ISBN: 978-65-87289-36-6 | Redes sociais da ABA:
Trabalho para Mesa Redonda
MR 12: Antropologia do Segredo
Segredos e revelações nos Tribunais do Júri do Brasil e da França
Em sintonia com a proposta-chave da mesa – discutir o segredo como uma forma relacional que envolve processos de comunicação, de contenção e circulação de informações, bem como de formação e violação de alianças – apresentarei algumas análises antropológicojurídicas a respeito de segredos e revelações presentes no Tribunal do Júri brasileiro e na Cour d’assises francesa. Após apresentar, em linhas gerais, algumas das principais semelhanças e diferenças entre os rituais dessas duas cortes, destacarei: 1) dificuldades, no Brasil e na França, para se ter acesso às pautas dos julgamentos, apesar de, a princípio, serem sessões abertas ao público; 2) casos que “correm em segredo de justiça”; 3) situações em que os julgamentos acontecem, total ou parcialmente, a portas fechadas; 4) orientações dadas aos jurados para que não demonstrem seus pensamentos e emoções e como suas linguagens corporais de adaptam (ou não) a isso; 5) juramentos de testemunhas, peritos, jurados e a não exigência de que informantes, réus e vítimas “digam a verdade”; 6) compromissos de confidencialidade entre advogados e clientes, bem como entre antropólogos e interlocutores; 7) estratégias de revelação e ocultação de argumentos utilizadas pelo Ministério Público, Defesa e Assistentes de Acusação/Partes Civis; 8) a confissão ou não de réus e seu “direito a permanecer em silêncio” (direito ao segredo?); 9) a produção de rumores, fofocas e informações pela mídia e por redes sociais sobre os crimes; 10) o princípio da incomunicabilidade entre os 7 jurados populares no Brasil, que lhes impede de trocar ideias entre si e com quaisquer pessoas a respeito do caso, inclusive na “sala secreta”, antes de intimamente decidirem e secretamente votarem; 11) a comunicabilidade entre os 9 jurados na França (3 magistrados e 6 populares), que lhes permite conversar sobre o caso nos intervalos do julgamento e debatê-lo, na “sala secreta”, antes de intimamente decidirem e secretamente votarem; 12) sanções a jurados franceses que revelam os conteúdos dos debates ocorridos na “sala secreta”. A proposta, portanto, é demonstrar que há vários momentos, situações e camadas em que, tanto nos plenários do Júri brasileiro quanto nos da França, segredos e revelações marcam as tensões presentes nos processos comunicativos que se desenvolvem durante os julgamentos. Cenários, performances, posições, relações de controle e, consequentemente, de poder, estão em jogo. Como o que interessa a uma antropologia do direito e do segredo, voltada para processos decisórios em tribunais de justiça, não são os segredos, em si, mas a percepção e a análise das redes de relações por eles mobilizadas, etnografias desses espaços são estratégias potentes para observar tais processos.