Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 050: Entre arte e política: articulações contemporâneas em pesquisas antropológicas
Não esqueça o motivo de nenhuma de suas partidas Ações performáticas em rodoviárias de Natal e a relação de migração e violência de gênero
Esta pesquisa em andamento faz uma reflexão sobre a relação entre migração e violência de gênero. Através da metodologia criada para o projeto doutoral, realizo uma ação performática em rodoviárias de capitais nordestinas. Essa metodologia ocorre a partir da minha vivência artística. Vestida com um macacão vermelho, sentada em silêncio em um banco na área de embarque, seguro um cartaz com as frases: Escuto mulheres. Escrevo/escrevemos histórias de mulheres sobre chegadas e partidas.
Por meio da ação performática, busco ouvir e escrever relatos sobre deslocamentos de mulheres. Compartilhar diferentes experiências, num fluxo de memórias, uma movência que convoca escuta, espaço, passagem (KRUCKEN, 2021). Conhecer parte das histórias dessas mulheres, até então, têm me trazido dados de violências de gênero que atravessam diferentes trajetórias ao longo dos anos.
No campo, a entrevista piloto já conseguiu mostrar outras dimensões de violências e por isso trago um dos relatos ouvidos até então. Damiana, uma mulher branca, de 52 anos, classe baixa, mora em Salvador e chegou na capital potiguar há quase três meses. Viajou para cuidar da mãe, que está doente. Ficou como cuidadora dela num hospital público em Natal, por dois meses, até a mãe ir para a UTI. Precisou sair do hospital e passou a morar na rodoviária. No dia que participou da ação, estava há duas semanas nessa situação, mas não pensava em voltar para casa. O sentimento que a moveu a viajar foi a perda, o medo de não encontrar mais a mãe viva. Com isso, podemos localizar como o recorte de violência de gênero é ampliado e traz outras dimensões, como a violência de Estado, uma vez que ela precisa morar numa rodoviária para cuidar da mãe, por falta de recursos.
Na metodologia, também coloco o meu corpo e experiências. Damiana indaga o que estou fazendo ali. Pergunto se gostaria de ouvir o meu relato, que abre o caderno usado na performance. Damiana será a única a ouvi-lo. Ela narra sua travessia, eu escuto. Eu conto o motivo de minha partida, ela ouve. Damiana fica curiosa e me pergunta mais sobre o projeto. Digo que faz parte de uma pesquisa de doutorado e pergunto se ela autoriza que eu leia o dela para a próxima mulher que se sentar comigo. Ela diz que sim. Volto a ficar em silêncio. Ela, então, começa a falar. Conta sobre as violências que sofreu do ex-marido e do dia que 18 anos depois de casada o colocou para fora de casa.
Desse modo, através da escuta de relatos de mulheres, apresento o de outras, construindo uma teia de significados. Rodoviária, são espaços de classe popular e por isso, escolho dialogar com Oyěwùmí (2004), Lugones (2008) e Kimberlé (1991), por também considerar que gênero precisa ser analisado junto com raça e classe, como marcadores da diferença entre as mulheres.