ISBN: 978-65-87289-36-6 | Redes sociais da ABA:
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 080: Ontologia e Linguagem: línguas indígenas, artes verbais e retomadas linguísticas
Ontologia, linguagem e movimento: uma abordagem tensiva sobre os xamanismos dos Hupd’äh, Yuhupdëh e Dâw
Distanciando-se de concepções de linguagem que operam a partir da separação entre natureza e sociedade, ou de conceitos como ideologia linguística (crenças e representações sobre a linguagem e sobre o real), o presente trabalho enfoca o multinaturalismo linguístico a partir da análise comparativa e das dimensões tensivas da poética dos soproencantamentos, gênero discursivo importante para os xamanismos dos povos Hupd'äh, Yuhupdëh e Dâw que vivem no Alto Rio Negro-AM. Trabalhos recentes sobre as línguas e artes verbais no Alto Rio Negro vêm apontando que, para contribuir com o registro e fortalecimento do multilinguismo, é fundamental a atenção às proposições ontológicas dos interlocutores indígenas quanto à tradução, dialogicidade, escuta e alteridade, tendo especial atenção às artes verbais e formas de discurso xamânicas (Barreto, 2019; Chernela, 2018; Epps & Ramos, 2020). A região do Alto Rio Negro-AM configura-se como uma das áreas com maior intensidade de multilinguismo no Brasil e até no mundo. Há um total de 22 grupos étnicos indígenas que falam línguas das famílias linguísticas Arawak, Tukano e a família formada pelas línguas Hup, Yuhup, Dâw e Nadëb. As complexas dimensões do contínuo entre ontologia-linguagem-movimento que os soproencantamentos Hup, Yuhup e Dâw revelam são aqui analisadas a partir da proposta de uma Antropologia Tensiva. Partindo da noção de diferença transversal (Viveiros de Castro, 2008), enfoca-se os modos de comunicação entre heterogêneos, entre multiplicidades intensivas, e busca-se descrever os caminhos vividos como linhas de fuga que acionam relações intensivas, feixes de afecções e forças que transformam os termos ao fazer passar algo entre eles. A aproximação crítica com a Semiótica tensiva permite então entender como o gradual e o contínuo aparecem em fenômenos linguísticos, cosmológicos e nos múltiplos mundos vividos a entrecuzarem-se. Enfatizando-se uma semântica das tensões e das gradações procura-se revelar as continuidades e descontinuidades entre a intensidade (ordem do sensível) e a extensão (ordem do inteligível), o que torna possível entender como se delineiam múltiplos campos de presença, centros dêiticos que correlacionam gradientes de presença e ausência de humanos e Seres-outrem (Fontanille, 2007; Zilberberg & Fontanille 2001).