Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 027: Antropologias da Paisagem: Conhecimentos, Relações e Políticas Multiespécie
Uma corografia social do rio Paraguaçu: história, percepções e travessias.
Compreendendo a paisagem como um processo, um indicativo de um mundo em desenvolvimento, atravessado, proponho apresentar o modo como venho abordando a paisagem do rio Paraguaçu, através da minha pesquisa de doutorado ainda em andamento. No intuito de desenhar uma corografia social do Paraguaçu, uma das minhas escolhas metodológicas tem sido a travessia. O rio Paraguaçu é o maior rio localizado inteiramente no estado da Bahia. O curso d’água nomeia a bacia hidrográfica do Paraguaçu, que é considerada por muitos o mais importante sistema fluvial de domínio do estado da Bahia, já que, com mais de 150 afluentes é a responsável pelo abastecimento de água e 60% da população da região da Grande Salvador – capital do estado e região metropolitana - e da cidade de Feira de Santana, segunda cidade mais populosa do estado, através da Barragem da Pedra do Cavalo. O rio vincula três biomas distintos: a mata atlântica, a caatinga e o cerrado. A presença desses três biomas se torna notória pelas alterações da vegetação, da geomorfologia e pela diversidade de modos de ocupação e uso do solo, que vai desde a presença de serras e vales da Chapada Diamantina, passa pela aridez da caatinga, pelos patrimônios materiais e históricos do recôncavo baiano, até o encontro com a Baía de Todos os Santos. Ilhas, enseadas, restingas, lagos de barragens, um leito ora largo, ora estreito e meandros são algumas das formas que aparecem na paisagem do rio. Histórias, pessoas e coisas atravessam e ocupam o leito deste rio, fabricam suas margens, limites e fronteiras, construindo encontros, fazendo laços, barrando o tempo em eventos, resistindo e negociando com o agronegócio e o hidronegócio, enquanto nos apresentam outras possibilidades de conhecimentos que mantém vidas ao longo da vinculação desses biomas.
Desse modo, inspirada na paisagem como uma categoria interessante para abordagens processuais em etnografia (Silveira et al., 2021), proponho descrever e compreender diferentes sentidos construídos, ao passo que diferentes modos de existência vivem com o Paraguaçu, interagem com ele e com outras existências que o habitam, diante dos três biomas percorridos por suas águas. Para tanto, recorro a narrativas de travessias, produzidas a partir da memória e da minha inserção etnográfica, como um meio de testemunhar estes sentidos e descrever a vinculação destes biomas. Assim, esta comunicação objetiva apresentar uma visão geral da paisagem do Paraguaçu, considerando as vinculações entre os três biomas por onde ele passa, os modos de exploração e de lidar com o rio, que decorrem dessas vinculações, a partir da travessia como escolha metodológica.