Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 037: Corpo, reprodução e moralidades: disputas de direitos e resistência à onda conservadora
A vida social da homofobia na Câmara dos Deputados: os usos políticos da categoria nos discursos de parlamentares brasileiros (2018-2023)
Este estudo é um recorte da minha pesquisa de doutorado em andamento, dedicada à investigação dos usos e efeitos políticos da homofobia enquanto categoria em diversas conjunturas e, consequentemente, por diferentes atores ao longo dos últimos anos no país. Na esteira de quase quarenta anos de produção socioantropológica sobre o tema, minha abordagem não visa construir ou reiterar abstrações conceituais, mas objetiva seguir etnograficamente a vida social da homofobia. Inspirado pela etnografia realizada por Abu-Lughod (2011) ao acompanhar a "vida social dos direitos" nos mundos das mulheres muçulmanas, meu interesse é compreender como a categoria (homofobia) é produzida e opera no cotidiano a partir de uma variedade de contextos, que incluem desde coletivos e movimentos LGBT+ a instituições do Estado, fontes documentais, eventos, manifestações, controvérsias públicas e o cenário político brasileiro. Este último, o plano da política, é o que anima a proposta deste texto, uma vez que, influenciado pelo processo metodológico delineado pela antropóloga Naara Luna (2017), busco analisar os discursos de deputados(as) sobre homofobia disponíveis no portal da Câmara entre os anos de 2018 a 2023. Dar atenção a essas narrativas pode proporcionar uma compreensão mais nuançada do modo como agentes políticos têm se apropriado, tensionado e mobilizado essa categoria através de gramáticas morais, políticas e religiosas às quais aderem. Meu argumento é que tais práticas discursivas não operam meramente em uma lógica de negação da existência da homofobia, mas na sua relativização como um problema menor ou pouco incidente no tecido social brasileiro, principalmente por parte de lideranças que se autodenominam conservadoras do Congresso Nacional. E, por conseguinte, nas tentativas destes parlamentares em escrutinar, esvaziar ou relativizar a categoria na sua dimensão política, conceitual e jurídica (conforme definido pelo Supremo Tribunal Federal em 2019). A exemplo, a afirmação em plenário, em 2019, do então deputado Otoni de Paula (PSC-RJ) de que não existe uniformidade nas definições empregadas para homofobia e transfobia. Assim, o que pretendo investigar neste trabalho é como deputados(as) estão empenhados(as) em contorcer, enquadrar e cooptar os sentidos e significados do conceito, ao mesmo tempo em que o condicionam ou o contrapõem a noções de liberdade de expressão, religiosa e na defesa da família. O intuito com isso é apreender como o termo tem sido inserido e manejado no terreno da política nacional, especialmente no que diz respeito às controvérsias públicas e aos pânicos morais em torno do gênero e das sexualidades.