ISBN: 978-65-87289-36-6 | Redes sociais da ABA:
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 031: Artes e crafts: composições, técnicas e trajetos criadores
Pontos para alinhavar um método - Arquivos, repertórios e performances do tecido, corpo e espaço
Ao investigar o universo dos fazeres têxteis, encontramos um limite em relação às fontes escritas tradicionais. Ingold lembra que “a fiação, torção e união das fibras estiveram entre as artes humanas mais antigas, das quais todas as demais derivaram, incluindo tanto as construções quanto os têxteis”. Apesar disso os fios nunca foram matéria de atenção aos estudos das artes, humanidades e ciências, por não levarem a sério os trabalhos compreendidos como femininos. Recorrer à oralidade seria a resposta mais rápida de um cientista social frente ao desafio de lidar com tal contexto não registrado pela escrita. No entanto, seria a voz suficiente para dar conta de um sistema permeado por gestos, imagens e silêncios? A autora Leda Maria Martins nomeia oralituras os movimentos performáticos grafados pela voz e pelo corpo na oralidade, nos quais o “gesto não é apenas uma representação mimética de um sentido possível (...) mas também institui e instaura a própria performance” (MARTINS, 2003,p. 65). Em extensão, o fazer se torna uma forma de contar, o artesanato uma expressão de um olhar subjetivo sobre o mundo. Podemos, com Diana Taylor, ir além e pensar nos mais diversos tecidos, mesmo aqueles à primeira vista ordinários, como registros, no sentido em que “tudo que tem significado se torna uma espécie de escrita”(TAYLOR, 2013, p. 57). Nesse fio, podemos pensar as performances que envolvem os fazeres têxteis como repertório, “maneiras como se produz e se transmite conhecimento por meio da ação incorporada" (TAYLOR, 2013, p. 55). Pensando com Diana e Leda, podemos “levar a sério o repertório de práticas incorporadas como um importante sistema de conhecer e de transmitir conhecimento.” (TAYLOR, 2013, p. 57). Nesta relação entre o dizer, o saber e o fazer, Porto-Gonçalves enxerga uma dimensão de disputa de poderes: “Há uma tradição que privilegia o discurso – o dizer – e não o fazer. Todo dizer, como representação do mundo, tenta construir / inventar / controlar mundos. Mas há sempre um fazer que pode não saber dizer, mas o não saber dizer não quer dizer que não sabe. Há sempre um saber inscrito no fazer.” (Porto-Gonçalves, 2017, P. 51). Não basta, assim, que escutemos apenas com os ouvidos às histórias que essas praticantes do tecido têm a nos contar, precisamos aprender a implicar nossos corpos e dialogar com suas performatividades. Há uma voz que não se manifesta da mesma forma que a palavra falada na vida política ou pública, pessoas que encontram outros meios para compartilhar suas subjetividades. Neste pequeno ensaio busco tatear, na interlocução de artesãs e pesquisadoras, os pontos que alinhavam uma inteligência própria dos fazeres têxteis: a textualidade dos arquivos têxteis; a leitura pelo avesso; os jogos de escala; os gestos que retramam o mundo.