Trabalho para Mesa Redonda
MR 69: Socialidades animais nas ciências humanas e sociais: desafios multidisciplinares e diálogos multiespécies
O Cosmopolitismo Doméstico nas derivas da Política Chilena atual
Em muitos países como o Brasil, pelo menos em grandes centros urbanos, os cães vira-latas estão se
tornando cada vez mais uma espécie em franca desaparição: os cães só podem habitar o espaço urbano sob a
propriedade de algum proprietário ou responsável e aqueles que estão fora desse registro, são confiscados
pelo Estado, como se a existência de cães fosse possível apenas como propriedade de um ser humano e
vinculada à posse responsável. Restam algumas matilhas em periferias e em algumas favelas. E os cães que
acompanham populações de rua em grandes cidades, o que confirma de alguma forma a perspectiva de seu
estatuto como propriedade.
No entanto, no Chile (e em algumas cidades do oeste da Argentina), há uma singularidade que já foi descrita
por viajantes como David Byrne: a existência de cães nas cidades não está referida apenas a proprietários
particulares, mas também é perceptível como parte singular das cidades. Nesses casos, se eles não são
animais domésticos, qual é o status deles como espécie (doméstica, selvagem ou praga)? Qual é a sua situação
em relação a esse espaço supostamente próprio da ecologia humana, isto é, cidades? Que formas singulares
esses animais apresentam diante outros canídeos (selvagens e domésticos)? O objetivo deste trabalho é
examinar as formas de associação entre cães, humanos e cidades em instancias específicas, como
manifestações, praças, ônibus e salas de aula e, a partir dessas descrições, refletir sobre a forma de
composição recíproca gerada por práticas de domesticação diversas e singulares. Gerando novas formas de vida
em comum interespécies.
Começarei discutindo aspectos específicos do que propomos chamar de metodologia quiltra (nome dos cães de
rua chilenos) numa linha de investigação que desenvolvo a partir da encruzilhada entre a etnografia e
etogramas etológicos. Em sequência, descreverei alguns conceitos derivados da observação e dos registros de
campo para discutir os trânsitos das formas de relação interespécies entre cães e humanos durante os
trânsitos da política chilena, considerando tanto o estalido social de 2019-2020, como os momentos
posteriores e mais atuais. A proposta é concluir este trabalho em forma de manifesto interespécies.
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