ISBN: 978-65-87289-36-6 | Redes sociais da ABA:
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 079: O visível e o in(di)visível: ciências, conhecimentos e produções de mundos.
O desafio da horizontalidade epistêmica na pesquisa participativa
Um ano depois de ter começado o doutorado em Estado e Sociedade, pela Universidade Federal do Sul da Bahia, em março de 2022, me mudei para a Reserva Extrativista (Resex) de Canavieiras, área de estudo da pesquisa que iria começar a desenvolver junto a lideranças pesqueiras artesanais. No anteprojeto propunha analisar o processo de formação de pescadoras artesanais da Resex como lideranças políticas que lutam pelo território do qual suas comunidades tradicionais dependem, ao conduzir uma pesquisa participativa nos termos assinalados por Alfonso Torres Carrillo: investigação que envolve as pessoas afetadas por uma situação considerada por elas mesmas como uma problemática social, na sua identificação, estudo e solução, para o fortalecimento do coletivo. Na primeira ocasião que tive para conversar com algumas lideranças da Resex, lhes expliquei que o projeto era apenas minha chave de entrada à Universidade e um ponto de partida para a co-construção do tema da pesquisa junto com elas. Também salientei que, dada a metodologia usada, o tema não era fixo e que poderia ser alterado a partir da relação que construíssemos e com o contexto no geral. As lideranças acolheram a ideia de fazer uma pesquisa participativa e deram sugestões de tal importância que, desde esse momento, a orientadora, o co- orientador acadêmicos e eu os passamos a reconhecê-los plenamente enquanto co- orientadores temáticos da pesquisa. Durante os primeiros meses de convivência com as lideranças, me foram relatadas histórias de racismo intelectual sofridas pessoalmente. Esse termo foi usado apenas por uma liderança, mas sua essência tem sido vivenciada pelas demais: desprezo que acadêmicas e técnicas manifestam diante do uso do conhecimento tradicional em cenários de gestão ambiental pública, como a gestão compartilhada de Unidades de Conservação, no caso, a Resex. Dentre os temas mencionados pelas lideranças, a discriminação étnico-epistemológica foi o que me causou maior impacto e, por tanto, tem sido meu guia para o amadurecimento da pesquisa. Com o apoio da orientadora e co-orientador acadêmicos, atualmente reconheço à horizontalidade epistêmica como um elemento teoricamente implícito nas abordagens da pesquisa participativa, mas que, também, se constitui como seu grande desafio. A construção moderna de ciência é contraria a quaisquer ideias de horizontalidade. Portanto, integrá-la de forma teórica e, especialmente, prática na pesquisa implica uma radical desconstrução e re-construção do que se entende por investigação. Propostas teóricas que apontam nessa direção, como a “Ecologia dos Saberes e o Encontro de Saberes, se baseiam na construção de conhecimento a partir da prática e inclusão de saberes não acadêmicos. É o que farei: mostrar, em um caso, como isso pode acontecer.