ISBN: 978-65-87289-36-6 | Redes sociais da ABA:
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 005: Antropoceno, Colonialismo e Agriculturas: resistências indígenas, quilombolas e camponesas diante das mutações climáticas
"Pandemia das roças": impacto das mudanças climáticas na agricultura tradicional indígena no Oiapoque
As Terras Indígenas Uaçá, Galibi e Juminã, estão situadas no município de Oiapoque/AP. Nesta região, vivem os indígenas Karipuna, Galibi Marworno, Galibi Kali’na e Palikur, exímios pescadores e agricultores, conhecedores dos movimentos das águas, do comportamento das espécies pesqueiras e de uma diversidade de produtos da sociobiodiversidade. Há mais de cinco séculos mantém relações com a sociedade não indígena, de diferentes formas. Uma das principais é a comercialização da farinha de mandioca e seus derivados, que costumava abastecer integralmente o município. Toneladas de farinha e outros produtos agrícolas chegavam semanalmente na cidade, provenientes das diferentes aldeias da região. Mais de 60 variedades de mandioca foram identificadas a partir de um levantamento dos pesquisadores indígenas da região, em 2011, cultivadas com base em seu complexo sistema agrícola tradicional. Contudo, nos últimos anos, essa realidade mudou. O regime de chuvas tem se alterado, trazendo um grande impacto para os sistemas agrícolas. O excesso de chuvas no período de abertura das roças tradicionais (no sistema de queima e coivara) fizeram com que algumas famílias não conseguissem abrir novas roças, assim como outras roças não queimassem direito. Especialmente em 2022 e 2023, houve uma proliferação de pragas e doenças, que acometeram a maior parte das roças dos 9mil indígenas que vivem na região. As plantas de mandioca, antes vigorosas e verdes, começam a secar e as raízes chegam a apodrecer antes de amadurecer. Segundo avaliação da Embrapa, foram identificados diferentes microorganismos que estão afetando a sanidade da mandioca. Essa situação também foi registrada no outro lado do rio, na Guiana Francesa, e em outro município. Esses técnicos afirmam que não há previsão de quando essa situação se normalizará, podendo levar até uma década. Ao mesmo tempo, propõem ações de enfrentamento e mitigação fundamentadas em conhecimentos técnico-científicos que desconsideram os conhecimentos dos povos indígenas. Por sua vez, os indígenas têm suas explicações próprias e vêm discutindo, experimentando e buscando nos conhecimentos e práticas tradicionais formas de enfrentar o problema. Tamanha catástrofe fez com que os indígenas comparassem o problema das roças à pandemia da Covid-19, nomeando esse momento como da “pandemia das roças”. Neste trabalho, fruto das discussões com os agentes ambientais indígenas do Oiapoque, pretende-se abordar três aspectos do impacto dessa situação para a população indígena do Oiapoque: a) insegurança alimentar, b) diminuição da renda familiar indígena e aumento de atividades exploratórias, e c) desvalorização dos conhecimentos indígenas e perda de variedades endógenas.