ISBN: 978-65-87289-36-6 | Redes sociais da ABA:
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 048: Ensinar e aprender Antropologia
A percepção da cultura como gambiarra: caminhos possíveis da Antropologia no Ensino Médio
Como explorar as potencialidades do conceito de cultura e do método da Antropologia com estudantes do Ensino Médio? Neste trabalho, apresento uma sequência de aulas realizada na disciplina de Sociologia em uma escola pública do Ensino Médio em que, ao final, em uma articulação entre os conhecimentos dos estudantes e as ferramentas propostas pela Antropologia, chegamos à conclusão de que toda cultura é uma gambiarra. O mote antropológico de se estranhar o que é comum e de se familiarizar com o que é estranho tem servido para mim, enquanto professor de Sociologia na rede estadual, como uma potência criadora de práticas escolares dissidentes de uma educação bancária, como nomeada por Paulo freire, que se fundamenta na repetição do mesmo e na domesticação (quando não exclusão sumária) da alteridade, estabelecendo o uniforme como norma e princípio. Partindo da perspectiva de que, como diz Tim Ingold, a antropologia não lhe diz o que você quer ouvir, ela abala os fundamentos do que você pensava que já sabia”, propus aos alunos alguns exercícios de estranhamento sobre o espaço escolar, suas formas de constituição e as naturalizações que compõem seu cotidiano. Iniciando com uma dinâmica sobre o texto Ritos Corporais Entre os Nacirema”, de Horace Miner, em versão adaptada, fizemos uma caminhada atenta pela escola e, em grupos, os alunos fotografaram objetos, espaços e ritos desse ambiente que consideraram cotidianos e escreveram trechos descrevendo-os como estranhos e exóticos. Em sequência, passamos por um jogo para perceber culturas como teias de significados”, baseado em Clifford Geertz; por uma discussão sobre o fazer antropológico como estranhamento, familiaridade e registro de outros”, seguida de um exercício de escrita de cadernos de campo baseado no olhar, ouvir e escrever antropológicos, como coloca Roberto Cardoso de Oliveira; por fim, discutimos em sala de aula o texto O Cidadão 100% Americano”, de Ralph Linton. Assim, continuando nossas conversas e retomando as práticas anteriores, chegamos juntos à conclusão, pouco ortodoxa, de que toda cultura é uma gambiarra, partindo das ideias de Helena Assunção e Ricardo Mendonça para evocar o termo gambiarra como práticas de improviso, de reapropriação de algum recurso disponível que o transforma e adequa a uma necessidade específica”. Diante dessa sequência, que continua reverberando em minha atuação docente e que culminou numa conceituação coletiva, inesperada e inventiva do tão debatido conceito de cultura, percebo que a própria antropologia ganha novos fôlegos quando propomos que ela seja praticada em ambientes não acadêmicos e especializados, como é o Ensino Médio, num movimento que reinventa e bagunça os fundamentos do que achávamos que sabíamos, parafraseando Ingold.