja, festas que tem o sonoro, produzido por um DJ e seu aparato técnico, e reproduzido por
caixas de som empilhadas em paredões, como elemento central e condutor das relações, que se manifestam,
substancialmente, pela dança. Em comunicação com outras manifestações culturais como o samba, pagode,
torneios de futebol etc., os bailes constituem a subjetividade de grande parte dos moradores das comunidades
que os produzem. Como empreendimentos coletivos de toda uma vizinhança, os bailes integram a economia e os
modos de viver de comunidades diversas. Ainda que sob constante ameaça de aniquilação, eles resistem como
acontecimentos que se tornaram tradicionais em seus territórios. Sendo assim, este artigo é parte de uma
tese de doutorado em processo, que busca pela pesquisa etnográfica dar visibilidade na academia às montagens
do funk carioca. As montagens são músicas assim denominadas pelo circuito do funk desde a década de 1990,
que se relacionam com o Set dos DJs de baile na medida em que são produzidas pela mixagem de funks e samples
de funk preexistentes. Muitas vezes subvalorizadas pelos próprios produtores de funk, as montagens funcionam
como dispositivo para jovens DJs ingressarem no circuito e são fundamentais nos processos constantes e
simultâneos de invenção e preservação do funk carioca - além de serem as músicas mais tocadas nos bailes.
Embora ainda não tenham se constituído como objeto de estudo para o campo do funk, as montagens representam
um instrumento de pesquisa privilegiado para se observar, entre outros aspectos, a construção de memória no
funk carioca e a sua simultânea atualização junto às demandas de sensibilidades do presente. O objetivo é
demonstrar a relevância das montagens nos processos fundamentais do gênero, contribuindo para uma
compreensão mais abrangente do funk carioca na academia. Em paralelo, este trabalho procura tangenciar as
maneiras pelas quais o funk carioca expressa territorialidades por aspectos não discursivos da música. Como
músicas produzidas para mediar as relações do baile, as montagens, desde as Montagens de Galera, tornam
audíveis não só os nomes de suas comunidades, mas também suas sensações. As colocações aqui reunidas são
fruto de um trabalho de campo que se inicia em 2018 e é contínuo e indiscernível de meu cotidiano como
público dos bailes e integrante de um estúdio musical de favela localizado no Complexo do Lins, Zona Norte
do Rio de Janeiro.