Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 063: Gênero, sexualidade e raça: produção de diferenças e desigualdades na cidade
Bissexualidade e classificações da sexualidade: ambiguidade e regionalidade em Belém no fim do século XX
A cidade de Belém do Pará tem sido pensada como um campo empírico que foi fundamental para a análise dos
processos de mudança nos sistemas de classificação da sexualidade no Brasil, mais especialmente o lugar
atribuído ao estudo antropólogo Peter Fry sobre a homossexualidade masculina. A categoria bissexual, ainda
que menos estudada, aparece nesse debate como um elemento controverso. Este trabalho toma a liminaridade
dessa categoria como ponto de partida para analisar essas mudanças, e o faz a partir de uma reflexão crítica
sobre as diferenças regionais do país. Tem como objetivo contribuir para a compreensão de processos de
mudança nas classificações da sexualidade e das categorias com as quais opera, sobretudo a categoria
bissexual, considerando seu caráter relacional e disputado. O recorte empírico é o da cidade de Belém,
entre as décadas de 1970 e 90, período de ampliação do debate público sobre a sexualidade na cidade, com a
eclosão da epidemia de HIV/Aids, o desenvolvimento de espaços segmentados de sociabilidade, as pesquisas
sobre sexualidade e a organização de movimentos locais de homossexuais, mulheres prostitutas e combate à
epidemia. Porém, mais do que um campo empírico, a análise propõe considerar a cidade como um campo de
produção de conhecimento. A metodologia consiste em um mapeamento de espaços, sujeitos e debates que permita
uma análise das categorias presentes, seus usos e seus trânsitos. Este procedimento cruza a realização de
entrevistas de pessoas envolvidas nos espaços de discussão da sexualidade com a análise de sua produção
intelectual, arquivos pessoais e os dois jornais de maior circulação na cidade no período: O Liberal e O
Diário do Pará. Como resultados, são descritas as tensões provocadas pela emergência de novas categorias em
um contexto no qual se estabelecem contrastes regionais com as capitais do Sudeste do país. A influência da
epidemia de HIV/Aids sobre as classificações da sexualidade no Brasil, apontada na literatura, não encerra a
totalidade da emergência dessa categoria, que foi dispersa e polissêmica. Além disso, um imaginário baseado
pela ideia de Amazônia é mobilizado, seja por moradores ou visitantes, nas formas como a sexualidade é
classificada e compreendida. A circulação de categorias como bissexual, GLS e andrógino era mediada em seus
múltiplos sentidos pela noção de que a Amazônia é uma região sem sexualidade ou menos madura sexualmente,
uma terra virgem.