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Trabalho para SE - Simpósio Especial
SE 15 - Laicidade e Democracia em Perspectiva
Altares fragmentados, imaginados e redispostos Expressões do racismo religioso e intolerância em contextos de exposição pública
Trago nesta comunicação uma reflexão sobre as formas assumidas pelo racismo religioso e intolerância na cidade de Fortaleza, Ceará, tomando como centro da análise três exposições de objetos afrorreligiosos ocorridas em períodos e contextos históricos distintos. Nos três casos, foco no percurso de altares fragmentados e redispostos, entendendo que acionam diferentes operações de representação, generalização e atribuição de autoria. Redisposição e fragmentação são aqui compreendidas como operações distintas, embora bastante entrelaçadas e marcadas por porosidades, cujas características assentam-se, no primeiro caso, na produção de continuidades mágico-religiosas, e, no segundo caso, na interrupção dessas continuidades, que pode se combinar a ações que visam a anulação/controle de sua eficácia. Essas duas expressões são aqui pensadas em contexto de exposição pública. A primeira exposição, aberta à população fortalezense, ocorreu em 1937, em uma delegacia, como resultado da apreensão de objetos de altares ou mesas de trabalho de Catimbó. O caso é apresentado como uma primeira aproximação à noção de fragmentação, na medida em que evidencia a tentativa de produzir descontinuidades de relações entre objetos e neutralização de sua eficácia, acompanhada da exposição. A segunda exposição, de caráter permanente, encontra-se atualmente no Museu Arthur Ramos e é composta por objetos doados pela polícia em data desconhecida. Nesse caso, a análise estará centrada em uma fotografia de um altar exposta na coleção Sincretismo Religioso. Alguns dos objetos que compõem o altar fotografado também fazem parte da mesma exposição, contribuindo para a existência de um altar imaginado e de operações de persistência da experiência de fragmentação. Por fim, a terceira exposição, chamada Festa, Baia, Gira, Cura, esteve disponível ao público fortalezense no Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura por seis meses entre 2023 e 2024, como parte das comemorações de 40 anos de um terreiro. O altar a que me atenho, que é aqui compreendido em uma forma estendida, foi formado a partir da redisposição de imagens e outros objetos advindos de diferentes terreiros. A exposição em questão foi alvo de tentativas de fragmentação por parte de representantes do legislativo estadual e, como buscarei argumentar, além de retomar operações discutidas nos dois casos anteriores, é atualizada a partir de dinâmicas contemporâneas. Nesse caso, atenho-me às noções de minorias, maioria cristã e exercício democrático apresentadas como justificativa para a tentativa de fragmentação. As trajetórias dos altares em questão não só apontam para as formas tomadas pelas perseguições e pelo racismo religioso, mas também indicam as dificuldades impostas a essas religiões quanto a sua exposição pública.