Trabalho para Mesa Redonda
MR 53: O FAZER ANTROPOLÓGICO NUMA SOCIEDADE DAS IMAGENS: perspectivas críticas e desafios teóricos e metodológicos aos cânones clássicos
Reflexões sobre ética e estética na documentação e exibição audiovisual dos rituais de matriz africana para além das guerras de imagem
Em 2004, filmei, pela primeira vez, uma festa de tambor de mina. Realizava uma pesquisa sobre questões
territoriais no quilombo maranhense de Santa Rosa dos Pretos, quando fui convidada por Mãe Severina para
filmar a festa de seu encantado-guia, o Caboclo Cearenso. O interesse pela filmagem foi por ela mesmo
revelado: Eu tinha vontade de me ver dançando, porque até agora eu não me vi dançando, uma vez que
incorporada, atuada, ela perde seus sentidos. Fiquei surpresa com seu pedido, pois até aquela época
considerava que a produção e a circulação de imagens dos espaços, dos rituais e dos médiuns incorporados por
entidades das religiões de matriz africana eram restritas e até mesmo proibidas.
Atualmente, com o novo cenário sociotecnológico que permitiu o amplo acesso às câmeras de celulares, os
próprios religiosos filmam e fotografam suas casas, festas, rituais, as danças dos orixás, inquices, voduns,
caboclos, exus, pombagiras, promovendo nas redes sociais uma intensa, afirmativa e dispersiva profusão de
suas imagens.
Para a presente mesa, desafiada a refletir sobre o fazer antropológico numa sociedade das imagens, discorro
sobre ética e estética na documentação e exibição audiovisual dos rituais de matriz africana para além das
guerras de imagem, investigando e interrogando, a partir dos questionamentos de Latour sobre o iconoclash
(2008), as múltiplas performances imagéticas da documentação dos rituais, as dos documentados, as minhas e
de muitas outras exibidas nas redes sociais.