ISBN: 978-65-87289-36-6 | Redes sociais da ABA:
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 084: Patrimônios Culturais, Gênero e Diversidade Sexual: confluências e divergências
Montando a Baiana: encruzilhadas de gênero, sexualidade, raça e religião no Maracatu de Baque Virado.
Nesta comunicação pretendo apresentar o desenvolvimento da pesquisa de mestrado Baianas Ricas no Maracatu de Baque Virado: corpovocalidades entre tradição e transgressão”, realizada no PPGAS-FFLCH-USP. Esta pesquisa, que parte também da Antropologia das Formas Expressivas, tem como objetivo perscrutar os lugares ocupados pelas baianas ricas, figura encarnada por homens gays, bichas, pessoas trans e travestis, no cortejo do Maracatu Nação. Essa figura ocupa espaços importantes tanto no séquito real das nações de maracatu, quanto nas festas, apresentações e atos políticos em que os novos grupos de maracatu participam. É a partir das décadas de 1960 e 1970 que os chamados frangos passam a ocupar especificamente a figura da baiana rica - anteriormente ocupada apenas por mulheres cis -, mas não sem ruídos nas comunidades maracatuzeiras. Uso aqui o termo frango por denotar a feminilidade dissidente corporificada historicamente por homens gays, mas também travestis e mulheres trans. É sob a exigência de entidades femininas, pombogiras, mestras de jurema e orixás, que essas novas baianas passam a desfilar nas cortes, sempre homenageando suas entidades. As comunidades nas periferias de Recife se constituem modernamente, sendo impactadas pelas lógicas sexistas que o pensamento ocidental informa. Mas ao considerá-las também enquanto comunidades de prática, é possível a pergunta: para além do sistema de gênero imposto e reproduzido colonialmente, quais lógicas de produção de corpo e gênero da diáspora movimentam, também, tais comunidades? Quais os lugares possíveis para esses femininos no universo de sentido das tradições afro-brasileiras? O que dizem esses corpos sobre si mesmos? Considerando a proximidade das comunidades maracatuzeiras com as religiões de matrizes africanas, é importante considerar a bibliografia sobre a presença de homossexuais e transsexuais nas comunidades de santo e suas implicações. (Birman, 2005; Dias, 2017; Fry, 1982; Landes, 1947; Segato, 2000). Para lidar com essas experiências racializadas e generificadas, o transfeminismo (Nascimento, 2021) surge como uma possibilidade teórica de estabelecimento de diálogos entre o feminismo e corpos/performances dissidentes. Isso coloca a possibilidade de não alcunhar os interlocutores a partir do jogo de poder e exclusão das identidades, como aponta Berenice Bento (2006, p.205), mas esperar as categorias mobilizadas na heterogeneidade das experiências e compreender também os percursos de cada categoria. Isso porque a figura da baiana surge nas biografias ora como forma de culto às ancestrais, ora como espaço de exercício de liberdade, e por vezes como um caminho para a compreensão do próprio gênero, como no caso de mulheres trans que transicionam a partir do exercício de montar sua baiana.