Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 023: Antropologia e saúde mental: sofrimento social e (micro)políticas emancipatórias
"O trabalho me consome. Ele consome a minha mente": Pensando o trabalho através da experiência de pessoas com Transtorno Afetivo Bipolar em grupos no Facebook
Gabriela Gonçalves de Aguiar (UFRGS)
Este trabalho visa discutir a relação de indivíduos não institucionalizados que possuem o diagnóstico de Transtorno Afetivo Bipolar (TAB) com o mercado de trabalho. O TAB é uma condição que está relacionado com altos índices de desemprego, dificuldades financeiras e laborais, maior propensão a estresse interpessoal e instabilidade no emprego. Recentemente tem-se falado mais sobre a relação entre as condições atuais de trabalho e o adoecimento psíquico de trabalhadores, mas como esses trabalhadores percebem e lidam com o trabalho em seu dia a dia, quando já possuem um diagnóstico de transtorno psiquiátrico? A partir da minha própria experiência convivendo com o diagnóstico de TAB há seis anos e trabalhando em empregos formais, bem como dos relatos em grupos de pessoas com TAB da rede social Facebook, pretendo discorrer sobre como o trabalho pode assumir uma dimensão grande e complexa, por vezes pesada, na vida de pessoas com TAB. É através dele que é garantido o seu sustento, e muitas vezes de suas famílias, e também se coloca como condição necessária para a continuidade do tratamento psiquiátrico, custeando as consultas de psiquiatras e psicólogos e, principalmente, a compra dos medicamentos. Em muitos casos é necessário tomar vários medicamentos ao mesmo tempo que não são acessíveis, nem estão disponíveis pelo SUS. É comum que as empresas pressionem por um rendimento, dito "normal", criando ambiente prejudicial à saúde mental, o que atrapalha o tratamento da pessoa com TAB. Ao mesmo tempo, é uma reclamação comum nos grupos do observados a resistência dos médicos em dar atestados que permitam o afastamento do trabalho ou recebimento de auxílio-doença. Tanto a empresa quanto os psiquiatras subestimam o quanto o TAB é incapacitante e, por vezes, querem que a pessoa com TAB se esforce e trabalhe mais do que ela consegue. O medicamento psiquiátrico é a principal via de tratamento, mas este também pode interferir no rendimento no trabalho e em outros âmbitos da vida já que nem sempre o organismo da pessoa se adapta a primeira medicação indicada, sendo necessário testar vários medicamentos e dosagens e manejar seus diversos efeitos colaterais. Assim, a pessoa diagnosticada com TAB tem que navegar entre dois sistemas de controle. Por um lado, submetido ao sistema disciplinar do trabalho, em que pode ser punida por sua condição ao não apresentar a produtividade esperada. Por outro, submetida ao regime biopolítico do poder médico, que pretende o gerenciamento da vida pelos medicamentos. Os dois sistemas tem como prioridade a produtividade do indivíduo para o sistema capitalista, e não o seu bem-estar.