Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 060: Experimentos de Ontologia: formas de mundialização desiguais e etnografia como atuar criativo.
Conflitos ontológicos, propriedade privada e lutas pelo comum, diálogos interepistêmicos México-Brasil.
O que se precisa para se dar conta dessa doença, dessa podridão da humanidade? Não se precisa uma
religião, ou uma ciência, ou uma ideologia. Basta olhar, escutar, sentir. Com a frase, o Subcomandante
Moises problematiza a nova convocação dos indígenas guerrilheiros do México para atravessar a tormenta e
chegar ao outro lado. Uma reflexão desses maias onde a tormenta é à inconformidade da natureza (
) sua a
forma de protestar, cada vez mais forte e cada vez mais terrível, e a experiência sensível da catástrofe
ambiental a maneira de criar um lugar-comum. Mas a tempestade, na reflexão deles, esta dada na propriedade
privada: centro do capitalismo e colonialismo ocidental, opondo-se à catástrofe com sua proposta de
estabelecer extensões da terra recuperada como do comum. Ou seja, sem propriedade, se posicionando assim
num conflito ontológico que contorna a destruição [que] a natureza vai cobrar ao recuperar a terra a do
capitalismo.
Mas essa posição dos Zapatistas, com grande visibilidade, coincide com as de outros movimentos indígenas do
continente menos conhecidos que também se contrapõe, nesse grande conflito ontológico, as políticas de
morte, compartilhando a importância de responder, sob categorias próprias, a guerra entre as relações
impostas pelos não indígena e as relações de humanos, não humanos e mais-que-humanos impedidas pela
propriedade privada, questões que trabalharei procurando um diálogo interepistêmico que acompanha a reflexão
Zapatista e as de duas lutas indígenas junto as quais tenho pesquisado.
Uma delas é a luta pela retomada do território no Nordeste Indígena brasileiro, em particular dos Tupinambá,
a qual, além de ser uma luta contra as fazendas por terras/recursos, é também um embate ontológico para
retomar as relações cerceadas pelas propriedades privadas onde foram capturadas agências de tipos e tempos
diversos que ao voltam à relação, quando as terras são recuperadas pelos indígenas, trazem uma plêiade de
mais-que-humanos que encorajam a abolição dos latifúndios para retomar espaços para humanos, animais,
plantas e outras agências não vivas.
A outra reflexão é sobre a luta dos Nahuas do Ocidente mexicano pela comunidade a qual há seculos se
contrapõe ao regime colonial, ao regime das fazendas ou ao regime da propriedade coletiva vinda da reforma
agraria da Revolução Mexicana. Formas de propriedade que, mesmo com relações diferentes entre elas, se opõem
ao lugar-comum almejado na ideia de comunidade, a qual não é apenas uma forma de organização social, mas
também uma categoria que engloba os tratos e os acordos coletivos deles com forças não humanas, como ventos,
águas e donos, que garantem a continuidade da comunidade mediante a perpetração de ciclos como o do clima ou
do milho.