ISBN: 978-65-87289-36-6 | Redes sociais da ABA:
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 097: Sistema de justiça e a (re)produção da cultura jurídica brasileira
O crime de violência política contra a mulher: uma etnografia entre o direito e política nos autos processuais da Justiça Eleitoral
Como uma violência torna-se um crime, mais especificamente, um crime eleitoral? Como julga a Justiça Eleitoral? Quais são as particularidades de uma violência de gênero ser um crime eleitoral? Como disputas políticas expressam-se no mundo do direito? Essas são algumas das questões que pretendo elaborar na apresentação, que é parte da minha pesquisa de mestrado, em andamento, que tem por objetivo principal perseguir a produção, articulação e mobilização da categoria de violência política de gênero por movimentos sociais e pelo poder judiciário. Após o assassinato de Marielle Franco, em 2018, o tema da violência política de gênero ganha tração no Brasil e, entre outras consequências, enseja a aprovação da Lei nº 14.192/2021 que introduz ao Código Eleitoral o art. 326-B que tipifica o crime de violência política contra a mulher com pena de reclusão de um a quatro anos. Por fazer parte do Código Eleitoral, a justiça competente para analisar e julgar casos de violência política contra mulher é a Justiça Eleitoral. Contudo, é preciso levar em consideração que uma etnografia sobre a Justiça Eleitoral encontra-se em uma tríplice fronteira, que exige um constante diálogo, tradução e interpretação de termos, conceitos e categorias do mundo do direito e do mundo político para uma análise antropológica. Isso porque a Justiça Eleitoral guarda diversas particularidades, quando comparada a outras esferas do poder judiciário, que são, em geral, objeto de estudos antropológicos. Pode-se dizer que a Justiça Eleitoral é um híbrido, que não apenas tem competência para conflitos político-eleitorais quando provocada; mas tem também poder administrativo e regulamentar. Ainda, ao contrário dos tribunais de justiça comuns, a Justiça Eleitoral tem uma composição rotativa, ou seja, a cada dois anos, juízes da justiça comum atuam, durante um biênio, como juízes eleitorais. Nesse sentido, pensar a criminalização, a nível eleitoral, coloca uma série de questões para a reflexão antropológica e, também, para a reflexão jurídica. Nesta apresentação, busco discutir as implicações de se realizar uma etnografia nessa esfera do judiciário e abordar aspectos dos autos processuais referentes ao crime de violência política contra mulher. Por ser um tipo penal recente, existem ainda poucos casos tramitando na Justiça Eleitoral. Ao longo de minha etnografia, identifiquei 18 casos sobre o tipo penal. A partir da imersão nos autos, busco traçar reflexões sobre quem são as pessoas que acionam a Justiça Eleitoral, quais agressões são compreendidas como violência política, quais são as implicações de se julgar um crime que, via de regra, estão sempre gravados, registrados e com testemunhas; e como fazer política e fazer justiça confundem-se na Justiça Eleitoral.