ISBN: 978-65-87289-36-6 | Redes sociais da ABA:
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 010: Antropologia da percepção e dos sentidos
“Fazia muita visagem isso”: o papel das coisas em encontros com o extra-ordinário e o ‘sobrenatural’ na Amazônia
Este trabalho é instigado pela grande quantidade de histórias de visagem que, contam, acontecem no Theatro da Paz, o principal teatro da capital paraense (Belém, PA), luxuosamente construído durante a ‘Belle Époque’ regional. Atráves das narrativas que coletei sobre o teatro e de casos similares na bibliografia, busco explorar a capacidade da materialidade na Amazônia de ‘fazer visagens’: tanto em seu papel de provocar os sentidos, que informam sobre a presença de visagens, quanto na potencialidade que alguns objetos tem de atrair ou causar visagens. Visagem é um termo que descreve, principalmente, uma categoria de encontros multissensoriais com entes extra-ordinários, com os quais se tem uma relação mais ou menos simétrica. Isso inclui encontros com entes por vezes chamados de Encantados, como a Curupira e a Matinta Perera; com não-vivos, na forma de fantasmas e assombrações; e com certos animais da mata e dos rios, como Macacos Guariba e os Botos. É comum que lugares antigos (como palacetes, ruínas, locais importantes em revoltas populares e antigas prisões) tenham fama de serem ‘visagentos’; assim como, à beira dos rios, às margens da cidade, certas regiões da mata e locais com artefatos arqueológicos. E, geralmente, é ouvindo histórias desses lugares que se escuta o termo ‘fazer visagem’, que, nesses contextos, significa performar ações que atraem ou provocam visagens. Porém, essa capacidade de ‘fazer visagem’, não é atribuída somente às pessoas, mas também a objetos, frequentemente artefatos arqueológicos e pertences ligados aos mortos, como a cadeira preferida de um idoso ou a carteira perdida de um inspetor de segurança. Contudo, ouvindo as narrativas de visagem, contadas por funcionários e pessoas que trabalham no Theatro da Paz, notei que materialidades ordinárias, como quadros de energia, paredes, chapéus, e principalmente portas e janelas, aparecem com frequência nos relatos. Por mais que não sejam ‘provocadores’, da mesma forma que as outras categorias de objeto listadas, essas materialidades tem um papel no ‘fazer visagem’, uma vez que, frequentemente, é através da sensorialidade despertada por elas que às visagens se fazem notar. Destacando, por fim, um duplo papel das coisas: de mediador e de agente nas relações com o extra-ordinário.