ISBN: 978-65-87289-36-6 | Redes sociais da ABA:
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 026: Antropologia, memória e eventos críticos
Memória e genocídio: considerações sobre os efeitos mnemônicos de um massacre estatal
O poder de um evento crítico pode ser visto com o tempo, na medida em que seus desdobramentos não cessam de imediato. A morte, como evento crítico, é capaz de transformar profundamente a vida de diversas pessoas. E um massacre estatal marca um ponto de inflexão na história de famílias e comunidades, produzindo efeitos duráveis. O objetivo desse trabalho é analisar quais os efeitos mnemônicos que um massacre oficioso promovido pelo Estado em maio de 2006 na Baixada Santista do estado de São Paulo, no evento conhecido como Crimes de Maio, gerou nas mães e familiares das vítimas da violência estatal que formaram o Movimento Mães de Maio. Através de uma pesquisa etnográfica realizada durante cinco anos, busco deslindar qual a relação da memória com esse evento crítico que remodelou irreversivelmente as vidas dessas mães. Por um lado, almejo saber quais marcações a violência de Estado gerou na memória dos familiares (a exemplo da dor, do sofrimento, da nostalgia e do trauma). Por outro lado, busco compreender como esses familiares produzem ativamente práticas mnemônicas que implicam um valor político para a memória do filho morto e da injustiça cometida. Nesse sentido, observo como as composições de memória (BORGES, 1944) das Mães de Maio em relação aos Crimes de Maio são formadas, bem como quais as “imagens agentes que tais composições criam e inventam (CURRUTHERS, 2000). Assim, a memória será encarada nesse trabalho não como meio de representações, mas a partir daquilo que ela cria, das relacionalidades que faz e desfaz (CARSTEN, 2007). Portanto, ao analisar a história, práticas e falas das Mães de Maio, interpelo a noção, o conceito e o tema da memória a partir de cinco eixos iniciais: a) as formas de inscrição da memória no corpo; b) a memória como plataforma de luta contra o genocídio e o esquecimento; c) a memória como ferramenta constitutiva da identidade política e existencial; d) a memória como dispositivo de pertencimento a uma comunidade moral; e) a memória como forma de conexão entre vivos e mortos. Consequentemente, ao explorar as relações entre memória e evento crítico por meio dessas diferentes linhas de aproximação à temática, interessa-me apreender os sentidos etnográficos que conectam memória, parentesco e política para o Movimento Mães de Maio.