Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 060: Experimentos de Ontologia: formas de mundialização desiguais e etnografia como atuar criativo.
Antropologia Indígena, indigenismo, antropologia: algumas questões preliminares acerca de conexões
possíveis
Ao longo das últimas décadas, a antropologia tem evidenciado certa dimensão política e poética do
processo de pesquisa, o que se desdobrou numa ampla reflexão sobre as especificidades contextuais
significativas no processo etnográfico, as parcialidades inerentes ao saber científico e a dinâmica complexa
de estabelecimento de acordos locais de pesquisa e de redes de relações com novos atores emergentes. Ao
mesmo tempo, a emergência atual do conceito de Ontologia suscita um campo de reflexões e contribuições para
a crítica política e epistemológica da disciplina antropológica. Nessa esteira, e buscando refletir sobre
modos de relação, comunicação e ação possíveis em meio ao reconhecimento de certa incomensurabilidade entre
mundos, apresento questões preliminares relacionadas a possíveis emaranhamentos, sobreposições e
contradições que emergem do encontro dos campos da antropologia, do indigenismo e da antropologia indígena.
Para tanto, pretendo refletir sobre minha atuação como pesquisador e servidor público da Funai junto ao povo
Auwẽ (Xavante) no leste mato-grossense. Buscarei descrever tensões, riscos e potencialidades de
uma coexistência delicada inerente à posição de pesquisador-servidor, corporificada neste encontro entre
estrutura institucional e engajamento pessoal; entre saberes - científicos ou não -, ação tecnopolítica e
alianças cosmopolítica estabelecidas em meio à divergência. Descrevo, por um lado, a experiência como
funcionário da área de gestão ambiental e territorial é cotidianamente confrontada com marcas persistentes
do problemático histórico de relações entre Funai e os Auwẽ, atravessado por projetos
desenvolvimentistas e por relações assistencialistas. Por outro, aponto como é possível vislumbrar alianças
entre agências estatais e os Auwẽ que, ainda que profundamente tensionadas e sujeitas a riscos de
captura, mostram-se fundamentais na luta indígena contra ameaças ao Cerrado centro-brasileiro. Articulada à
está discussão, pretendo tecer reflexões a respeito de uma antropologia indígena, a partir da discussão de
trabalhos e da ação cosmopolítica de antropólogas indígenas norte-americanas e brasileiras e de minha
própria colaboração com antropólogos auwẽ. Argumento que a razão de ser deste campo está
estreitamente relacionado a uma pragmática cosmopolítica - e, talvez, extra-acadêmica - fundamental para a
constituição e, sobretudo, para a defesa de mundos. Pretendo, com isso, criar ressonâncias entre estes
campos que permitam aventar questões sobre maneiras efetivas de extrapolar o mapeamento abstrato e
conceitual de conflitos e controvérsias e de reencontrar a ação cosmoprática, assumindo posições de sujeito
com responsabilidades éticas sobre regimes de existência específicos.