Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 080: Ontologia e Linguagem: línguas indígenas, artes verbais e retomadas linguísticas
Artes verbais e retomadas kanhgág: o que fazem os vẽnh jyvẽn e os tỹnh
Neste trabalho apresento algumas reflexões sobre duas formas de arte verbal do povo Kaingang: os
vẽnh jyvẽn, também traduzidos, em português indígena, como aconselhamentos, e os
tỹnh, geralmente traduzidos como cantos. A partir da etnografia realizada nas Terras Indígenas
Apucaraninha (PR) e Rio Da Várzea (RS), abordo a importância de ambas para a circulação dos kanhgág jykre
[conhecimentos kaingang] e para os movimentos de retomada kanhgág, que incluem tanto retomadas territoriais
quanto retomadas de formas de conhecer e existir enquanto kanhgág pé [verdadeiramente kaingang]. Os
vẽnh jyvẽn e os tỹnh exploram com profundidade recursos poéticos, semânticos e
gramaticais da língua kaingang [kanhgág vĩ], sendo considerados de grande beleza e eficácia. Além
disso, apontam para formas de conexão e atenção específicas e formas de relacionalidade que extrapolam o
plano das interações humanas. Estão em jogo, nestas formas discursivas, relações com os javé [ancestrais] e
relações interespecíficas, especialmente com os tãn [donos, mestres] de animais, plantas e outros seres.
Falas e cantos que fazem o pensamento, os vẽnh jyvẽn e os tỹnh constroem e
reforçam os vínculos dos Kaingang com seus ancestrais demiurgos Kamé e Kanhru, acionando continuamente o
tempo do mito [gufã] no presente. Os vẽnh jyvẽn versam também sobre relações de
respeito, cuidado, atribuições daquilo que é há [bom, correto, belo] e korég [ruim, errado, feio],
moralidades kanhgág que se replicam desde as falas dos antigos no vãsỹ [tempo passado] e que
orientam as condutas no ũri [tempo de hoje]. Nesta apresentação, trarei tanto trechos e
transcrições dessas formas discursivas, quanto reflexões indígenas sobre a importância de se saber ouvir e
proferir adequadamente a kanhgág vĩ [língua, fala kaingang], para a qual os vẽnh
jyvẽn e os tỹnh são fundamentais.