ISBN: 978-65-87289-36-6 | Redes sociais da ABA:
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 012: Antropologia das Emoções
Amor, vergonha e culpa nos discursos das mães de homens trans: uma análise micropolítica das emoções
Este trabalho analisa os aspectos micropolíticos das emoções presentes nos discursos de familiares de homens trans, em sua maioria mães ligadas ao ativismo político. A análise desses discursos está situada no campo teórico e etnográfico conhecido como antropologia das emoções e na sua intersecção com os temas do gênero, parentesco e poder. Este trabalho integra parte de uma pesquisa mais ampla de doutorado, ainda em desenvolvimento, em que foi realizada uma etnografia entre os anos de 2020 e 2023, que incluiu observação participante em espaços frequentados por homens trans e suas famílias nas cidades de Salvador/BA, Feira de Santana/BA e Aracaju/SE, entrevistas semiestruturadas, além de conversas informais. Para esta apresentação, será focado nos discursos das mães que, ao narrarem o momento de “descoberta” da identidade transmasculina de seus filhos, descreveram um misto de sentimentos, sendo a vergonha, a culpa e o amor os mais abordados por elas. A vergonha emerge nessas falas como uma resposta ao olhar julgador do outro que não respeita a transgeneridade, sendo esta percebida como algo negativo e, portanto, motivo de constrangimento. Associada a isso, a culpa também emerge nessas narrativas atrelada a compreensão da transgeneridade como um desvio moral. Essas mães relataram que sentiram culpa e foram culpabilizadas pela transição de seus filhos e, consequentemente, recaiu sobre elas a responsabilidade dessa “falha de conduta”. Assim, a análise desses sentimentos evidencia duas formas de manutenção das hierarquias de gênero: o entendimento da transgeneridade como um “erro de conduta” que se contrapõe a cisgeneridade como “normal”; e a responsabilização das mulheres por esse “erro”, sendo elas culpadas por qualquer “desvio” em suas famílias. Por outro lado, o amor aparece nos discursos dessas mães como um elemento fundamental para apoiar a transição. Assim, “aceitar um filho trans por amor” foi uma das formas pelas quais essas pessoas conseguiram manter suas relações, sendo o amor descrito como parte constitutiva do parentesco. Além disso, o amor ganha contornos mais coletivos ao ser utilizado como principal estratégia de mobilização política de um grupo ativista composto majoritariamente por mães de pessoas LGBTQI+. Esse grupo utiliza de concepções hegemônicas sobre a maternidade, como “a boa mãe é aquela que ama e cuida”, para que esse “amor” possa “eliminar preconceitos” e incluir as dissidências sexuais e de gênero. Assim, essas mães ativistas utilizam de retóricas políticas emocionais como forma de agir frente à cisheteronormatividade. Com isso, essa apresentação visa demonstrar a complexidade do potencial micropolítico das emoções frente às relações normativas de subordinação e poder.