Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 040: Culturas populares e os usos da tradição
O Reinado da Sociedade Ubaense de Congados Nossa Senhora do Rosário: tradição e relações simbólicas do acervo material de um congado da Zona da Mata Mineira
O objetivo desta apresentação é refletir sobre os objetos sagrados que fazem parte do universo simbólico da Sociedade Ubaense de Congados Nossa Senhora do Rosário, localizada em Ubá/MG. Mais conhecida como congado de Ubá, a manifestação cultural é registrada como patrimônio cultural do município. A especificidade da colonização da Zona da Mata mineira, tardia comparativamente às demais regiões do Estado, confere também às expressões culturais desta região características próprias, em grande parte vinculadas à memória do volumoso contingente populacional escravizado. O atual rei congo de Ubá, coroado em 2021, tem a responsabilidade de manter e transmitir os fundamentos e o legado dos reis anteriores, dois dos quais foram escravizados. Entre os fundamentos do congado de Ubá encontram-se os objetos rituais, indumentárias e instrumentos litúrgicos que compõem seu acervo. Alguns desses objetos têm status de relíquia, sendo alocados em um altar na sala importante chamada de Reino de Nossa Senhora do Rosário, Santa Efigênia e São Benedito, localizada no fundo da sede do congado. Ali estão, em meio a profusa imaginária católica, as coroas dos reis Adão Quintão e Zinho, antecessores do rei Braizinho. Já a espada e o cetro, chamado de Divino devido à figura zoomórfica em sua ponta, transmitidos quando do falecimento do rei anterior, são utilizados no calendário festivo e ritual do congado. Ainda que tenha assumido como Rei Congo imediatamente após receber a coroa, o cetro e a espada que pertenceram ao Mestre Zinho, a coroação diante de Nossa Senhora do Rosário é considerada uma cerimônia essencial para oficializar o reinado. Para a ocasião, rei Braizinho utilizou uma coroa confeccionada por seu filho, que é integrante de um grupo de charola de São Sebastião de Juiz de Fora/MG. Houve controvérsias sobre o modelo da coroa, bastante colorida e adornada, diferente do modelo tradicionalmente portado pelos reis anteriores. A coroa tradicional daquele congado é oblonga e toda coberta de rosários, sem brilhos. Posteriormente, foi confeccionada uma nova coroa, em conformidade com as coroas ancestrais. Nesta pesquisa, pretende-se compreender o modo como os objetos rituais do congado de Ubá reverberam a memória e a temporalidade da cultura e da religiosidade negra de origem colonial. Nesse percurso, espera-se aferir a ideia de temporalidade espiralar proposta por Leda Maria Martins, que compreende o descoroamento e a transmissão da coroa como ritos que permitem a circulação da energia por meio do ancestre. A pesquisa, portanto, propõe discussões sobre as articulações entre tradição, autenticidade, tempo, espaço e memória por meio da dimensão material do patrimônio imaterial.