ISBN: 978-65-87289-36-6 | Redes sociais da ABA:
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 092: Retomadas, tessituras e insurgência no fazer antropológico e outros fazeres.
Sobre antropologias e suas crias: o cuidado no centro do fazer etnográfico.
Nesta comunicação, aportamos às maternidades como marcador social da diferença considerando as especificidades do fazer antropológico. Nosso argumento é em prol de antropologias que olhem, escutem e escrevam através das sobreposições possíveis entre o pessoal e o intelectual na trajetória de antropólogas mães construída na conciliação entre o trabalho do cuidado e o trabalho científico. Esse debate é deveras importante em uma ciência que se ocupa das relações de alteridade, mas que pouco escuta os sons que emergem do cotidiano de quem cuida ao mesmo tempo em que faz antropologia. Dessa forma, é necessário o reconhecimento do cuidado como centro do trabalho da antropóloga diante do desafio de antropólogas-mães de ir a campo e produzir etnografia tal como aprendemos em nossas formações canônicas. Assim, essa proposta vista discutir o cuidado de um ponto de vista metodológico e epistemológico, centrando em uma prática ética-política em diálogo com o debate feminista interseccional. Se é preciso considerar a existência de muitas realidades em nossos trabalhos de campo, há também as realidades relativas ao próprio fazer antropológico, sempre situado, mas ainda pouco abordado sob a perspectiva do cuidado (PÉREZ-BUSTOS, 2020). A história da antropologia brasileira há muito tem sido criticada pelo apagamento da produção intelectual e da contribuição de mulheres para a formação da nossa disciplina (CORRÊA, 2003). Mais recentemente, discutimos o que faz de uma obra um clássico (BRANCO et al., 2018) e os autores que lemos nos cursos de mestrado e de doutorado (TEIXEIRA; CUNHA, 2023), promovendo, assim, a crítica necessária sobre o reconhecimento de quem faz antropologia (GROSSI; REA, 2020). Para isso, tem-se considerado as interseccionalidades entre raça, gênero, classe e nacionalidade, de modo a refletir sobre os contextos e sujeitos que estudamos, sobre como fazemos antropologia e como ela tem sido ainda produzida de forma hegemônica a partir de pressupostos eurocêntricos, a despeito dos avanços trazidos pelas políticas afirmativas dos últimos anos. Por fim, consideramos ser esta uma importante discussão, pois ainda há poucas reflexões sobre quem faz antropologia no país, especialmente diante da emergência de um debate público acerca do cuidado que tem revelado a manutenção da divisão sexual do trabalho, inclusive, nas ciências sociais. Apesar de estarmos em um processo de pluralização de nosso corpo discente e docente, nossa disciplina continua desparida e descuidada em relação aos contextos de suas antropólogas e suas antropologias e das encruzilhadas que marcam os saberes e fazeres de nós mães e antropólogas, entre os espaços acadêmicos e o cotidiano da vida (re)produtiva.