Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 079: O visível e o in(di)visível: ciências, conhecimentos e produções de mundos.
Reencantamento do mundo e a imaginação de outros mundos possíveis: uma etnografia das narrativas
artivistas do grupo Tambores de Safo
Desencantamento do mundo é uma expressão cunhada pelo sociólogo alemão Max Weber para designar um
processo histórico milenar de desmagificação da compreensão da realidade, promovido pela religião e pela
ciência, dando lugar à um modo racional, guiado por práticas científicas e pelo avanço tecnológico, de
explicar o mundo. A destruição das imagens mágicas deu lugar aos processos de racionalização modernos, sendo
o racionalismo ocidental a marca fundamental do homem moderno. Esse processo de desencantamento do mundo se
deu a partir da expulsão dos elementos mágicos do âmago das práticas e crenças das grandes religiões,
através do estabelecimento de uma ética de conduta religiosa. Após a desmagificação das religiões
hegemônicas, ocorreu a desmagificação da sociedade ocidental como um todo, onde qualquer crença metafísica
passa a ser vista como irracional, dando lugar à ciência como o modelo de conhecimento que estabelece a
ordem racional das coisas através de uma concepção causal da natureza e do mundo. Este trabalho tem como
objetivo, através da problematização da noção de desencantamento, ampliar os horizontes do fazer científico,
assim como do fazer político, situando historicamente a construção desses saberes e trazendo para o diálogo
outras epistemologias não hegemônicas. Faremos isso através da etnografia realizada com o coletivo Tambores
de Safo, um grupo artivista que mobiliza categorias e compreensões que extrapolam o fazer científico e o
fazer político hegemônico, trazendo para o centro do debate uma construção artístico-política que se mostra
engajada com o debate decolonial que avança dentro e fora da academia e que se coloca como produtor de
conhecimento, trazendo à tona conceitos forjados no seio de epistemologias subalternizadas e evocando a
noção de encantamento. Tambores de Safo é um coletivo artivista composto por pessoas cisgêneras e
transgêneras, lésbicas, bissexuais e pansexuais, que pretende através da arte mobilizar uma produção de
saber politicamente encantada, bem como valorizar a cultura de matriz afroameríndia e produzir conteúdo
artístico-político antirracista e anticapitalista. A produção artivista do coletivo Tambores de Safo, que
conjuga arte com política, se faz a partir de uma epistemologia das encruzilhadas, ou seja, a partir da
confluência de diversos saberes e práticas que se atravessam. As encruzilhadas, domínio de Exu, são
dimensões espaciais-teórico-metodológicas que fundamentam os sistemas de pensamento da cosmologia de matriz
africana. Na lógica da encruzilhada, não há silenciamentos, aniquilações e padronizações. Não há uma ordem
única e nem um sentido único de caminhar. Assim, discutiremos noções como reencantamento e ancestralidade na
produção de saber através da etnografia realizada com o coletivo.