Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 079: O visível e o in(di)visível: ciências, conhecimentos e produções de mundos.
Uma (futura) ecologia da história: mosquitos modificados no Brasil e além
Há mais de cem anos, campanhas de saúde pública no Brasil tentam eliminar o mosquito Aedes aegypti, uma
espécie conhecida por seu papel na transmissão de vírus patogênicos como febre amarela, dengue, Zika e
chikungunya. Não obstante esses esforços, o A. aegypti continua a proliferar por todo o Brasil. Como parte
de uma nova iniciativa, técnicos e agentes de saúde estão liberando mosquitos nas ruas e becos do Rio de
Janeiro. Esses insetos estão infectados com uma bactéria chamada Wolbachia, um micróbio que reduz
significativamente a capacidade do A. aegypti de transmitir vírus. Nesse caso, as picadas desse mosquito
modificado ainda seriam um aborrecimento, mas não mais uma preocupação de saúde constante e implacável. Ao
transformar o antigo inimigo em um novo aliado, proponentes dessa estratégia estão propondo também uma
mudança na biopolítica maisquehumana: da erradicação à coexistência. De novembro de 2017 a julho de 2018,
realizei pesquisa etnográfica com agentes de saúde pública e técnicos e pesquisadores do projeto Wolbachia
implementando tal estratégia no Rio.
Devido ao longo histórico de tentativas e fracassos do Brasil em reduzir as arboviroses, meus interlocutores
caracterizavam o país, e mais especificamente o Rio de Janeiro, como um local ideal para testar a estratégia
Wolbachia. Além disso, eles argumentavam que, considerando a projeção da expansão geográfica do A. aegypti
causada pelas mudanças climáticas, as ecologias de mosquitos no Brasil seriam um prenúncio do que ainda está
por vir em outros países, principalmente na Europa e Estados Unidos.
Esta apresentação visa investigar como a ecologia da história do Brasil (adaptando aqui a proposta de Hannah
Landecker por uma biologia da história) é entendida como o futuro alhures. Para tal, examino
etnograficamente de que maneira cientistas e técnicos do projeto Wolbachia instrumentalizavam as relações
historicamente constituídas entre humanos, mosquitos e vírus para reimaginar possíveis futuros multiespécie.
Ao propor pensar uma (futura) ecologia da história busco repensar as relações espaciotemporais entre Norte
Global e Sul Global em um contexto de transformações planetárias. Ou seja, busco oferecer uma forma de
compreender o momento atual, mas, ao mesmo tempo, resistir à reificação de certos lugares como o passado ou
futuro.