ISBN: 978-65-87289-36-6 | Redes sociais da ABA:
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 065: Igualdade jurídica e de tratamento: etnografias de narrativas, produção de provas, processos decisórios e construção de verdades
Como julgar um serial killer: formação de alianças e tradução de modos de existências no julgamento do Maníaco do Parque
O objetivo deste trabalho é recuperar os argumentos apresentados no julgamento do Maníaco do Parque para investigar as conexões parciais entre as diferentes entidades envolvidas na condenação de Francisco e o tipo de aliança que se estabeleceu ali. Esse trabalho é resultado de uma tentativa de interpretação das transformações do serial killer ao longo desse percurso técnico-científico-jurídico pelo qual ele circula, tomando o julgamento do Maníaco como um caso paradigmático nesse sentido. Se a tradução de um objeto científico comporta sempre uma mudança de termos, a tarefa das entidades envolvidas nessa diplomacia entre diferentes modos de existência, é encontrar uma linguagem interessante (CALLON, 2020) para o direito e para a ciência, qualificada a operar uma negociação (LATOUR, 2017, 2019) capaz de determinar formas provisórias e heterogêneas de lidar com o problema duplamente jurídico e científico do assassino em série. No Júri, a questão seria em torno do grau de normalidade de Francisco. Uma vez que a defesa tinha diante de si um réu confesso, não seria possível defendê-lo por meio de uma negação dos crimes. Para o promotor, Edilson Bonfim, o desafio era explorar as falhas e controvérsias envolvendo os laudos, o que exigia uma nova arquitetura, capaz de dar conta de um problema tão excepcional e sombrio. Ele deveria estar apto a questionar as avaliações de peritos que sugeriam uma outra punição, baseada no argumento da inimputabilidade. Tais debates evidenciam um balanço de forças diferente daquele que observamos nos julgamentos de Febrônio Índio do Brasil e Benedito, por exemplo. Enquanto a legislação da época tornou possível a internação de Febrônio no primeiro Manicômio Judiciário brasileiro, sob as recomendações dos médicos da época, o caso do Maníaco do Parque seria atravessado por uma série de discussões entre as teorias do Primeiro Mundo e a legislação atrasada, nas palavras da promotoria. Assim, argumento que o julgamento e a condenação de Francisco têm efeitos importantes na operacionalização do assassino em série por meio do estabelecimento de uma nova trajetória possível para esses crimes no sistema penal brasileiro e também nas pesquisas científicas brasileiras sobre o tema.