Trabalho para Mesa Redonda
MR 12: Antropologia do Segredo
Segredos e revelações nos Tribunais do Júri do Brasil e da França
Em sintonia com a proposta-chave da mesa – discutir o segredo como uma forma
relacional que envolve processos de comunicação, de contenção e circulação de informações,
bem como de formação e violação de alianças – apresentarei algumas análises antropológicojurídicas a respeito de segredos e revelações presentes no Tribunal do Júri brasileiro e na Cour
d’assises francesa.
Após apresentar, em linhas gerais, algumas das principais semelhanças e diferenças
entre os rituais dessas duas cortes, destacarei:
1) dificuldades, no Brasil e na França, para se ter acesso às pautas dos julgamentos,
apesar de, a princípio, serem sessões abertas ao público;
2) casos que “correm em segredo de justiça”;
3) situações em que os julgamentos acontecem, total ou parcialmente, a portas fechadas;
4) orientações dadas aos jurados para que não demonstrem seus pensamentos e
emoções e como suas linguagens corporais de adaptam (ou não) a isso;
5) juramentos de testemunhas, peritos, jurados e a não exigência de que informantes,
réus e vítimas “digam a verdade”;
6) compromissos de confidencialidade entre advogados e clientes, bem como entre
antropólogos e interlocutores;
7) estratégias de revelação e ocultação de argumentos utilizadas pelo Ministério Público,
Defesa e Assistentes de Acusação/Partes Civis;
8) a confissão ou não de réus e seu “direito a permanecer em silêncio” (direito ao
segredo?);
9) a produção de rumores, fofocas e informações pela mídia e por redes sociais sobre
os crimes;
10) o princípio da incomunicabilidade entre os 7 jurados populares no Brasil, que lhes
impede de trocar ideias entre si e com quaisquer pessoas a respeito do caso, inclusive
na “sala secreta”, antes de intimamente decidirem e secretamente votarem;
11) a comunicabilidade entre os 9 jurados na França (3 magistrados e 6 populares), que
lhes permite conversar sobre o caso nos intervalos do julgamento e debatê-lo, na
“sala secreta”, antes de intimamente decidirem e secretamente votarem;
12) sanções a jurados franceses que revelam os conteúdos dos debates ocorridos na “sala
secreta”.
A proposta, portanto, é demonstrar que há vários momentos, situações e camadas em
que, tanto nos plenários do Júri brasileiro quanto nos da França, segredos e revelações
marcam as tensões presentes nos processos comunicativos que se desenvolvem durante os
julgamentos. Cenários, performances, posições, relações de controle e, consequentemente,
de poder, estão em jogo.
Como o que interessa a uma antropologia do direito e do segredo, voltada para processos
decisórios em tribunais de justiça, não são os segredos, em si, mas a percepção e a análise das
redes de relações por eles mobilizadas, etnografias desses espaços são estratégias potentes
para observar tais processos.