Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 095: Saberes plurais em torno do uso de drogas
A atuação das mulheres daimistas nas relações de poder no contexto de transnacionalização do Santo Daime
Compreendendo o poder como uma entidade não monolítica, mas sim como algo que se manifesta nas relações
sociais e está constantemente em fluxo (Foucault 1979), neste artigo, discutirei como, no contexto de
transnacionalização do Santo Daime, as mulheres tem participado das dinâmicas de poder dentro da religião. O
Santo Daime é uma religião ayahuasqueira brasileira de origem amazônica e que foi fundada na década de 1930
na periferia de Rio Branco (AC). Tradicionalmente, a organização dessa religião está estruturada a partir de
papéis e dinâmicas de gênero que tendem a refletir aspectos patriarcais de seu contexto de origem (Chaves,
2003; Moreira e Macre, 2011; Assis, 2017; Benedito, 2018). Desde a década de 1980, o Santo Daime adentrou de
maneira mais expressiva aos fluxos das religiões globais, inserindo-se em contextos marcados pela
secularização (Assis, Labate, 2014); pela guerra internacional às drogas tornadas ilícitas (Karam, 2013) e
pelas novas dinâmicas de gênero resultantes dos feminismos (Gross, 2005). Com essa inserção, um novo perfil
de adeptos passou a fazer parte dessa religião, em sua maioria, pessoas brancas, escolarizadas e das classes
médias (Assis, Labate, 2014). Atualmente, o Santo Daime está presente em todos os continentes habitados e em
mais de 43 países (Assis 2017), e, a partir de um levantamento exploratório realizado durante minha pesquisa
de doutorado, foi possível constatar que a maioria destes grupos conta com um público majoritariamente
masculino. Apesar disso, nesses mesmos espaços, vem sendo possível observar a importância da atuação de
mulheres na manutenção da presença dessa religião nos novos espaços nos quais vem se inserindo e nas
flexibilizações dos papéis de gênero dentro dela, ainda que nada disso ocorra isento de contradições,
conflitos e disputas. A título de exemplo, é possível citar o surgimento de mulheres em cargos de liderança
nas igrejas (especialmente na Europa e nos Estados Unidos); seu lugar de importância nas negociações diretas
de cunho institucional com o Estado; a ocupação por parte delas, de espaços antes dedicados exclusivamente
aos homens dentro da religião; a criação de novos cargos institucionais e de espaços de articulação
feminina, além do fortalecimento do apoio a vítimas de assédio e a tentativa de maior visibilidade de papéis
tradicionalmente atribuídos às mulheres. O texto é parte de minha pesquisa de tese na qual, partindo de um
lugar híbrido de mulher lésbica daimista pesquisadora, pude entrevistar em profundidade, com a utilização da
técnica do relato de vida (Bertaux 2010), mulheres daimistas de diversas partes do Brasil e do mundo.